segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

O jornalismo cafajeste da Folha

Por Miguel do Rosário, no blog O Cafezinho:

Preciso registrar e comentar uma matéria da Folha sobre a rotina dos presos petistas na Papuda, por razões arqueológicas. Algum dia, alguém estudará a podridão do nosso jornalismo, que atingiu um partidarismo fanático, inescrupuloso e cafajeste.

A matéria é tão visivelmente tendenciosa que surtirá efeito ao contrário ao desejado.

Em primeiro lugar, os repórteres entrevistam “um apenado que obteve liberdade condicional” e deitam verdades sobre o que todos os presos falam.

Em segundo lugar, vê-se um esforço inaudito para procurar qualquer mínima suposta regalia, com vistas a produzir ainda mais hostilidade contra os presos, dentro e fora da prisão. Aí entra a falta de escrúpulos. O que a Folha deseja: criar animosidade contra os réus junto aos outros presos?

Confiram o trecho e me digam se já leram algo mais estúpido na história do jornalismo brasileiro ou mesmo mundial:

A mulher de um deles relatou à Folha que seu marido, que trabalha como eletricista dentro da Papuda, uma vez foi à cela de Dirceu e tentou puxar assunto, mas não foi correspondido.

“Eles acham que a gente é lixo”, disse o preso recém-solto, que afirma só tê-los visto nas poucas vezes que passou em frente à cela deles.

Como é que é? Um deles tentou puxar assunto e “não foi correspondido”? Qual o interesse em divulgar uma informação tão vaga, tão vazia, tão subjetiva? E a troco de que a Folha agora vai dar credibilidade ao que todo preso fala dos réus “petistas”?

Para que divulgar, tão descaradamente, tão mesquinhamente, os hábitos alimentares dos réus, e sempre de maneira a fazer um contraste com outros presos? E tudo por que? Porque Dirceu toma uma coca-cola na cantina? Eu tenho um parente que foi policial civil na Papuda e ele me disse que há por lá um bocado de presos endinheirados: estelionatários, golpistas, traficantes, ladrões cinco estrelas, corruptos. Nunca houve revolta porque um preso comprou um guaraná e um sanduíche na cantina. Não é do feitio de presidiários terem pensamentos jacobinos ou “igualitários”. A Folha está mentindo – como sempre – quando diz que os presos estão “revoltados” porque Dirceu tem o “privilégio” de beber refrigerante. Isso é ridículo.

A grande ironia é ver a Folha dando continuidade ao linchamento midiático ao mesmo tempo em que fala em “privilégios”. O único fator que pode causar revolta nos presos é se eles perceberem que a mídia deseja uma rebelião, para manter os holofotes sobre os presos do mensalão, ao invés de estar investigando algo novo, como o trensalão paulista ou a máfia de fiscais que agia nos tempos de Serra/Kassab.

Ou seja, os petistas foram condenados num julgamento político, viciado, sob pressão da mídia. São presos novamente de forma ilegal. Estão sentenciados a regime semi-aberto e estão em regime fechado. Estão sendo linchados diariamente pela mídia, sem poder se defender.

E, mesmo fazendo tudo isso, a Folha fala que eles são “privilegiados”!

Ora, Deus me livre de um dia ser um privilegiado assim!

Privilegiado, que eu saiba, são aqueles que são poupados pela mídia. Tem sua vida íntima resguardada. Passeiam em Florença com ninfetas loiras. Tem dinheiro. Estão livres e intocáveis. Podem sonegar bilhões em impostos e ainda posar de santos…

Os réus do mensalão, definitivamente, não são privilegiados. São vítimas de um julgamento viciado, cheio de erros, a demonstração última da mídia de que, se não tem mais poder para ganhar eleições, ainda têm para influenciar o STF e prender inocentes.

Quem deveria estar na Papuda é esse tipo de jornalismo, junto com todos os servidores públicos que se acovardam ou se acumpliciam com as violações de direitos básicos de cidadãos. Mais grave ainda se as vítimas são representantes políticos, porque se viola não somente o direito de indivíduos, mas se agride os milhões de brasileiros que, democraticamente, transferiram suas responsabilidades para aqueles que consideravam preparados para representá-los no parlamento e defender seus direitos.

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NA FOLHA

Presos do mensalão ficam isolados na cadeia

Condenados do semiaberto, como Dirceu, tem banho de sol exclusivo, e Valério está em ala de segurança máxima na Papuda

Apenado relata que os detentos ilustres evitam contato com os demais e receberam o apelido de ‘petistas’

AGUIRRE TALENTO
MATHEUS LEITÃO
Os condenados no julgamento do mensalão que estão presos há quase dois meses no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília, comem melhor e não se misturam com os demais apenados, tomam banho de sol o dia inteiro e são mais bem tratados pelos carcereiros.

Essa é a versão que corre na cadeia entre os detentos, que apelidaram os colegas ilustres de “petistas”, apesar de apenas dois dos oito condenados do esquema que estão na Papuda serem do PT.

Os comentários que correm de boca em boca foram relatados à Folha por um apenado que obteve liberdade condicional na semana passada e que pede anonimato.

Segundo a direção da Papuda, a situação não é assim. O presídio diz que as quentinhas servidas às 11h30 e às 17h são todas iguais, com arroz, feijão, salada e carne.

Mas os presos do mensalão, de fato, têm rotina diferenciada, com o objetivo de evitar contato com os demais –por razões de segurança.

Presos na mesma cela do CIR (Centro Integrado de Reabilitação), de regime semiaberto, o ex-ministro José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, o ex-tesoureiro do PL (hoje PR) Jacinto Lamas e os ex-deputados Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Carlos Rodrigues (PR-RJ) estão em ala destinada a ex-policiais.

Já os presos do regime fechado, o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza e seus ex-sócios Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, estão em celas individuais. Valério fica no pavilhão de segurança máxima, chamado de “seguro”, onde ficam estupradores e presos cujo contato com os demais pode ser perigoso.

O dia na Papuda começa às 6h, quando todos devem estar de pé para o “confere”, quando carcereiros verificam as condições dos presos. Às 7h, o café da manhã –pão com manteiga e café com leite– é servido na cela.

Dirceu e os companheiros complementam a refeição com frutas, biscoitos e sucos comprados na cantina. Semanalmente, familiares podem levar até R$ 125 aos presos.

Às 9h, começa o banho de sol, mas o horário varia para cada ala. Nesse ponto, a rotina dos “petistas” é diferente da dos 12 mil presos da Papuda –1.600 deles no CIR.

Os condenados do mensalão esperam um dos sete pátios do CIR vagar para ter o banho de sol exclusivo.

Todos usam o uniforme da cadeia, com roupas brancas.

O contato com os outros presos é raro. A mulher de um deles relatou à Folha que seu marido, que trabalha como eletricista dentro da Papuda, uma vez foi à cela de Dirceu e tentou puxar assunto, mas não foi correspondido.

“Eles acham que a gente é lixo”, disse o preso recém-solto, que afirma só tê-los visto nas poucas vezes que passou em frente à cela deles.

Enquanto aguardam decisão da Justiça sobre pedido para trabalhar fora do presídio, passam o tempo lendo.

Os condenados que estão no CIR também têm uma TV dentro da cela, regalia geralmente concedida só aos detentos que trabalham. Eles costumam assistir e comentar o noticiário. O aparelho é desligado às 22h –exceção ocorreu no Réveillon, quando passaram da meia-noite.

Dirceu e Delúbio começaram um curso à distância de direito constitucional e estudam juntos entre o almoço e o jantar.

No regime fechado, os condenados do mensalão levam uma vida mais árdua. Valério não tem TV e vê sua luz ser apagada às 21h. Já Paz se queixa de eventualmente ficar sem banho de sol.

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