Por Paulo Donizetti de Souza, na Rede Brasil Atual:
“Esses caras que estão aí estão querendo voltar para um sistema econômico que já acabou”, constata o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, ao definir o projeto político do governo interino e seus objetivos para a economia do país. “Não dá mais. Você não cola as tendências destrutivas dessa forma de economia globalizada com as condições reais de vida das pessoas”, diz o professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Para ele, os economistas brasileiros que apregoam a recaída neoliberal não conseguem captar as transformações que põem em xeque o capitalismo global e repetem uma fórmula macroeconômica superada. “Pensam que tudo vai continuar do mesmo jeito, então tem de fazer ajuste fiscal. A macroeconomia não consegue capturar as mudanças estruturais no arranjo global e na vida das pessoas. Então ficam insistindo nas mesmas coisas. O problema é que essa macroeconomia, que guia a política do governo interino, não vale mais nada”, critica.
“Não tem capacidade operativa e muito menos explicativa. Estamos assistindo a uma transformação muito profunda, que nasce de um desarranjo e da dificuldade de olhar pra frente”, diz Belluzzo. Ele participou, na manhã de hoje (29), ao lado do economista Ladislau Dowbor, professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, de debate na abertura da conferência nacional dos bancários. O evento, na capital paulista, vai até domingo (31) e definirá rumos para a campanha nacional da categoria, que tem data-base para renovação da convenção coletiva de trabalho em 1º de setembro.
O economista alerta que o desafio posto aos governos do mundo todo é como sair dessa rota em direção ao futuro. “A questão que o pensamento econômico tem de se colocar é o que vai acontecer com a vida dos trabalhadores e dos cidadãos com essa derrocada de um sistema econômico que acabou.” Ele observa que o que se debate no mundo inteiro é como se reduz a jornada de trabalho, como se cria uma renda básica para as pessoas possam sobreviver, como se redefinem as relações sociais e as relações da economia para que a sociedade possa “viver dignamente”.
“Estamos num momento em que, por incrível que pareça, as pessoas sofrem sem necessidade. Porque, mal ou bem, o que essa economia chamada capitalismo criou ao longo dos últimos 200 anos, a despeito dela mesma, foi abundância – ou possibilidade de abundância – sem que se possa realizar isso dentro dos marcos das relações sociais que estão aí”, diz o professor.
“Esse é que é problema. Criou-se uma riqueza material enorme, com um custo também enorme do ponto de vista ambiental e humano, e não adianta recorrer a fórmulas velhas. Temos que pensar em como vai ser o socialismo do século 21. O socialismo da liberdade, da diversidade e da igualdade”, define, lamentando que ainda existam resistências a enfrentar esse debate. “Com um disse um pensador do século 19, a sociedade só se propõe problemas que pode resolver. E nós estamos nos propondo esse problema (olhar para o futuro) a partir de um sistema econômico que não dá mais.”
Declínio do império
Ao iniciar sua exposição com uma “aula” sobre o processo de globalização financeira a partir do início dos anos 1980, Belluzzo explicou como o modelo que regula as economias do mundo todo chegou ao seu limite, inclusive, no país que mais se beneficiou dela de lá para cá, os Estados Unidos. Ele observa que analistas e meios de comunicação brasileiros dão muita ênfase à forma espalhafatosa como se comporta o candidato conservador Donald Trump, do Partido Republicano, e pouco analisam seu conteúdo.
A candidatura Trump, que apavora o mundo democrático, está, segundo ele, bem posicionada entre os trabalhadores das regiões mais afetadas pelas saídas das empresas ao longo do processo de financeirização da economia – e que não só foram criar empregos na China e no restante da Ásia como se tornaram exportadoras de manufaturados para os próprios norte-americanos. “Os Estados Unidos passaram a ser importadores de bens e a ter sua conta de capitais negativa. Os ganhos oriundos do setor produtivo passaram a ser substituídos por ganhos com a especulação financeira. O resultado disso foi a queda nos empregos e na renda”, observa, explicando por que agora a fala de Trump tem aderência quando ele promete taxar em até 40% produtos vindos da Ásia.
“Ocorre que hoje o eleitorado do socialista Bernie Sanders – derrotado nas prévias do Partido Democrata por Hillary Clinton para a disputa da sucessão de Barack Obama – não diz (nas pesquisas) que vai votar na Hillary, embora não admita também que pretenda voltar em Trump. Mas o que esse eleitorado está dizendo é ‘não queremos mais isso’”, analisa o professor da Unicamp.
Para ele, os economistas brasileiros que apregoam a recaída neoliberal não conseguem captar as transformações que põem em xeque o capitalismo global e repetem uma fórmula macroeconômica superada. “Pensam que tudo vai continuar do mesmo jeito, então tem de fazer ajuste fiscal. A macroeconomia não consegue capturar as mudanças estruturais no arranjo global e na vida das pessoas. Então ficam insistindo nas mesmas coisas. O problema é que essa macroeconomia, que guia a política do governo interino, não vale mais nada”, critica.
“Não tem capacidade operativa e muito menos explicativa. Estamos assistindo a uma transformação muito profunda, que nasce de um desarranjo e da dificuldade de olhar pra frente”, diz Belluzzo. Ele participou, na manhã de hoje (29), ao lado do economista Ladislau Dowbor, professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, de debate na abertura da conferência nacional dos bancários. O evento, na capital paulista, vai até domingo (31) e definirá rumos para a campanha nacional da categoria, que tem data-base para renovação da convenção coletiva de trabalho em 1º de setembro.
O economista alerta que o desafio posto aos governos do mundo todo é como sair dessa rota em direção ao futuro. “A questão que o pensamento econômico tem de se colocar é o que vai acontecer com a vida dos trabalhadores e dos cidadãos com essa derrocada de um sistema econômico que acabou.” Ele observa que o que se debate no mundo inteiro é como se reduz a jornada de trabalho, como se cria uma renda básica para as pessoas possam sobreviver, como se redefinem as relações sociais e as relações da economia para que a sociedade possa “viver dignamente”.
“Estamos num momento em que, por incrível que pareça, as pessoas sofrem sem necessidade. Porque, mal ou bem, o que essa economia chamada capitalismo criou ao longo dos últimos 200 anos, a despeito dela mesma, foi abundância – ou possibilidade de abundância – sem que se possa realizar isso dentro dos marcos das relações sociais que estão aí”, diz o professor.
“Esse é que é problema. Criou-se uma riqueza material enorme, com um custo também enorme do ponto de vista ambiental e humano, e não adianta recorrer a fórmulas velhas. Temos que pensar em como vai ser o socialismo do século 21. O socialismo da liberdade, da diversidade e da igualdade”, define, lamentando que ainda existam resistências a enfrentar esse debate. “Com um disse um pensador do século 19, a sociedade só se propõe problemas que pode resolver. E nós estamos nos propondo esse problema (olhar para o futuro) a partir de um sistema econômico que não dá mais.”
Declínio do império
Ao iniciar sua exposição com uma “aula” sobre o processo de globalização financeira a partir do início dos anos 1980, Belluzzo explicou como o modelo que regula as economias do mundo todo chegou ao seu limite, inclusive, no país que mais se beneficiou dela de lá para cá, os Estados Unidos. Ele observa que analistas e meios de comunicação brasileiros dão muita ênfase à forma espalhafatosa como se comporta o candidato conservador Donald Trump, do Partido Republicano, e pouco analisam seu conteúdo.
A candidatura Trump, que apavora o mundo democrático, está, segundo ele, bem posicionada entre os trabalhadores das regiões mais afetadas pelas saídas das empresas ao longo do processo de financeirização da economia – e que não só foram criar empregos na China e no restante da Ásia como se tornaram exportadoras de manufaturados para os próprios norte-americanos. “Os Estados Unidos passaram a ser importadores de bens e a ter sua conta de capitais negativa. Os ganhos oriundos do setor produtivo passaram a ser substituídos por ganhos com a especulação financeira. O resultado disso foi a queda nos empregos e na renda”, observa, explicando por que agora a fala de Trump tem aderência quando ele promete taxar em até 40% produtos vindos da Ásia.
“Ocorre que hoje o eleitorado do socialista Bernie Sanders – derrotado nas prévias do Partido Democrata por Hillary Clinton para a disputa da sucessão de Barack Obama – não diz (nas pesquisas) que vai votar na Hillary, embora não admita também que pretenda voltar em Trump. Mas o que esse eleitorado está dizendo é ‘não queremos mais isso’”, analisa o professor da Unicamp.
Arranjo superado
Belluzzo insiste em apontar para os erros do Brasil ao tentar seguir, tardiamente, nos anos 1990, um arranjo econômico que tinha tudo para dar errado por promover riqueza (de poucos) sem promover produção e desenvolvimento. Essa visão “errática” custou caro ao país, quando se abriu para financeirização sem controle. “A China quando se abriu, abriu onde podia, na produção de bens. No setor financeiro, controlava 80% do crédito por meio dos bancos públicos. Abriu onde podia e controlou onde tinha de controlar.”
Quando veio o Plano Real, em 1994, conseguiu-se a estabilização econômica a partir da âncora cambial, com o real e dólar praticamente se equivalendo. “Depois (em 1999) desvalorizou-se o câmbio e mandaram os juros para a casa do chapéu. Entre 1994 e 1999, o juro real (acima da inflação) médio foi de 22,5% ao ano. Que economia aguenta isso? Saímos de uma dívida bruta ocupando 30% do PIB para 70% do PIB”, lembra.
O professor pondera ainda que o governo Lula, embora tenha conseguido manejar a condução da economia e fazer o país crescer – aproveitando o bem o ciclo das commodities – não aproveitou bem o ciclo para partir para outro arranjo que libertasse a política econômica da má condução dos fatores câmbio e juros.
“Deixar o câmbio desvalorizado (dólar barato) é dar sopa para chinês. E deixamos, nos últimos 20 anos. Nos demos bem nos anos 2000 porque a economia cresceu, então a relação dívida PIB voltou a cair para a casa dos 50%. Mas em 2014 voltamos a 54%, o que é ótimo comparado com os padrões mundiais, e em 2015 chegamos a nos aproximar dos 70% de novo”, descreve Belluzzo, assinalando que é uma relação ruim para um país que ainda paga taxas tão elevadas de juros (foram R$ 510 bilhões no ano passado, quase 10% do PIB).
“Eu falo sobre isso com o Lula e ele fica chateado. Quando começo a falar (sobre nossos erros na gestão de juros e câmbio), ele muda de assunto e começa a falar do Corinthians.”
Belluzzo insiste em apontar para os erros do Brasil ao tentar seguir, tardiamente, nos anos 1990, um arranjo econômico que tinha tudo para dar errado por promover riqueza (de poucos) sem promover produção e desenvolvimento. Essa visão “errática” custou caro ao país, quando se abriu para financeirização sem controle. “A China quando se abriu, abriu onde podia, na produção de bens. No setor financeiro, controlava 80% do crédito por meio dos bancos públicos. Abriu onde podia e controlou onde tinha de controlar.”
Quando veio o Plano Real, em 1994, conseguiu-se a estabilização econômica a partir da âncora cambial, com o real e dólar praticamente se equivalendo. “Depois (em 1999) desvalorizou-se o câmbio e mandaram os juros para a casa do chapéu. Entre 1994 e 1999, o juro real (acima da inflação) médio foi de 22,5% ao ano. Que economia aguenta isso? Saímos de uma dívida bruta ocupando 30% do PIB para 70% do PIB”, lembra.
O professor pondera ainda que o governo Lula, embora tenha conseguido manejar a condução da economia e fazer o país crescer – aproveitando o bem o ciclo das commodities – não aproveitou bem o ciclo para partir para outro arranjo que libertasse a política econômica da má condução dos fatores câmbio e juros.
“Deixar o câmbio desvalorizado (dólar barato) é dar sopa para chinês. E deixamos, nos últimos 20 anos. Nos demos bem nos anos 2000 porque a economia cresceu, então a relação dívida PIB voltou a cair para a casa dos 50%. Mas em 2014 voltamos a 54%, o que é ótimo comparado com os padrões mundiais, e em 2015 chegamos a nos aproximar dos 70% de novo”, descreve Belluzzo, assinalando que é uma relação ruim para um país que ainda paga taxas tão elevadas de juros (foram R$ 510 bilhões no ano passado, quase 10% do PIB).
“Eu falo sobre isso com o Lula e ele fica chateado. Quando começo a falar (sobre nossos erros na gestão de juros e câmbio), ele muda de assunto e começa a falar do Corinthians.”
0 comentários:
Postar um comentário