quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Caso Levy: Opinião e discurso de ódio

Por Leonardo Sakamoto, em seu blog:

Responderei, hoje, à mensagem educadérrima e super chique do leitor Wagner:



Preservei o sobrenome e o avatar do leitor para evitar o bullying

Wagner, assim como você, muita gente na internet também confunde opinião com discurso de ódio.

Mas, olha, fique tranquilo. É um erro bem comum quando você não está acostumado às regras do debate público de ideias.

Na internet, o anonimato traz aquela sensação quentinha de segurança e, por conta disso, não raro, as pessoas extrapolam. Afinal de contas, por aqui é menos simples (mas não impossível) identificar quem falou a abobrinha.

Então, vamos por partes. O direito ao livre exercício de pensamento e o direito à liberdade de expressão são garantidos pela Constituição e pelos tratados internacionais que o país assinou.

Mas, da mesma forma, as pessoas também são livres para ter sua orientação sexual. Isso sem contar o direito de ver preservada a sua integridade física e psicológica.

Ou seja, o mesmo direito que Levy Fidelix tem de ter suas opiniões, as pessoas também têm de ver garantida sua dignidade.

Agora, algo importante que as pessoas não sabem: liberdade de expressão não é um direito fundamental absoluto. Porque não há direitos fundamentais absolutos. Nem o direito à vida é. Prova disso é o direito à legítima defesa.

Pois a partir do momento em que alguém abusa de sua liberdade de expressão, indo além de expor a sua opinião, espalhando o ódio e incitando à violência, isso pode trazer consequências mais graves à vida de outras pessoas.

Como já disse aqui, pessoas como Levy Fidelix dizem que não incitam a violência. Não é a mão delas que segura a faca ou o revólver, mas é a sobreposicão de seus discursos ao longo do tempo que distorce o mundo e torna o ato de esfaquear, atirar e atacar banais. Ou, melhor dizendo, “necessários'', quase um pedido do céu. São pessoas como ele que alimentam lentamente a intolerância, que depois será consumida pelos malucos que fazem o serviço sujo.

E o candidato foi bem claro em sua argumentação. Depois de humilhar homossexuais, afirmou: “Vamos ter coragem! Nós somos maioria! Vamos enfrentar essa minoria. Vamos enfrentá-los''. Caberia bem em um filme sobre as Cruzadas ou a Inquisição, mas não em um debate presidencial.

A solução é garantir uma convivência pacífica e educada das diferenças. O ideal seria ir além da tolerância, com as pessoas enxergando essas diferenças como uma coisa boa para termos uma sociedade mais plural e interessante. Porém, na atual impossibilidade disso, a tolerância já está de bom tamanho.

Mas, aí, temos uma informação importante: a liberdade de expressão não admite censura prévia. Ou seja, apesar de alguns juízes não entenderem isso e darem sentenças aqui e ali para calar de antemão biografias, reportagens, propagandas, movimentos sociais, a lei garante que as pessoas não sejam proibidas de dizer o que pensam.

E foi isso o que aconteceu. Levy quis falar, Levy falou. A Record, acertadamente, não cortou seu microfone.

Contudo, há o outro lado da moeda: as pessoas são sim responsáveis pelo impacto que a divulgação de suas opiniões causam. Como foi o caso de dirigir a um grupo específico (homossexuais) um sentimento de ódio, propondo a restrição de seus direitos e até sua extirpação social. E toda pessoa que emitir um discurso de ódio, está sujeita a sofrer as consequências: pagar uma indenização, ir para a cadeia, perder o emprego, ter sua candidatura cassada.

Afinal, o exercício das liberdades pressupõe responsabilidade. Quem não consegue conviver com isso, não deveria nem fazer parte do debate público, recolhendo-se junto com sua raiva e ódio ao seu cantinho.

Por fim, a responsabilidade por uma declaração é diretamente proporcional ao poder de difusão dessa mensagem. Quanto mais pública a figura, mais responsável ela deve ser. Quanto maior o megafone (no caso de Levy, foi a segunda maior emissora de TV do país), mais responsável ela deve ser.

Certamente há outros candidatos e candidatas que não concordam com a justa equidade de direitos entre heterossexuais e homossexuais. Mas, apesar disso, nenhum deles descarregou essa opinião para o telespectador. Não dessa forma. Isso não é sinal de covardia dos outros. É sinal de estupidez de Levy.

Ou seja, o problema não é ter opinião. Muito menos declará-la. E sim como você faz isso. De forma respeitosa ou agressiva? Privilegiando o diálogo de diferentes e buscando uma convivência pacífica, ou conclamando as pessoas para desrespeitar ainda mais aqueles vistos como diferentes por medo ou desconhecimento?

Tenho a certeza de que se o combate ao discurso de ódio gerar a cassação de uma candidatura, estaremos passando para um outro patamar de civilidade no país.

3 comentários:

Anônimo disse...

Qdo a direita quer ganhar no grito já chega chamando o adversário de comunista, terrorista, e por aí vai. Comportamento bem doutrinado, claro, dos beócios.

Fabio Leonardo Cardoso disse...

Você também se igualou à eles ao postar um comentário como "anônimo" não expondo seu nome. Realmente alguns esquerdistas devem ter coerência, aliás, toda a esquerda deve agir com mais coerência. Prova disso é a própria candidata Luciana Genro que, ao receber imediatamente a palavra após a resposta do candidato Levy, comportou-se como uma gatinha mansa. Ora, ao meu ver ela quer se passar como um Leão, porem, ao ter a chance de agir comportou-se como um gatinho.

Anônimo disse...

Sakamoto,
Muito boa sua dissertação-resposta ao cidadão nervoso.
Gostaria de acrescentar ao seu tema sobre Liberdade de Expressão.Um juiz americano colocou isso de forma didática :Imagine um teatro lotado - se alguém gritar "FOGO" por brincadeira,pode gerar um pânico que leve a mortes.É inútil, invocar depois, na Justiça,a liberdade de expressão para gritar "fogo".
Carlos Magno