quinta-feira, 16 de julho de 2009

Jô Soares e o “caçador de marajás”

Nos momentos mais deprimentes das “baixarias na política”, como na atual crise do Senado, Jô Soares sempre leva ao seu programa da TV Globo várias comentaristas globais para espinafrar os políticos e desqualificar a política. São as tais “meninas do Jô”, sempre tão venenosas e cheias de certezas. No programa desta quarta-feira, as jornalistas Cristiana Lobo, Lúcio Hippolito, Lilian Witte Fibe, Flávia Oliveira e Ana Maria Tahan concentraram seus ataques no recente aperto de mão do presidente Lula ao senador Collor de Mello, numa solenidade pública em Alagoas. Para elas, travestidas de vestais da ética, este gesto seria a prova definitiva de que política não presta.

As “meninas do Jô” só deixaram da lembrar aos telespectadores sem memória que a candidatura de Collor de Mello, em 1989, foi fabricada nos sinistros laboratórios da própria TV Globo. Elas inclusive evitaram utilizar a expressão “caçador de marajás”, cunhada na época para alavancar o político alagoano e evitar a vitória de Lula, o temido líder grevista daquele período. Elas também nada falaram sobre a manipulação grosseira feita pelo Jornal Nacional da edição do debate entre os dois candidatos, nas vésperas daquele pleito. E ainda omitiram a informação de que a família de Collor de Mello ainda é proprietária da empresa afiliada da TV Globo em Alagoas.

Anarquista ao gosto do patrão

Diante das baixarias da famíglia Marinho, o recente aperto de mão é apenas um gesto protocolar! Com seu humor tendencioso, Jô Soares nunca cobrou qualquer autocrítica de seus patrões. Além das “meninas do Jô”, ele poderia ouvir o professor Venício de Lima, que no livro “Mídia: crise política e poder no Brasil” desmascara as manipulações da TV Globo na eleição do “caçador de marajás” e em outros episódios lamentáveis da nossa história recente. Também poderia convidar o professor Bernardo Kucinski, que no livro “A síndrome da antena parabólica” denuncia o total colapso da ética na mídia brasileira e o papel nefasto da famíglia Marinho na política nacional.

Até algum tempo atrás, Jô Soares ainda seduzia muita gente. Na época da ditadura, que contou com o apoio ativo da TV Globo até a reta final da campanha das “Diretas-Já”, ele fez um humor corajoso de denúncia da censura e dos militares. Após a conquista da democracia liberal, ele se deu por satisfeito e nunca mais incomodou os poderosos e os barões da mídia. Maroto, ele vestiu a oportuna fantasia do “anarquista”. O falecido professor Maurício Tragtemberg, um intelectual anarquista autêntico, costumava zombar destes anarquistas “riquinhos”, que fazem suas críticas comportamentais, mas não tem qualquer compromisso com a justiça social.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Congresso da UNE e desemprego dos jovens

A União Nacional dos Estudantes (UNE), entidade unitária dos universitários que sempre teve papel de destaque nas lutas democráticas e populares do Brasil, inicia hoje o seu 51º congresso. O evento reunirá mais de 15 mil jovens, cheios de energia e combatividade, em Brasília. Durante cinco dias, eles participarão de 25 mesas de debates plurais, discutindo os temas de maior relevo para a juventude. Ao final, aprovarão seu plano de lutas e elegerão a nova direção da entidade. A mídia hegemônica, que prefere noticiar fofocas e desfiles, possivelmente fará uma cobertura pífia deste evento de porte e destilará seu veneno, na linha da criminalização dos movimentos sociais.

Entre os temas que angustiam estes jovens conscientes e aguerridos, o da perspectiva de trabalho da juventude obrigatoriamente estará em pauta. A grave crise estrutural do capitalismo, acelerada pelo colapso da economia dos EUA, agrava um cenário que já era negativo e coloca em dúvida o futuro. Recente estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revela que o mercado de trabalho para os jovens brasileiros é marcado pelos altos índices de desemprego e informalidade. De acordo com o relatório “Trabalho decente e juventude no Brasil”, 67,5% dos jovens entre 15 e 24 anos estavam desempregados ou no mercado informal em 2006.

Falta de perspectiva dos jovens

O detalhado estudo, que tem como base a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) de 1992 a 2006, comprova que o déficit era maior entre as mulheres jovens (70,1%) do que entre os homens jovens (65,6%). O índice também era mais dramático entre os jovens negros (74,7%) do que entre os jovens brancos (59,6%). Já as jovens mulheres negras vivem, segundo a própria OIT, “uma situação de dupla discriminação”, de gênero e etnia. O desemprego e a informalidade afetavam 77,9% das jovens mulheres negras. Se o quadro já era grave antes da eclosão da crise capitalista, ele deve ter piorado na fase atual, segundo Laís Abramo, diretora da OIT no Brasil.

Apesar de reconhecer os avanços nas políticas públicas de geração de emprego para juventude do governo Lula, a diretora da OIT avalia que eles ainda são insuficientes. Para ela, o desafio maior consiste “em melhorar a qualidade da educação”. A pesquisa indica que 7% dos jovens brancos tinham baixa escolaridade e que o número mais do que dobrava (16%) entre os jovens negros. Também aponta que dos 22 milhões de jovens economicamente ativos, 30% trabalhavam mais de 20 horas semanais, o que prejudica o seu desempenho escolar. “Há uma espécie de círculo vicioso: o jovem não entra no mercado porque não tem experiência, mas para ter experiência ele precisa estar dentro do mercado”, alerta Laís Abramo.

Políticas públicas mais ativas

Com as mesmas preocupações, o atual presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Marcio Pochmann, propõe medidas de maior impacto para encarar o drama da falta de perspectiva da juventude, principal vítima do desemprego, da precariedade e da informalidade. No livro “A batalha pelo primeiro emprego”, reeditado pela Publisher, ele afirma que é urgente a adoção de políticas públicas mais ativas. Ele não trata a educação como panacéia, já que muitos jovens saídos da universidade hoje estão desempregados. “No Brasil, o avanço da escolaridade do jovem não tem sido acompanhado da melhor inserção e trajetória no mercado do trabalho”. O problema, portanto, não reside unicamente na educação, como difundem a mídia e os neoliberais.

Entre outras propostas, Pochmann defende que o ingresso do jovem no mercado de trabalho seja adiado, dando-lhe mais tempo para o estudo. Os avanços tecnológicos, que impulsionaram ainda mais a produtividade, justificariam e tornariam viável esta medida. Ele lembra que nos chamados países desenvolvidos, a cada 10 jovens, seis se encontram em situação de inatividade; no Brasil, sete a cada 10 já trabalham. “A ampliação da idade para ingresso no trabalho decorre da maior ocupação do tempo livre das faixas etárias inferiores da população com educação e programas de treinamento profissional de iniciação ao trabalho”. Ele também defende “a obrigação legal por parte das empresas com mais de nove empregados de conceder tempo e condições de formação prática ao trabalhador jovem” e a drástica redução das horas-extras.

Pochmann destaca a urgência da luta contra os entraves neoliberais. “Uma estratégia nacional pelo primeiro emprego do jovem deve levar em consideração, em primeiro lugar, a necessidade do crescimento econômico sustentado por um período relativamente longo de tempo, em especial no Brasil que tem cerca de 1,5 milhão de pessoas que ingressam anualmente no trabalho... Sem isso, as medidas direcionadas ao ingresso da juventude no trabalho tornam-se insuficientes, parcialmente compensatórias e relativamente parciais”. A leitura do seu livro é obrigatória para os conscientes e combativos militantes da UNE, que lutam por mudanças profundas no Brasil.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Serra e o “futurismo” da Revista da Folha

Com a manchete “São Paulo futurista”, a Revista da Folha desde domingo ingressou com tudo na campanha presidencial do governador paulista José Serra. Quem lê a reportagem, que trata dos “rascunhos de uma São Paulo em projetos que somam R$ 32 bilhões”, é levado a acreditar que a capital, administrada pelo demo Gilberto Kassab, e o estado, comandado há décadas pelos tucanos, serão o paraíso do futuro. Não haverá mais congestionamentos quilométricos, moradias precárias, menores consumindo crack no centro da cidade, falta de canalização do esgoto, postos de saúde abandonados, escolas caindo aos pedaços. As maquetes exibidas seduzem os ingênuos!

A reportagem promete um território dos sonhos. “Um metrô conectando o centro ao aeroporto de Cumbica. Edifícios com arquiteturas de grife espalhados pela cidade... Recuperação de uma das regiões mais degradadas da cidade [a cracolândia na estação da Luz]... Um sistema de transporte público um tanto melhor do que esse que São Paulo hoje possui [qual?]... E a favela do futuro”. José Serra nem é entrevistado para não dar muito na cara. No seu lugar, seu fiel seguidor Kassab, que disse em recente entrevista que “durmo de paletó” para atender o chefe notívago, garante que a São Paulo futurista terá “melhor fluidez no trânsito, mais áreas verdes, mais segurança, mais emprego, mais educação e melhor prestação de serviços”.

Truque de edição esconde a realidade

O repórter Gustavo Fioratti até explica que os projetos estão apenas no papel, que pouca coisa de concreto foi encaminhada. Também observa que as mudanças “imaginadas” são fomentadas pelo “maior evento futebolístico do planeta” – a Copa do Mundo de 2014. E reconhece que tais obras dependerão, também, das verbas do governo federal. Mas estas ponderações ficam ofuscadas no meio das páginas com ilusórias maquetes e fotomontagens. O leitor incauto da Revista da Folha, principalmente das camadas médias alienadas, é induzido a crer no “futurismo” tucano. A vida é um inferno na maior metrópole do país, mas no futuro, com “Serra presidente”, será um paraíso!

A manobra lembra um alerta do falecido jornalista Aloysio Biondi, um exemplo de dignidade na profissão. No artigo “Mentira e caradurismo (ou: a imprensa no reinado de FHC)”, que serviu de posfácio do livro “Padrões de manipulação da grande imprensa”, de Perseu Abramo, outro ícone do jornalismo, ele mostra que a mídia hegemônica bajulou descaradamente o tucano FHC. “Sem medo de exagerar, pode-se comprovar que técnicas jornalísticas e a experiência de profissionais regiamente pagos foram utilizadas permanentemente para encobrir a realidade. Valeu lançar mão de tudo: de manchetes falsas, inclusive ‘invertendo a informação’, a colocar o lide no final das matérias, isto é, esconder a informação realmente importante nas últimas linhas”.

Um dos truques mais usados pela mídia no reinado de FHC foi o de prometer um futuro melhor sem base na realidade. O ilusionismo foi feito com base em “manchetes encomendadas”, “cifras enganosas” e “omissão escandalosa”. Na época, ele advertiu: “No jornalismo do reinado de FHC é bobagem confiar nos títulos e na abertura, ou primeiras linhas (lide) da matéria, que são sempre otimistas... Técnica de edição? Diariamente, os jornais estão cheios desses truques de esconder a verdade”. O alerta de Aloysio Biondi se encaixa perfeitamente na análise critica da reportagem dominical da Revista da Folha, uma peça descarada da campanha presidencial de outro tucano.

domingo, 12 de julho de 2009

Lançado o livro “A ditadura da mídia”

A mídia hegemônica vive um paradoxo. Ela nunca foi tão poderosa no mundo e no Brasil, em decorrência dos avanços tecnológicos nos ramos das comunicações e das telecomunicações, do intenso processo de concentração e monopolização do setor nas últimas décadas e da criminosa desregulamentação do mercado que a deixou livre de qualquer controle público. Atualmente, ela exerce a sua brutal ditadura midiática, manipulando informações e deturpando comportamentos. Na crise de hegemonia dos partidos burgueses, a mídia hegemônica confirma uma velha tese do revolucionário italiano Antonio Gramsci e transforma-se num verdadeiro “partido do capital”.

Por outro lado, ela nunca esteve tão vulnerável e sofreu tantos questionamentos da sociedade. No mundo todo, cresce a resistência ao poder manipulador da mídia, expresso nas mentiras ditadas pela CNN e Fox para justificar a invasão dos EUA no Iraque, na sua ação golpista na Venezuela ou na cobertura tendenciosa de inúmeros processos eleitorais. Alguns governantes, respaldados pelas urnas, decidem enfrentar, com formas e ritmos diferentes, esse poder que se coloca acima do Estado de Direito. Na América Latina rebelde, as mudanças no setor são as mais sensíveis.

No caso do Brasil, a mídia controlada por meia dúzia de famílias também esbanja poder, mas dá vários sinais de fragilidade. Na acirrada disputa sucessória de 2006, o bombardeio midiático não conseguiu induzir o povo ao retrocesso político. Pesquisas recentes apontam queda de audiência da poderosa TV Globo e da tiragem de jornalões tradicionais. O governo Lula, com todas as suas vacilações, adota medidas para se contrapor à ditadura midiática, como a criação da TV Brasil e a convocação da primeira Conferência Nacional de Comunicação.

Este quadro, com seus paradoxos, coloca em novo patamar a luta pela democratização da mídia e pelo fortalecimento de meios alternativos, contra-hegemônicos, de informação. Este desafio se tornou estratégico. Sem enfrentar a ditadura midiática não haverá avanços na democracia, nas lutas dos trabalhadores por uma vida mais digna, na batalha histórica pela superação da barbárie capitalista e nem mesmo na construção do socialismo. Aos poucos, os partidos de esquerda e os movimentos sociais percebem que esta luta estratégica exige o reforço dos veículos alternativos, a denúncia da mídia burguesa e uma plataforma pela efetiva democratização da comunicação.

O livro A ditadura da mídia tem o modesto objetivo de contribuir com este debate. Não é uma obra acadêmica, mas uma peça de denúncia política. Ela não é neutra nem imparcial, mas visa desmascarar o nefasto poder da mídia hegemônica e formular propostas para a democratização dos meios de comunicação. O livro foi prefaciado pelo professor Venício A. de Lima, um dos maiores especialista no tema no país, e apresenta também um comentário do jornalista Laurindo Lalo Leal Filho, ouvidor da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Ele reúne cinco capítulos:

1- Poder mundial a serviço do capital e das guerras;
2- A mídia na berlinda na América Latina rebelde;
3- Concentração sui generis e os donos da mídia no Brasil;
4- De Getúlio a Lula, histórias da manipulação da imprensa;
5- Outra mídia é urgente: as brechas da democratização.

O exemplar custa R$ 20,00. Na venda de cotas para entidades (acima de 50 exemplares), o valor unitário é de R$ 10,00. Para adquirir sua cota, escreva para: aaborges1@uol.com.br.

sábado, 11 de julho de 2009

Visita à rebelde e criativa Rádio Favela

Em 9 de julho, enquanto a elite paulista festejava o feriado da fracassada “revolução oligárquica de 1932”, estive em Belo Horizonte para uma agenda carregada. Pela manhã, audiência pública na Assembléia Legislativa de Minas Gerais, requerida pelo deputado Carlin Moura (PCdoB) para debater os desafios da 1ª Conferência Nacional de Comunicação. Na seqüência, um almoço com comunicadores populares, entre eles integrantes da combativa Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço), o incansável jornalista Luis Carlos Bernardes, o Peninha, e o legendário Edivaldo Amorim, Didi, presidente da Associação Brasileira de Canais Comunitários (Abccom). O papo foi excelente – só faltou a indispensável cachaça mineira. Depois, uma conversa com o atual presidente do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais, o classista Aloísio Morais.

Todas as atividades foram riquíssimas. Para encerrar o educativo dia, o jornalista Kerison Lopes organizou uma marcante visita à Rádio Favela FM. No alto do morro da Serra, a maior favela de BH, uma prova inconteste do heroísmo e criatividade do povo brasileiro. Num pequeno sobrado, vários jovens envolvidos na programação desta rádio comunitária. Fundada em 1981, ela enfrentou violenta repressão, inúmeras prisões e processos; teve seus equipamentos várias vezes destruídos ou escondidos às pressas – como retrata o belo filme “Uma onda no ar”. Com muita persistência, ela conquistou a comunidade e, após quase 20 anos de heroísmo, conseguiu a sua outorga legal.

Um exemplo para o Brasil

No estúdio bem equipado, dois comentaristas esculhambam a elitização do futebol mineiro, com a cobrança de elevados ingressos na Libertadores da América, que terá o Cruzeiro na decisão. “O futebol é do povo, não é da elite que come caviar e toma champanhe”, dispara um dos locutores. Na varanda, que dá uma vista panorâmica da capital mineira, o ativo Misael dos Santos mostra as marcas das algemas que ficaram de uma de suas prisões, “quando a rádio era chamada de pirata”. Lembra sua mudança forçada para São Paulo, mas que o levou a trabalhar como operador de som nas greves operárias do ABC e a conhecer o líder grevista Lula, o atual presidente do Brasil.

Misael fala empolgado da programação da Rádio Favela, que toca todo tipo de música, presta diversos serviços à comunidade e dá informações aos ouvintes, sempre numa linguagem popular e com abordagens críticas. “A elite metida do país apanha bastante na rádio”. Este comunicador e guerreiro popular também lembra os prêmios da emissora, que inclusive foi condecorada duas vezes pela ONU por sua atuação no combate às drogas e à violência. Hoje o sinal da rádio atinge vários municípios da região metropolitana de Belo Horizonte e tem uma maiores audiências do Estado.

Que bom seria para a consciência crítica da sociedade se o Brasil tivesse milhares de emissoras comunitárias legalizadas como a Rádio Favela. A ditadura midiática não teria o mesmo poder de manipulação que dispõem atualmente. Misael, obrigado pela aula!