Por Luiza Romão, no site da Fundação Perseu Abramo:
Articule bem as próximas sílabas e deixe ecoar no espaço a seguinte frase: “Vou quebrar sua cara”. Escute a sonoridade de cada consoante, perceba a tônica e a contundência do verbo, reflita sobre o enunciado. De quem seria essa voz? Feito isso, tente imaginar em que contexto tal ameaça foi proferida. Seria uma cena de bang-bang? Uma frenética briga entre torcidas organizadas? Ou ainda o teaser do primeiro filme de Tarantino? Sem sombra de dúvidas, a fala evoca um contexto de tensão e violência bem distantes da dita e esperada civilidade.
Bom, frustrando a expectativa de grandes epopeias, devo admitir que tal pensamento não partiu da boca de Al Pacino, tão pouco de Don Corleone, mas sim do atual secretário de Cultura da cidade de São Paulo, André Sturm. A ocasião? Uma reunião com os agentes culturais de Ermelino Matarazzo.
Como mostra o áudio disponível no link [aqui], o foco do secretário era obrigar o coletivo local a assinar uma “parceria” com a Prefeitura. Depois de ser contestado pelos artistas, Sturm se descontrola e ameaça agredir um dos interlocutores, chegando a proferir absurdos como “não vou sujar minhas mãos” [com você].
Se isoladamente o episódio já ultrapassa os limites do aceitável, ao colocá-lo numa perspectiva histórica (considerando os últimos seis meses de gestão), a situação extrapola o admissível, configurando-se como uma violência a todos os trabalhadores da cultura.
Nessa e nas próximas colunas, tentaremos traçar uma cronologia das ações de sucateamento, corte de verba e abuso de poder praticados pela Secretaria de Cultura (na figura de André Sturm) e pela Prefeitura (liderada por João Doria), a fim de evidenciar o plano de gestão neoliberal posto em curso.
Primeiramente, o ano começou com um congelamento de 43,5% da verba destinadas a Cultura (197,4 milhões dos 453,3 milhões anuais), ficando atrás somente de Gestão Ambiental (que sofreu um congelamento de 44,5%). Utilizando-se da crise econômica como justificativa, a Prefeitura promoveu também reduções drásticas no orçamento de Saúde e Educação. Curiosamente, menos de um mês depois, João Doria abriu uma licitação, no valor de R$ 100 milhões anuais, para marketing e publicidade da Prefeitura (em TV’s, mídia impressa, internet, etc).
Como podemos perceber o discurso da crise é uma fachada perversa para escamotear as reais prioridades do “gestor”. A intenção não é construir uma cidade abrangente e igualitária, mas sim disputar o espetáculo, construir um imaginário tão grandioso quanto irreal. Não à toa, Doria recorreu ao cosplay, jogo juvenil que confunde o real com a ficção, para se apresentar à população; tal qual na brincadeira nerd, o prefeito constrói personagens de si, máscaras fantásticas e disfarces perigosos. O que vale não é a política urbana ou as condições de trabalho, mas sim o fascínio do novo figurino, o ilusionismo do show midiático.
É importante dizer que tal chave de espetacularização opera numa lógica completamente oposta à do fazer artístico (a qual preza pela dialética, por deslocamentos subjetivos e pela formação do pensamento crítico). As ofensivas contra os programas de formação, os editais públicos e os projetos de cultura não são gratuitas e/ou ocasionais; pelo contrário, revelam uma estrutura de pensamento e administração reducionista que exclui a complexidade da pesquisa estética, do enfrentamento de ideias e da elaboração intelectual, e tem como resultado a massivização da experiência e do imaginário social.
Articule bem as próximas sílabas e deixe ecoar no espaço a seguinte frase: “Vou quebrar sua cara”. Escute a sonoridade de cada consoante, perceba a tônica e a contundência do verbo, reflita sobre o enunciado. De quem seria essa voz? Feito isso, tente imaginar em que contexto tal ameaça foi proferida. Seria uma cena de bang-bang? Uma frenética briga entre torcidas organizadas? Ou ainda o teaser do primeiro filme de Tarantino? Sem sombra de dúvidas, a fala evoca um contexto de tensão e violência bem distantes da dita e esperada civilidade.
Bom, frustrando a expectativa de grandes epopeias, devo admitir que tal pensamento não partiu da boca de Al Pacino, tão pouco de Don Corleone, mas sim do atual secretário de Cultura da cidade de São Paulo, André Sturm. A ocasião? Uma reunião com os agentes culturais de Ermelino Matarazzo.
Como mostra o áudio disponível no link [aqui], o foco do secretário era obrigar o coletivo local a assinar uma “parceria” com a Prefeitura. Depois de ser contestado pelos artistas, Sturm se descontrola e ameaça agredir um dos interlocutores, chegando a proferir absurdos como “não vou sujar minhas mãos” [com você].
Se isoladamente o episódio já ultrapassa os limites do aceitável, ao colocá-lo numa perspectiva histórica (considerando os últimos seis meses de gestão), a situação extrapola o admissível, configurando-se como uma violência a todos os trabalhadores da cultura.
Nessa e nas próximas colunas, tentaremos traçar uma cronologia das ações de sucateamento, corte de verba e abuso de poder praticados pela Secretaria de Cultura (na figura de André Sturm) e pela Prefeitura (liderada por João Doria), a fim de evidenciar o plano de gestão neoliberal posto em curso.
Primeiramente, o ano começou com um congelamento de 43,5% da verba destinadas a Cultura (197,4 milhões dos 453,3 milhões anuais), ficando atrás somente de Gestão Ambiental (que sofreu um congelamento de 44,5%). Utilizando-se da crise econômica como justificativa, a Prefeitura promoveu também reduções drásticas no orçamento de Saúde e Educação. Curiosamente, menos de um mês depois, João Doria abriu uma licitação, no valor de R$ 100 milhões anuais, para marketing e publicidade da Prefeitura (em TV’s, mídia impressa, internet, etc).
Como podemos perceber o discurso da crise é uma fachada perversa para escamotear as reais prioridades do “gestor”. A intenção não é construir uma cidade abrangente e igualitária, mas sim disputar o espetáculo, construir um imaginário tão grandioso quanto irreal. Não à toa, Doria recorreu ao cosplay, jogo juvenil que confunde o real com a ficção, para se apresentar à população; tal qual na brincadeira nerd, o prefeito constrói personagens de si, máscaras fantásticas e disfarces perigosos. O que vale não é a política urbana ou as condições de trabalho, mas sim o fascínio do novo figurino, o ilusionismo do show midiático.
É importante dizer que tal chave de espetacularização opera numa lógica completamente oposta à do fazer artístico (a qual preza pela dialética, por deslocamentos subjetivos e pela formação do pensamento crítico). As ofensivas contra os programas de formação, os editais públicos e os projetos de cultura não são gratuitas e/ou ocasionais; pelo contrário, revelam uma estrutura de pensamento e administração reducionista que exclui a complexidade da pesquisa estética, do enfrentamento de ideias e da elaboração intelectual, e tem como resultado a massivização da experiência e do imaginário social.
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