O Brasil está farto dos políticos tradicionais, não aguenta mais corrupção, o sistema está podre e precisa mudar. Das manchetes às redes sociais, passando por botecos e padarias, esse é o discurso dominante. Precisamos desesperadamente de algo novo. O que se vê na prática, contudo, é que os brasileiros e seus principais partidos continuam apostando no de sempre.
Quanto ao povo, o maior indício dessa tendência vem das últimas pesquisas eleitorais, que colocam o ex-presidente Lula na liderança, seguido pela reincidente Marina Silva e por um militar da reserva cujo nome preferimos não mencionar. Quanto aos partidos, o mais recente sinal de conservadorismo vem do PSDB, que tinha tudo para assumir as rédeas da nação, mas parece ter montado ao contrário na sela e só consegue olhar para trás.
Tentam vislumbrar as eleições de 2018, mas o fazem olhando o estrume pisado das eleições passadas e abraçam o PMDB.Eles até torcem o pescoço para espiar o caminho, mas logo se cansam e voltam a encarar a poeira do que passou. Atualmente, tentam vislumbrar as eleições de 2018, mas o fazem olhando o estrume pisado das eleições passadas e abraçam o PMDB. Nesse processo, dão as costas à juventude do próprio partido (onde a novidade supostamente deveria estar) que quer manter distância do Conde Temer.
Não se importam com malas de dinheiro, com reuniões em porões, não se importam com Renans, Romeros e Eunícios. Nem com reformas. Caso contrário, poderiam apoiá-las mesmo fora do governo, como chegaram a aventar.
Mas não. Eles querem mesmo é repisar o estrume, mantendo a aliança com o mastodonte fisiológico que sustentou e vampirizou FHC, Lula e Dilma, transformando a política no reino dos Joesleys, Marcelos e Eikes. Eles querem tempo de TV e quiçá uma futura base ampla no Congresso.
O mais irônico nisso tudo talvez seja a constatação de que o primeiro nome de destaque do partido a fincar pé publicamente na ideia de continuar com Temer foi justamente o homem que, para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso – e consequentemente para boa parte da nação coxinha –, é a própria personificação do novo. Sim, ele mesmo, o pós-prefeito de São Paulo, João Doria Júnior.
Na segunda-feira da semana passada (5) o tucanato paulista tinha se reunido para ensaiar um desembarque da canoa furada do Conde, mas Doria apareceu de surpresa e fez um discurso inflamado em favor da permanência. “Nosso inimigo chama-se PT, partido que é inimigo do Brasil”, afirmou. Depois da fala, tocaram o tema da vitória do Senna e foi que nem chuva em churrasco: os caciques todos metendo as convicções entre as pernas e dando o fora o mais rápido possível.
Abraçar o PMDB não tem nada de novo, João Doria também não tem. A postura de Doria pode parecer incoerente, mas, no fundo, não é. É hipócrita apenas. Porque se abraçar o PMDB não tem nada de novo, João Doria também não tem. O conservadorismo rançoso que ele encarna fica evidente nas políticas que vêm sendo implantadas na maior cidade do país.
Desde que assumiu, nosso pós-prefeito tem feito uma administração que vai contra tudo o que há de moderno em matéria de cidades.
Enquanto Miami atrai turistas com seu bairro grafitado de Wynwood, Doria cobre obras de arte com tinta cinza. Enquanto Frankfurt festeja mais de 20 anos do fim de sua cracolândia, conquistado à base de terapias de substituição e acolhimento, Doria quer resolver o mesmo problema com polícia e internação forçada. Enquanto a ONU recomenda a redução de velocidade para humanizar cidades, Doria pavimenta ciclovias, aposta no acelera, e coleciona multas ao volante de Porsches e BMWs, máquinas superdimensionadas que encarnam o atraso em termos de locomoção urbana.
Ao exibir seus ternos de alfaiataria nas redes sociais o alcaide paulistano parece mirar nas técnicas de comunicação que ajudaram Barack Obama a se tornar o presidente mais moderninho e descolado da história dos EUA.
Mas ao aparecer em vídeo alimentando seus alvíssimos cachorros junto de uma primeira dama que lhe sussurra um subserviente “e agora?”; ao demitir, também em vídeo público, uma atônita secretária de governo; ao incentivar seus empregados a transformarem cidadãos em situação de fragilidade em garotos propaganda involuntários, João Agripino da Costa Doria Júnior exala autoritarismo em vez de charme. E acaba mais parecido com o planetariamente odiado presidente Donald Trump.
O PSDB, claro, não aposta apenas em Dória como novidade. Flerta, por exemplo, com o apresentador de TV Luciano Huck. Isso sim é novidade, certo? Bem, em 1989 outra voz hegemônica dos finais de semana, o comunicador Senor Abravanel, candidatou-se a comandar o país. Mais conhecido como Silvio Santos, teve sua chapa impugnada pela Justiça Eleitoral por não cumprir o rito de convenções estaduais.
Ou seja, o tucano do terceiro milênio seria o equivalente político à internet discada, secretária eletrônica, quebra vento, rádio-taxi… É batata que vai dar certo.
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