quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Bolsonaro: entre a punição e o prêmio

Por Renato Rovai, em seu blog:

Há um grupo de oportunistas que descobriu há algum tempo que a espetacularização costuma garantir bons frutos políticos, mesmo quando ela se conecta com o que há de mais bizarro e, inclusive, criminoso. Por muito tempo no Brasil isso foi conhecido como o voto Cacareco. O coitado do Cacareco nem tem muita coisa a ver com isso na verdade.

Aliás, vale a pena conhecer essa história. Em 1959, um simpático rinoceronte foi “lançado” candidato a vereador em São Paulo e teve quase 100 mil votos. Foi a forma que eleitores encontraram para protestar contra o que consideravam o baixo nível dos candidatos reais.

Mas há outros casos tão famosos quanto. Por exemplo, o do Macaco Tião, que era famoso por atirar alimentos nos visitantes do Zoológico do Rio, e que foi lançado candidato pela turma do Casseta Popular, em 1988, pra prefeito do Rio de Janeiro e obteve 400 mil votos. Nem Cacareco e nem Tião assumiram seus mandatos. Era época do voto em cédulas e essas opções não se consumavam.

Mas há casos em que pessoas fizeram o discurso da antipolítica e de alguma forma se deram bem. Cicciolina, a atriz pornográfica italiana que se elegeu mostrando os seios, é dessa mesma safra. Tiririca também. Se elegeu como palhaço e agora se reelegeu porque de alguma forma levou mais a sério o mandato de que muitos dos seus pares.

Na votação em urna eletrônica, votar em cacarecos ou macacos Tião não é possível. Ou você anula o voto ou busca um candidato que tenha essas características para protestar. Ou ainda, procura alguém que você acha que pareça a antítese do modelo vigente. E ao que parece é neste espaço que um Bolsonaro deita e rola.

O deputado pepista que se elegeu como o mais votado do Rio de Janeiro representa não só os saudosos dos tempos obscuros da ditadura militar, como também uma parcela da população que acha todos os políticos iguais. E aí, ele que ataca a todos e a própria instituição que representa, passa ser opção.

É evidente que isso não explica o fenômeno inteiro, porque Marco Feliciano se elegeu com imensa votação fazendo um discurso contra a população LGBT e sem defender a ditadura militar ou ameaçar um colega de estupro, como Bolsonaro. Mas se conectou a partir desse discurso com os setores mais conservadores.

Sim, os conservadores e ultraconservadores existem e precisam ser representados no processo democrático.

A questão é que quando os grupos que lhe combatem acabam dando muito destaque aos seus discursos, numa sociedade de circulação de informação rápida e abundante, isso pode acabar se tornando um prêmio muito mais do que uma punição. Mais gente que pensa como Bolsonaro e Feliciano vai lhes premiar com votos na próxima eleição. É isso o que tem acontecido nos últimos tempos com esse tipo de personagem político.

Mas então devemos ficar todos quietos com as estapafúrdias declarações desses meliantes políticos que chegam a fazer apologia ao estupro, por exemplo. Evidente que não. Este é um caso que deveria ser tratado como exemplar. Ao invés de fazer muito barulho contra o deputado milico-bandido (sim, milico-bandido, porque o sujeito é capitão e fez apologia ao estupro), as organizações feministas deveriam fazer de tudo para puni-lo judicialmente e no Legislativo. A cassação de Bolsonaro neste caso é algo absolutamente justificável.

Ao mesmo tempo, deveríamos pensar em como denunciar ações que buscam promoção para setores específicos sem tornar esses cafajestes em símbolos de bandeiras que condenamos. O ultraconservadorismo tem seu espaço na sociedade e quanto mais se vier a falar deles, mais referências públicas eles se tornarão para representar esse campo político.

A luta sem fulanização é sempre melhor por isso. Criar uma agenda positiva para as nossas bandeiras pode não dar muita audiência, mas é muito menos arriscado do ponto de vista de transformar bandidos em heróis. Os movimentos de Direitos Humanos, em especial aqueles que lutam por direitos civis, deveriam pensar em como lidar com essa questão.

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