segunda-feira, 17 de março de 2014

A competição no mercado de mídia


Por Luis Nassif, no Jornal GGN:

O mercado de opinião tem características bastante semelhantes às de outros produtos de mercado.

Mais que isso, é ele quem dá voz às demandas e aspirações de grupos sociais. Quanto maior o número de grupos sociais representados, mais legítima é a democracia. E vice-versa.

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No século 20, no entanto, o modelo de grupo de mídia acabou dispondo de tal influência sobre a opinião pública - e, através dela, sobre governos, políticos e empresas - que eximiu-se de prestar contas de suas obrigações constitucionais.

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O direito econômico desenvolveu teorias e princípios visando conter o excesso de poder de mercado de empresas ou grupos, através de práticas anticoncorrenciais.

Com menos concorrência, há a tendência inexorável a práticas abusivas por parte dos cartéis/monopólios, em detrimento do cidadão/consumidor.

No mercado de opinião, os malefícios são maiores ainda, porque mexem com a própria essência da democracia, desequilibrando as disputas políticas e incentivando as soluções extra-constitucionais. Foi assim, ao insuflar golpes de Estado no Brasil (como em 1964), e em várias tentativas de golpe de Estado na América Latina, ou mesmo manipulando as eleições (como na campanha contra Barack Obama) ou mesmo induzindo a linchamentos morais, como em tantos episódios.

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Em geral, a defesa dos oligopólios consiste em dividir a mídia entre a imprensa privada e a imprensa estatal: quem é contra a Globo é a favor do Granma (o jornal oficial do governo cubano) ou do Pravda (o jornal oficial do partido comunista da Rússia).

É uma esperteza retórica. A verdadeira discussão é entre um mercado de mídia oligopolizado ou um mercado de mídia concorrencial.

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Ao longo das décadas, os grupos de mídia brasileiros consolidaram um conjunto de práticas monopolistas, impedindo a entrada de novos competidores:


- O controle da publicidade privada através do BV (bônus de veiculação), pelo qual grupos de mídia devolvem às agências de publicidade parte das verbas dos patrocinadores.

- As centrais de mídia - especialmente na emissora líder, a Globo - valendo-se da publicidade cruzada entre diversos veículos do grupo para sufocar competidores. Tipo, quem anunciar em um jornal concorrente de O Globo, fica proibido de anunciar na TV Globo.

- O conceito de rede de emissoras, com cada afiliada tendo vantagens competitivas insuperáveis, ante os competidores das respectivas praças, além de significar um amplo desequilíbrio das demandas e manifestações regionais.

- O controle da publicidade pública, através de ataques e críticas a cada tentativa de mudar a composição das verbas.

- O percentual máximo de 30% de capital estrangeiro na mídia, gerando o último cartório da economia brasileira que, desde a Constituição de 1988 passou a considerar como empresa nacional a multinacional instalada no país.

- O controle absoluto das concessões públicas de rádio e televisão. Em todo país democrático, com economia de mercado, as concessões não são eternas. São tratadas como bens públicos, têm prazo de validade e a obrigação, por parte do concessionário, de contrapartidas ao público. Por aqui, tornaram-se propriedade particular.

- A parceria com os coronéis políticos donos de concessão, provocando profundos desequilíbrios nas disputas políticas estaduais.

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Daí a necessidade imperiosa de, através de uma Lei de Mídia, tirar o Brasil do anacronismo de um mercado de mídia fechada, cartelizado, impondo regras que permitam a verdadeira economia de mercado no setor.

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