A volta do auxílio emergencial é uma imposição da realidade. Não é possível conceber uma política de Estado nas condições atuais do Brasil conforme prescreve a Constituição sem essa medida. A soma dos efeitos das crises econômicas e sanitárias cria um cenário de grandes privações para a imensa maioria do povo, enquanto os recursos da nação se concentram no pico da pirâmide social.
Por qualquer ângulo que se olhe para esse cenário, aparece uma equação que não fecha. Por que uma minoria pode gozar de imensos privilégios enquanto a grande maioria vive tão grandes privações? Em qual doutrina é possível encontrar uma resposta plausível para essa tremenda injustiça social? Existem teses que, como é lógico, exigem comprovação prática.
A tese do governo Bolsonaro é de que o Estado deve ser um mero administrador dos fluxos de capitais, deixando aos mercados a tarefa de regular o equilíbrio na produção e na distribuição da renda nacional. É uma tese antiga no Brasil, resultado de importações de ideias que pareciam mortas no passado e que ressurgiram com força à medida em que o capitalismo entrou na sua mais grave crise do pós-Segunda Guerra Mundial, em meados da década de 1970, que passou a ser conhecida como projeto neoliberal.
Sua base é a hipertrofia do mercado financeiro, do qual derivou sistemas políticos divorciados de soberanias dos povos e de conceitos como democracia e justiça social. No Brasil, essa tese com traços escravistas ganhou força na ditadura militar, a ideia de que não há como distribuir os frutos de um desenvolvimento não realizado. Primeiro era preciso fazer o bolo crescer para só depois distribuí-lo, o falso dilema inflação-desenvolvimento.
A política econômica da ”era militar” chegou à crise dos anos 1980, que levou à guinada ainda mais ‘ortodoxa” da linha de condução da economia quando o país ingressou na “era neoliberal”. Foi pelo caminho da prioridade à política de “estabilização monetária” em detrimento da postura desenvolvimentista que o Brasil chegou totalmente prostrado à grande crise do final dos 1990, iniciada com a derrubada dos chamados “tigres asiáticos” pelo circuito financeiro internacional.
Novamente o país enfrenta essa velha tese, bem expressa em 1979 pelo então ministro do Planejamento, Mário Henrique Simonsen, ao deixar o comando da equipe econômica recomendando ao seu sucessor, Antônio Delfim Netto, suas ideias sobre “estabilidade”, “necessidade de ajustes” e “austeridade fiscal”. Agora, no governo Bolsonaro com Paulo Guedes à frente do Ministério da Economia, essa história renasceu das cinzas. Esse é o contexto do debate sobre o auxílio emergencial, reafirmado pelo presidente da República na quarta-feira (10) com o mantra de que o governo não tem de onde tirar recursos para atender a essa demanda.
É o mesmo discurso ouvido quando surgiu a proposta no ano passado, que só foi adiante pela força da oposição na Câmara dos Deputados e dos setores populares que se mobilizaram por essa conquista. Agora, com o “Manifesto em Defesa do Auxílio Emergencial e de um programa de Renda Mínima que garanta a dignidade para todos” lançado pela Frente Mista em Defesa da Renda Básica no Congresso Nacional, mais uma vez se forma um amplo movimento em defesa dessa medida crucial para o país e para o povo nesse momento.
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