Reproduzo matéria de Jacson Segundo, publicada no Observatório do Direito à Comunicação:
A futura presidente do Brasil, Dilma Rousseff, e os próximos deputados e senadores terão sob suas responsabilidades uma oportunidade ímpar de tornar o sistema de comunicação brasileiro mais democrático e plural. No primeiro dia de trabalho, cada um deles terá à disposição uma proposta de anteprojeto de lei geral para área, preparada por uma comissão interministerial criada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em julho deste ano.
Para não criar alarde em cima das propostas que estão sendo construídas, os membros do governo praticamente não têm falado sobre o assunto. Em entrevista coletiva concedida nesta segunda-feira (8) pelo ministro chefe da Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins, não foi diferente. No entanto, ele deu sinalizações importantes do que está sendo pensado pela comissão governamental, coordenada pela Casa Civil.
O ministro garantiu que no anteprojeto estarão presentes propostas de regulamentação de artigos do capítulo da Comunicação Social da Constituição que “há 22 anos dormem em algum canto”. É o que acontece, por exemplo, com os artigos 220, 221 e 223. O primeiro garante a liberdade de expressão e proíbe a formação de oligopólios e monopólios, o segundo dita princípios a serem seguidos pelos veículos (como promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação) e o terceiro, entre outras definições, diz que os sistemas privado, público e estatal de mídia devem ser complementares.
O desinteresse histórico dos governos e do Congresso em regulamentar tais artigos fez com que a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e Federação dos Radialistas (Fitert) entrassem com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) no Supremo Tribunal Federal (STF), em 20 de outubro deste ano, para que a Justiça obrigasse o legislativo a regulamentá-los.
A ministra Ellen Gracie entendeu que as entidades sindicais não poderiam apresentar tal pedido e arquivou a Ação. No entanto, Fábio Konder Comparato e Georghio Tomelin, advogados proponentes do recurso judicial, recorreram da decisão, e a ministra encaminhou a ADO para a Procuradoria Geral da República para que emita sua opinião sobre a procedência do agravo regimental solicitado pelos advogados.
O ministro Franklin Martins também reforçou que o anteprojeto vai se basear em princípios como a pluralidade, a neutralidade, o estímulo à competição à inovação e a proteção da cultura nacional e regional. A maioria, inclusive, já presente na Constituição Federal.
Outra preocupação evidente da comissão que elabora o anteprojeto é com uma regulação mais efetiva sobre o papel de cada agente econômico em um mercado em que as mídias e os serviços estão cada vez mais convergentes. O ministro Franklin lembrou a discrepância que há entre o setor de telecomunicações e o de radiodifusão em termos de faturamento. No ano passado, o primeiro faturou R$ 13 bilhões, e o segundo, R$ 180 bilhões. “Ou a gente regula para frente ou as teles passam por cima da radiodifusão”, disse.
O governo já havia frisado que o anteprojeto está sendo construído tomando em consideração as propostas aprovadas na Conferência Nacional de Comunicação. No entanto, algumas organizações da sociedade civil têm reivindicado maior participação na construção da proposta de revisão do marco legal. O governo, por sua vez, diz que neste primeiro momento a intenção é criar consensos internos sobre a proposta. Caberá a presidente Dilma decidir o encaminhamento do anteprojeto. Se vai ou não fazer uma consulta pública sobre ele, por exemplo.
Liberdade de imprensa
Na coletiva, o ministro também emitiu opinião sobre temas que estão sendo pautados por alguns veículos. Ele afirmou, por exemplo, que, se um conselho de comunicação for criado para censurar a mídia, o governo deve ser contra. No entanto, “se o conselho for para debater a mídia, qual é o problema?”, indagou Martins, lembrando que tal órgão existe em outras áreas.
Perguntado sobre se o governo não estaria com a intenção de cercear a mídia, o ministro foi enfático em afirmar que a imprensa é livre no país e que ela não está acima das críticas. Fez questão também de resgatar sua trajetória de vida. “Não apoiei a ditadura em momento algum”, respondeu ele à repórter do jornal O Globo.
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domingo, 14 de novembro de 2010
Mapa eleitoral identifica a direita
Reproduzo artigo de Marcos Coimbra, intitulado "Os tons do azul", publicado na revista CartaCapital:
Quase toda a imprensa usou mapas coloridos nas representações dos resultados da eleição presidencial. E, por razões evidentes, foi consenso pintar de vermelho os estados onde Dilma Rousseff ganhou e de azul aqueles em que José Serra se saiu melhor.
É um procedimento que ajuda a visualizar o que aconteceu, mas que leva a diversos equívocos. O mais grave é dar a impressão de que fomos “dois Brasis” na eleição: na metade- de baixo (Sul, Sudeste e Centro-Oeste), predominando o azul e, na de cima (Nordeste e Norte), o vermelho.
Como todo mundo sabe que a parte azul é mais rica e moderna e a vermelha mais pobre e atrasada, a impressão provocada por mapas desse tipo é de que o Brasil desenvolvido foi derrotado pelo subdesenvolvido. Se dependesse do primeiro, Serra seria o presidente. Inversamente, dos mapas emerge a conclusão de que Dilma venceu à custa da pobreza.
Mas é possível ir adiante nessa cartografia, buscando os matizes de cada cor. Por meio deles podemos identificar os nichos mais típicos de cada candidato, os lugares onde o azul é mais azul e o vermelho mais vermelho. É neles que o serrismo e o dilmismo atingiram seu auge e sua essência ficou mais clara.
Os da presidente eleita são fáceis de antecipar: Dilma alcançou seu máximo nos bolsões de extrema pobreza do interior do Nordeste. Lá, onde o Bolsa Família cobre quase toda a população, ela ultrapassou 90% dos votos, esmagando o adversário.
Que bela e convincente maneira de demonstrar que, quanto maior a pobreza, maior a derrota de Serra, maior a vitória do “paternalismo” sobre a “modernidade”, do analfabeto sobre o educado. O que deixa o quadro menos arrumado e complica a versão fácil que empolga os setores conservadores é que o serrismo tem uma geografia que desafia essa explicação. Pois, se o vermelho se acentua de forma previsível, o azul fica mais carregado em lugares inesperados. Em outras palavras, o voto Serra chegou ao ápice em municípios e regiões que de modernos e educados não têm nada.
São várias as explicações para o fato de o Acre ter sido o paraíso do serrismo. Não foi em São Paulo, onde ninguém estranharia que vencesse por larga margem, nem nas partes mais tradicionais do País que ele teve sua melhor performance. Foi lá, longe do “Sul Maravilha”, que Serra obteve mais que o dobro dos votos da petista, venceu em todos os municípios (salvo em Feijó) e está o município mais serrista do Brasil, Porto Acre, cidade miserável e de baixos níveis de escolaridade, onde suplantou Dilma por uma vantagem amazônica.
A versão mais corrente é que o petismo acriano seria responsável pela catástrofe. Depois de 12 anos no poder, o eleitorado teria mostrado, pelo voto em Serra, sua insatisfação com os irmãos Viana e seu grupo. Hipotéticas evidências são arroladas para sustentar a tese, desde desgastes com o funcionalismo público estadual a críticas ao modo como dialogam com a mídia.
O problema desse raciocínio é que tanto Tião Viana se elegeu governador quanto Jorge Viana senador. Ou seja, os acrianos teriam se comportado de maneira totalmente esdrúxula: para protestar contra os dois, os elegeram, mas derrotaram a candidata a presidente que apoiavam. Não seria muito mais lógico impedir que continuassem a administrar o estado?
Para complicar o “mistério acriano” e colocar sob suspeita as explicações localistas, Marina Silva também perdeu para Serra, apesar de “filha da terra”. E, em outros estados do “corredor do agronegócio”, houve vários resultados que sugerem que a avaliação de quem apoiava Dilma não teve efeito no voto que ela recebeu. Blairo Maggi, por exemplo, foi um dos campeões de voto para o Senado, elegeu seu candidato ao governo do Mato Grosso, mas viu Dilma perder.
Não foram fatos locais que explicaram o que aconteceu no Acre e nos demais estados vencidos pelo tucano. Também não foi uma oposição “Brasil moderno” vs. “Brasil arcaico”, como ilustram amplamente os casos do Acre e de Porto Acre. Não foi a educação que deu votos a Serra e a ignorância a Dilma.
Serra venceu onde venceu por fatores ideológicos (exceção de São Paulo, onde o bairrismo teve influência). Não foi um voto explicado pela sociologia (ou a geografia), mas pela política.
No Brasil inteiro, foi basicamente o eleitor antipetista, em muitos casos anticonservacionista, anti-indigenista e “antimovimentos sociais”, a favor da “agenda moral” e dos “valores tradicionais” que votou em Serra. Foi o eleitor de direita. No Sul e no Centro-Oeste, chegando ao Acre e a Roraima, ele era maioria, ainda que pequena. Por isso, Serra venceu nessas regiões. E perdeu no País, onde esse voto é minoria.
O predomínio do voto de direita no Acre é algo que merece estudo. Mas o certo é que Tião e Jorge Viana estão de parabéns pela vitória que tiveram em um estado que se inclinou tanto nessa direção. Sua votação mostra que, apesar disso, o eleitorado do Acre reconhece o trabalho que fizeram em benefício do estado.
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Quase toda a imprensa usou mapas coloridos nas representações dos resultados da eleição presidencial. E, por razões evidentes, foi consenso pintar de vermelho os estados onde Dilma Rousseff ganhou e de azul aqueles em que José Serra se saiu melhor.
É um procedimento que ajuda a visualizar o que aconteceu, mas que leva a diversos equívocos. O mais grave é dar a impressão de que fomos “dois Brasis” na eleição: na metade- de baixo (Sul, Sudeste e Centro-Oeste), predominando o azul e, na de cima (Nordeste e Norte), o vermelho.
Como todo mundo sabe que a parte azul é mais rica e moderna e a vermelha mais pobre e atrasada, a impressão provocada por mapas desse tipo é de que o Brasil desenvolvido foi derrotado pelo subdesenvolvido. Se dependesse do primeiro, Serra seria o presidente. Inversamente, dos mapas emerge a conclusão de que Dilma venceu à custa da pobreza.
Mas é possível ir adiante nessa cartografia, buscando os matizes de cada cor. Por meio deles podemos identificar os nichos mais típicos de cada candidato, os lugares onde o azul é mais azul e o vermelho mais vermelho. É neles que o serrismo e o dilmismo atingiram seu auge e sua essência ficou mais clara.
Os da presidente eleita são fáceis de antecipar: Dilma alcançou seu máximo nos bolsões de extrema pobreza do interior do Nordeste. Lá, onde o Bolsa Família cobre quase toda a população, ela ultrapassou 90% dos votos, esmagando o adversário.
Que bela e convincente maneira de demonstrar que, quanto maior a pobreza, maior a derrota de Serra, maior a vitória do “paternalismo” sobre a “modernidade”, do analfabeto sobre o educado. O que deixa o quadro menos arrumado e complica a versão fácil que empolga os setores conservadores é que o serrismo tem uma geografia que desafia essa explicação. Pois, se o vermelho se acentua de forma previsível, o azul fica mais carregado em lugares inesperados. Em outras palavras, o voto Serra chegou ao ápice em municípios e regiões que de modernos e educados não têm nada.
São várias as explicações para o fato de o Acre ter sido o paraíso do serrismo. Não foi em São Paulo, onde ninguém estranharia que vencesse por larga margem, nem nas partes mais tradicionais do País que ele teve sua melhor performance. Foi lá, longe do “Sul Maravilha”, que Serra obteve mais que o dobro dos votos da petista, venceu em todos os municípios (salvo em Feijó) e está o município mais serrista do Brasil, Porto Acre, cidade miserável e de baixos níveis de escolaridade, onde suplantou Dilma por uma vantagem amazônica.
A versão mais corrente é que o petismo acriano seria responsável pela catástrofe. Depois de 12 anos no poder, o eleitorado teria mostrado, pelo voto em Serra, sua insatisfação com os irmãos Viana e seu grupo. Hipotéticas evidências são arroladas para sustentar a tese, desde desgastes com o funcionalismo público estadual a críticas ao modo como dialogam com a mídia.
O problema desse raciocínio é que tanto Tião Viana se elegeu governador quanto Jorge Viana senador. Ou seja, os acrianos teriam se comportado de maneira totalmente esdrúxula: para protestar contra os dois, os elegeram, mas derrotaram a candidata a presidente que apoiavam. Não seria muito mais lógico impedir que continuassem a administrar o estado?
Para complicar o “mistério acriano” e colocar sob suspeita as explicações localistas, Marina Silva também perdeu para Serra, apesar de “filha da terra”. E, em outros estados do “corredor do agronegócio”, houve vários resultados que sugerem que a avaliação de quem apoiava Dilma não teve efeito no voto que ela recebeu. Blairo Maggi, por exemplo, foi um dos campeões de voto para o Senado, elegeu seu candidato ao governo do Mato Grosso, mas viu Dilma perder.
Não foram fatos locais que explicaram o que aconteceu no Acre e nos demais estados vencidos pelo tucano. Também não foi uma oposição “Brasil moderno” vs. “Brasil arcaico”, como ilustram amplamente os casos do Acre e de Porto Acre. Não foi a educação que deu votos a Serra e a ignorância a Dilma.
Serra venceu onde venceu por fatores ideológicos (exceção de São Paulo, onde o bairrismo teve influência). Não foi um voto explicado pela sociologia (ou a geografia), mas pela política.
No Brasil inteiro, foi basicamente o eleitor antipetista, em muitos casos anticonservacionista, anti-indigenista e “antimovimentos sociais”, a favor da “agenda moral” e dos “valores tradicionais” que votou em Serra. Foi o eleitor de direita. No Sul e no Centro-Oeste, chegando ao Acre e a Roraima, ele era maioria, ainda que pequena. Por isso, Serra venceu nessas regiões. E perdeu no País, onde esse voto é minoria.
O predomínio do voto de direita no Acre é algo que merece estudo. Mas o certo é que Tião e Jorge Viana estão de parabéns pela vitória que tiveram em um estado que se inclinou tanto nessa direção. Sua votação mostra que, apesar disso, o eleitorado do Acre reconhece o trabalho que fizeram em benefício do estado.
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Livro sobre "trabalho indecente" de jovens
Reproduzo matéria enviada por Reiko Miura, da Fundação Perseu Abramo:
O mundo do trabalho é, frequentemente, alvo de investigações acadêmicas ou de esforços descritivos que buscam compreendê-lo melhor, nas particularidades de cada momento histórico, e assim, instrumentalizar a militância sindical para os embates da luta de classes.
Neste início de século 21, um elemento fundamental do mundo do trabalho é a questão da juventude - seja pela necessidade de trabalhar e suas nuances, seja pela ausência de trabalho ou sua precarização. Para contribuir com esse debate, o sociólogo Anderson Campos, especialista em Economia do Trabalho e Sindicalismo pelo Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho, da Unicamp e assessor político da CUT, lança o livro "Juventude e ação sindical: Crítica ao trabalho indecente", buscando problematizar de que forma se dá a inserção dos jovens no mercado de trabalho e os impactos dessa presença para a luta por "trabalho decente", bandeira do movimento sindical em defesa de direitos trabalhistas e contra a flexibilização, precarização e informalização do trabalho.
Prefaciado pelo economista Márcio Pochmann, presidente do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), o livro aborda temas atuais como a questão do estágio, as políticas públicas de proteção social da juventude e a sindicalização de trabalhadores/as dessa faixa etária. "O assunto sindical também se torna estratégico para uma massa juvenil que envolve cerca de 50 milhões de brasileiros", afirma Pochmann.
Artur Henrique, presidente nacional da CUT, destaca que "a baixa estruturação do mercado de trabalho brasileiro afeta mais fortemente os jovens, que na média, tem uma inserção precária, instável e insegura; e talvez o mais grave dessa inserção precária no presente, seja o futuro".
De acordo com o autor, a intenção do trabalho é buscar uma ação sindical de jovens integrada à agenda do sindicalismo combativo, e ao mesmo tempo, que essa ação possibilite a renovação da mesma agenda.
* Lançamento em São Paulo será no dia 23/11 às 19h, no Clube da Cana. Rua Barão de Tatuí, 272, Santa Cecília.
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O mundo do trabalho é, frequentemente, alvo de investigações acadêmicas ou de esforços descritivos que buscam compreendê-lo melhor, nas particularidades de cada momento histórico, e assim, instrumentalizar a militância sindical para os embates da luta de classes.
Neste início de século 21, um elemento fundamental do mundo do trabalho é a questão da juventude - seja pela necessidade de trabalhar e suas nuances, seja pela ausência de trabalho ou sua precarização. Para contribuir com esse debate, o sociólogo Anderson Campos, especialista em Economia do Trabalho e Sindicalismo pelo Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho, da Unicamp e assessor político da CUT, lança o livro "Juventude e ação sindical: Crítica ao trabalho indecente", buscando problematizar de que forma se dá a inserção dos jovens no mercado de trabalho e os impactos dessa presença para a luta por "trabalho decente", bandeira do movimento sindical em defesa de direitos trabalhistas e contra a flexibilização, precarização e informalização do trabalho.
Prefaciado pelo economista Márcio Pochmann, presidente do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), o livro aborda temas atuais como a questão do estágio, as políticas públicas de proteção social da juventude e a sindicalização de trabalhadores/as dessa faixa etária. "O assunto sindical também se torna estratégico para uma massa juvenil que envolve cerca de 50 milhões de brasileiros", afirma Pochmann.
Artur Henrique, presidente nacional da CUT, destaca que "a baixa estruturação do mercado de trabalho brasileiro afeta mais fortemente os jovens, que na média, tem uma inserção precária, instável e insegura; e talvez o mais grave dessa inserção precária no presente, seja o futuro".
De acordo com o autor, a intenção do trabalho é buscar uma ação sindical de jovens integrada à agenda do sindicalismo combativo, e ao mesmo tempo, que essa ação possibilite a renovação da mesma agenda.
* Lançamento em São Paulo será no dia 23/11 às 19h, no Clube da Cana. Rua Barão de Tatuí, 272, Santa Cecília.
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Um retrato da desigualdade no Chile
Reproduzo artigo de Andrés Figueroa Cornejo, da Argenpress.info, publicado no sítio Carta Maior:
Enquanto Sebastián Piñera aproveita os últimos créditos político-midiáticos do espetacular resgate dos 33 mineiros da mina San José, Também em Copiapó, no dia 8 de novembro, Homero Aguirre e Daniel Lazcano, trabalhadores da mina de cobre Los Reyes, morreram em um novo acidente de trabalho. A exploração pertence à empresa Sociedad Legal Compañía Minera Del Sur.
Quando centenas de desempregados, dos milhares que ficaram na rua por ocasião do abrupto corte dos empregos emergenciais em Concepção - numa situação crítica logo após o terremoto e o maremoto de fevereiro de 2010 -, viajaram a Santiago e depois a Valparaíso para exigir a reabertura dos trabalhos emergenciais, o presidente Piñera anunciou as vigas mestras de sua agenda de governo batizada com pompa "Chile País Desenvolvido: Mais Oportunidades e Melhores Empregos". A fórmula piñerista simplesmente é uma extensão ampliada das políticas dos últimos governos da Concertação: aumentar o investimento no país, incentivos tributários para o reinvestimentos de pequenas e médias empresas e incentivo ao turismo.
A fantasia publicitária de converter o Chile em um país desenvolvido sobre pilares que intensificam a abertura econômica e o investimento transnacional sem travas nem impostos significativos só tornam o Chile mais dependente dos preços do cobre. Não é estranho que entre janeiro e outubro de 2010, o governo tenha autorizado um investimento histórico de capitais de mega corporações estrangeiras que chegou a 13,275 bilhões de dólares (mais de 200% em relação ao mesmo período de 2009), distribuídos assim: 83% para a exploração de cobre; 9,1% para serviços; 4% para os setores de eletricidade, gás e água; e 3,4% para comunicações.
Os preços do cobre estão em níveis extraordinariamente altos (como todas as matérias primas do continente) em função da demanda asiática, em especial da China. Isso, como já ocorreu em outros períodos, torna a economia chilena muito sensível ao destino das potências que hegemonizam o planeta. Neste contexto, aprofunda-se o perfil primário extrativista do país. Esses capitais estrangeiros migram segundo seu próprio capricho e de acordo com variáveis incontroláveis pelo Estado chileno. Além disso, geram pouco trabalho. Ou seja, se incrementa a natureza rentista do padrão de acumulação capitalista da classe no poder e se posterga a industrialização e a diversificação necessária ao país para impulsionar um projeto nacional e integral de desenvolvimento.
A classe dominante só persegue o lucro rápido e no curto prazo, hipotecando as bases genuínas de um país a caminho de um desenvolvimento democrático, alimentando uma estrutura econômica deformada, contra toda ideia de soberania, dramaticamente subordinada ao capital das economias centrais cujos objetivos estão muito longe de ser o bem estar e os interesses das maiorias nacionais.
Assim mesmo, com um desemprego estrutural "oficial" beirando os 10%, a simplificação na criação de microempresas - que, na maioria dos casos, são negócios familiares - é uma maneira desesperada de multiplicar o trabalho precário por conta própria em função da ausência de trabalho formal para absorver a força de trabalho desempregada. Aquelas pequenas e médias empresas que se dedicam a atividades produtivas, além disso, estão condenadas a vender seus produtos aos preços impostos por um mercado cada vez mais concentrado (a cadeia de supermercados Wal-Mart, que se chama Líder no Chile, é paradigmática neste sentido), com o agravante de ter que competir com mercadorias asiáticas cuja importação é livre.
E quando Piñera fala de "modernização do Estado", ele se refere simplesmente ao seu encolhimento, com o subsequente aumento do desemprego e menor fiscalização em todos os âmbitos. De fato, espera-se numerosas demissões para o final de novembro, no marco de uma dura negociação coletiva com os sindicatos do setor público que pedem um aumento salarial de 8,9%, sendo que, até agora, o governo só ofereceu um escasso 3,7% nominal.
A acumulação capitalista por meio do saqueio dos recursos naturais desta vez tem seu ponto duro no território do Lago Neltume, cujas comunidades mapuche resistem à construção do túnel de prospecção para a Central Neltume, propriedade da transnacional Endesa-Enel. Os mapuche denunciaram que a "Endesa-Enel invadiu nosso território, retirando-nos a água, apropriando-se dos direitos de aproveitamento contínuo dos bens de vários riachos que pertencem a famílias de nossa comunidade".
Entre as maldições da prospecção está o fato de que a companhia "nos deixará sem nossas ervas medicinais ao elevar o caudal do lago Neltume, ervas que usamos desde tempos ancestrais e que, sem as quais, morreremos". Os mapuche dizem ainda que a Endesa-Enel "deve compreender que os seres humanos não são donos da natureza, mas sim parte dela, e que o dinheiro e o lucro não podem ficar acima dos direitos coletivos dos povos".
Os trabalhadores da terceira corporação de cobre privada que explora o mineral no país, Doña Inés de Collahuasi, estão em greve desde o dia 5 de novembro. A 4.500 metros de altura na região norte, o presidente do sindicato, Manuel Muñoz informou que a companhia, em 2010, terá investimentos de 3 bilhões de dólares, enquanto os trabalhadores estão exigindo 50 milhões de dólares em três anos, somando todas as suas demandas.
Em outro setor, os trabalhadores da construção civil que edificam o Hospital de Puerto Montt, no sul do Chile, cujas empresas selecionadas para a obra são Besalco, Moller y Pérez Cotapos, associadas no Consórcio Hospital de Puerto Montt, mobilizaram-se contra as más condições de segurança e higiene no interior de uma obra estatal. Os operários agrupados na Federação de Trabalhadores da Construção (Fetracoma), foram desalojados da obra com extrema violência por Forças Especiais de Carabineiros, com a anuência do governador da zona, Francisco Muñoz, da secretária regional do Ministério da Saúde, Mônica Winkler, e da secretária do Trabalho, Andrea Rosmanich, que conheciam perfeitamente as péssimas condições de trabalho na construção. 23 trabalhadores e dirigentes sindicais foram detidos pela polícia.
Segundo a Pesquisa de Caracterização Socio-Econômica 2009 (Casen), realizada pelo Ministério do Planejamento a cada 3 anos, o Chile é hoje mais pobre que em 2006. De acordo com os dados oficiais, em 2006 a pobreza alcançava 13,7% da população nacional, enquanto hoje esse índice é de 15,1%. Por regiões, a pesquisa aponta como líderes do ranking da miséria a região de La Araucanía, com 27,1%, a de Bio Bío, com 21%, a de Maule, com 20,8%, a de Los Ríos, com 20,4%, Atacama, com 17,4% e Coquimbo com 16,6%. As mulheres são mais pobres do que os homens (15,7% x 14,5%); e a população originária (indígena) mais pobre que a mestiça (19,9% x 14,8%).
Agora vem o importante. O corte ou linha de pobreza fixado pelo Estado é de 64 mil pesos por mês (128 dólares) para os que vivem nas cidades e de 43 mil pesos mensais (86 dólares) para os que vivem em zonas rurais. Ou seja, se no momento da realização da pesquisa a pessoa obtém um peso a mais que os mínimos assinalados, para efeitos estatísticos já não é mais considerada pobre. E a linha de pobreza é fabricada mediante uma misteriosa cesta "básica de alimentos por pessoa cujo conteúdo calórico e proteico permita satisfazer um nível mínimo de exigências nutricionais". Isto é, um conjunto de produtos alimentícios - cuja qualidade e origem não interessa - que um ser humano precisa para não desfalecer de inanição.
E mais. Com uma suposição fundada no cinismo mais abjeto, o informe da Casen indica que "se assume que os lares que conseguem cobrir adequadamente suas necessidades de alimentação satisfazem, ao mesmo tempo, os padrões mínimos das outras necessidades básicas". Por que se supõe que alguém que mal tem recursos para comer conta com recursos para ter acesso aos serviços básicos (moradia, eletricidade, água, gás telefone), à saúde, à educação, à seguridade social, à recreação, a um emprego estável e a um larguíssimo etcétera?
Que ciência apóia essa hipótese?
O Estado fixa a linha de pobreza em 64 mil pesos, em um Chile onde duas viagens no transporte público custam mil pesos, um quilo de pão outros mil pesos, uma mensalidade universitária mais de 200 mil pesos em média e o aluguel de uma habitação ou quarto com banho compartilhado custa entre 60 e 80 mil pesos/mês. Quantos chilenos ganham com seu trabalho considerando um desemprego estrutural que não sai de 8 a 10% - menos de 350 mil pesos (700 dólares). Cerca de 70 ou 80% da população?
Resulta óbvio que a pobreza ou o empobrecimento da população do país é muito maior que 15,1%, e que esse número não é mais que um indicador colocado na vitrine para as agências avaliadoras de risco multinacionais que orientam o grande capital investidor para benefício de uma minoria rentista e grande proprietária.
Em um micro-ônibus da Transantiago havia um aviso fixado por algum usuário que dizia: "Se pago a passagem, não como". Essa é uma verdade do tamanho do sol em um pequeno país cujo PIB cresce a cerca de 6%, ao custo da mais dura desigualdade social, concentração econômica e exploração sem limite nem regulação alguma de seres humanos e natureza.
Tradução: Katarina Peixoto
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Enquanto Sebastián Piñera aproveita os últimos créditos político-midiáticos do espetacular resgate dos 33 mineiros da mina San José, Também em Copiapó, no dia 8 de novembro, Homero Aguirre e Daniel Lazcano, trabalhadores da mina de cobre Los Reyes, morreram em um novo acidente de trabalho. A exploração pertence à empresa Sociedad Legal Compañía Minera Del Sur.
Quando centenas de desempregados, dos milhares que ficaram na rua por ocasião do abrupto corte dos empregos emergenciais em Concepção - numa situação crítica logo após o terremoto e o maremoto de fevereiro de 2010 -, viajaram a Santiago e depois a Valparaíso para exigir a reabertura dos trabalhos emergenciais, o presidente Piñera anunciou as vigas mestras de sua agenda de governo batizada com pompa "Chile País Desenvolvido: Mais Oportunidades e Melhores Empregos". A fórmula piñerista simplesmente é uma extensão ampliada das políticas dos últimos governos da Concertação: aumentar o investimento no país, incentivos tributários para o reinvestimentos de pequenas e médias empresas e incentivo ao turismo.
A fantasia publicitária de converter o Chile em um país desenvolvido sobre pilares que intensificam a abertura econômica e o investimento transnacional sem travas nem impostos significativos só tornam o Chile mais dependente dos preços do cobre. Não é estranho que entre janeiro e outubro de 2010, o governo tenha autorizado um investimento histórico de capitais de mega corporações estrangeiras que chegou a 13,275 bilhões de dólares (mais de 200% em relação ao mesmo período de 2009), distribuídos assim: 83% para a exploração de cobre; 9,1% para serviços; 4% para os setores de eletricidade, gás e água; e 3,4% para comunicações.
Os preços do cobre estão em níveis extraordinariamente altos (como todas as matérias primas do continente) em função da demanda asiática, em especial da China. Isso, como já ocorreu em outros períodos, torna a economia chilena muito sensível ao destino das potências que hegemonizam o planeta. Neste contexto, aprofunda-se o perfil primário extrativista do país. Esses capitais estrangeiros migram segundo seu próprio capricho e de acordo com variáveis incontroláveis pelo Estado chileno. Além disso, geram pouco trabalho. Ou seja, se incrementa a natureza rentista do padrão de acumulação capitalista da classe no poder e se posterga a industrialização e a diversificação necessária ao país para impulsionar um projeto nacional e integral de desenvolvimento.
A classe dominante só persegue o lucro rápido e no curto prazo, hipotecando as bases genuínas de um país a caminho de um desenvolvimento democrático, alimentando uma estrutura econômica deformada, contra toda ideia de soberania, dramaticamente subordinada ao capital das economias centrais cujos objetivos estão muito longe de ser o bem estar e os interesses das maiorias nacionais.
Assim mesmo, com um desemprego estrutural "oficial" beirando os 10%, a simplificação na criação de microempresas - que, na maioria dos casos, são negócios familiares - é uma maneira desesperada de multiplicar o trabalho precário por conta própria em função da ausência de trabalho formal para absorver a força de trabalho desempregada. Aquelas pequenas e médias empresas que se dedicam a atividades produtivas, além disso, estão condenadas a vender seus produtos aos preços impostos por um mercado cada vez mais concentrado (a cadeia de supermercados Wal-Mart, que se chama Líder no Chile, é paradigmática neste sentido), com o agravante de ter que competir com mercadorias asiáticas cuja importação é livre.
E quando Piñera fala de "modernização do Estado", ele se refere simplesmente ao seu encolhimento, com o subsequente aumento do desemprego e menor fiscalização em todos os âmbitos. De fato, espera-se numerosas demissões para o final de novembro, no marco de uma dura negociação coletiva com os sindicatos do setor público que pedem um aumento salarial de 8,9%, sendo que, até agora, o governo só ofereceu um escasso 3,7% nominal.
A acumulação capitalista por meio do saqueio dos recursos naturais desta vez tem seu ponto duro no território do Lago Neltume, cujas comunidades mapuche resistem à construção do túnel de prospecção para a Central Neltume, propriedade da transnacional Endesa-Enel. Os mapuche denunciaram que a "Endesa-Enel invadiu nosso território, retirando-nos a água, apropriando-se dos direitos de aproveitamento contínuo dos bens de vários riachos que pertencem a famílias de nossa comunidade".
Entre as maldições da prospecção está o fato de que a companhia "nos deixará sem nossas ervas medicinais ao elevar o caudal do lago Neltume, ervas que usamos desde tempos ancestrais e que, sem as quais, morreremos". Os mapuche dizem ainda que a Endesa-Enel "deve compreender que os seres humanos não são donos da natureza, mas sim parte dela, e que o dinheiro e o lucro não podem ficar acima dos direitos coletivos dos povos".
Os trabalhadores da terceira corporação de cobre privada que explora o mineral no país, Doña Inés de Collahuasi, estão em greve desde o dia 5 de novembro. A 4.500 metros de altura na região norte, o presidente do sindicato, Manuel Muñoz informou que a companhia, em 2010, terá investimentos de 3 bilhões de dólares, enquanto os trabalhadores estão exigindo 50 milhões de dólares em três anos, somando todas as suas demandas.
Em outro setor, os trabalhadores da construção civil que edificam o Hospital de Puerto Montt, no sul do Chile, cujas empresas selecionadas para a obra são Besalco, Moller y Pérez Cotapos, associadas no Consórcio Hospital de Puerto Montt, mobilizaram-se contra as más condições de segurança e higiene no interior de uma obra estatal. Os operários agrupados na Federação de Trabalhadores da Construção (Fetracoma), foram desalojados da obra com extrema violência por Forças Especiais de Carabineiros, com a anuência do governador da zona, Francisco Muñoz, da secretária regional do Ministério da Saúde, Mônica Winkler, e da secretária do Trabalho, Andrea Rosmanich, que conheciam perfeitamente as péssimas condições de trabalho na construção. 23 trabalhadores e dirigentes sindicais foram detidos pela polícia.
Segundo a Pesquisa de Caracterização Socio-Econômica 2009 (Casen), realizada pelo Ministério do Planejamento a cada 3 anos, o Chile é hoje mais pobre que em 2006. De acordo com os dados oficiais, em 2006 a pobreza alcançava 13,7% da população nacional, enquanto hoje esse índice é de 15,1%. Por regiões, a pesquisa aponta como líderes do ranking da miséria a região de La Araucanía, com 27,1%, a de Bio Bío, com 21%, a de Maule, com 20,8%, a de Los Ríos, com 20,4%, Atacama, com 17,4% e Coquimbo com 16,6%. As mulheres são mais pobres do que os homens (15,7% x 14,5%); e a população originária (indígena) mais pobre que a mestiça (19,9% x 14,8%).
Agora vem o importante. O corte ou linha de pobreza fixado pelo Estado é de 64 mil pesos por mês (128 dólares) para os que vivem nas cidades e de 43 mil pesos mensais (86 dólares) para os que vivem em zonas rurais. Ou seja, se no momento da realização da pesquisa a pessoa obtém um peso a mais que os mínimos assinalados, para efeitos estatísticos já não é mais considerada pobre. E a linha de pobreza é fabricada mediante uma misteriosa cesta "básica de alimentos por pessoa cujo conteúdo calórico e proteico permita satisfazer um nível mínimo de exigências nutricionais". Isto é, um conjunto de produtos alimentícios - cuja qualidade e origem não interessa - que um ser humano precisa para não desfalecer de inanição.
E mais. Com uma suposição fundada no cinismo mais abjeto, o informe da Casen indica que "se assume que os lares que conseguem cobrir adequadamente suas necessidades de alimentação satisfazem, ao mesmo tempo, os padrões mínimos das outras necessidades básicas". Por que se supõe que alguém que mal tem recursos para comer conta com recursos para ter acesso aos serviços básicos (moradia, eletricidade, água, gás telefone), à saúde, à educação, à seguridade social, à recreação, a um emprego estável e a um larguíssimo etcétera?
Que ciência apóia essa hipótese?
O Estado fixa a linha de pobreza em 64 mil pesos, em um Chile onde duas viagens no transporte público custam mil pesos, um quilo de pão outros mil pesos, uma mensalidade universitária mais de 200 mil pesos em média e o aluguel de uma habitação ou quarto com banho compartilhado custa entre 60 e 80 mil pesos/mês. Quantos chilenos ganham com seu trabalho considerando um desemprego estrutural que não sai de 8 a 10% - menos de 350 mil pesos (700 dólares). Cerca de 70 ou 80% da população?
Resulta óbvio que a pobreza ou o empobrecimento da população do país é muito maior que 15,1%, e que esse número não é mais que um indicador colocado na vitrine para as agências avaliadoras de risco multinacionais que orientam o grande capital investidor para benefício de uma minoria rentista e grande proprietária.
Em um micro-ônibus da Transantiago havia um aviso fixado por algum usuário que dizia: "Se pago a passagem, não como". Essa é uma verdade do tamanho do sol em um pequeno país cujo PIB cresce a cerca de 6%, ao custo da mais dura desigualdade social, concentração econômica e exploração sem limite nem regulação alguma de seres humanos e natureza.
Tradução: Katarina Peixoto
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Ipea debate o desenvolvimento nacional
Reproduzo entrevista concedida ao jornalista Umberto Martins, publicada no sítio Vermelho:
Cerca de 2 mil pessoas já estavam inscritas para a 1ª Conferência do Desenvolvimento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) até quinta-feira (11). O evento será realizado na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, dias 24 a 26. Reunirá economistas como Maria da Conceição Tavares, autoridades, dirigentes das centrais sindicais e dos movimentos sociais. O economista Renaut Michel, diretor adjunto de Estudos Macroeconômicos do Ipea, falou ao Vermelho sobre o tema. Leia abaixo:
Quais os objetivos da conferência?
Em primeiro lugar, o Ipea pretende promover um grande debate nacional sobre desenvolvimento, envolvendo não só acadêmicos, mas a sociedade como um todo. O tema, considerado central nos anos 1950 a 1980, foi relegado ao esquecimento durante os anos 1990 e, mais tarde, retornou com força em toda a América Latina, sendo incorporado como o norte dos trabalhos do Ipea. Nossa grande expectativa é colocar na agenda brasileira as questões centrais associadas ao desenvolvimento, ao projeto de nação.
Qual a razão do esquecimento?
Vejo dois motivos, um deles ideológico, que foi o arcabouço teórico hegemônico nos anos 1990 hostil às ideias desenvolvimentistas. Outro é o pensamento que não vê a necessidade da participação do Estado no desenvolvimento econômico e advoga que a economia deve ser abandonada do livre jogo do mercado. O resultado das políticas fundadas nessas concepções foi medíocre e esta é também uma das razões pela qual o debate sobre desenvolvimento voltou à ordem do dia.
Ao convidar representantes das centrais e dos movimentos sociais para algumas mesas, a intenção do Ipea é ampliar o debate sobre o tema?
Com efeito, a questão do desenvolvimento ultrapassa a esfera acadêmica e até a esfera exclusivamente econômica. Temos a dimensão ambiental e social do desenvolvimento, a infra-estrutura, os problemas urbanos, a inserção internacional. Enfim, é uma questão multidisciplinar.
As centrais sindicais lutam, hoje, pela redução da jornada e concebem a valorização do trabalho como uma fonte de desenvolvimento, ao contrário do pensamento dominante, que aposta sempre na redução de custos trabalhistas. Qual sua opinião a este respeito?
Não tenho dúvidas de que o debate sobre o mundo do trabalho é central. As centrais sindicais têm um papel muito importante no debate e na definição de uma agenda desenvolvimentista. 2010 foi um ano interessante neste sentido, uma vez que foram registrados recordes mensais sucessivos na geração de empregos formais.
O comportamento do mercado de trabalho foi muito positivo, contribuindo para a ampliação da renda e do consumo. A política de valorização do salário mínimo também foi fundamental para aquecer a demanda doméstica, ao lado das políticas sociais do governo Lula. Considero importante a redução da jornada de trabalho para avançar no sentido de uma melhor distribuição funcional da renda, dada pela sua divisão entre capital e trabalho. Isto melhorou ligeiramente, mas é preciso avançar mais.
Hoje, o capital se apropria de cerca de 60% do PIB enquanto o trabalho participa com 40%, a relação anos atrás era de 62% contra 38%. Precisamos avançar mais e a redução da jornada, sem redução de salários, é um passo significativo nesta direção.
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Cerca de 2 mil pessoas já estavam inscritas para a 1ª Conferência do Desenvolvimento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) até quinta-feira (11). O evento será realizado na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, dias 24 a 26. Reunirá economistas como Maria da Conceição Tavares, autoridades, dirigentes das centrais sindicais e dos movimentos sociais. O economista Renaut Michel, diretor adjunto de Estudos Macroeconômicos do Ipea, falou ao Vermelho sobre o tema. Leia abaixo:
Quais os objetivos da conferência?
Em primeiro lugar, o Ipea pretende promover um grande debate nacional sobre desenvolvimento, envolvendo não só acadêmicos, mas a sociedade como um todo. O tema, considerado central nos anos 1950 a 1980, foi relegado ao esquecimento durante os anos 1990 e, mais tarde, retornou com força em toda a América Latina, sendo incorporado como o norte dos trabalhos do Ipea. Nossa grande expectativa é colocar na agenda brasileira as questões centrais associadas ao desenvolvimento, ao projeto de nação.
Qual a razão do esquecimento?
Vejo dois motivos, um deles ideológico, que foi o arcabouço teórico hegemônico nos anos 1990 hostil às ideias desenvolvimentistas. Outro é o pensamento que não vê a necessidade da participação do Estado no desenvolvimento econômico e advoga que a economia deve ser abandonada do livre jogo do mercado. O resultado das políticas fundadas nessas concepções foi medíocre e esta é também uma das razões pela qual o debate sobre desenvolvimento voltou à ordem do dia.
Ao convidar representantes das centrais e dos movimentos sociais para algumas mesas, a intenção do Ipea é ampliar o debate sobre o tema?
Com efeito, a questão do desenvolvimento ultrapassa a esfera acadêmica e até a esfera exclusivamente econômica. Temos a dimensão ambiental e social do desenvolvimento, a infra-estrutura, os problemas urbanos, a inserção internacional. Enfim, é uma questão multidisciplinar.
As centrais sindicais lutam, hoje, pela redução da jornada e concebem a valorização do trabalho como uma fonte de desenvolvimento, ao contrário do pensamento dominante, que aposta sempre na redução de custos trabalhistas. Qual sua opinião a este respeito?
Não tenho dúvidas de que o debate sobre o mundo do trabalho é central. As centrais sindicais têm um papel muito importante no debate e na definição de uma agenda desenvolvimentista. 2010 foi um ano interessante neste sentido, uma vez que foram registrados recordes mensais sucessivos na geração de empregos formais.
O comportamento do mercado de trabalho foi muito positivo, contribuindo para a ampliação da renda e do consumo. A política de valorização do salário mínimo também foi fundamental para aquecer a demanda doméstica, ao lado das políticas sociais do governo Lula. Considero importante a redução da jornada de trabalho para avançar no sentido de uma melhor distribuição funcional da renda, dada pela sua divisão entre capital e trabalho. Isto melhorou ligeiramente, mas é preciso avançar mais.
Hoje, o capital se apropria de cerca de 60% do PIB enquanto o trabalho participa com 40%, a relação anos atrás era de 62% contra 38%. Precisamos avançar mais e a redução da jornada, sem redução de salários, é um passo significativo nesta direção.
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Da polarização à politização da sociedade
Reproduzo artigo de Igor Felippe Santos:
A eleição de Dilma Rousseff (PT) é uma vitória da sociedade brasileira. E não temos que ter vergonha de comemorar a derrota de José Serra (PSDB), que se tornou símbolo dos setores que se opõem às bandeiras progressistas no país.
A mídia burguesa, os setores conservadores da igreja católica e evangélica, os ruralistas mais truculentos e o imperialismo dos Estados Unidos perderam uma batalha importante com a derrota de Serra.
O tucano fez uma campanha fratricida, lançando mão de boatos, mentiras e ataques aos movimentos sociais (especialmente ao MST), com um corte de extrema-direita, para fazer terrorismo eleitoral. A imagem das mulheres grávidas no horário político de Serra demonstra sua opção pelo chamado “vale tudo”, inclusive jogar sua biografia no lixo.
Por debaixo dos panos, sem a coragem de debater publicamente, a campanha tucana satanizou a descriminalização do aborto e o casamento civil entre homossexuais, que já foram aprovados em países mais avançados. Com isso, os tucanos caíram no colo da Tradição, Família e Propriedade (TFP) e da Opus Dei.
O clima criado pela campanha de Serra, tanto a oficial como a das sombras, causou uma polarização eleitoral, que obrigou os setores mais importantes da sociedade a tomarem partido. Organizações da sociedade civil, entidades de classe, intelectuais, artistas, estudantes, médicos, profissionais liberais, igrejas e a mídia (desde as televisões, passando pelos jornais, até chegar à internet) tiveram que fazer uma opção entre Dilma e Serra. E aqueles que se omitiram, pagarão o preço de ver o trem da história passar nos próximos quatro anos.
Como o embate eleitoral teve um nível muito baixo, essa polarização não girou em torno de projetos políticos antagônicos para o Brasil, mas na capacidade dos candidatos de continuarem as linhas gerais do governo Lula. De qualquer forma, dois campos políticos se expressaram de forma clara nessas eleições, contraponto o setor progressista e conservador. Em 2006, por exemplo, o quadro político não ficou tão claro.
Nesse quadro, o grande desafio dos setores progressistas é manter a coesão desse bloco construído em torno de Dilma e politizar as disputas políticas que virão, em torno do programa democrático-popular. Assim, a partir desta eleição, esse campo poderá fazer pressão por mudanças estruturais necessárias para a sociedade brasileira, que garantam educação, saúde, moradia, saneamento básico e terra para os brasileiros.
Embora as políticas públicas nessas áreas sejam muito importantes, não terão forças para solucionar os principais problemas que essa geração do povo brasileiro enfrenta no seu dia a dia. Os direitos sociais da população só estarão garantidos com reformas estruturais, que implicam enfrentar os interesses da classe dominante brasileira e internacional, que quer impor uma outra agenda ao país.
As forças do neoliberalismo, lideradas pelos bancos, capital financeiro, empresas transnacionais e os grandes meios de comunicação, farão o possível – e impossível, como mostraram na campanha – para impedir qualquer medida progressista do governo federal.
Não podemos ignorar, inclusive, que esses setores têm força e influência dentro da ampla coalizão de forças que venceu a eleição presidencial. Por isso, é fundamental a pressão da sociedade para enfrentar os interesses conservadores, inclusive dentro do que vier a ser o governo Dilma.
Os setores progressistas venceram uma batalha importante com a vitória de Dilma, mas a luta continua, será intensa e dependerá da participação de toda a sociedade brasileira, que precisa se posicionar em relação a cada disputa, enfrentando os interesses dos poderosos para garantir transformações sociais para resolver os problemas do povo brasileiro.
* Igor Felippe Santos é jornalista, editor da Página do MST, integrante da Rede de Comunicadores pela Reforma Agrária e do Centro de Estudos Barão de Itararé.
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A eleição de Dilma Rousseff (PT) é uma vitória da sociedade brasileira. E não temos que ter vergonha de comemorar a derrota de José Serra (PSDB), que se tornou símbolo dos setores que se opõem às bandeiras progressistas no país.
A mídia burguesa, os setores conservadores da igreja católica e evangélica, os ruralistas mais truculentos e o imperialismo dos Estados Unidos perderam uma batalha importante com a derrota de Serra.
O tucano fez uma campanha fratricida, lançando mão de boatos, mentiras e ataques aos movimentos sociais (especialmente ao MST), com um corte de extrema-direita, para fazer terrorismo eleitoral. A imagem das mulheres grávidas no horário político de Serra demonstra sua opção pelo chamado “vale tudo”, inclusive jogar sua biografia no lixo.
Por debaixo dos panos, sem a coragem de debater publicamente, a campanha tucana satanizou a descriminalização do aborto e o casamento civil entre homossexuais, que já foram aprovados em países mais avançados. Com isso, os tucanos caíram no colo da Tradição, Família e Propriedade (TFP) e da Opus Dei.
O clima criado pela campanha de Serra, tanto a oficial como a das sombras, causou uma polarização eleitoral, que obrigou os setores mais importantes da sociedade a tomarem partido. Organizações da sociedade civil, entidades de classe, intelectuais, artistas, estudantes, médicos, profissionais liberais, igrejas e a mídia (desde as televisões, passando pelos jornais, até chegar à internet) tiveram que fazer uma opção entre Dilma e Serra. E aqueles que se omitiram, pagarão o preço de ver o trem da história passar nos próximos quatro anos.
Como o embate eleitoral teve um nível muito baixo, essa polarização não girou em torno de projetos políticos antagônicos para o Brasil, mas na capacidade dos candidatos de continuarem as linhas gerais do governo Lula. De qualquer forma, dois campos políticos se expressaram de forma clara nessas eleições, contraponto o setor progressista e conservador. Em 2006, por exemplo, o quadro político não ficou tão claro.
Nesse quadro, o grande desafio dos setores progressistas é manter a coesão desse bloco construído em torno de Dilma e politizar as disputas políticas que virão, em torno do programa democrático-popular. Assim, a partir desta eleição, esse campo poderá fazer pressão por mudanças estruturais necessárias para a sociedade brasileira, que garantam educação, saúde, moradia, saneamento básico e terra para os brasileiros.
Embora as políticas públicas nessas áreas sejam muito importantes, não terão forças para solucionar os principais problemas que essa geração do povo brasileiro enfrenta no seu dia a dia. Os direitos sociais da população só estarão garantidos com reformas estruturais, que implicam enfrentar os interesses da classe dominante brasileira e internacional, que quer impor uma outra agenda ao país.
As forças do neoliberalismo, lideradas pelos bancos, capital financeiro, empresas transnacionais e os grandes meios de comunicação, farão o possível – e impossível, como mostraram na campanha – para impedir qualquer medida progressista do governo federal.
Não podemos ignorar, inclusive, que esses setores têm força e influência dentro da ampla coalizão de forças que venceu a eleição presidencial. Por isso, é fundamental a pressão da sociedade para enfrentar os interesses conservadores, inclusive dentro do que vier a ser o governo Dilma.
Os setores progressistas venceram uma batalha importante com a vitória de Dilma, mas a luta continua, será intensa e dependerá da participação de toda a sociedade brasileira, que precisa se posicionar em relação a cada disputa, enfrentando os interesses dos poderosos para garantir transformações sociais para resolver os problemas do povo brasileiro.
* Igor Felippe Santos é jornalista, editor da Página do MST, integrante da Rede de Comunicadores pela Reforma Agrária e do Centro de Estudos Barão de Itararé.
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sábado, 13 de novembro de 2010
Participe do II Fórum de Cultura Digital
Juca e Gil from FLi Multimídia on Vimeo.
Por Altamiro Borges
Começa neste domingo, 14, e segue até o dia 17, o II Fórum de Cultura Digital, na Cinemateca de São Paulo. O evento é promovido pela Casa de Cultura Digital e pelo Ministério da Cultura e discutirá, entre outros temas, o papel da internet, o direito autoral na rede e as novas experiências da comunicação compartilhada.
Na quarta-feira, dia 17, das 13h às 16h, haverá uma arena para discutir banda larga e cultura digital. O formato será de uma grande "assembléia", com o objetivo de impulsionar a campanha pelo direito à internet de alta velocidade para todos. Na ocasião, será lançado o Gibi "Eu quero Banda Larga", publicado pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.
Participe. Para conhecer a programação completa do II Fórum de Cultura Digital, acesse: http://culturadigital.br
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Dilma e a pauta mínima desafiante
Reproduzo artigo de Wladimir Pomar, publicado no sítio do Correio da Cidadania:
As eleições de 2010 não tiveram o debate político como seu forte. No entanto, as discussões políticas sobre o futuro se avolumam e apresentam uma pauta desafiante a ser enfrentada pelo governo Dilma, pelo PT e, em geral, pela esquerda.
O governo Dilma terá que ser diferente do governo Lula. Ser uma simples continuidade do governo que sucede significaria prostrar-se diante dos limites que adversários e alguns aliados pretendem impor a governos democráticos e populares. O que seria um desastre para o desenvolvimento dessas experiências inusitadas da história brasileira.
O governo Dilma só pode ter sucesso se for muito além dos avanços do governo Lula. Pode e deve tomá-los como suporte, mas terá de considerar diferentes tanto os problemas herdados quanto os emergentes. Queira ou não, sua pauta terá que partir dessa constatação, porque a realidade é sempre mais forte do que os desejos.
Entre tais problemas, ganhou destaque, legitimidade e prioridade ainda maiores a questão social. O populismo praticado por Serra foi o reconhecimento do peso político que essa questão tem hoje no país. A derrota do candidato da direita foi, em grande parte, resultado da consciência do eleitorado quanto à falsidade de seu populismo, ao comparar os governos FHC e Lula.
Assim, mais do que o governo Lula, o governo Dilma terá que operar medidas que avancem na solução das questões sociais. Não pode limitar-se à educação e à saúde. Precisará avançar na solução do saneamento, transportes públicos e moradias, aproveitando os eventos internacionais a serem realizados no Brasil. Precisará alcançar o pleno emprego, seja através do desenvolvimento industrial, seja através das demandas de aumento substancial da produção agrícola, para assentar os milhares de trabalhadores que não têm terra para trabalhar.
O mesmo é verdade para o combate à corrupção. Se esta já era uma questão constrangedora da sociedade brasileira, ela se tornou ainda mais virulenta com o processo de globalização e um perigo constante para um governo que pretende avançar na ampliação democrática e no benefício das grandes camadas populares. Será necessário avançar ainda mais na legislação que pune corruptos e corruptores e não vacilar em afastar aqueles que, mesmo estando no governo, no PT ou na esquerda, cometem atos dessa natureza.
O governo Dilma também se verá compelido a combinar, de forma ainda mais consciente, os processos aparentemente antagônicos de desenvolvimento econômico e social e de proteção ambiental, através da solução das questões fundiária, do zoneamento agrícola e do zoneamento florestal. O que demandará uma revisão mais profunda do Código Florestal, em tramitação no Congresso.
A questão nacional e as relações internacionais multipolares continuarão sendo um tema estratégico de primeira grandeza para o governo Dilma. Diante de um quadro cada vez mais complexo, em virtude da crise mundial do capitalismo, precisará reafirmar a soberania e a independência, ao mesmo tempo em que deverá se esforçar para manter relações pacíficas com todas as nações, independentemente de seu regime político, tendo os interesses nacionais do Brasil em primeiro lugar.
A ampliação da democracia, abrindo cada vez mais espaços para as grandes camadas sociais da população brasileira, e tendo em conta sua opção de solucionar seus problemas através do voto, continuará sendo crucial para o sucesso do novo governo. O que demanda enfrentar a realização da reforma política, sem deixar de levar em conta que os projetos alternativos de sociedade e a disputa entre classes continuam presentes na sociedade brasileira.
Cada setor social tem seu próprio projeto classista, independentemente da forma como o apresenta. Portanto, detectar como a disputa entre os diferentes projetos se expressa será fundamental para a estratégia de desenvolver as forças produtivas, gerar riqueza e recompor a força social da classe dos trabalhadores assalariados.
O governo Dilma, da mesma forma que o governo Lula, terá que administrar as contradições do processo em que coexistem diferentes formas de propriedade, e em que a redistribuição de renda passou a ser um componente essencial, tanto de unidade, quanto das disputas entre classes. E é nesse contexto que terá que ser enfrentada a reforma tributária.
Além disso, essas questões estratégicas deverão ser influenciadas por problemas emergenciais de diferentes tipos, a exemplo do câmbio e da reforma da previdência. O problema cambial é imediato e carrega grande perigo para o crescimento econômico e o desenvolvimento social. Os Estados Unidos ingressaram numa política de desvalorização cambial comandada pelo Estado, no rumo contrário do câmbio flutuante que exigem para os demais países, enquanto o governo brasileiro continua engajado nesse tipo de câmbio. Em algum momento, para evitar a necessidade de uma maxidesvalorização, o governo brasileiro terá que adotar mudanças que garantam a competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional.
O problema cambial, assim como os demais problemas emergentes, se refletirá no comportamento dos partidos, inclusive dos aliados do governo. Nesse sentido, o governo Dilma terá sempre de trabalhar para obter maioria em seus projetos no Congresso, em especial aqueles que podem beneficiar as camadas populares e a nação, em detrimento de alguns interesses econômicos e sociais da burguesia.
Terá que praticar constantemente o método de unidade e de luta no seio da coalizão governamental, tendo sempre as questões sociais e nacionais como parâmetros principais. Supor que contará eternamente com os votos de todos os parlamentares da chamada base aliada não passa de um sonho.
A pauta mínima, tanto para o governo Dilma quanto para o PT e a esquerda em geral, exige que as lições das eleições de 2010 sejam tomadas na devida conta, partindo da constatação de que a direita no Brasil, mesmo travestida de social-democrata, se tornou ainda mais conservadora e reacionária.
A ação dessa direita sobre cada um dos itens dessa pauta será no sentido de abrir brechas na coalizão governamental, paralisar o governo diante de reais ou fictícios deslizes, desacreditá-lo frente às grandes massas da população e, mesmo, impor saídas extra-constitucionais para liquidar uma experiência que, apesar de lenta, aponta na direção de as camadas populares se transformarem em reais participantes na história. O que se torna cada vez mais inconcebível para uma burguesia que reinava sozinha.
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As eleições de 2010 não tiveram o debate político como seu forte. No entanto, as discussões políticas sobre o futuro se avolumam e apresentam uma pauta desafiante a ser enfrentada pelo governo Dilma, pelo PT e, em geral, pela esquerda.
O governo Dilma terá que ser diferente do governo Lula. Ser uma simples continuidade do governo que sucede significaria prostrar-se diante dos limites que adversários e alguns aliados pretendem impor a governos democráticos e populares. O que seria um desastre para o desenvolvimento dessas experiências inusitadas da história brasileira.
O governo Dilma só pode ter sucesso se for muito além dos avanços do governo Lula. Pode e deve tomá-los como suporte, mas terá de considerar diferentes tanto os problemas herdados quanto os emergentes. Queira ou não, sua pauta terá que partir dessa constatação, porque a realidade é sempre mais forte do que os desejos.
Entre tais problemas, ganhou destaque, legitimidade e prioridade ainda maiores a questão social. O populismo praticado por Serra foi o reconhecimento do peso político que essa questão tem hoje no país. A derrota do candidato da direita foi, em grande parte, resultado da consciência do eleitorado quanto à falsidade de seu populismo, ao comparar os governos FHC e Lula.
Assim, mais do que o governo Lula, o governo Dilma terá que operar medidas que avancem na solução das questões sociais. Não pode limitar-se à educação e à saúde. Precisará avançar na solução do saneamento, transportes públicos e moradias, aproveitando os eventos internacionais a serem realizados no Brasil. Precisará alcançar o pleno emprego, seja através do desenvolvimento industrial, seja através das demandas de aumento substancial da produção agrícola, para assentar os milhares de trabalhadores que não têm terra para trabalhar.
O mesmo é verdade para o combate à corrupção. Se esta já era uma questão constrangedora da sociedade brasileira, ela se tornou ainda mais virulenta com o processo de globalização e um perigo constante para um governo que pretende avançar na ampliação democrática e no benefício das grandes camadas populares. Será necessário avançar ainda mais na legislação que pune corruptos e corruptores e não vacilar em afastar aqueles que, mesmo estando no governo, no PT ou na esquerda, cometem atos dessa natureza.
O governo Dilma também se verá compelido a combinar, de forma ainda mais consciente, os processos aparentemente antagônicos de desenvolvimento econômico e social e de proteção ambiental, através da solução das questões fundiária, do zoneamento agrícola e do zoneamento florestal. O que demandará uma revisão mais profunda do Código Florestal, em tramitação no Congresso.
A questão nacional e as relações internacionais multipolares continuarão sendo um tema estratégico de primeira grandeza para o governo Dilma. Diante de um quadro cada vez mais complexo, em virtude da crise mundial do capitalismo, precisará reafirmar a soberania e a independência, ao mesmo tempo em que deverá se esforçar para manter relações pacíficas com todas as nações, independentemente de seu regime político, tendo os interesses nacionais do Brasil em primeiro lugar.
A ampliação da democracia, abrindo cada vez mais espaços para as grandes camadas sociais da população brasileira, e tendo em conta sua opção de solucionar seus problemas através do voto, continuará sendo crucial para o sucesso do novo governo. O que demanda enfrentar a realização da reforma política, sem deixar de levar em conta que os projetos alternativos de sociedade e a disputa entre classes continuam presentes na sociedade brasileira.
Cada setor social tem seu próprio projeto classista, independentemente da forma como o apresenta. Portanto, detectar como a disputa entre os diferentes projetos se expressa será fundamental para a estratégia de desenvolver as forças produtivas, gerar riqueza e recompor a força social da classe dos trabalhadores assalariados.
O governo Dilma, da mesma forma que o governo Lula, terá que administrar as contradições do processo em que coexistem diferentes formas de propriedade, e em que a redistribuição de renda passou a ser um componente essencial, tanto de unidade, quanto das disputas entre classes. E é nesse contexto que terá que ser enfrentada a reforma tributária.
Além disso, essas questões estratégicas deverão ser influenciadas por problemas emergenciais de diferentes tipos, a exemplo do câmbio e da reforma da previdência. O problema cambial é imediato e carrega grande perigo para o crescimento econômico e o desenvolvimento social. Os Estados Unidos ingressaram numa política de desvalorização cambial comandada pelo Estado, no rumo contrário do câmbio flutuante que exigem para os demais países, enquanto o governo brasileiro continua engajado nesse tipo de câmbio. Em algum momento, para evitar a necessidade de uma maxidesvalorização, o governo brasileiro terá que adotar mudanças que garantam a competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional.
O problema cambial, assim como os demais problemas emergentes, se refletirá no comportamento dos partidos, inclusive dos aliados do governo. Nesse sentido, o governo Dilma terá sempre de trabalhar para obter maioria em seus projetos no Congresso, em especial aqueles que podem beneficiar as camadas populares e a nação, em detrimento de alguns interesses econômicos e sociais da burguesia.
Terá que praticar constantemente o método de unidade e de luta no seio da coalizão governamental, tendo sempre as questões sociais e nacionais como parâmetros principais. Supor que contará eternamente com os votos de todos os parlamentares da chamada base aliada não passa de um sonho.
A pauta mínima, tanto para o governo Dilma quanto para o PT e a esquerda em geral, exige que as lições das eleições de 2010 sejam tomadas na devida conta, partindo da constatação de que a direita no Brasil, mesmo travestida de social-democrata, se tornou ainda mais conservadora e reacionária.
A ação dessa direita sobre cada um dos itens dessa pauta será no sentido de abrir brechas na coalizão governamental, paralisar o governo diante de reais ou fictícios deslizes, desacreditá-lo frente às grandes massas da população e, mesmo, impor saídas extra-constitucionais para liquidar uma experiência que, apesar de lenta, aponta na direção de as camadas populares se transformarem em reais participantes na história. O que se torna cada vez mais inconcebível para uma burguesia que reinava sozinha.
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Quanto vale o voto do nordestino?
Reproduzo artigo de Maria Inês Nassif, publicado no jornal Valor Econômico:
O Brasil elegeu, por dois mandatos, um ex-metalúrgico como presidente da República. Agora elege uma mulher. Ambos de centro-esquerda. Para quem assistiu de fora a eleição de Dilma Rousseff e os dois mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pode parecer que o país avança celeremente para uma civilizada socialdemocracia e busca com ardor o Estado de bem-estar social. Para quem assistiu de dentro, todavia, é impossível deixar de registrar a feroz resistência conservadora à ascensão de uma imensa massa de miseráveis à cidadania.
Ocorre hoje um grande descompasso entre classes em movimento e as que mantêm o status quo; e, em consequência de uma realidade anterior, onde a concentração de renda pessoal se refletia em forte concentração da renda federativa, há também um descompasso entre regiões em movimento, tiradas da miséria junto com a massa de beneficiados pelo Bolsa Família ou por outros programas sociais com efeito de distribuição de renda, e outras que pretendem manter a hegemonia. A redução da desigualdade tem trazido à tona os piores preconceitos das classes médias tradicionais e das elites do país não apenas em relação às pessoas que ascendem da mais baixa escala da pirâmide social, mas preconceitos que transbordam para as regiões que, tradicionalmente miseráveis, hoje crescem a taxas chinesas.
A onda de preconceito contra os nordestinos, por exemplo, é semelhante ao preconceito em estado puro jogado pelos setores tradicionais no presidente Luiz Inácio Lula da Silva e na própria eleita, Dilma Rousseff, durante a campanha eleitoral. É a expressão do temor de que os “de baixo”, embora ainda em condições inferiores às das classes tradicionais, possam ameaçar uma estabilidade que não apenas é econômica, mas que no imaginário social é também de poder e status.
Há resistências à mobilidade social e regional
São Paulo foi a expressão mais acabada da polarização eleitoral entre pobres de um lado, e classe média e ricos de outro. Os primeiros aderiram a Dilma; os últimos, mesmo uma parcela de classe média paulista que foi PT na origem, reforçaram José Serra (PSDB). A partir de agora, pode também polarizar a mudança política que fatalmente será descortinada, à medida que avança o processo de distribuição regional de renda e de aumento do poder aquisitivo das classes mais pobres. A hegemonia política paulista está em questão desde as eleições de 2006 – e Lula foi poupado do desgaste de ter origem política em São Paulo porque era também destinatário do preconceito de ter nascido no Nordeste; e, principalmente, porque foi o responsável pela desconcentração regional de renda.
Com a expansão do eleitorado petista no Norte e no Nordeste do país, houve uma natural perda de força dos petistas paulistas, diante do PT nacional. Do ponto de vista regional, o voto está procedendo a mudanças na formação histórica do PT, em que São Paulo era o centro do poder político do partido. Isso não apenas pelo que ganha no Nordeste, mas pelo que não ganha em São Paulo: o partido estadual tem dificuldade de romper o bloqueio tucano e também de atrair de novos quadros, que possam vencer a resistência do eleitorado paulista ao petismo.
No caso do PSDB, todavia, a quebra da hegemonia paulista será mais complicada. Os tucanos continuam fortes no Estado, têm representação expressiva na bancada federal e há cinco eleições vencem a disputa pelo governo do Estado. No resto no do país, têm perdido espaço. Parte do PSDB concorda com o diagnóstico de que a excessiva paulistização do partido, se consolida seu poder no Estado mais rico da Federação, tem sido um dos responsáveis pelo seu encolhimento no resto do Brasil.
Mas é difícil colocar essa disputa interna no nível da racionalidade, até porque o partido nacional não pode abrir mão do trunfo de estar estabelecido em território paulista; e, de outro lado, o partido de Serra tem uma grande dificuldade de debate interno – como disse o governador Alberto Goldman em entrevista ao Valor, é um partido com cabeça e sem corpo, isto é, tem mais caciques do que base. Não há experiência anterior de agregação de todos os setores do partido para discutir uma “refundação” e diretrizes que permitam sair do enclave paulista. Não há experiência de debate programático. E aí o presidente Fernando Henrique Cardoso tem toda razão: o PSDB assumiu substância ideológica apenas ao longo de seu governo. É essa a história do PSDB. A política de abertura do país à globalização, a privatização de estatais e a redução do Estado foram princípios que se incorporaram ao partido conforme foram sendo assumidos como políticas de Estado pelo governo tucano.
Todos os partidos, sem exceção, estão diante de um quadro de profundas mudanças no país e terão que se adaptar a isso. Fora a mobilidade social e regional que ocorreu no período, houve nas últimas décadas um grande avanço de escolaridade. A isso, os programas de transferência de renda agregaram consciência de direitos de cidadania. O país é outro. Não se ganha mais eleição com preconceito – até porque o voto do alvo do preconceito tem o mesmo valor que o voto da velha elite. Se os grandes partidos não se assumirem ideologicamente, outros, menores, tomarão o seu espaço.
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O Brasil elegeu, por dois mandatos, um ex-metalúrgico como presidente da República. Agora elege uma mulher. Ambos de centro-esquerda. Para quem assistiu de fora a eleição de Dilma Rousseff e os dois mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pode parecer que o país avança celeremente para uma civilizada socialdemocracia e busca com ardor o Estado de bem-estar social. Para quem assistiu de dentro, todavia, é impossível deixar de registrar a feroz resistência conservadora à ascensão de uma imensa massa de miseráveis à cidadania.
Ocorre hoje um grande descompasso entre classes em movimento e as que mantêm o status quo; e, em consequência de uma realidade anterior, onde a concentração de renda pessoal se refletia em forte concentração da renda federativa, há também um descompasso entre regiões em movimento, tiradas da miséria junto com a massa de beneficiados pelo Bolsa Família ou por outros programas sociais com efeito de distribuição de renda, e outras que pretendem manter a hegemonia. A redução da desigualdade tem trazido à tona os piores preconceitos das classes médias tradicionais e das elites do país não apenas em relação às pessoas que ascendem da mais baixa escala da pirâmide social, mas preconceitos que transbordam para as regiões que, tradicionalmente miseráveis, hoje crescem a taxas chinesas.
A onda de preconceito contra os nordestinos, por exemplo, é semelhante ao preconceito em estado puro jogado pelos setores tradicionais no presidente Luiz Inácio Lula da Silva e na própria eleita, Dilma Rousseff, durante a campanha eleitoral. É a expressão do temor de que os “de baixo”, embora ainda em condições inferiores às das classes tradicionais, possam ameaçar uma estabilidade que não apenas é econômica, mas que no imaginário social é também de poder e status.
Há resistências à mobilidade social e regional
São Paulo foi a expressão mais acabada da polarização eleitoral entre pobres de um lado, e classe média e ricos de outro. Os primeiros aderiram a Dilma; os últimos, mesmo uma parcela de classe média paulista que foi PT na origem, reforçaram José Serra (PSDB). A partir de agora, pode também polarizar a mudança política que fatalmente será descortinada, à medida que avança o processo de distribuição regional de renda e de aumento do poder aquisitivo das classes mais pobres. A hegemonia política paulista está em questão desde as eleições de 2006 – e Lula foi poupado do desgaste de ter origem política em São Paulo porque era também destinatário do preconceito de ter nascido no Nordeste; e, principalmente, porque foi o responsável pela desconcentração regional de renda.
Com a expansão do eleitorado petista no Norte e no Nordeste do país, houve uma natural perda de força dos petistas paulistas, diante do PT nacional. Do ponto de vista regional, o voto está procedendo a mudanças na formação histórica do PT, em que São Paulo era o centro do poder político do partido. Isso não apenas pelo que ganha no Nordeste, mas pelo que não ganha em São Paulo: o partido estadual tem dificuldade de romper o bloqueio tucano e também de atrair de novos quadros, que possam vencer a resistência do eleitorado paulista ao petismo.
No caso do PSDB, todavia, a quebra da hegemonia paulista será mais complicada. Os tucanos continuam fortes no Estado, têm representação expressiva na bancada federal e há cinco eleições vencem a disputa pelo governo do Estado. No resto no do país, têm perdido espaço. Parte do PSDB concorda com o diagnóstico de que a excessiva paulistização do partido, se consolida seu poder no Estado mais rico da Federação, tem sido um dos responsáveis pelo seu encolhimento no resto do Brasil.
Mas é difícil colocar essa disputa interna no nível da racionalidade, até porque o partido nacional não pode abrir mão do trunfo de estar estabelecido em território paulista; e, de outro lado, o partido de Serra tem uma grande dificuldade de debate interno – como disse o governador Alberto Goldman em entrevista ao Valor, é um partido com cabeça e sem corpo, isto é, tem mais caciques do que base. Não há experiência anterior de agregação de todos os setores do partido para discutir uma “refundação” e diretrizes que permitam sair do enclave paulista. Não há experiência de debate programático. E aí o presidente Fernando Henrique Cardoso tem toda razão: o PSDB assumiu substância ideológica apenas ao longo de seu governo. É essa a história do PSDB. A política de abertura do país à globalização, a privatização de estatais e a redução do Estado foram princípios que se incorporaram ao partido conforme foram sendo assumidos como políticas de Estado pelo governo tucano.
Todos os partidos, sem exceção, estão diante de um quadro de profundas mudanças no país e terão que se adaptar a isso. Fora a mobilidade social e regional que ocorreu no período, houve nas últimas décadas um grande avanço de escolaridade. A isso, os programas de transferência de renda agregaram consciência de direitos de cidadania. O país é outro. Não se ganha mais eleição com preconceito – até porque o voto do alvo do preconceito tem o mesmo valor que o voto da velha elite. Se os grandes partidos não se assumirem ideologicamente, outros, menores, tomarão o seu espaço.
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O governo Dilma e o Brasil real
Reproduzo artigo do teólogo Frei Betto, publicado no jornal O Estado de Minas:
Findas as eleições e vitoriosa Dilma Rousseff, é hora de descer do palanque e encarar o Brasil real. Há muito a ser feito. Os dados abaixo são todos oficiais.
Em que pese os avanços sociais do governo Lula, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio – PNAD 2009 -, IBGE, divulgada em 8 de setembro, a renda média do brasileiro, calculada em R$ 1.106 em 2009, foi 2,2% inferior à de 2008.
Embora o rendimento real médio do trabalho tenha se elevado de R$ 1.082 (2008) para R$ 1.106 (2009) – alta de 2,2% -, esta variação ainda é inferior à da década de 1990, quando subiu, entre 1995 e 1998, de R$ 1.113 para R$ 1.121. Em 2009, a renda per capta dos 10% mais pobres cresceu apenas 1,5% enquanto a média nacional foi de 2,4%.
Em 2009, trabalhavam no Brasil 101,1 milhões de pessoas. Metade na economia informal, sem carteira assinada. Comparado com o ano anterior, houve o aumento do emprego com carteira assinada: de 58,8% (2008) para 59,6% (2009).
Porém, o desemprego teve alta de 18,5%. Em 2008, o índice foi de 7,1 milhões de desempregados. Em 2009, 8,4 milhões, acréscimo de 1,3 milhão de pessoas fora do mercado de trabalho.
O número de crianças no mercado de trabalho mereceu a significativa redução de 1 milhão. Em 2009, encontravam-se no mercado de trabalho 4,25 milhões de brasileiros entre 5 e 17 anos de idade. Comparado a 2008, menos 202 mil crianças e adolescentes. Embora no nordeste tenha ocorrido um pequeno aumento entre jovens de 14 a 15 anos.
O índice de analfabetos de 2009 ainda é alto: 8,9 % da população. Reduziu-se o número de analfabetos com mais de 15 anos de idade: de 10% da população (2008) passou para 9,7% (2009). E um em cada cinco brasileiros é analfabeto funcional, incapaz de redigir uma carta sem graves erros de concordância e sintaxe, e também sem condições de interpretar um texto.
Com o governo Lula, o Brasil avançou na redução da pobreza e da desigualdade social. Cerca de 20 milhões de pessoas deixaram a extrema miséria. Porém, houve queda, nos últimos anos, do ritmo de aumento da renda dos 10% mais pobres.
Em 2009, encontravam-se em extrema pobreza 8,4% dos brasileiros (15,96 milhões de pessoas), numa população de 190 milhões. No ano anterior a 2009, a pobreza extrema caiu 0,4%. De 2007 a 2008, havia decrescido 1,5%, três vezes mais. Portanto, o ritmo de desempobrecimento dos brasileiros foi reduzido.
É verdade que, graças à facilidade de crédito (o volume chegou a R$ 1 trilhão) e à crise financeira mundial, que obrigou muitos exportadores a destinarem seus produtos ao mercado interno, houve significativo aumento do consumo de bens duráveis: máquinas de lavar roupa, televisores, microcomputadores, celulares e aparelhos de DVD.
Hoje, 72% das moradias possuem tais equipamentos. O curioso é esta contradição: 59,1% dos domicílios brasileiros não dispõem de rede de esgoto, o que equivale a 34,6 milhões de moradias.
No governo Lula, aumentou o número de casas com abastecimento de água, coleta de lixo e energia elétrica. Mas recuou o índice das que são servidas por rede de esgoto (saneamento): de 59,3% (2008) caiu para 59,1% (2009). À falta de saneamentos são atribuídos 68% dos casos de enfermidades.
Depois de sete anos de queda, a taxa de fecundidade voltou a subir no Brasil. Passou de 1,89 filho por mulher (2008) para 1,94 (2009).
O Brasil tende a um perfil populacional acentuadamente de idosos. Em 2009, 11,3% dos brasileiros tinham 60 anos de idade ou mais. Isso significa aumento do custo da Previdência (que é um dos mecanismos de distribuição de renda) e da saúde pública.
Quem se deu muito bem na gestão Lula foram os bancos. O lucro dos três maiores – Banco do Brasil, Itaú e Bradesco – somam R$ 167 bilhões na era Lula, alta de 420 % comparada à era FHC (quando o lucro foi de R$ 32,262 bilhões).
As mazelas do Brasil têm razões estruturais. Nenhum governo, desde o fim da ditadura, em 1985, ousou promover reformas como a agrária, a tributária, a política, nem dos sistemas de saúde e educação. Enquanto não se mexer nessas estruturas e serviços, o país estará, como diz Jesus, pondo remendo novo em pano velho.
Espera-se que Dilma Rousseff mexa na estrutura da casa brasileira, sobretudo na fundiária e na tributária. A primeira, para dar fim à imensidão de terras ociosas e à miséria e ao êxodo rurais. A segunda, para que o peso maior dos impostos não continue recaindo sobre os mais pobres.
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Findas as eleições e vitoriosa Dilma Rousseff, é hora de descer do palanque e encarar o Brasil real. Há muito a ser feito. Os dados abaixo são todos oficiais.
Em que pese os avanços sociais do governo Lula, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio – PNAD 2009 -, IBGE, divulgada em 8 de setembro, a renda média do brasileiro, calculada em R$ 1.106 em 2009, foi 2,2% inferior à de 2008.
Embora o rendimento real médio do trabalho tenha se elevado de R$ 1.082 (2008) para R$ 1.106 (2009) – alta de 2,2% -, esta variação ainda é inferior à da década de 1990, quando subiu, entre 1995 e 1998, de R$ 1.113 para R$ 1.121. Em 2009, a renda per capta dos 10% mais pobres cresceu apenas 1,5% enquanto a média nacional foi de 2,4%.
Em 2009, trabalhavam no Brasil 101,1 milhões de pessoas. Metade na economia informal, sem carteira assinada. Comparado com o ano anterior, houve o aumento do emprego com carteira assinada: de 58,8% (2008) para 59,6% (2009).
Porém, o desemprego teve alta de 18,5%. Em 2008, o índice foi de 7,1 milhões de desempregados. Em 2009, 8,4 milhões, acréscimo de 1,3 milhão de pessoas fora do mercado de trabalho.
O número de crianças no mercado de trabalho mereceu a significativa redução de 1 milhão. Em 2009, encontravam-se no mercado de trabalho 4,25 milhões de brasileiros entre 5 e 17 anos de idade. Comparado a 2008, menos 202 mil crianças e adolescentes. Embora no nordeste tenha ocorrido um pequeno aumento entre jovens de 14 a 15 anos.
O índice de analfabetos de 2009 ainda é alto: 8,9 % da população. Reduziu-se o número de analfabetos com mais de 15 anos de idade: de 10% da população (2008) passou para 9,7% (2009). E um em cada cinco brasileiros é analfabeto funcional, incapaz de redigir uma carta sem graves erros de concordância e sintaxe, e também sem condições de interpretar um texto.
Com o governo Lula, o Brasil avançou na redução da pobreza e da desigualdade social. Cerca de 20 milhões de pessoas deixaram a extrema miséria. Porém, houve queda, nos últimos anos, do ritmo de aumento da renda dos 10% mais pobres.
Em 2009, encontravam-se em extrema pobreza 8,4% dos brasileiros (15,96 milhões de pessoas), numa população de 190 milhões. No ano anterior a 2009, a pobreza extrema caiu 0,4%. De 2007 a 2008, havia decrescido 1,5%, três vezes mais. Portanto, o ritmo de desempobrecimento dos brasileiros foi reduzido.
É verdade que, graças à facilidade de crédito (o volume chegou a R$ 1 trilhão) e à crise financeira mundial, que obrigou muitos exportadores a destinarem seus produtos ao mercado interno, houve significativo aumento do consumo de bens duráveis: máquinas de lavar roupa, televisores, microcomputadores, celulares e aparelhos de DVD.
Hoje, 72% das moradias possuem tais equipamentos. O curioso é esta contradição: 59,1% dos domicílios brasileiros não dispõem de rede de esgoto, o que equivale a 34,6 milhões de moradias.
No governo Lula, aumentou o número de casas com abastecimento de água, coleta de lixo e energia elétrica. Mas recuou o índice das que são servidas por rede de esgoto (saneamento): de 59,3% (2008) caiu para 59,1% (2009). À falta de saneamentos são atribuídos 68% dos casos de enfermidades.
Depois de sete anos de queda, a taxa de fecundidade voltou a subir no Brasil. Passou de 1,89 filho por mulher (2008) para 1,94 (2009).
O Brasil tende a um perfil populacional acentuadamente de idosos. Em 2009, 11,3% dos brasileiros tinham 60 anos de idade ou mais. Isso significa aumento do custo da Previdência (que é um dos mecanismos de distribuição de renda) e da saúde pública.
Quem se deu muito bem na gestão Lula foram os bancos. O lucro dos três maiores – Banco do Brasil, Itaú e Bradesco – somam R$ 167 bilhões na era Lula, alta de 420 % comparada à era FHC (quando o lucro foi de R$ 32,262 bilhões).
As mazelas do Brasil têm razões estruturais. Nenhum governo, desde o fim da ditadura, em 1985, ousou promover reformas como a agrária, a tributária, a política, nem dos sistemas de saúde e educação. Enquanto não se mexer nessas estruturas e serviços, o país estará, como diz Jesus, pondo remendo novo em pano velho.
Espera-se que Dilma Rousseff mexa na estrutura da casa brasileira, sobretudo na fundiária e na tributária. A primeira, para dar fim à imensidão de terras ociosas e à miséria e ao êxodo rurais. A segunda, para que o peso maior dos impostos não continue recaindo sobre os mais pobres.
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Folha demite Amorim e é desmentida
Reproduzo artigo de Luiz Carlos Azenha, publicado no blog Viomundo:
Ontem a Folha de S. Paulo demitiu Celso Amorim do governo. Disse que o ministro foi “desconvidado” do encontro do G20, na Coreia do Sul, pelo próprio governo. Hoje Celso Amorim esclarece que foi ele quem pediu para não ir, já que a ênfase do encontro era nas questões econômicas. A mentira saiu com destaque. O desmentido, miudinho.
A Folha não apenas demitiu Celso Amorim, como tirou o ex-embaixador brasileiro nos Estados Unidos, Antonio Patriota — ligado a Amorim — da lista de ministeriáveis. Colocou no lugar dele o José Viegas Filho e o Nelson Jobim. O Jobim, aliás, está em todas. Hoje, em editorial, a Folha dá uma guinada na política externa brasileira.
Duas coisas me impressionam profundamente neste período pós-eleitoral: 1. a desconexão entre os fatos e o noticiário; 2. o lobby descarado que os jornais fazem em defesa de seus candidatos ao ministério e dos “programa de governo” que formulam. É como se a população tivesse eleito a Folha para governar. Eu não consigo ler mais nenhuma “notícia” sem esperar pelo desmentido dela no dia seguinte.
O nível dos jornais brasileiros é uma lástima. O Valor Econômico, que é o menos ruinzinho, mandou um repórter para o Vietnã, fazer reportagem sobre o plantio de arroz, sob patrocínio da Sygenta! Embora tenha noticiado no pé da “reportagem” que a viagem tinha sido paga pela Sygenta, o jornal não esclareceu o que é a Sygenta. No texto, o repórter atribui parcialmente à ideologia a rejeição de rizicultores vietnamitas aos “pacotes” tecnológicos da Sygenta. Fica parecendo que os pacotes tecnológicos da Sygenta são milagrosos e que os vietnamitas não tem apenas 5 mil anos de desenvolvimento da tecnologia de plantio de arroz. O repórter não reserva uma linha sequer à vasta literatura existente sobre o papel exercido pelas grandes corporações do agronegócio — dentre as quais figuram com destaque a Sygenta e a Monsanto –, que tentam cercar o mercado das sementes, do veneno e dos fertilizantes.
Estamos falando de um jornal que, em tese, deveria servir aos formuladores das políticas públicas brasileiras.
No entanto, serve ao lobby descarado.
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Ontem a Folha de S. Paulo demitiu Celso Amorim do governo. Disse que o ministro foi “desconvidado” do encontro do G20, na Coreia do Sul, pelo próprio governo. Hoje Celso Amorim esclarece que foi ele quem pediu para não ir, já que a ênfase do encontro era nas questões econômicas. A mentira saiu com destaque. O desmentido, miudinho.
A Folha não apenas demitiu Celso Amorim, como tirou o ex-embaixador brasileiro nos Estados Unidos, Antonio Patriota — ligado a Amorim — da lista de ministeriáveis. Colocou no lugar dele o José Viegas Filho e o Nelson Jobim. O Jobim, aliás, está em todas. Hoje, em editorial, a Folha dá uma guinada na política externa brasileira.
Duas coisas me impressionam profundamente neste período pós-eleitoral: 1. a desconexão entre os fatos e o noticiário; 2. o lobby descarado que os jornais fazem em defesa de seus candidatos ao ministério e dos “programa de governo” que formulam. É como se a população tivesse eleito a Folha para governar. Eu não consigo ler mais nenhuma “notícia” sem esperar pelo desmentido dela no dia seguinte.
O nível dos jornais brasileiros é uma lástima. O Valor Econômico, que é o menos ruinzinho, mandou um repórter para o Vietnã, fazer reportagem sobre o plantio de arroz, sob patrocínio da Sygenta! Embora tenha noticiado no pé da “reportagem” que a viagem tinha sido paga pela Sygenta, o jornal não esclareceu o que é a Sygenta. No texto, o repórter atribui parcialmente à ideologia a rejeição de rizicultores vietnamitas aos “pacotes” tecnológicos da Sygenta. Fica parecendo que os pacotes tecnológicos da Sygenta são milagrosos e que os vietnamitas não tem apenas 5 mil anos de desenvolvimento da tecnologia de plantio de arroz. O repórter não reserva uma linha sequer à vasta literatura existente sobre o papel exercido pelas grandes corporações do agronegócio — dentre as quais figuram com destaque a Sygenta e a Monsanto –, que tentam cercar o mercado das sementes, do veneno e dos fertilizantes.
Estamos falando de um jornal que, em tese, deveria servir aos formuladores das políticas públicas brasileiras.
No entanto, serve ao lobby descarado.
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O que está mudando na mídia hoje
Reproduzo artigo de Luis Nassif, publicado no seu blog:
O anúncio da visita de Rupert Murdoch ao presidente Lula traz à tona as profundas mudanças que deverão ocorrer proximamente na mídia. Murdoch é um empresário australiano que inaugurou a era da globalização na mídia. Com apoio do mercado de capitais, avançou sobre o mercado britânico, depois sobre o norte-americano e suas empresas – Fox News à frente – se tornou ator político relevante nas eleições locais.
Essa mesma estratégia político-partidária foi adotada pelo grupo sul-africana Naspers – sócio da Editora Abril. Trata-se de uma mudança de enfoque no papel convencional da mídia ao longo da história. Historicamente jornais sempre se aliaram a partidos políticos, na oposição ou na situação, mas como papel auxiliar.
Em geral, esses grupos tinham posição consolidada em seus respectivos mercados. A convergência digital derrubou as barreiras de entrada (necessidade de investimento em máquinas, capital de giro, papéis, etc), permitiu a entrada de novos atores no mercado, como as teles e os grupos de entretenimento.
O caminho escolhido por alguns grupos – especialmente donos de TV aberta (que têm maior abrangência) – foi o de utilizar o espaço preservado para passar a atuar politicamente, não mais como coadjuvante, mas como protagonista.
Murdoch abriu o caminho ao empregar vários candidatos republicanos e liderar um pesado movimento conservador – que acabou influenciando a mídia em geral. No Brasil, esse movimento foi imitado pelo pacto entre quatro grandes grupos de mídia – Globo, Abril, Estadão e Veja – que, de 2005 até agora, comandaram a oposição política, inclusive tendo papel decisivo na indicação de José Serra à presidência, em detrimento de Aécio Neves – que teria mais possibilidade de vitória.
O reverso desse movimento é o desabrochar da sociedade civil na internet: blogs, ONGs, OSCIPs, sindicatos, movimentos sociais, todo esse conjunto disputando dentro da mesma plataforma tecnológica dos grandes grupos.
Nos dois casos, haverá a disputa pela audiência e pelas opiniões políticas – os grandes grupos dispondo de estrutura profissional, as organizações sociais somando esforços com o chamado trabalho em rede. Os demais grupos dedicando-se ao entretenimento, a atender às demandas de seus leitores/ouvintes, ora pendendo para uma ideia ou outra.
É em cima desse movimento global que se darão as mudanças na radiodifusão brasileira, inclusive a proposta de mudança na legislação prometida por Lula antes de deixar o poder. A ideia central será, de um lado, defender os atuais grupos de mídia da competição com as teles – muito mais poderosas financeiramente. De outro lado, abrir espaço para uma melhor competição no setor.
Em breve deverão ocorrer transformação de monta no setor. Nas TVs abertas, o aparecimento de novas redes, provavelmente com capital externo. A crise do Banco Panamericano deverá precipitar a venda do SBT. A rede Mais TV está sendo assediada por grupos portugueses. No cabo, as teles começam a competir com a Net. E na internet, blogs e sites ganharam a maioridade.
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O anúncio da visita de Rupert Murdoch ao presidente Lula traz à tona as profundas mudanças que deverão ocorrer proximamente na mídia. Murdoch é um empresário australiano que inaugurou a era da globalização na mídia. Com apoio do mercado de capitais, avançou sobre o mercado britânico, depois sobre o norte-americano e suas empresas – Fox News à frente – se tornou ator político relevante nas eleições locais.
Essa mesma estratégia político-partidária foi adotada pelo grupo sul-africana Naspers – sócio da Editora Abril. Trata-se de uma mudança de enfoque no papel convencional da mídia ao longo da história. Historicamente jornais sempre se aliaram a partidos políticos, na oposição ou na situação, mas como papel auxiliar.
Em geral, esses grupos tinham posição consolidada em seus respectivos mercados. A convergência digital derrubou as barreiras de entrada (necessidade de investimento em máquinas, capital de giro, papéis, etc), permitiu a entrada de novos atores no mercado, como as teles e os grupos de entretenimento.
O caminho escolhido por alguns grupos – especialmente donos de TV aberta (que têm maior abrangência) – foi o de utilizar o espaço preservado para passar a atuar politicamente, não mais como coadjuvante, mas como protagonista.
Murdoch abriu o caminho ao empregar vários candidatos republicanos e liderar um pesado movimento conservador – que acabou influenciando a mídia em geral. No Brasil, esse movimento foi imitado pelo pacto entre quatro grandes grupos de mídia – Globo, Abril, Estadão e Veja – que, de 2005 até agora, comandaram a oposição política, inclusive tendo papel decisivo na indicação de José Serra à presidência, em detrimento de Aécio Neves – que teria mais possibilidade de vitória.
O reverso desse movimento é o desabrochar da sociedade civil na internet: blogs, ONGs, OSCIPs, sindicatos, movimentos sociais, todo esse conjunto disputando dentro da mesma plataforma tecnológica dos grandes grupos.
Nos dois casos, haverá a disputa pela audiência e pelas opiniões políticas – os grandes grupos dispondo de estrutura profissional, as organizações sociais somando esforços com o chamado trabalho em rede. Os demais grupos dedicando-se ao entretenimento, a atender às demandas de seus leitores/ouvintes, ora pendendo para uma ideia ou outra.
É em cima desse movimento global que se darão as mudanças na radiodifusão brasileira, inclusive a proposta de mudança na legislação prometida por Lula antes de deixar o poder. A ideia central será, de um lado, defender os atuais grupos de mídia da competição com as teles – muito mais poderosas financeiramente. De outro lado, abrir espaço para uma melhor competição no setor.
Em breve deverão ocorrer transformação de monta no setor. Nas TVs abertas, o aparecimento de novas redes, provavelmente com capital externo. A crise do Banco Panamericano deverá precipitar a venda do SBT. A rede Mais TV está sendo assediada por grupos portugueses. No cabo, as teles começam a competir com a Net. E na internet, blogs e sites ganharam a maioridade.
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Jagunço de Serra se despede da Câmara
Reproduzo artigo de Mino Carta, publicado na revista CartaCapital:
Na Câmara Federal, o ex-deputado tucano Marcelo Itagiba, ex-emedebista, ex-policial, deita falação para injuriar alguns jornalistas, precisamente aqueles que atuaram do lado oposto à compacta campanha de ódio a favor de José Serra desencadeada pela mídia nativa.
Luiz Carlos Azenha é inepto. Bob Fernandes é mentecapto, mercenário desqualificado. Leandro Fortes, famigerado mitômano. Palmério Doria, profissional da mentira. Paulo Henrique Amorim, crápula. Luis Nassif, estelionatário. Marcelo Auler, hidrófobo. Quanto a mim, sou um velhaco de trajetória venal.
Creio que para os colegas ofendidos as injúrias de Itagiba equivalham a outros tantos reconhecimentos de honradez e qualidade profissional. O acima assinado passará a incluir as definições desse sabujo da tucanagem despenada entre as mais favoráveis que recebeu ao longo da sua vida de jornalista. Uma do colega Nirlando Beirão, companheiro de diversas jornadas: “Nunca o vi vacilar à frente dos poderosos”. A outra do então ditador aposentado João Baptista Figueiredo, pronunciada em 1988: “Ele é um chato que questiona tudo, reescreveria até os Evangelhos, Geisel o detestava, mas não tem rabo preso”.
Meu modelo é nonno Luigi, toscano, pai da minha mãe, falecido aos 56 anos, antes do meu nascimento. Perseguido pelo fascismo, afastado da direção de um diário genovês, esgrimista, desafiava os desafetos para duelos. Sabia ganhar e perder, certa vez foi ferido da ponta da orelha esquerda à base do pescoço, escapou por um triz.
Mas quem ousaria contestar o ex-esbirro-Itagiba, que se permite condenar Paulo Lacerda ou Protógenes Queiroz? Há de ser velhaco e venal quem ao sair da direção de Veja em fevereiro de 1976 teve de inventar os seus empregos porque não existiria barão midiático disposto a lhe oferecer trabalho. E ainda quem nunca deixou de defender a verdade factual e expor desabridamente suas opiniões.
Tenho pena de figuras como a de Marcelo Itagiba, jagunços de um poder no ocaso. Sinto no seu ataque a admirável interpretação do papel de janízaro, a cumprir a ordem do sultão humilhado, incapaz de conter a sede de vingança, o rancor inextinguível contra a vida e o mundo. No seu discurso federal, o porta-voz do ódio levanta casos de muitos anos atrás, todos a convergir em uma única direção. Basta segui-la para entender em nome de quem ele age. Boa pista para mentecaptos, ineptos, mitômanos e assim por diante.
Inclusive para velhacos e venais. Arrisco um palpite: trata-se da mesma personagem que acionou a procuradora Cureau contra CartaCapital.
Falemos de regulação
O ministro Franklin Martins define como “fantasma” a assertiva bastante comum de que a liberdade de imprensa sofre ameaça no Brasil de Lula e Dilma. Também diz que a regulação da mídia é necessidade inadiável. Primeiro: respeita a verdade factual, nunca a mídia nativa foi tão livre de deturpar os fatos como se deu durante a campanha eleitoral. Segundo: o avanço tecnológico justifica plenamente a regulação da comunicação eletrônica, de sorte a adaptar à situação atual leis e regras superadas, ou seja, obsoletas.
O anteprojeto que o ministro pretende aprontar antes do fim do mandato do presidente Lula tratará dessa atualização técnica, sem risco algum para a liberdade de expressão. Temos aqui outro aspecto da questão, e o ministro passa por ele à margem do seminário internacional de Brasília, realizado nesta semana, ao condenar um conflito de interesse insuportável em um país democrático: inúmeros parlamentares são donos de instrumentos midiáticos, de jornais a rádios e tevês, ou contam com os préstimos de laranjas para esconder o verdadeiro proprietário.
No caso, o ministro volta a acertar. Trata-se de permitir outra regulação, a determinar de forma democrática os poderes e os alcances da mídia brasileira. Cabe ao Congresso a aprovação de uma lei que circunscreva claramente o raio de ação dos patrões (é aceitável que alguém seja dono de tudo?) e valorize os profissionais, a resguardá-los da prepotência medieval de serem comandados por um diretor de redação por direito divino.
Perguntava Joana D’Arc na peça de Bernard Shaw: “Quando, ó Deus, esta terra estará em condições de receber os seus santos?” Seria demais esperar pelos santos: bastariam deputados e senadores de boa-fé democrática, conscientes das suas responsabilidades.
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Na Câmara Federal, o ex-deputado tucano Marcelo Itagiba, ex-emedebista, ex-policial, deita falação para injuriar alguns jornalistas, precisamente aqueles que atuaram do lado oposto à compacta campanha de ódio a favor de José Serra desencadeada pela mídia nativa.
Luiz Carlos Azenha é inepto. Bob Fernandes é mentecapto, mercenário desqualificado. Leandro Fortes, famigerado mitômano. Palmério Doria, profissional da mentira. Paulo Henrique Amorim, crápula. Luis Nassif, estelionatário. Marcelo Auler, hidrófobo. Quanto a mim, sou um velhaco de trajetória venal.
Creio que para os colegas ofendidos as injúrias de Itagiba equivalham a outros tantos reconhecimentos de honradez e qualidade profissional. O acima assinado passará a incluir as definições desse sabujo da tucanagem despenada entre as mais favoráveis que recebeu ao longo da sua vida de jornalista. Uma do colega Nirlando Beirão, companheiro de diversas jornadas: “Nunca o vi vacilar à frente dos poderosos”. A outra do então ditador aposentado João Baptista Figueiredo, pronunciada em 1988: “Ele é um chato que questiona tudo, reescreveria até os Evangelhos, Geisel o detestava, mas não tem rabo preso”.
Meu modelo é nonno Luigi, toscano, pai da minha mãe, falecido aos 56 anos, antes do meu nascimento. Perseguido pelo fascismo, afastado da direção de um diário genovês, esgrimista, desafiava os desafetos para duelos. Sabia ganhar e perder, certa vez foi ferido da ponta da orelha esquerda à base do pescoço, escapou por um triz.
Mas quem ousaria contestar o ex-esbirro-Itagiba, que se permite condenar Paulo Lacerda ou Protógenes Queiroz? Há de ser velhaco e venal quem ao sair da direção de Veja em fevereiro de 1976 teve de inventar os seus empregos porque não existiria barão midiático disposto a lhe oferecer trabalho. E ainda quem nunca deixou de defender a verdade factual e expor desabridamente suas opiniões.
Tenho pena de figuras como a de Marcelo Itagiba, jagunços de um poder no ocaso. Sinto no seu ataque a admirável interpretação do papel de janízaro, a cumprir a ordem do sultão humilhado, incapaz de conter a sede de vingança, o rancor inextinguível contra a vida e o mundo. No seu discurso federal, o porta-voz do ódio levanta casos de muitos anos atrás, todos a convergir em uma única direção. Basta segui-la para entender em nome de quem ele age. Boa pista para mentecaptos, ineptos, mitômanos e assim por diante.
Inclusive para velhacos e venais. Arrisco um palpite: trata-se da mesma personagem que acionou a procuradora Cureau contra CartaCapital.
Falemos de regulação
O ministro Franklin Martins define como “fantasma” a assertiva bastante comum de que a liberdade de imprensa sofre ameaça no Brasil de Lula e Dilma. Também diz que a regulação da mídia é necessidade inadiável. Primeiro: respeita a verdade factual, nunca a mídia nativa foi tão livre de deturpar os fatos como se deu durante a campanha eleitoral. Segundo: o avanço tecnológico justifica plenamente a regulação da comunicação eletrônica, de sorte a adaptar à situação atual leis e regras superadas, ou seja, obsoletas.
O anteprojeto que o ministro pretende aprontar antes do fim do mandato do presidente Lula tratará dessa atualização técnica, sem risco algum para a liberdade de expressão. Temos aqui outro aspecto da questão, e o ministro passa por ele à margem do seminário internacional de Brasília, realizado nesta semana, ao condenar um conflito de interesse insuportável em um país democrático: inúmeros parlamentares são donos de instrumentos midiáticos, de jornais a rádios e tevês, ou contam com os préstimos de laranjas para esconder o verdadeiro proprietário.
No caso, o ministro volta a acertar. Trata-se de permitir outra regulação, a determinar de forma democrática os poderes e os alcances da mídia brasileira. Cabe ao Congresso a aprovação de uma lei que circunscreva claramente o raio de ação dos patrões (é aceitável que alguém seja dono de tudo?) e valorize os profissionais, a resguardá-los da prepotência medieval de serem comandados por um diretor de redação por direito divino.
Perguntava Joana D’Arc na peça de Bernard Shaw: “Quando, ó Deus, esta terra estará em condições de receber os seus santos?” Seria demais esperar pelos santos: bastariam deputados e senadores de boa-fé democrática, conscientes das suas responsabilidades.
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Os últimos anos do império da Globo
Reproduzo artigo de Renato Rovai, publicado no sítio da Revista Fórum:
Há elementos bastante sólidos para se afirmar que as Organizações Globo estão vivendo seus últimos anos de império e que para breve ela será apenas mais um grupo de comunicação no Brasil. A audiência da TV aberta, que é o carro chefe da emissora vem caindo de forma constante há algum tempo.
Além disso, a Globo tem perdido telespectadores tanto para a concorrência como para a Internet. Os jovens já passam mais tempo no computador do que na frente da TV. Além do que, na Internet a Globo é mais uma. Seu portal não é nem o maior do país.
Agora, há dois novos elementos que são pilares fundamentais do poder da Globo que podem torná-la ainda mais fraca nos próximos anos. O primeiro tem relação com a decisão recente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cadê) que tirou da emissora a preferência pela renovação dos direitos do Campeonato Brasileiro das temporadas de 2012 a 2014.
A Rede Record está em polvorosa com a notícia. E há apostas de que o grupo do bispo pensa em dobrar o valor pago hoje pelos Marinhos, de 500 milhões ano para 1 bilhão.
Se isso vier a acontecer e a emissora paulista, que já venceu a concorrência pela transmissão dos Jogos Olímpicos de 2012, passará a ter a hegemonia da cobertura esportiva. No caso do Campeonato Brasileiro, se a Record vencer mais essa ela passa a ter condições objetivas de derrotar a Globo no horário nobre.
O melhor horário para os jogos da semana é o das 20h, 20h30. Mas por conta do Jornal Nacional e das novelas, a Globo faz com que eles se iniciem cada dia mais tarde. Antes eram 21h15 e agora já estão começando às 22h. Isso diminui consideravelmente o público nos estádios.
A Globo também só transmite um jogo por semana. Se a Record vier a ganhar o Brasileirão, ela vai fazer exatamente ao contrário. Transmitirá os jogos no horário nobre tanto para poder vender publicidades por um preço melhor, quanto para tirar audiência da sua principal concorrente. E empurrar as novelas para segundo lugar no horário.
Além disso, ao invés de transmitir apenas um jogo por semana, vai tentar fazer o maior número possível de partidas. Ou seja, vamos ter jogos nos canais abertos nas quartas e quintas e talvez em até dois horários nesses dias. Algo como o jogo das 19h e o das 21h. Além disso, o campeonato da série B provavelmente vai ser negociado com alguma parceira, como SBT ou a Rede TV pra ser transmitido nas terças e sextas em horários também nobres. E vão arrancar alguns pontinhos das novelas nos outros dias.
Boa parte da audiência e dos lucros da Globo tem relação com o futebol. Ele é uma das galinhas dos ovos de ouro da emissora. É quem paga boa parte das contas. O núcleo de novelas também é o responsável por uma considerável parcela das receitas e da audiência da emissora. Ou seja….
O segundo elemento que pode levar a derrocada da empresa dos Marinhos ser mais rápido do que o imaginado é que pela primeira vez desde 1964 que há indícios claros de ela não vai ser a toda poderosa do Ministério da Comunicação.
Há muitas articulações tanto no meio empresarial, quanto na sociedade civil e na classe política para impedir que novamente o futuro titular da pasta seja pau-mandado do Jardim Botânico.
Um importante dirigente partidário disse a seguinte frase que resume o animo da tropa governista: “Dessa vez eles perderam mesmo. Quando decidiram apoiar radicalmente o Serra fizeram uma opção. Vão ter o direito sagrado de ser oposição, inclusive no ministério da Comunicação”.
Amém!
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Há elementos bastante sólidos para se afirmar que as Organizações Globo estão vivendo seus últimos anos de império e que para breve ela será apenas mais um grupo de comunicação no Brasil. A audiência da TV aberta, que é o carro chefe da emissora vem caindo de forma constante há algum tempo.
Além disso, a Globo tem perdido telespectadores tanto para a concorrência como para a Internet. Os jovens já passam mais tempo no computador do que na frente da TV. Além do que, na Internet a Globo é mais uma. Seu portal não é nem o maior do país.
Agora, há dois novos elementos que são pilares fundamentais do poder da Globo que podem torná-la ainda mais fraca nos próximos anos. O primeiro tem relação com a decisão recente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cadê) que tirou da emissora a preferência pela renovação dos direitos do Campeonato Brasileiro das temporadas de 2012 a 2014.
A Rede Record está em polvorosa com a notícia. E há apostas de que o grupo do bispo pensa em dobrar o valor pago hoje pelos Marinhos, de 500 milhões ano para 1 bilhão.
Se isso vier a acontecer e a emissora paulista, que já venceu a concorrência pela transmissão dos Jogos Olímpicos de 2012, passará a ter a hegemonia da cobertura esportiva. No caso do Campeonato Brasileiro, se a Record vencer mais essa ela passa a ter condições objetivas de derrotar a Globo no horário nobre.
O melhor horário para os jogos da semana é o das 20h, 20h30. Mas por conta do Jornal Nacional e das novelas, a Globo faz com que eles se iniciem cada dia mais tarde. Antes eram 21h15 e agora já estão começando às 22h. Isso diminui consideravelmente o público nos estádios.
A Globo também só transmite um jogo por semana. Se a Record vier a ganhar o Brasileirão, ela vai fazer exatamente ao contrário. Transmitirá os jogos no horário nobre tanto para poder vender publicidades por um preço melhor, quanto para tirar audiência da sua principal concorrente. E empurrar as novelas para segundo lugar no horário.
Além disso, ao invés de transmitir apenas um jogo por semana, vai tentar fazer o maior número possível de partidas. Ou seja, vamos ter jogos nos canais abertos nas quartas e quintas e talvez em até dois horários nesses dias. Algo como o jogo das 19h e o das 21h. Além disso, o campeonato da série B provavelmente vai ser negociado com alguma parceira, como SBT ou a Rede TV pra ser transmitido nas terças e sextas em horários também nobres. E vão arrancar alguns pontinhos das novelas nos outros dias.
Boa parte da audiência e dos lucros da Globo tem relação com o futebol. Ele é uma das galinhas dos ovos de ouro da emissora. É quem paga boa parte das contas. O núcleo de novelas também é o responsável por uma considerável parcela das receitas e da audiência da emissora. Ou seja….
O segundo elemento que pode levar a derrocada da empresa dos Marinhos ser mais rápido do que o imaginado é que pela primeira vez desde 1964 que há indícios claros de ela não vai ser a toda poderosa do Ministério da Comunicação.
Há muitas articulações tanto no meio empresarial, quanto na sociedade civil e na classe política para impedir que novamente o futuro titular da pasta seja pau-mandado do Jardim Botânico.
Um importante dirigente partidário disse a seguinte frase que resume o animo da tropa governista: “Dessa vez eles perderam mesmo. Quando decidiram apoiar radicalmente o Serra fizeram uma opção. Vão ter o direito sagrado de ser oposição, inclusive no ministério da Comunicação”.
Amém!
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Derrubar o muro na Palestina
Reproduzo artigo de Soraya Misleh, publicado no sítio Ciranda:
Na mesma semana em que movimentos protestam no mundo contra o muro do apartheid na Palestina, celebra-se a queda do Muro de Berlim - em 9 de novembro de 1989. Em sua 8ª edição, a iniciativa, coordenada pelo movimento Stop the Wall, segue até dia 16, contando com maratona midiática que teve início à zero hora de ontem (12) e terá duração de 48h ininterruptas. Durante o período, mídias alternativas do mundo todo têm se mobilizado para vencer a árdua batalha no campo da informação e contribuir, assim, para abalar os alicerces da enorme barreira na Cisjordânia.
Tal, como lembrou o historiador André Gattaz em artigo de sua autoria intitulado “Ilusões sobre o processo de paz na Palestina”, trata-se na verdade de “um complexo de fortificações composto por muros, cercas, fossos, barreiras, portões de controle, torres de segurança e equipamentos de vigilância eletrônica, orçado em mais de um milhão de dólares o quilômetro”.
Ainda conforme o especialista, “embora o governo israelense denomine-o ‘cerca de segurança’, vem sendo conhecido no restante do mundo como ‘muro da vergonha’ ou ainda ‘muro do apartheid’, numa triste recordação dos tempos do apartheid que separava negros e brancos na África do Sul, ou do muro de Berlim que simbolicamente separava o comunismo do capitalismo, e que com tanto simbolismo foi derrubado”. Aliás, sua altura e extensão superam consideravelmente este último. Ainda em construção, desde 2002, mede cerca de 700km e tem aproximadamente 9m de altura. O de Berlim, levantado em 1961, tinha em torno de 155km e 3m.
O muro na Cisjordânia tem anexado terras e impedido os cidadãos palestinos do direito elementar de ir e vir - à escola, aos hospitais, ao trabalho. O Tribunal Internacional de Haia declarou a construção ilegal em 2004, recomendando sua derrubada imediata e a reparação dos danos que vem causando.
Mais ainda, vaticinou: “Todos os estados têm a obrigação de não reconhecer a situação ilegal resultante da construção do muro e não dar auxílio ou assistência para manter a situação criada por tal construção; todos os estados signatários da Quarta Convenção de Genebra relativa à Proteção de Civis em Tempos de Guerra, de 12 de agosto de 1949, têm, além disso, a obrigação, enquanto respeitam a Carta das Nações Unidas e a lei internacional, de exigir de Israel o cumprimento da lei humanitária internacional incorporada naquela Convenção...”
Como lembra Gattaz no mesmo artigo, o Brasil, como signatário da Convenção de Genebra, aí se inclui. Portanto, se não por razões humanitárias, em cumprimento à lei internacional, não pode se calar diante da opressão e da injustiça.
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Na mesma semana em que movimentos protestam no mundo contra o muro do apartheid na Palestina, celebra-se a queda do Muro de Berlim - em 9 de novembro de 1989. Em sua 8ª edição, a iniciativa, coordenada pelo movimento Stop the Wall, segue até dia 16, contando com maratona midiática que teve início à zero hora de ontem (12) e terá duração de 48h ininterruptas. Durante o período, mídias alternativas do mundo todo têm se mobilizado para vencer a árdua batalha no campo da informação e contribuir, assim, para abalar os alicerces da enorme barreira na Cisjordânia.
Tal, como lembrou o historiador André Gattaz em artigo de sua autoria intitulado “Ilusões sobre o processo de paz na Palestina”, trata-se na verdade de “um complexo de fortificações composto por muros, cercas, fossos, barreiras, portões de controle, torres de segurança e equipamentos de vigilância eletrônica, orçado em mais de um milhão de dólares o quilômetro”.
Ainda conforme o especialista, “embora o governo israelense denomine-o ‘cerca de segurança’, vem sendo conhecido no restante do mundo como ‘muro da vergonha’ ou ainda ‘muro do apartheid’, numa triste recordação dos tempos do apartheid que separava negros e brancos na África do Sul, ou do muro de Berlim que simbolicamente separava o comunismo do capitalismo, e que com tanto simbolismo foi derrubado”. Aliás, sua altura e extensão superam consideravelmente este último. Ainda em construção, desde 2002, mede cerca de 700km e tem aproximadamente 9m de altura. O de Berlim, levantado em 1961, tinha em torno de 155km e 3m.
O muro na Cisjordânia tem anexado terras e impedido os cidadãos palestinos do direito elementar de ir e vir - à escola, aos hospitais, ao trabalho. O Tribunal Internacional de Haia declarou a construção ilegal em 2004, recomendando sua derrubada imediata e a reparação dos danos que vem causando.
Mais ainda, vaticinou: “Todos os estados têm a obrigação de não reconhecer a situação ilegal resultante da construção do muro e não dar auxílio ou assistência para manter a situação criada por tal construção; todos os estados signatários da Quarta Convenção de Genebra relativa à Proteção de Civis em Tempos de Guerra, de 12 de agosto de 1949, têm, além disso, a obrigação, enquanto respeitam a Carta das Nações Unidas e a lei internacional, de exigir de Israel o cumprimento da lei humanitária internacional incorporada naquela Convenção...”
Como lembra Gattaz no mesmo artigo, o Brasil, como signatário da Convenção de Genebra, aí se inclui. Portanto, se não por razões humanitárias, em cumprimento à lei internacional, não pode se calar diante da opressão e da injustiça.
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José de Abreu e Fernando Morais no Barão
Reproduzo matéria publicada no sítio do Centro de Estudos Barão de Itararé:
O Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé acaba de ganhar dois reforços de peso. Na semana passada, o escritor Fernando Morais e o ator José de Abreu se incorporaram ao conselho consultivo da entidade, que passa a ter 56 membros.
Especializado em biografias e grandes reportagens, o mineiro Fernando Gomes de Morais tem 64 anos e está no jornalismo há quase cinco décadas. É autor de A Ilha, Olga, Chatô — O Rei do Brasil e O Mago, entre outras obras.
Já José de Abreu ganhou destaque nas eleições presidenciais, ao acusar o candidato tucano, José Serra, de “fascista”. Aos 64 anos, ele deve estar no elenco de Insensato Coração, a próxima novela das 9 a ser exibida pela TV Globo. Os vínculos com a emissora não o impediram de fazer campanha aberta em defesa da presidente eleita, Dilma Rousseff.
Confira abaixo a composição completa da diretoria e do conselho consultivo do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.
Diretoria
Presidente: Altamiro Borges
Secretária-geral: Renata Mielli
Diretora de Finanças e Planejamento: Danielle Penha
Diretora de Estudos e Pesquisas: Rita Casaro
Diretor de Comunicação: Rodrigo Vianna
Diretor de Formação: Igor Fuser
Diretora de Políticas Públicas: Márcia Quintanilha
Conselho fiscal
Luana Bonone
Eduardo Navarro
Vandré Fernandes
Suplentes do conselho fiscal
Guiomar Prates
Madalena Guasco
Márcia Nestardo
Conselho Consultivo
1- André Vitral (UNE)
2- Bartíria Costa (Conam)
3- Beto Almeida (Telesur)
4- Breno Altman (Opera Mundi)
5- Carlos Lopes (Hora do Povo)
6- Daniel Castro (Ipea)
7- Denis de Moraes (Universidade Federal Fluminense)
8- Dennis de Oliveira (USP)
9- Edson França (Unegro)
10- Eduardo Guimarães (Blog da Cidadania)
11- Edivaldo Farias - Didi (Abccom)
12- Emir Sader (Blog do Emir)
13- Fernando Morais (escritor)
14- Gilberto Maringoni (Faculdade Cásper Libero)
15- Gilson Caroni (Faculdades Integradas Hélio Alonso)
16- Gualberto Costa (Associação Brasileira de Cartunistas)
17- Hermano Alegri (Adital)
18- Igor Felippe (MST)
19- João Brant (Coletivo Intervozes)
20- João Franzim (Agência Sindical)
21- João Guilherme Vargas Neto (consultor sindical)
22- Joaquim Palhares (Carta Maior)
23- José Augusto Oliveira – Guto (Fenaj)
24- José de Abreu (ator)
25- José Reinaldo de Carvalho (Vermelho)
26- José Soter (Abraço)
27- Laurindo Lalo Leal Filho (USP)
28- Leandro Fortes (CartaCapital)
29- Leonardo Severo (CUT)
30- Lúcia Stumpf (Coordenação dos Movimentos Sociais)
31- Luis Carlos Azenha (Viomundo)
32- Luis Fernando Verissimo (escritor)
33- Luis Nassif (Luis Nassif Online)
34- Marcos Dantas (UFRJ)
35- Maria Inês Nassif (Valor Econômico)
36- Maurício Dias (CartaCapital)
37- Mouzar Benedito (escritor)
38- Nascimento Silva (Fitert)
39- Nilton Viana (Brasil de Fato)
40- Orlando Guilhon (Associação de Rádios Públicas)
41- Oswaldo Colibri (Rádio Brasil Atual)
42- Paulo Salvador (Revista do Brasil)
43- Percival Henriques (Anid)
44- Rachel Moreno (Mulher e Mídia)
45- Regina Lima (Abepec)
46- Renato Rovai (Revista Fórum)
47- Rita Freire (Ciranda)
48- Ronaldo de Moura (Contag)
49- Sérgio Amadeu (Faculdade Cásper Libero)
50- Sérgio Gomes (Oboré)
51- Sylvio Michelli (Federação dos Servidores Públicos)
52- Socorro Gomes (Cebrapaz)
53- Tereza Cruvinel (EBC)
54- Venício Lima (UnB)
55- Vito Giannotti (Núcleo Piratininga de Comunicação)
56- Wagner Nabuco (Caros Amigos)
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O Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé acaba de ganhar dois reforços de peso. Na semana passada, o escritor Fernando Morais e o ator José de Abreu se incorporaram ao conselho consultivo da entidade, que passa a ter 56 membros.
Especializado em biografias e grandes reportagens, o mineiro Fernando Gomes de Morais tem 64 anos e está no jornalismo há quase cinco décadas. É autor de A Ilha, Olga, Chatô — O Rei do Brasil e O Mago, entre outras obras.
Já José de Abreu ganhou destaque nas eleições presidenciais, ao acusar o candidato tucano, José Serra, de “fascista”. Aos 64 anos, ele deve estar no elenco de Insensato Coração, a próxima novela das 9 a ser exibida pela TV Globo. Os vínculos com a emissora não o impediram de fazer campanha aberta em defesa da presidente eleita, Dilma Rousseff.
Confira abaixo a composição completa da diretoria e do conselho consultivo do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.
Diretoria
Presidente: Altamiro Borges
Secretária-geral: Renata Mielli
Diretora de Finanças e Planejamento: Danielle Penha
Diretora de Estudos e Pesquisas: Rita Casaro
Diretor de Comunicação: Rodrigo Vianna
Diretor de Formação: Igor Fuser
Diretora de Políticas Públicas: Márcia Quintanilha
Conselho fiscal
Luana Bonone
Eduardo Navarro
Vandré Fernandes
Suplentes do conselho fiscal
Guiomar Prates
Madalena Guasco
Márcia Nestardo
Conselho Consultivo
1- André Vitral (UNE)
2- Bartíria Costa (Conam)
3- Beto Almeida (Telesur)
4- Breno Altman (Opera Mundi)
5- Carlos Lopes (Hora do Povo)
6- Daniel Castro (Ipea)
7- Denis de Moraes (Universidade Federal Fluminense)
8- Dennis de Oliveira (USP)
9- Edson França (Unegro)
10- Eduardo Guimarães (Blog da Cidadania)
11- Edivaldo Farias - Didi (Abccom)
12- Emir Sader (Blog do Emir)
13- Fernando Morais (escritor)
14- Gilberto Maringoni (Faculdade Cásper Libero)
15- Gilson Caroni (Faculdades Integradas Hélio Alonso)
16- Gualberto Costa (Associação Brasileira de Cartunistas)
17- Hermano Alegri (Adital)
18- Igor Felippe (MST)
19- João Brant (Coletivo Intervozes)
20- João Franzim (Agência Sindical)
21- João Guilherme Vargas Neto (consultor sindical)
22- Joaquim Palhares (Carta Maior)
23- José Augusto Oliveira – Guto (Fenaj)
24- José de Abreu (ator)
25- José Reinaldo de Carvalho (Vermelho)
26- José Soter (Abraço)
27- Laurindo Lalo Leal Filho (USP)
28- Leandro Fortes (CartaCapital)
29- Leonardo Severo (CUT)
30- Lúcia Stumpf (Coordenação dos Movimentos Sociais)
31- Luis Carlos Azenha (Viomundo)
32- Luis Fernando Verissimo (escritor)
33- Luis Nassif (Luis Nassif Online)
34- Marcos Dantas (UFRJ)
35- Maria Inês Nassif (Valor Econômico)
36- Maurício Dias (CartaCapital)
37- Mouzar Benedito (escritor)
38- Nascimento Silva (Fitert)
39- Nilton Viana (Brasil de Fato)
40- Orlando Guilhon (Associação de Rádios Públicas)
41- Oswaldo Colibri (Rádio Brasil Atual)
42- Paulo Salvador (Revista do Brasil)
43- Percival Henriques (Anid)
44- Rachel Moreno (Mulher e Mídia)
45- Regina Lima (Abepec)
46- Renato Rovai (Revista Fórum)
47- Rita Freire (Ciranda)
48- Ronaldo de Moura (Contag)
49- Sérgio Amadeu (Faculdade Cásper Libero)
50- Sérgio Gomes (Oboré)
51- Sylvio Michelli (Federação dos Servidores Públicos)
52- Socorro Gomes (Cebrapaz)
53- Tereza Cruvinel (EBC)
54- Venício Lima (UnB)
55- Vito Giannotti (Núcleo Piratininga de Comunicação)
56- Wagner Nabuco (Caros Amigos)
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Experiências mundiais de regulação da mídia
Reproduzo artigo de Bia Barbosa, publicado no sítio Carta Maior:
A história já está ficando repetitiva. Todas as vezes em que se fala de medidas para regular a veiculação de conteúdo audiovisual a reação de uma parcela da grande mídia é a mesma: o governo quer censurar a imprensa e a liberdade de expressão. O que ficou claro, no entanto, a partir de uma série de experiências reguladoras apresentadas no seminário “Comunicações eletrônicas e convergência de mídias”, encerrado nesta quarta (10) em Brasília, foi justamente o contrário. Especialistas da França, Inglaterra, Portugal, Espanha, Estados Unidos e Argentina e também de organismos como a Unesco e a União Européia reafirmaram a importância de regras para a exibição de conteúdos no rádio e na TV para a garantia da pluralidade e o respeito aos direitos humanos, pilares de sociedades democráticas.
Não se trata, portanto, de censura, porque não há em vigor nesses países a idéia de aprovação prévia para veiculação de um determinado conteúdo. O que existe – sobretudo para os concessionários de rádio e TV, ou seja, o conteúdo jornalístico da mídia impressa e a internet não respondem a essas regulamentações – são regras para a promoção da pluralidade, diversidade, cultura nacional e regional, e imparcialidade jornalística; para a proteção das crianças e adolescentes, e da privacidade; para o combate ao chamado “discurso do ódio” e à injúria e difamação; e para a garantia do direito de resposta dos ouvintes e telespectadores.
Coincidentemente, a grande maioria desses mecanismos está prevista na Constituição brasileira, mas até hoje não se tornou regras de fato aplicáveis justamente porque o setor da radiodifusão, com o apoio da mídia impressa, bloqueia o debate público sobre a questão, formando uma opinião pública contrária a essa visão na sociedade em geral e também em uma parte do Parlamento.
Como todas as experiências fizeram questão de destacar, o princípio por trás dessas regras é justamente o da liberdade de expressão, que não é considerada um valor absolutista – e, portanto, tem limites – simplesmente porque não pode ser permitida apenas para alguns, tampouco para violar demais direitos.
“A liberdade da expressão não pode ser usada para abusar da liberdade de outras pessoas. Incitar a violência contra outras pessoas, por exemplo, é algo que não pode existir nos meios de comunicação”, explicou Wijayananda Jayaweera, Diretor da Divisão de Desenvolvimento da Comunicação da Unesco. “O sistema regulatório existe para servir ao interesse público, e não necessariamente ao interesse dos radiodifusores. Deve garantir a pluralidade e promover a diversidade de idéias, de opiniões, de vozes numa sociedade”, acrescentou.
“Nas democracias, há mais obrigações de conteúdo para a radiodifusão porque são empresas que estão usando um espaço público e porque o que veiculam tem um impacto muito grande. Por isso, questões como imparcialidade jornalística, discurso de ódio, proteção de crianças no rádio e na TV precisam estar previstas em leis que vão além da legislação geral”, afirmou o canadense Toby Mendel, consultor da Unesco.
Diretiva européia
Foi para atender a esses princípios que a União Européia discute uma regulamentação comum para os países desde o final dos anos 80. Entre 2005 e 2007, por conta do cenário da convergência tecnológica, desenvolveu-se a construção de uma diretiva que definiu regras para todos os 27 países. A legislação foi colocada em consulta pública, recebeu centenas de contribuições e foi debatida em conferências regionais, até ser submetida e aprovada pelo Parlamento Europeu.
“Nosso objetivo era promover a diversidade cultural européia, garantir a circulação de conteúdo plural e estimular a competitividade da indústria audiovisual”, explicou Harald Trettenbein, diretor adjunto de Políticas de Audiovisual e Mídias da Comissão Européia. A indústria européia produz três vezes mais conteúdo que a americana, mas havia barreiras de idiomas que dificultavam essa difusão. Por isso, uma das regras cumpridas pelas emissoras de rádio e TV de todos os países hoje é a obrigação de veicular produção independente e conteúdo europeu.
A diretiva também define para todos limitações na veiculação de publicidade. O tempo máximo de publicidade permitido é de 20% da grade – no Brasil, apesar de não respeitada, a lei prevê 25% - e há regras específicas para a veiculação de anúncios de tabaco, medicamentos, álcool e comida gordurosa. Anúncios e conteúdos considerados violadores de direitos humanos podem ser sancionados. A proteção aos direitos das crianças é levada a sério e há a previsão para mecanismos de acessibilidade para pessoas com deficiência, como a audiodescrição.
Respondendo a essa diretiva, Portugal fez uma recente atualização da lei de audiovisual nacional. Hoje o país possui uma vasta regulamentação para a veiculação de conteúdo na radiodifusão, que inclui a definição de horários de difusão para proteção de crianças; cotas para veiculação de músicas portuguesas no rádio; direito de resposta; proteção de grupos minoritários, para evitar manifestações de preconceito regional, de gênero e étnico-racial; e para a promoção do pluralismo e da diversidade.
“O órgão regulador do audiovisual em Portugal faz uma apreciação permanente dos conteúdos. Prezamos pelo rigor, pelo contraditório, pelo cumprimento das obrigações legais. Para garantir a diversidade, fazemos o monitoramento de programas e publicamos um relatório anual sobre como as temáticas são tratadas”, explicou José Alberto Azeredo Lopes, presidente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social de Portugal (ERC) e professor de Direito Internacional. “A abordagem de mercado olha a população como consumidores. A abordagem para o regulador de conteúdos é uma abordagem de cidadania”, acrescentou.
A ERC é um organismo público criado por lei, de natureza administrativa, independente, não estatal. Além do monitoramento de conteúdo, é responsável pela concessão e renovação dos canais de TV aberta e da gestão de mecanismos como o direito de antena, garantido a partidos políticos, associações sindicais e patronais nas emissoras públicas. Suas ações estão sujeitas à fiscalização do Poder Judiciário. Em dois anos, 95% das decisões da ERC que foram questionadas na Justiça foram confirmadas pela corte suprema de Portugal.
Pluralismo político
Outro exemplo significativo de regulação de conteúdo vem do órgão francês, o Conselho Superior de Audiovisual. Uma das ações recorrentes do órgão é zelar pelo pluralismo político no rádio e na TV. Para isso, monitoram mês a mês o tempo de exposição dos dois grandes blocos partidários – situação e oposição – para que tenham um tempo de discurso equilibrado.
“O tempo de exibição da oposição deve ser pelo menos o da metade do governo. Isso é zelar pelo pluralismo, pela neutralidade da informação. E, nos períodos eleitorais, o tempo para cada candidato deve ser exatamente o mesmo”, contou Emmanuel Gabla, diretor adjunto do CSA. “A pluralidade na emissão é o que garante a riqueza e a prevalência do interesse público na nossa televisão”, “é uma escolha social promover a diversidade cultural para que não exista o monopólio da indústria cultural e a uniformização”.
Na França, os canais têm ainda a obrigação de estimular a produção independente, os conteúdos franceses e europeus e de respeitar rigorosamente os direitos humanos. “Sancionamos um canal que transmitia um reality show que atentava contra a dignidade humana. Colocaram no ar uma mulher que tinha que andar de coleira no chão, como se fosse uma cachorra”, exemplificou. “Estamos estudando medidas para decidir como agir em casos de veiculação deste mesmo conteúdo na internet. Na TV, por exemplo, temos classificação indicativa para os programas, para proteger as crianças. Mas muitos programas podem ser vistos, exatamente da mesma forma, depois na internet, sem nenhuma indicação. Por que num caso as crianças são protegidas e em outro, não?”, questionou Emmanuel Gabla.
Como o CSA também é responsável pela atribuição de freqüências, ele considera o conteúdo veiculado no momento de autorizar ou renovar outorgas – uma das principais reivindicações que organizações da sociedade civil brasileira buscam incluir nos procedimentos nacionais para as concessões de rádio e TV. “Quando abrimos concessões para novos canais na TV digital, o critério era o tipo de conteúdo que veiculariam, buscando ampliar o pluralismo”, relatou.
Tradição britânica
No Reino Unido, o tradicional OfCom regula o conteúdo com base no que prevê o Código de Radiodifusão e dispõe de mecanismos como limites à publicidade, cota de gênero, de produção independente, de acessibilidade, proteção da privacidade e contra conteúdo ofensivo, imparcialidade e precisão jornalística. O nível de regulação depende do tipo de plataforma utilizada e de quanto o próprio cidadão pode se responsabilizar pelo que está assistindo. Desta forma, a TV aberta, por exemplo, tem mais obrigações do que a TV por assinatura ou o Video Sob Demanda, já bastante difundido na Europa. Entre as prioridades do OfCom para o biênio 2010/2011 está justamente a atualização da regulação de conteúdo para atender às demandas do público.
“Se recebemos uma reclamação de um cidadão, tratamos com seriedade esta crítica, analisamos se a expectativa do usuário foi desrespeitada. Vamos estudar o caso específico e analisar se é o caso de impor sansões. Temos grupos que se reúnem com a audiência e analisam os conteúdos. Promovemos uma visão crítica da mídia por parte da população”, explicou Vincent Edward Affleck, Diretor Internacional da Ofcom.
“Estamos falando de concessões públicas, e a posição especial dos radiodifusores justifica isso. Nem sempre agradamos a toda a mídia, mas as regras que estabelecemos – centradas em como os meios devem respeitar os direitos fundamentais, sempre garantindo a liberdade de expressão – já são aceitas como algo necessário para a democracia”, analisou Affleck.
O que ficou claro no seminário promovido pela Secretaria de Comunicação da Presidência da República é que a regulação de conteúdo não é nenhum bicho de sete cabeças, nenhuma ameaça à liberdade de expressão e algo muito distante da censura.
“É algo que todos fazem. O que se tem são obrigações de conteúdo, que estão nos contratos e devem ser cumpridas, e que se referem a questões gerais. Nada que diga o que pode e o que não pode se feito”, avaliou o ministro Franklin Martins. “Neste sentido, o seminário qualificou o debate público sobre este tema. Recolheu experiências que, sem copiar ninguém, vão nos ajudar a formular um novo marco regulatório para o Brasil”, concluiu. Oxalá o Brasil também avance neste sentido, para fazer valer a sua Constituição Federal, respeitando os direitos humanos e dando voz a toda a sua diversidade.
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A história já está ficando repetitiva. Todas as vezes em que se fala de medidas para regular a veiculação de conteúdo audiovisual a reação de uma parcela da grande mídia é a mesma: o governo quer censurar a imprensa e a liberdade de expressão. O que ficou claro, no entanto, a partir de uma série de experiências reguladoras apresentadas no seminário “Comunicações eletrônicas e convergência de mídias”, encerrado nesta quarta (10) em Brasília, foi justamente o contrário. Especialistas da França, Inglaterra, Portugal, Espanha, Estados Unidos e Argentina e também de organismos como a Unesco e a União Européia reafirmaram a importância de regras para a exibição de conteúdos no rádio e na TV para a garantia da pluralidade e o respeito aos direitos humanos, pilares de sociedades democráticas.
Não se trata, portanto, de censura, porque não há em vigor nesses países a idéia de aprovação prévia para veiculação de um determinado conteúdo. O que existe – sobretudo para os concessionários de rádio e TV, ou seja, o conteúdo jornalístico da mídia impressa e a internet não respondem a essas regulamentações – são regras para a promoção da pluralidade, diversidade, cultura nacional e regional, e imparcialidade jornalística; para a proteção das crianças e adolescentes, e da privacidade; para o combate ao chamado “discurso do ódio” e à injúria e difamação; e para a garantia do direito de resposta dos ouvintes e telespectadores.
Coincidentemente, a grande maioria desses mecanismos está prevista na Constituição brasileira, mas até hoje não se tornou regras de fato aplicáveis justamente porque o setor da radiodifusão, com o apoio da mídia impressa, bloqueia o debate público sobre a questão, formando uma opinião pública contrária a essa visão na sociedade em geral e também em uma parte do Parlamento.
Como todas as experiências fizeram questão de destacar, o princípio por trás dessas regras é justamente o da liberdade de expressão, que não é considerada um valor absolutista – e, portanto, tem limites – simplesmente porque não pode ser permitida apenas para alguns, tampouco para violar demais direitos.
“A liberdade da expressão não pode ser usada para abusar da liberdade de outras pessoas. Incitar a violência contra outras pessoas, por exemplo, é algo que não pode existir nos meios de comunicação”, explicou Wijayananda Jayaweera, Diretor da Divisão de Desenvolvimento da Comunicação da Unesco. “O sistema regulatório existe para servir ao interesse público, e não necessariamente ao interesse dos radiodifusores. Deve garantir a pluralidade e promover a diversidade de idéias, de opiniões, de vozes numa sociedade”, acrescentou.
“Nas democracias, há mais obrigações de conteúdo para a radiodifusão porque são empresas que estão usando um espaço público e porque o que veiculam tem um impacto muito grande. Por isso, questões como imparcialidade jornalística, discurso de ódio, proteção de crianças no rádio e na TV precisam estar previstas em leis que vão além da legislação geral”, afirmou o canadense Toby Mendel, consultor da Unesco.
Diretiva européia
Foi para atender a esses princípios que a União Européia discute uma regulamentação comum para os países desde o final dos anos 80. Entre 2005 e 2007, por conta do cenário da convergência tecnológica, desenvolveu-se a construção de uma diretiva que definiu regras para todos os 27 países. A legislação foi colocada em consulta pública, recebeu centenas de contribuições e foi debatida em conferências regionais, até ser submetida e aprovada pelo Parlamento Europeu.
“Nosso objetivo era promover a diversidade cultural européia, garantir a circulação de conteúdo plural e estimular a competitividade da indústria audiovisual”, explicou Harald Trettenbein, diretor adjunto de Políticas de Audiovisual e Mídias da Comissão Européia. A indústria européia produz três vezes mais conteúdo que a americana, mas havia barreiras de idiomas que dificultavam essa difusão. Por isso, uma das regras cumpridas pelas emissoras de rádio e TV de todos os países hoje é a obrigação de veicular produção independente e conteúdo europeu.
A diretiva também define para todos limitações na veiculação de publicidade. O tempo máximo de publicidade permitido é de 20% da grade – no Brasil, apesar de não respeitada, a lei prevê 25% - e há regras específicas para a veiculação de anúncios de tabaco, medicamentos, álcool e comida gordurosa. Anúncios e conteúdos considerados violadores de direitos humanos podem ser sancionados. A proteção aos direitos das crianças é levada a sério e há a previsão para mecanismos de acessibilidade para pessoas com deficiência, como a audiodescrição.
Respondendo a essa diretiva, Portugal fez uma recente atualização da lei de audiovisual nacional. Hoje o país possui uma vasta regulamentação para a veiculação de conteúdo na radiodifusão, que inclui a definição de horários de difusão para proteção de crianças; cotas para veiculação de músicas portuguesas no rádio; direito de resposta; proteção de grupos minoritários, para evitar manifestações de preconceito regional, de gênero e étnico-racial; e para a promoção do pluralismo e da diversidade.
“O órgão regulador do audiovisual em Portugal faz uma apreciação permanente dos conteúdos. Prezamos pelo rigor, pelo contraditório, pelo cumprimento das obrigações legais. Para garantir a diversidade, fazemos o monitoramento de programas e publicamos um relatório anual sobre como as temáticas são tratadas”, explicou José Alberto Azeredo Lopes, presidente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social de Portugal (ERC) e professor de Direito Internacional. “A abordagem de mercado olha a população como consumidores. A abordagem para o regulador de conteúdos é uma abordagem de cidadania”, acrescentou.
A ERC é um organismo público criado por lei, de natureza administrativa, independente, não estatal. Além do monitoramento de conteúdo, é responsável pela concessão e renovação dos canais de TV aberta e da gestão de mecanismos como o direito de antena, garantido a partidos políticos, associações sindicais e patronais nas emissoras públicas. Suas ações estão sujeitas à fiscalização do Poder Judiciário. Em dois anos, 95% das decisões da ERC que foram questionadas na Justiça foram confirmadas pela corte suprema de Portugal.
Pluralismo político
Outro exemplo significativo de regulação de conteúdo vem do órgão francês, o Conselho Superior de Audiovisual. Uma das ações recorrentes do órgão é zelar pelo pluralismo político no rádio e na TV. Para isso, monitoram mês a mês o tempo de exposição dos dois grandes blocos partidários – situação e oposição – para que tenham um tempo de discurso equilibrado.
“O tempo de exibição da oposição deve ser pelo menos o da metade do governo. Isso é zelar pelo pluralismo, pela neutralidade da informação. E, nos períodos eleitorais, o tempo para cada candidato deve ser exatamente o mesmo”, contou Emmanuel Gabla, diretor adjunto do CSA. “A pluralidade na emissão é o que garante a riqueza e a prevalência do interesse público na nossa televisão”, “é uma escolha social promover a diversidade cultural para que não exista o monopólio da indústria cultural e a uniformização”.
Na França, os canais têm ainda a obrigação de estimular a produção independente, os conteúdos franceses e europeus e de respeitar rigorosamente os direitos humanos. “Sancionamos um canal que transmitia um reality show que atentava contra a dignidade humana. Colocaram no ar uma mulher que tinha que andar de coleira no chão, como se fosse uma cachorra”, exemplificou. “Estamos estudando medidas para decidir como agir em casos de veiculação deste mesmo conteúdo na internet. Na TV, por exemplo, temos classificação indicativa para os programas, para proteger as crianças. Mas muitos programas podem ser vistos, exatamente da mesma forma, depois na internet, sem nenhuma indicação. Por que num caso as crianças são protegidas e em outro, não?”, questionou Emmanuel Gabla.
Como o CSA também é responsável pela atribuição de freqüências, ele considera o conteúdo veiculado no momento de autorizar ou renovar outorgas – uma das principais reivindicações que organizações da sociedade civil brasileira buscam incluir nos procedimentos nacionais para as concessões de rádio e TV. “Quando abrimos concessões para novos canais na TV digital, o critério era o tipo de conteúdo que veiculariam, buscando ampliar o pluralismo”, relatou.
Tradição britânica
No Reino Unido, o tradicional OfCom regula o conteúdo com base no que prevê o Código de Radiodifusão e dispõe de mecanismos como limites à publicidade, cota de gênero, de produção independente, de acessibilidade, proteção da privacidade e contra conteúdo ofensivo, imparcialidade e precisão jornalística. O nível de regulação depende do tipo de plataforma utilizada e de quanto o próprio cidadão pode se responsabilizar pelo que está assistindo. Desta forma, a TV aberta, por exemplo, tem mais obrigações do que a TV por assinatura ou o Video Sob Demanda, já bastante difundido na Europa. Entre as prioridades do OfCom para o biênio 2010/2011 está justamente a atualização da regulação de conteúdo para atender às demandas do público.
“Se recebemos uma reclamação de um cidadão, tratamos com seriedade esta crítica, analisamos se a expectativa do usuário foi desrespeitada. Vamos estudar o caso específico e analisar se é o caso de impor sansões. Temos grupos que se reúnem com a audiência e analisam os conteúdos. Promovemos uma visão crítica da mídia por parte da população”, explicou Vincent Edward Affleck, Diretor Internacional da Ofcom.
“Estamos falando de concessões públicas, e a posição especial dos radiodifusores justifica isso. Nem sempre agradamos a toda a mídia, mas as regras que estabelecemos – centradas em como os meios devem respeitar os direitos fundamentais, sempre garantindo a liberdade de expressão – já são aceitas como algo necessário para a democracia”, analisou Affleck.
O que ficou claro no seminário promovido pela Secretaria de Comunicação da Presidência da República é que a regulação de conteúdo não é nenhum bicho de sete cabeças, nenhuma ameaça à liberdade de expressão e algo muito distante da censura.
“É algo que todos fazem. O que se tem são obrigações de conteúdo, que estão nos contratos e devem ser cumpridas, e que se referem a questões gerais. Nada que diga o que pode e o que não pode se feito”, avaliou o ministro Franklin Martins. “Neste sentido, o seminário qualificou o debate público sobre este tema. Recolheu experiências que, sem copiar ninguém, vão nos ajudar a formular um novo marco regulatório para o Brasil”, concluiu. Oxalá o Brasil também avance neste sentido, para fazer valer a sua Constituição Federal, respeitando os direitos humanos e dando voz a toda a sua diversidade.
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Liberdade de expressão para quem?
Reproduzo artigo de Elaine Tavares, publicado no sítio da Adital:
O velho Marx já ensinou a muitos anos sobre o que é a ideologia. É o encobrimento da verdade. Assim, tudo aquilo que esconde, vela, obscurece, tapa, encobre, engana, é ideologia. É dentro deste espectro que podemos colocar o debate que se faz hoje no Brasil, na Venezuela, no Equador e na Bolívia sobre o binômio "liberdade de expressão X censura". Para discutir esse tema é preciso, antes de tudo, observar de onde partem os gritos de "censura, censura", porque na sociedade capitalista toda e qualquer questão precisa ser analisada sob o aspecto de classe. A tal da "democracia", tão bendita por toda a gente, precisa ela mesma de um adjetivo, como bem já ensinou Lênin. "Democracia para quem? Para que classe?".
Na Venezuela a questão da liberdade de expressão entrou com mais força no imaginário das gentes quando o governo decidiu cassar a outorga de uma emissora de televisão, a RCTV, por esta se negar terminantemente a cumprir a lei, discutida e votada democraticamente pela população e pela Assembléia Nacional. "Censura, cerceamento da liberdade de expressão" foram os conceitos usados pelos donos da emissora para "denunciar" a ação governamental. Os empresários eram entrevistados pela CNN e suas emissoras amigas, de toda América Latina, iam reproduzindo a fala dos poderosos donos da RCTV. Transformados em vítimas da censura, eles foram inclusive convidados para palestras e outros ‘quetais’ aqui nas terras tupiniquins.
Lá na Venezuela os organismos de classe dos jornalistas, totalmente submetidos à razão empresarial, também gritavam "censura, censura" e faziam coro com as entidades de donos de empresas de comunicação internacionais sobre o "absurdo" de haver um governo que fazia cumprir a lei. Claro que pouquíssimos jornais e jornalistas conseguiram passar a informação correta sobre o caso, explicando a lei, e mostrando que os que se faziam de vítima, na verdade eram os que burlavam as regras e não respeitavam a vontade popular e política. Ou seja, os arautos da "democracia liberal" não queriam respeitar as instituições da sua democracia. O que significa que quando a democracia que eles desenham se volta contra eles, já não é mais democracia. Aí é ditadura e cerceamento da liberdade de expressão.
No Brasil, a questão da censura voltou à baila agora com o debate sobre os Conselhos de Comunicação. Mesma coisa. A "democracia liberal" consente que existam conselhos de saúde, de educação, de segurança, etc... Mas, de comunicação não pode. Por quê? Porque cerceia a liberdade de expressão. Cabe perguntar. De quem?
Os grandes meios de comunicação comercial no Brasil praticam a censura, todos os dias, sistematicamente. Eles escondem os fatos relacionados a movimentos sociais, lutas populares, povos indígenas, enfim, as maiorias exploradas. Estas só aparecem nas páginas dos jornais ou na TV na seção de polícia ou quando são vítimas de alguma tragédia. No demais são esquecidas, escondidas, impedidas de dizerem a sua palavra criadora. E quando a sociedade organizada quer discutir sobre o que sai na TV, que é uma concessão pública, aí essa atitude "absurda" vira um grande risco de censura e de acabar com a liberdade de expressão. Bueno, ao povo que não consegue se informar pelos meios, porque estes censuram as visões diferentes das suas, basta observar quem está falando, quem é contra os conselhos. De que classe eles são. Do grupo dos dominantes, ou dos dominados?
Agora, na Bolívia, ocorre a mesma coisa com relação à recém aprovada lei anti-racista. Basta uma olhada rápida nos grandes jornais de La Paz e lá está a elite branca a gritar: "censura, censura". A Sociedade Interamericana de Imprensa, que representa os empresários, fala em cerceamento da liberdade de expressão. Os grêmios de jornalistas, também alinhados com os patrões falam a mesma coisa, assim como as entidades que representam o poder branco, colonial e racista. Estes mesmos atores sociais que ao longo de 500 anos censuraram a voz e a realidade indígena e negra nos seus veículos de comunicação, agora vem falar de censura. E clamam contra suas próprias instituições.
A lei anti-racista prevê que os meios de comunicação que incentivarem pensamentos e ações racistas poderão ser multados ou fechados. Onde está o "absurdo" aí? Qual é o cerceamento da liberdade de expressão se a própria idéia de liberdade, tão cara aos liberais, se remete à máxima: "a minha liberdade vai até onde começa a do outro"? Então, como podem achar que é cerceamento da liberdade de expressão usar do famoso "contrato social" que garante respeito às diferenças?
Ora, toda essa gritaria dos grandes empresários da comunicação e seus capachos nada mais é do que o profundo medo que todos têm da opinião pública esclarecida. Eles querem o direito de continuar a vomitar ideologia nos seus veículos, escondendo a voz das maiorias, obscurecendo a realidade, tapando a verdade. Eles querem ter o exclusivo direito de decidir quem aparece na televisão e qual o discurso é válido. Eles querem manter intacto seu poder escravista, racista e colonial que continua se expressando como se não tivessem passado 500 anos e a democracia avançado nas suas adjetivações. Hoje, na América Latina, já não há apenas a democracia liberal, há a democracia participativa, protagônica, o nacionalismo popular. As coisas estão mudando e as elites necrosadas se recusam a ver.
O racismo é construção de quem domina
Discursos como esses, das elites latino-americanas e seus capachos, podem muito bem ser explicados pela história. Os componentes de racismo, discriminação e medo da opinião pública esclarecida têm suas raízes na dominação de classe. Para pensar essa nossa América Latina um bom trabalho é o do escritor Eric Williams, nascido e criado na ilha caribenha de Trinidad Tobago, epicentro da escravidão desde a invasão destas terras orientais pelos europeus. No seu livro Capitalismo e Escravidão, ele mostra claramente que o processo de escravidão não esteve restrito apenas ao negro. Tão logo os europeus chegaram ao que chamaram de Índias Orientais, os primeiros braços que trataram de escravizar foram os dos índios.
Os europeus buscavam as Índias e encontraram uma terra nova. Não entendiam a língua, não queriam saber de colonização. Tudo o que buscavam era o ouro. Foi fácil então usar da legitimação filosófica do velho conceito grego que ensinava ser apenas "o igual", "o mesmo", aquele que devia ser respeitado. Se a gente originária não era igual à européia, logo, não tinha alma, era uma coisa, e podia ser usada como mão de obra escrava para encontrar as riquezas com as quais sonhavam. Simples assim.
Essa foi a ideologia que comandou a invasão e seguiu se sustentando ao longo destes 500 anos. Por isso é tão difícil ao branco boliviano aceitar que os povos originários possam ter direitos. Daí essa perplexidade diante do fato de que, agora, por conta de uma lei, eles não poderão mais expressar sua ideologia racista, que nada mais fez e ainda faz, que sustentar um sistema de produção baseado na exploração daquele que não é igual.
Eric Williams vai contar ainda como a Inglaterra construiu sua riqueza a partir do tráfico de gente branca e negra, para as novas terras, a serem usadas como braço forte na produção do açúcar, do tabaco, do algodão e do café. Como o índio não se prestou ao jogo da escravidão, lutando, fugindo, morrendo por conta das doenças e até se matando, o sistema capitalista emergente precisava inventar uma saída para a exploração da vastidão que havia encontrado. A escravidão foi uma instituição econômica criada para produzir a riqueza da Inglaterra e, de quebra, dos demais países coloniais. Só ela seria capaz de dar conta da produção em grande escala, em grandes extensões de terra. Não estava em questão se o negro era inferior ou superior. Eram braços, e não eram iguais, logo, passíveis de dominação. Eles foram roubados da África para trabalhar a terra roubada dos originários de Abya Yala.
Também os brancos pobres dos países europeus vieram para as Américas como servos sob contrato, o que era, na prática, escravidão. Segundo Williams, de 1654 a 1685, mais de 10 mil pessoas nestas condições partiram somente da cidade de Bristol, na Inglaterra, para servir a algum senhor no Caribe. Conta ainda que na civilizada terra dos lordes também eram comuns os raptos de mulheres, crianças e jovens, depois vendidos como servos. Uma fonte segura de dinheiro. De qualquer forma, estas ações não davam conta do trabalho gigantesco que estava por ser feito no novo mundo, e é aí que entra a África. Para os negociantes de gente, a África era terra sem lei e lá haveria de ter milhões de braços para serem roubados sem que alguém se importasse. E assim foi. Milhões vieram para a América Latina e foram esses, juntamente com os índios e os brancos pobres, que ergueram o modo de produção capitalista, garantiram a acumulação do capital e produziram a riqueza dos que hoje são chamados de "países ricos".
E justamente porque essa gente foi a responsável pela acumulação de riqueza de alguns que era preciso consolidar uma ideologia de discriminação, para que se mantivesse sob controle a dominação. Daí o discurso - sistematicamente repetido na escola, na família, nos meios de comunicação - de que o índio é preguiçoso, o negro é inferior e o pobre é incapaz. Assim, se isso começa a mudar, a elite opressora sabe que o seu mundo pode ruir.
Liberdade de expressão
É por conta da necessidade de manter forte a ideologia que garante a dominação que as elites latino-americanas tremem de medo quando a "liberdade de expressão" se volta contra elas. Esse conceito liberal só tem valor se for exercido pelos que mandam e aí voltamos àquilo que já escrevi lá em cima. Quando aqueles que os dominadores consideram "não-seres" - os pobres, os negros, os índios - começam a se unir e a construir outro conceito de direito, de modo de organizar a vida, de comunicação, então se pode ouvir os gritos de "censura, censura, censura" e a ladainha do risco de se extinguir a liberdade de expressão.
O que precisa ficar bem claro a todas as gentes é de que está em andamento na América Latina uma transformação. Por aqui, os povos originários, os movimentos populares organizados, estão constituindo outras formas de viver, para além dos velhos conceitos europeus que dominaram as mentes até então. Depois de 500 anos amordaçados pela "censura" dos dominadores, os oprimidos começam a conhecer sua própria história, descobrir seus heróis, destapar sua caminhada de valentia e resistência. Nomes como Tupac Amaru, Juana Azurduy, Zumbi dos Palmares, Guaicapuru, Bartolina Sisa, Tupac Catari, Sepé Tiaraju, Dandara, Artigas, Chica Pelega, assomam, ocupam seu espaço no imaginário popular e provocam a mudança necessária.
Conceitos como Sumak kawsay, dos Quíchua equatorianos, ou o Teko Porã, dos Guarani, traduzem um jeito de viver que é bem diferente do modo de produção capitalista baseado na exploração, na competição, no individualismo. O chamado "bem viver" pressupõe uma relação verdadeiramente harmônica e equilibrada com a natureza, está sustentado na cooperação e na proposta coletiva de organização da vida. Estes são conceitos poderosos e "perigosos". Por isso, os meios de comunicação não podem ficar à mercê dos desejos populares.
Essas idéias "perigosas" poderiam começar a aparecer num espaço onde elas estão terminantemente proibidas. É esse modo de pensar que tem sido sistematicamente censurado pelos meios de comunicação. Porque as elites sabem que destruída e ideologia da discriminação contra o diferente e esclarecida a opinião pública, o mundo que construíram pode começar a ruir. A verdadeira liberdade de expressão é coisa que precisa ficar bem escondida, por isso são tão altos os gritos que dizem que ela pode se acabar se as gentes começarem a "meter o bedelho" neste negócio que prospera há 500 anos.
Basta de bobagens
É neste contexto histórico, econômico e político que deveriam ser analisados os fatos que ocorrem hoje na Venezuela, no Equador, na Bolívia e na Argentina. O Brasil deveria, não copiar o que lá as gentes construíram na sua caminhada histórica, mas compreender e perceber que é possível estabelecer aqui também um processo de mudança. Neste mês de novembro o Ministério das Comunicações chamou um seminário para discutir uma possível lei de regulamentação da mídia brasileira.
Não foi sem razão que os convidados eram de Portugal, Espanha e Estados Unidos. Exemplos de um mundo distante, envelhecido, necrosado, representantes de um capitalismo moribundo. As revolucionárias, criativas e inovadoras contribuições dos países vizinhos não foram mencionadas. A Venezuela tem uma das leis mais interessantes de regulamentação da rádio e TV, a Argentina deu um passo adiante com a contribuição do movimento popular, a Bolívia avança contra o racismo, o Equador inova na sua Constituição, e por aqui tudo é silêncio. Censura?
Os governantes insistem em buscar luz onde reina a obscuridade. E, ainda assim pode-se ouvir o grito dos empresários a dizer: censura, censura, censura. O atraso brasileiro é tão grande que mesmo as liberais regulamentações européias são avançadas demais. Enquanto isso Abya Yala caminha, rasgando os véus...
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O velho Marx já ensinou a muitos anos sobre o que é a ideologia. É o encobrimento da verdade. Assim, tudo aquilo que esconde, vela, obscurece, tapa, encobre, engana, é ideologia. É dentro deste espectro que podemos colocar o debate que se faz hoje no Brasil, na Venezuela, no Equador e na Bolívia sobre o binômio "liberdade de expressão X censura". Para discutir esse tema é preciso, antes de tudo, observar de onde partem os gritos de "censura, censura", porque na sociedade capitalista toda e qualquer questão precisa ser analisada sob o aspecto de classe. A tal da "democracia", tão bendita por toda a gente, precisa ela mesma de um adjetivo, como bem já ensinou Lênin. "Democracia para quem? Para que classe?".
Na Venezuela a questão da liberdade de expressão entrou com mais força no imaginário das gentes quando o governo decidiu cassar a outorga de uma emissora de televisão, a RCTV, por esta se negar terminantemente a cumprir a lei, discutida e votada democraticamente pela população e pela Assembléia Nacional. "Censura, cerceamento da liberdade de expressão" foram os conceitos usados pelos donos da emissora para "denunciar" a ação governamental. Os empresários eram entrevistados pela CNN e suas emissoras amigas, de toda América Latina, iam reproduzindo a fala dos poderosos donos da RCTV. Transformados em vítimas da censura, eles foram inclusive convidados para palestras e outros ‘quetais’ aqui nas terras tupiniquins.
Lá na Venezuela os organismos de classe dos jornalistas, totalmente submetidos à razão empresarial, também gritavam "censura, censura" e faziam coro com as entidades de donos de empresas de comunicação internacionais sobre o "absurdo" de haver um governo que fazia cumprir a lei. Claro que pouquíssimos jornais e jornalistas conseguiram passar a informação correta sobre o caso, explicando a lei, e mostrando que os que se faziam de vítima, na verdade eram os que burlavam as regras e não respeitavam a vontade popular e política. Ou seja, os arautos da "democracia liberal" não queriam respeitar as instituições da sua democracia. O que significa que quando a democracia que eles desenham se volta contra eles, já não é mais democracia. Aí é ditadura e cerceamento da liberdade de expressão.
No Brasil, a questão da censura voltou à baila agora com o debate sobre os Conselhos de Comunicação. Mesma coisa. A "democracia liberal" consente que existam conselhos de saúde, de educação, de segurança, etc... Mas, de comunicação não pode. Por quê? Porque cerceia a liberdade de expressão. Cabe perguntar. De quem?
Os grandes meios de comunicação comercial no Brasil praticam a censura, todos os dias, sistematicamente. Eles escondem os fatos relacionados a movimentos sociais, lutas populares, povos indígenas, enfim, as maiorias exploradas. Estas só aparecem nas páginas dos jornais ou na TV na seção de polícia ou quando são vítimas de alguma tragédia. No demais são esquecidas, escondidas, impedidas de dizerem a sua palavra criadora. E quando a sociedade organizada quer discutir sobre o que sai na TV, que é uma concessão pública, aí essa atitude "absurda" vira um grande risco de censura e de acabar com a liberdade de expressão. Bueno, ao povo que não consegue se informar pelos meios, porque estes censuram as visões diferentes das suas, basta observar quem está falando, quem é contra os conselhos. De que classe eles são. Do grupo dos dominantes, ou dos dominados?
Agora, na Bolívia, ocorre a mesma coisa com relação à recém aprovada lei anti-racista. Basta uma olhada rápida nos grandes jornais de La Paz e lá está a elite branca a gritar: "censura, censura". A Sociedade Interamericana de Imprensa, que representa os empresários, fala em cerceamento da liberdade de expressão. Os grêmios de jornalistas, também alinhados com os patrões falam a mesma coisa, assim como as entidades que representam o poder branco, colonial e racista. Estes mesmos atores sociais que ao longo de 500 anos censuraram a voz e a realidade indígena e negra nos seus veículos de comunicação, agora vem falar de censura. E clamam contra suas próprias instituições.
A lei anti-racista prevê que os meios de comunicação que incentivarem pensamentos e ações racistas poderão ser multados ou fechados. Onde está o "absurdo" aí? Qual é o cerceamento da liberdade de expressão se a própria idéia de liberdade, tão cara aos liberais, se remete à máxima: "a minha liberdade vai até onde começa a do outro"? Então, como podem achar que é cerceamento da liberdade de expressão usar do famoso "contrato social" que garante respeito às diferenças?
Ora, toda essa gritaria dos grandes empresários da comunicação e seus capachos nada mais é do que o profundo medo que todos têm da opinião pública esclarecida. Eles querem o direito de continuar a vomitar ideologia nos seus veículos, escondendo a voz das maiorias, obscurecendo a realidade, tapando a verdade. Eles querem ter o exclusivo direito de decidir quem aparece na televisão e qual o discurso é válido. Eles querem manter intacto seu poder escravista, racista e colonial que continua se expressando como se não tivessem passado 500 anos e a democracia avançado nas suas adjetivações. Hoje, na América Latina, já não há apenas a democracia liberal, há a democracia participativa, protagônica, o nacionalismo popular. As coisas estão mudando e as elites necrosadas se recusam a ver.
O racismo é construção de quem domina
Discursos como esses, das elites latino-americanas e seus capachos, podem muito bem ser explicados pela história. Os componentes de racismo, discriminação e medo da opinião pública esclarecida têm suas raízes na dominação de classe. Para pensar essa nossa América Latina um bom trabalho é o do escritor Eric Williams, nascido e criado na ilha caribenha de Trinidad Tobago, epicentro da escravidão desde a invasão destas terras orientais pelos europeus. No seu livro Capitalismo e Escravidão, ele mostra claramente que o processo de escravidão não esteve restrito apenas ao negro. Tão logo os europeus chegaram ao que chamaram de Índias Orientais, os primeiros braços que trataram de escravizar foram os dos índios.
Os europeus buscavam as Índias e encontraram uma terra nova. Não entendiam a língua, não queriam saber de colonização. Tudo o que buscavam era o ouro. Foi fácil então usar da legitimação filosófica do velho conceito grego que ensinava ser apenas "o igual", "o mesmo", aquele que devia ser respeitado. Se a gente originária não era igual à européia, logo, não tinha alma, era uma coisa, e podia ser usada como mão de obra escrava para encontrar as riquezas com as quais sonhavam. Simples assim.
Essa foi a ideologia que comandou a invasão e seguiu se sustentando ao longo destes 500 anos. Por isso é tão difícil ao branco boliviano aceitar que os povos originários possam ter direitos. Daí essa perplexidade diante do fato de que, agora, por conta de uma lei, eles não poderão mais expressar sua ideologia racista, que nada mais fez e ainda faz, que sustentar um sistema de produção baseado na exploração daquele que não é igual.
Eric Williams vai contar ainda como a Inglaterra construiu sua riqueza a partir do tráfico de gente branca e negra, para as novas terras, a serem usadas como braço forte na produção do açúcar, do tabaco, do algodão e do café. Como o índio não se prestou ao jogo da escravidão, lutando, fugindo, morrendo por conta das doenças e até se matando, o sistema capitalista emergente precisava inventar uma saída para a exploração da vastidão que havia encontrado. A escravidão foi uma instituição econômica criada para produzir a riqueza da Inglaterra e, de quebra, dos demais países coloniais. Só ela seria capaz de dar conta da produção em grande escala, em grandes extensões de terra. Não estava em questão se o negro era inferior ou superior. Eram braços, e não eram iguais, logo, passíveis de dominação. Eles foram roubados da África para trabalhar a terra roubada dos originários de Abya Yala.
Também os brancos pobres dos países europeus vieram para as Américas como servos sob contrato, o que era, na prática, escravidão. Segundo Williams, de 1654 a 1685, mais de 10 mil pessoas nestas condições partiram somente da cidade de Bristol, na Inglaterra, para servir a algum senhor no Caribe. Conta ainda que na civilizada terra dos lordes também eram comuns os raptos de mulheres, crianças e jovens, depois vendidos como servos. Uma fonte segura de dinheiro. De qualquer forma, estas ações não davam conta do trabalho gigantesco que estava por ser feito no novo mundo, e é aí que entra a África. Para os negociantes de gente, a África era terra sem lei e lá haveria de ter milhões de braços para serem roubados sem que alguém se importasse. E assim foi. Milhões vieram para a América Latina e foram esses, juntamente com os índios e os brancos pobres, que ergueram o modo de produção capitalista, garantiram a acumulação do capital e produziram a riqueza dos que hoje são chamados de "países ricos".
E justamente porque essa gente foi a responsável pela acumulação de riqueza de alguns que era preciso consolidar uma ideologia de discriminação, para que se mantivesse sob controle a dominação. Daí o discurso - sistematicamente repetido na escola, na família, nos meios de comunicação - de que o índio é preguiçoso, o negro é inferior e o pobre é incapaz. Assim, se isso começa a mudar, a elite opressora sabe que o seu mundo pode ruir.
Liberdade de expressão
É por conta da necessidade de manter forte a ideologia que garante a dominação que as elites latino-americanas tremem de medo quando a "liberdade de expressão" se volta contra elas. Esse conceito liberal só tem valor se for exercido pelos que mandam e aí voltamos àquilo que já escrevi lá em cima. Quando aqueles que os dominadores consideram "não-seres" - os pobres, os negros, os índios - começam a se unir e a construir outro conceito de direito, de modo de organizar a vida, de comunicação, então se pode ouvir os gritos de "censura, censura, censura" e a ladainha do risco de se extinguir a liberdade de expressão.
O que precisa ficar bem claro a todas as gentes é de que está em andamento na América Latina uma transformação. Por aqui, os povos originários, os movimentos populares organizados, estão constituindo outras formas de viver, para além dos velhos conceitos europeus que dominaram as mentes até então. Depois de 500 anos amordaçados pela "censura" dos dominadores, os oprimidos começam a conhecer sua própria história, descobrir seus heróis, destapar sua caminhada de valentia e resistência. Nomes como Tupac Amaru, Juana Azurduy, Zumbi dos Palmares, Guaicapuru, Bartolina Sisa, Tupac Catari, Sepé Tiaraju, Dandara, Artigas, Chica Pelega, assomam, ocupam seu espaço no imaginário popular e provocam a mudança necessária.
Conceitos como Sumak kawsay, dos Quíchua equatorianos, ou o Teko Porã, dos Guarani, traduzem um jeito de viver que é bem diferente do modo de produção capitalista baseado na exploração, na competição, no individualismo. O chamado "bem viver" pressupõe uma relação verdadeiramente harmônica e equilibrada com a natureza, está sustentado na cooperação e na proposta coletiva de organização da vida. Estes são conceitos poderosos e "perigosos". Por isso, os meios de comunicação não podem ficar à mercê dos desejos populares.
Essas idéias "perigosas" poderiam começar a aparecer num espaço onde elas estão terminantemente proibidas. É esse modo de pensar que tem sido sistematicamente censurado pelos meios de comunicação. Porque as elites sabem que destruída e ideologia da discriminação contra o diferente e esclarecida a opinião pública, o mundo que construíram pode começar a ruir. A verdadeira liberdade de expressão é coisa que precisa ficar bem escondida, por isso são tão altos os gritos que dizem que ela pode se acabar se as gentes começarem a "meter o bedelho" neste negócio que prospera há 500 anos.
Basta de bobagens
É neste contexto histórico, econômico e político que deveriam ser analisados os fatos que ocorrem hoje na Venezuela, no Equador, na Bolívia e na Argentina. O Brasil deveria, não copiar o que lá as gentes construíram na sua caminhada histórica, mas compreender e perceber que é possível estabelecer aqui também um processo de mudança. Neste mês de novembro o Ministério das Comunicações chamou um seminário para discutir uma possível lei de regulamentação da mídia brasileira.
Não foi sem razão que os convidados eram de Portugal, Espanha e Estados Unidos. Exemplos de um mundo distante, envelhecido, necrosado, representantes de um capitalismo moribundo. As revolucionárias, criativas e inovadoras contribuições dos países vizinhos não foram mencionadas. A Venezuela tem uma das leis mais interessantes de regulamentação da rádio e TV, a Argentina deu um passo adiante com a contribuição do movimento popular, a Bolívia avança contra o racismo, o Equador inova na sua Constituição, e por aqui tudo é silêncio. Censura?
Os governantes insistem em buscar luz onde reina a obscuridade. E, ainda assim pode-se ouvir o grito dos empresários a dizer: censura, censura, censura. O atraso brasileiro é tão grande que mesmo as liberais regulamentações européias são avançadas demais. Enquanto isso Abya Yala caminha, rasgando os véus...
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quinta-feira, 11 de novembro de 2010
Adeus a Serra e a seus tucaninhos
Vídeo postado no blog Coisas da Soninha.
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O governo Dilma e a comunicação
Reproduzo artigo de Claudia Santiago, publicado no sítio do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC):
A revista IstoÉ, edição da semana que passou, prestou um grande serviço aos seus leitores. Dissecou em suas páginas a história de Dilma Rousseff, a primeira mulher a presidir o Brasil, país com altos índices de espancamento e homicídios de mulheres. O PT poderia pedir permissão à revista e, a partir do material já produzido, fazer um jornal de papel com uma grande tiragem e contar para o povo quem é esta mulher.
As pessoas não sabem. Poucos, apenas os muito bem informados, são os que votaram em Dilma porque ela é a Dilma. A grande maioria votou porque o presidente Lula pediu. E essa maioria está insegura, esperando que alguém converse com ela e diga que votou corretamente. É fácil chegar a esta conclusão. Basta conversar com as pessoas que lêem as manchetes de manhã nas bancas de revistas, com as manicures, com os porteiros, com os funcionários de bares e padarias. “Por que você acha que vai dar certo?”, perguntam. Se esperar pelos jornais que fizeram a campanha de José Serra, o PT terá problemas sérios para governar.
Duas questões a serem encaradas pelo governo
Já está mais do que provado que passou da hora de encarar os graves problemas de concentração midiática no país, sabendo que este não é um problema exclusivamente nacional. O governo Dilma precisa aprender com a Argentina, Venezuela, Bolívia e Equador e não ceder na regulamentação da mídia. Não pode ter medo. Como explica o professor Venício Lima no seu livro Liberdade de Imprensa X Liberdade de Expressão, os movimentos que estudam o comportamento da mídia no Brasil e querem mudanças não estão propondo nada fora do marco do liberalismo.
O governo Dilma precisa, então, encarar rapidamente duas questões: a sua relação com a concentração da informação nas mãos das famílias por nós já bem conhecidas, e sua relação com a mídia alternativa e comunitária. Como o governo Dilma vai se comportar com relação às rádios comunitárias, ao jornalismo público e às diversas iniciativas de comunicação no campo popular? São perguntas que precisam ser respondidas. Rapidamente.
Apostar todas as fichas na Internet é um erro
A internet é fantástica, maravilhosa, cumpriu um papel central nesta eleição: para o bem e para o mal, como gosta o ex-candidato José Serra. Mas serve muito pouco para combater valores arcaicos arraigados na nossa sociedade. Pelo contrário, também ajuda a difundi-los, como a xenofobia, por exemplo. É muita informação, tudo muito rápido, muito passageiro. A utilizam bem os que dependem dela para trabalhar e os que não trabalham.
O povo trabalhador se mantém alheio ao que se passa da rede. Pega suas rebarbas. Não interage. E quando chega em casa assiste televisão.Passivamente.
Aqueles que querem uma sociedade baseada em valores solidários não podem abrir mão, pelo menos por um bom tempo, de uma folha de papel distribuída pacientemente de casa em casa, nos locais de trabalho. O jornal Folha Universal é um exemplo que não pode, de maneira nenhuma, ser desprezado. Outra questão que precisa ser encarada definitivamente, sem mais delongas, é o uso do rádio, este velho companheiro que faz a cabeça enquanto se dirige um carro, toma banho, faz comida, bota o papel na impressoras e se exerce tantas outras atividades.
Para muitos, sei, estarei parecendo bem ultrapassada com o que digo. Mas eu não tenho a menor dúvida. Para falar com o povo, precisa de um pedaço de papel, com imagens bonitas, bons títulos, textos gostosos de ler. E, obviamente, uma pauta que lhe diga respeito.
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A revista IstoÉ, edição da semana que passou, prestou um grande serviço aos seus leitores. Dissecou em suas páginas a história de Dilma Rousseff, a primeira mulher a presidir o Brasil, país com altos índices de espancamento e homicídios de mulheres. O PT poderia pedir permissão à revista e, a partir do material já produzido, fazer um jornal de papel com uma grande tiragem e contar para o povo quem é esta mulher.
As pessoas não sabem. Poucos, apenas os muito bem informados, são os que votaram em Dilma porque ela é a Dilma. A grande maioria votou porque o presidente Lula pediu. E essa maioria está insegura, esperando que alguém converse com ela e diga que votou corretamente. É fácil chegar a esta conclusão. Basta conversar com as pessoas que lêem as manchetes de manhã nas bancas de revistas, com as manicures, com os porteiros, com os funcionários de bares e padarias. “Por que você acha que vai dar certo?”, perguntam. Se esperar pelos jornais que fizeram a campanha de José Serra, o PT terá problemas sérios para governar.
Duas questões a serem encaradas pelo governo
Já está mais do que provado que passou da hora de encarar os graves problemas de concentração midiática no país, sabendo que este não é um problema exclusivamente nacional. O governo Dilma precisa aprender com a Argentina, Venezuela, Bolívia e Equador e não ceder na regulamentação da mídia. Não pode ter medo. Como explica o professor Venício Lima no seu livro Liberdade de Imprensa X Liberdade de Expressão, os movimentos que estudam o comportamento da mídia no Brasil e querem mudanças não estão propondo nada fora do marco do liberalismo.
O governo Dilma precisa, então, encarar rapidamente duas questões: a sua relação com a concentração da informação nas mãos das famílias por nós já bem conhecidas, e sua relação com a mídia alternativa e comunitária. Como o governo Dilma vai se comportar com relação às rádios comunitárias, ao jornalismo público e às diversas iniciativas de comunicação no campo popular? São perguntas que precisam ser respondidas. Rapidamente.
Apostar todas as fichas na Internet é um erro
A internet é fantástica, maravilhosa, cumpriu um papel central nesta eleição: para o bem e para o mal, como gosta o ex-candidato José Serra. Mas serve muito pouco para combater valores arcaicos arraigados na nossa sociedade. Pelo contrário, também ajuda a difundi-los, como a xenofobia, por exemplo. É muita informação, tudo muito rápido, muito passageiro. A utilizam bem os que dependem dela para trabalhar e os que não trabalham.
O povo trabalhador se mantém alheio ao que se passa da rede. Pega suas rebarbas. Não interage. E quando chega em casa assiste televisão.Passivamente.
Aqueles que querem uma sociedade baseada em valores solidários não podem abrir mão, pelo menos por um bom tempo, de uma folha de papel distribuída pacientemente de casa em casa, nos locais de trabalho. O jornal Folha Universal é um exemplo que não pode, de maneira nenhuma, ser desprezado. Outra questão que precisa ser encarada definitivamente, sem mais delongas, é o uso do rádio, este velho companheiro que faz a cabeça enquanto se dirige um carro, toma banho, faz comida, bota o papel na impressoras e se exerce tantas outras atividades.
Para muitos, sei, estarei parecendo bem ultrapassada com o que digo. Mas eu não tenho a menor dúvida. Para falar com o povo, precisa de um pedaço de papel, com imagens bonitas, bons títulos, textos gostosos de ler. E, obviamente, uma pauta que lhe diga respeito.
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