Por Paulo Kliass, no jornal Brasil de Fato:
A última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central confirmou mais uma vez a tendência de elevação da taxa oficial de juros. No dia 2 de abril foi divulgada a decisão: a Selic estava cotada no patamar de 11% ao ano. Trata-se do nono encontro consecutivo daquele colegiado com resultados de arrocho monetário, numa série que teve início em abril de 2013. Naquele momento, a taxa havia saído de 7,25% e foi sendo aumentada desde então.
A justificativa oficial para tal opção de política econômica é o suposto risco de descontrole sobre a inflação. Como se sabe, um dos tripés do programa que orienta a bússola da economia ao longo das últimas duas décadas é o estabelecimento de metas de inflação. O governo se compromete a cumprir um intervalo, considerado aceitável, para o crescimento médio dos preços em nosso país. Atualmente, a faixa vai de um mínimo de 2,5% até o máximo de 6,5% anuais, com o chamado “centro da meta” cravado em 4,5%.
Assim, à medida que a evolução da conjuntura começa a sinalizar algum tipo de elevação do Ipca, o modelo adotado recomenda a elevação da Selic como forma de anular a tendência altista dos preços. Ocorre que boa parte dos economistas – aqueles que não trabalham para consultorias financeiras nem comungam do enfoque liberal-monetarista – sabemos que existem outras avaliações a respeito do polêmico impacto da elevação dos juros. O exemplo mais gritante dessa ineficácia foi a retomada da alta da Selic em abril passado, quando a injustificável histeria criada a respeito dos riscos da inflação estava concentrada no crescimento dos preços do... tomate. Seria cômico, se não fosse trágico.
Sempre que o governo decide por elevar a taxa oficial de juros, verifica-se um repasse imediato sobre o custo dos empréstimos aos clientes no balcão dos bancos. Além disso, o mais grave é que o “spread” cobrado pelas instituições financeiras não retrocede. Pelo contrário, ele tende a aumentar. Trata-se da diferença entre a taxa que os bancos remuneram nossos depósitos e a taxa que cobram quando fazemos uma operação de crédito. Assim, os juros altos atuam de forma perversa – entre outras razões – por significar uma transferência de renda de todos os demais setores da sociedade para as instituições financeiras. Outro elemento negativo da política monetária restritiva é seu efeito recessivo sobre o ritmo da atividade econômica.
Aliás, é essa mesma a intenção subjacente ao modelo adotado. A alta dos juros inibe a demanda e a tendência ao crescimento do consumo baixa. Com isso, os preços tendem a ser reduzidos. Ocorre que o aumento dos custos financeiros representa também um desestímulo a novos investimentos e à atividade empresarial e produtiva de uma forma geral. Em outras palavras, elevar juros é provocar retração na atividade econômica. Não por acaso o crescimento do PIB em 2013 foi de apenas 2,3% e as perspectivas para o resultado de 2014 são ainda mais pessimistas.
Finalmente, o aumento na Selic opera como um verdadeiro tiro no pé nas intenções governamentais de promover a “austeridade” na política fiscal. Como a taxa oficial é utilizada para remunerar os próprios títulos da dívida pública, cada aumento nos juros do Banco Central provoca um aumento inesperado nas despesas orçamentárias do período. Como nosso volume de dívida já superou a marca de R$ 2 trilhões, cada ponto percentual de aumento na Selic representa um dispêndio extra de R$ 20 bilhões ao longo de 12 meses. A decisão do Copom, por exemplo, que a elevou de 10,75% para 11% tem como contrapartida um custo de R$ 5 bi para o Tesouro Nacional.
Ou seja, ao mesmo tempo em que determinam cortes em setores essenciais como saúde, educação, previdência e investimentos, o próprio governo promove o aumento de um gasto essencialmente parasita – a despesa de natureza financeira. Uma orientação muito distante de um modelo que busque o desenvolvimento sustentável e inclusivo.
* Paulo Kliass é doutor em economia pela Universidade de Paris 10 (Nanterre) e integrante da carreira de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental, do governo federal.
A última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central confirmou mais uma vez a tendência de elevação da taxa oficial de juros. No dia 2 de abril foi divulgada a decisão: a Selic estava cotada no patamar de 11% ao ano. Trata-se do nono encontro consecutivo daquele colegiado com resultados de arrocho monetário, numa série que teve início em abril de 2013. Naquele momento, a taxa havia saído de 7,25% e foi sendo aumentada desde então.
A justificativa oficial para tal opção de política econômica é o suposto risco de descontrole sobre a inflação. Como se sabe, um dos tripés do programa que orienta a bússola da economia ao longo das últimas duas décadas é o estabelecimento de metas de inflação. O governo se compromete a cumprir um intervalo, considerado aceitável, para o crescimento médio dos preços em nosso país. Atualmente, a faixa vai de um mínimo de 2,5% até o máximo de 6,5% anuais, com o chamado “centro da meta” cravado em 4,5%.
Assim, à medida que a evolução da conjuntura começa a sinalizar algum tipo de elevação do Ipca, o modelo adotado recomenda a elevação da Selic como forma de anular a tendência altista dos preços. Ocorre que boa parte dos economistas – aqueles que não trabalham para consultorias financeiras nem comungam do enfoque liberal-monetarista – sabemos que existem outras avaliações a respeito do polêmico impacto da elevação dos juros. O exemplo mais gritante dessa ineficácia foi a retomada da alta da Selic em abril passado, quando a injustificável histeria criada a respeito dos riscos da inflação estava concentrada no crescimento dos preços do... tomate. Seria cômico, se não fosse trágico.
Sempre que o governo decide por elevar a taxa oficial de juros, verifica-se um repasse imediato sobre o custo dos empréstimos aos clientes no balcão dos bancos. Além disso, o mais grave é que o “spread” cobrado pelas instituições financeiras não retrocede. Pelo contrário, ele tende a aumentar. Trata-se da diferença entre a taxa que os bancos remuneram nossos depósitos e a taxa que cobram quando fazemos uma operação de crédito. Assim, os juros altos atuam de forma perversa – entre outras razões – por significar uma transferência de renda de todos os demais setores da sociedade para as instituições financeiras. Outro elemento negativo da política monetária restritiva é seu efeito recessivo sobre o ritmo da atividade econômica.
Aliás, é essa mesma a intenção subjacente ao modelo adotado. A alta dos juros inibe a demanda e a tendência ao crescimento do consumo baixa. Com isso, os preços tendem a ser reduzidos. Ocorre que o aumento dos custos financeiros representa também um desestímulo a novos investimentos e à atividade empresarial e produtiva de uma forma geral. Em outras palavras, elevar juros é provocar retração na atividade econômica. Não por acaso o crescimento do PIB em 2013 foi de apenas 2,3% e as perspectivas para o resultado de 2014 são ainda mais pessimistas.
Finalmente, o aumento na Selic opera como um verdadeiro tiro no pé nas intenções governamentais de promover a “austeridade” na política fiscal. Como a taxa oficial é utilizada para remunerar os próprios títulos da dívida pública, cada aumento nos juros do Banco Central provoca um aumento inesperado nas despesas orçamentárias do período. Como nosso volume de dívida já superou a marca de R$ 2 trilhões, cada ponto percentual de aumento na Selic representa um dispêndio extra de R$ 20 bilhões ao longo de 12 meses. A decisão do Copom, por exemplo, que a elevou de 10,75% para 11% tem como contrapartida um custo de R$ 5 bi para o Tesouro Nacional.
Ou seja, ao mesmo tempo em que determinam cortes em setores essenciais como saúde, educação, previdência e investimentos, o próprio governo promove o aumento de um gasto essencialmente parasita – a despesa de natureza financeira. Uma orientação muito distante de um modelo que busque o desenvolvimento sustentável e inclusivo.
* Paulo Kliass é doutor em economia pela Universidade de Paris 10 (Nanterre) e integrante da carreira de Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental, do governo federal.
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