domingo, 12 de janeiro de 2014

O direito constitucional de dar um rolé

Por Eduardo Guimarães, no Blog da Cidadania:

Não pode ser considerado nem como uma pálida sombra de justiça a concessão recente pelo Poder Judiciário de uma liminar que gerou algumas das cenas mais bizarras que estes olhos cansados pela visão de tantos absurdos ao longo da vida já puderam contemplar.

Apesar de esses fatos terem sido amplamente divulgados, antes de ir ao ponto há que revisitá-los.

O Shopping JK Iguatemi, em São Paulo – onde mais poderia ser? –, conseguiu liminar que o autorizou a impedir a entrada em suas instalações de “adolescentes desacompanhados”. A punição por desobediência, 10 mil reais.

A tal liminar estendeu-se automaticamente a outros shoppings da grande São Paulo e de algumas cidades do interior do Estado.

Em um desses espaços abertos ao público, situado no bairro suburbano de Itaquera, ao contrário do que ocorreu no JK Iguatemi os manifestantes do movimento “rolezinho” não ficaram só na promessa e efetivamente compareceram, o que fez com que fossem agredidos pela polícia.

Apesar da truculência policial no shopping da periferia, foi no do bairro nobre paulistano que a discriminação se fez sentir com mais força. Seguranças faziam uma “triagem” de quem podia e de quem não podia entrar – em Itaquera, pelo menos os jovens puderam entrar, ainda que só para poderem ser expulsos no tapa.

As imagens abaixo podem esclarecer quem podia ou não entrar nos shoppings protegidos por liminar. Mostram uma “triagem” presumivelmente baseada em critérios inconstitucionais como traços físicos.





Manifestações violentas têm ocorrido por todo país e este blog tem criticado esse tipo de ação. Contudo, nunca o direito de reunião e manifestação.

Enquanto alguém não comete vandalismo ou qualquer outro crime, não pode ter sua presença impedida em locais abertos ao público como sói ser um shopping. É inconstitucional. Aliás, fazer uma triagem para permitir o ingresso do cidadão em algum local baseada nos critérios que as fotos acima revelam, é criminoso.

Segundo o artigo 5º, inciso XVI da Constituição Federal, “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização”.

“Rolezinho” é uma corruptela do substantivo masculino rolé. Trata-se de uma gíria antiga, que já era usada em São Paulo quando este blogueiro cinquentenário ainda era tão adolescente quanto esses que foram humilhados, discriminados e que tiveram seus direitos de cidadãos violados.

Rolé, segundo o Houaiss, significa “realizar um pequeno passeio”. Trata-se de direito constitucional e foi infringido, acima de por qualquer outro, por medida cautelar visivelmente inconstitucional, amparada nos preconceitos de quem pediu e de quem concedeu.

4 comentários:

Ordem do Saber disse...

Passa o tempo, mas vez ou outra vemos essas cenas terríveis.

Discriminar pelas roupas ou por qualquer outro critério é algo horrível.
Muito embora seja possível saber o estilo das pessoas que fazem arruaça nos shoppings (não me entenda mal).

Enfim... queira ou não, ainda temos muito contra o que lutar por uma sociedade mais igualitária.

Um bom domingo.

Rafael Saad Moreira disse...

A polícia não pode permitir a condução do desfecho do evento, mobilizado por centenas de jovens (muitos maiores legais), pelo seu caráter anárquico e acéfalo. Pergunto: qual é a intenção real do movimento? Alguns indivíduos de índole duvidosa não poderiam se aproveitar de um possível conflito, subvertendo as boas intenções da maioria que ali se encontra?
Porque se reunirem em centros comerciais e não em praças sem riscos à propriedade alheia?
São perguntas sem respostas. Grande abraço, Rafael.

Anônimo disse...

Eu adoraria ser proibido de entrar em shoppings centers. As vez alguns compromissos "me obrigam" a encarar mas se fosse proibido pelo poder público teria uma bela desculpa e agradeceria!

Anônimo disse...

a discriminacao eh pelas roupas, cutis, assessorios, isto eh, "pelo conjunto".
o judiciario precisa de um expurgo em larga escala.