Reproduzo excelente artigo do professor Venício A. de Lima, publicado no Observatório da Imprensa:
Desde sua publicação no final de dezembro de 2009, o III Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) tem sido objeto de violenta campanha conservadora apoiada e, em parte, promovida pela grande mídia. O tema já foi tratado inúmeras vezes no Observatório (ver, por exemplo, "A mídia contra a Constituição” e “A unanimidade reacionária”).
Contra o III PNDH vale tudo: quem discorda de uma de suas propostas ataca o conjunto do plano, coloca tudo no mesmo saco, como se não houvesse distinção entre descriminalização do aborto e mediação de conflitos agrários. E, para o ataque à única diretriz referente ao direito à comunicação, são utilizadas até mesmo citações de propostas de "controle social da mídia" que simplesmente não constam do III PNDH (2009) e estão, ao contrário, no II PNDH (2002).
Excrescências
Os opositores deram, agora, um passo à frente no vale-tudo de suas acusações: passaram a divulgar "afirmações" do ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) sobre modificações no III PNDH que, na verdade, nunca foram feitas.
E mais: a presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ) – a mesma que comparou o papel da entidade ao da deusa mitológica Atenas-Minerva, de ética questionável – chamou o III PNDH de "excrescência" ["Ações contra tentativa de cercear a imprensa", O Globo, 19/3/2010, pág. 10).
Excrescência é uma palavra feia que, na verdade, soa pior do que seu significado – segundo o Aurélio, "demasia, excesso, superfluidade". Aproveito a palavra utilizada pela presidente da ANJ para descrever algumas excrescências que estão sendo praticadas pela grande mídia no vale tudo contra o III PNDH.
Manipulação grotesca
Após a reunião do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) em que foi apresentado o III PNDH, acompanhada por jornalistas, inclusive da Rede Globo, na terça-feira (16/3), o ministro da SEDH conversou com alguns repórteres. Reafirmou que havia disposição do governo de rever três pontos do III PNDH: defesa ao direito ao aborto, condenação do uso de símbolos religiosos em prédios públicos e criação de novos mecanismos de mediação de conflitos agrários.
Perguntado por um repórter do Estado de S.Paulo se "no capítulo da imprensa há algum reparo ou não?", o ministro respondeu literalmente:
"No capítulo da imprensa não estamos fechados para fazer reparos. Agora, há pouco ainda relia, pela milésima vez, `definir critérios editoriais de ranking´, e não conseguimos nos convencer de que haja aí a menor intenção de censura a imprensa. Esse governo, por todos os seus ministros, pelo presidente, dezenas de vezes, reafirma que é absolutamente contra qualquer tipo de censura à imprensa. O presidente Lula declara: `Eu sou fruto da liberdade de imprensa´. Então, nesse sentido, foi interpretado como se fosse intenção de censura aquilo que é um chamamento à mídia para parcerias, para engajamento, das próprias entidades empresariais, dos sindicatos de jornalistas do Brasil inteiro, dos profissionais, para entendermos juntos as nossas co-responsabilidades. Então o que está dito lá é definir critérios editoriais de ranking, pra premiar, pra valorizar as boas matérias, como já há em inúmeras experiências, o prêmio Vladmir Herzog de jornalismo e Direitos Humanos; o prêmio da ANDI, e também no ranking, localizar, na programação, programas que eventualmente tenham conotação racista, de discriminação à mulher, que sejam homofóbicos. O Brasil já tem instrumentos, para esse ranking sendo feito, o MP, defensores, as autoridades constituídas tomarem as iniciativas adequadas. Então, nesse sentido o ranking pode ser feito em parceria com as próprias empresas, elas podem ser convidadas a isso, seja com os Direitos Humanos, seja com o MJ, onde está sediada a classificação indicativa, seja no próprio Ministério das Comunicações. Então o que nós estamos fazendo no momento é fazer o diálogo sereno, o debate, explicando que não há nenhuma(...). E se houver uma argumentação de que determinado aspecto, determinada ação, das 521, 500 de grande acordo e polêmica em torno de 20, que merece reparo porque pode suscitar uma interpretação equivocada, também incluiremos esse reparo” (Transcrição da Assessoria de Comunicação Social da SEDH)”.
Na mesma noite, o Jornal Nacional da Rede Globo, deu a chamada: "O governo admite alterar pontos mais polêmicos do Programa Nacional de Direitos Humanos". No telejornal, o apresentador leu a seguinte nota coberta:
"O secretário nacional de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, declarou nesta terça-feira que serão alterados quatro pontos do programa que provocou polêmica com setores da sociedade. Segundo Vannuchi, vai ser retirada do Programa de Direitos Humanos a parte que previa negociação de invasores de terra com uma comissão do governo antes de se recorrer à Justiça. O plano não vai mais tratar da descriminalização do aborto, nem da proibição de símbolos religiosos em prédios públicos. O secretário disse ainda que vai alterar a proposta de impor um limite à autonomia das empresas de comunicação. A versão final deve sair em abril.
Os três pontos que poderiam ser alterados se transformaram em quatro, incluída a referência a uma "proposta de impor um limite à autonomia das empresas de comunicação" que, além de não ser especificada, também não foi mencionada na fala do ministro da SEDH.
Curiosamente, no dia seguinte, 17 de março, a matéria sobre o assunto publicada no jornal O Globo sob o título "Estamos dispostos a fazer correções", cita os três pontos relacionados pelo ministro e não faz qualquer referência ao "quarto" ponto mencionado no JN.
Partidarização assumida
Após encontro na Fecomercio, que reuniu representantes da ANJ, da Abert e da Aner, e discutiu a possibilidade de ingresso no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o III PNDH, no dia 18 de março ["Ações contra tentativa de cercear a imprensa", O Globo, 19/3/2010, pág. 10), a presidente da ANJ – que é também diretora-superintendente do Grupo Folha – afirmou:
"A liberdade de imprensa é um bem maior que não deve ser limitado. A esse direito geral, o contraponto é sempre a questão da responsabilidade dos meios de comunicação. E, obviamente, esses meios de comunicação estão fazendo, de fato, a posição oposicionista deste país, já que a oposição está profundamente fragilizada. E esse papel de oposição, de investigação, sem dúvida nenhuma incomoda sobremaneira o governo".
A presidente da ANJ assume publicamente que os jornais estão desempenhando o papel de partidos de oposição ao governo, vale dizer, estão agindo partidariamente, e ainda justifica: a razão é que "a oposição está profundamente fragilizada".
Estratégia conservadora
Em artigo recente, o professor Laurindo Lalo Leal, da ECA-USP, escreveu com propriedade sobre a campanha conservadora contra o III PNDH, em particular, e contra as propostas relativas ao direito à comunicação. Para ele, a campanha faz parte de uma estratégia conservadora que é nossa velha conhecida:
"Elege-se um tema de impacto que tenha amplo apoio na sociedade e se atribui ao adversário a intenção de destruí-lo. No caso, a democracia e a liberdade de expressão. Dizem que o governo elaborou um Plano Nacional de Direitos Humanos propondo o controle social da mídia. Repetem isso à exaustão e passam ao ataque."
Para aqueles que não se esquecem do passado é impossível não lembrar de situações históricas em que as bandeiras eram outras, mas a estratégia, a mesma. É exatamente isso o que está sendo feito hoje com o suporte e a participação da grande mídia e a liderança de suas entidades representativas: ANJ, Abert e ANER. Até onde se pretende chegar, não se sabe.
A escalada dos ataques, todavia, sobe a cada dia. E no vale-tudo para que se atinjam os objetivos, vale qualquer excrescência.
Anexo – Decreto nº 7.037, de 21/12/09.
Aprova o Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH-3 e dá outras providências.
Diretriz 22: Garantia do direito à comunicação democrática e ao acesso à informação para consolidação de uma cultura em Direitos Humanos.
Objetivo Estratégico I:
Promover o respeito aos Direitos Humanos nos meios de comunicação e o cumprimento de seu papel na promoção da cultura em Direitos Humanos.
Ações Programáticas:
a) Propor a criação de marco legal regulamentando o art. 221 da Constituição, estabelecendo o respeito aos Direitos Humanos nos serviços de radiodifusão (rádio e televisão) concedidos, permitidos ou autorizados, como condição para sua outorga e renovação, prevendo penalidades administrativas como advertência, multa, suspensão da programação e cassação, de acordo com a gravidade das violações praticadas.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Justiça; Ministério da Cultura
b) Promover diálogo com o Ministério Público para proposição de ações objetivando a suspensão de programação e publicidade atentatórias aos Direitos Humanos.
Responsáveis: Ministério da Justiça; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República
c) Suspender patrocínio e publicidade oficial em meios que veiculam programações atentatórias aos Direitos Humanos.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Justiça
d) Elaborar critérios de acompanhamento editorial a fim de criar ranking nacional de veículos de comunicação comprometidos com os princípios de Direitos Humanos, assim como os que cometem violações.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República; Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República; Ministério da Cultura; Ministério da Justiça
e) Desenvolver programas de formação nos meios de comunicação públicos como instrumento de informação e transparência das políticas públicas, de inclusão digital e de acessibilidade.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Cultura; Ministério da Justiça
f) Avançar na regularização das rádios comunitárias e promover incentivos para que se afirmem como instrumentos permanentes de diálogo com as comunidades locais.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Cultura; Ministério da Justiça
g) Promover a eliminação das barreiras que impedem o acesso de pessoas com deficiência sensorial à programação em todos os meios de comunicação e informação, em conformidade com o Decreto no 5.296/2004, bem como acesso a novos sistemas e tecnologias, incluindo Internet.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Justiça
Objetivo Estratégico II:
Garantia do direito à comunicação democrática e ao acesso à informação.
Ações Programáticas:
a) Promover parcerias com entidades associativas de mídia, profissionais de comunicação, entidades sindicais e populares para a produção e divulgação de materiais sobre Direitos Humanos.
Responsáveis: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Cultura; Ministério das Comunicações
b) Incentivar pesquisas regulares que possam identificar formas, circunstâncias e características de violações dos Direitos Humanos na mídia.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República
c) Incentivar a produção de filmes, vídeos, áudios e similares, voltada para a educação em Direitos Humanos e que reconstrua a história recente do autoritarismo no Brasil, bem como as iniciativas populares de organização e de resistência.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Cultura; Ministério da Justiça..
sábado, 27 de março de 2010
OEA, herança maldita da Guerra Fria
Reproduzo artigo de Breno Altman, jornalista e diretor do sítio Opera Mundi:
A recondução do chileno José Miguel Insulza à secretaria-geral da Organização dos Estados Americanos normalmente seria fato de pouca monta. Afinal, trata-se de uma relíquia da Guerra Fria. Qualquer que seja seu dirigente, essa entidade tem em seu código genético o papel de articular a supremacia geopolítica dos Estados Unidos abaixo do rio Bravo.
Sua nova assembléia geral, convocada para reeleger o atual secretário-geral, chama atenção apenas porque ocorre em um cenário no qual muitos países latino-americanos parecem dispostos a superar o antigo modelo de associação continental.
A ampliação do Mercosul, o nascimento da Alba, a criação da Unasul e, mais recentemente, a fundação da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e do Caribe (Celac) são sinais de que amadurece um forte sentimento autonomista na região. Por maiores que sejam as dificuldades, ganha força a percepção de que não é satisfatória a condição de quintal do vizinho ao norte, historicamente guarnecida pela OEA.
A pia batismal dessa instituição foi o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), assinado no Rio de Janeiro em 1947. Esse documento adotava um sistema de segurança coletiva no qual qualquer ataque a uma das nações do continente seria respondido pelos demais países signatários. Expressava, na prática, um contrato de adesão à hegemonia militar dos Estados Unidos na disputa contra a União Soviética e o campo socialista.
De nada serviu quando a Argentina, em 1982, foi atacada pela Inglaterra, depois de recuperar provisoriamente o controle das Ilhas Malvinas. A Casa Branca, mais do que cruzar os braços, colocou seus serviços de inteligência para auxiliar a marinha inglesa. Mas essa é outra história, fica aqui apenas um retrato da hipocrisia reinante nas tais “relações interamericanas”.
A criação da OEA
A submissão dos governos sulistas ao TIAR animou Washington a novos passos. Na 9ª Conferência Internacional dos Estados Americanos, realizada em Bogotá entre março e abril de 1948, o general George Marshall, então secretário de Estado, convocou os países presentes a um “compromisso de luta contra o comunismo”. Levou para casa uma nova organização continental, oficialmente fundada no dia 30 de abril de 1948 através de uma declaração, a Carta da OEA, que contou com a assinatura de 21 países e passou a vigorar a partir de dezembro de 1951.
A intenção dos norte-americanos, para além de estabelecer sua direção sobre questões de defesa, era criar um novo instrumento jurídico, político e econômico com o qual pudessem construir laços de subordinação que não reproduzissem o velho e fracassado colonialismo europeu. Suas ambições hegemônicas deveriam se realizar a partir da renúncia voluntária de países formalmente independentes a porções de sua soberania.
O recurso à violência viria a assumir um caráter punitivo e de ação política, respaldando oligarquias nacionais contra forças insurgentes ou governos populares, mas sem a lógica da ocupação permanente ou da anexação territorial. Uma estratégia na qual a OEA, nas palavras de Fidel Castro, desempenharia o papel de “ministério das colônias” dos Estados Unidos.
Cuba, aliás, seria a primeira vítima do tacape da entidade sediada na capital norte-americana. Acusada de se aliar ao bloco socialista, teve sua participação suspensa em 1962. Logo depois, em 1965, foi a vez da República Dominicana. Quando forças leais ao presidente constitucional Juan Bosh estavam a um passo de derrotar grupos civis e militares que tinham realizado um golpe de Estado, o país foi invadido por tropas conjuntas dos EUA e da OEA, com vergonhosa participação brasileira.
As ditaduras do continente, a propósito, sempre puderam desfilar livremente pelos corredores e encontros da instituição. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, mui seletivamente, só tinha olhos para governos que rompessem o alinhamento com a Casa Branca.
Nenhuma dessas informações consta do sítio eletrônico da organização liderada pelo socialista Insulza. Devidamente submetida a uma cirurgia plástica quando se esgotou o ciclo dos militares, no final dos anos 80, a OEA foi reinventada como articuladora de iniciativas integracionistas. Foram forjados, em seu âmbito, projetos como o da ALCA (Área de Livre Comércio das Américas), que buscavam redesenhar os mercados e Estados nacionais como espaços acessórios da economia norte-americana.
Giro à esquerda
Mas essas tentativas acabaram frustradas ou comprometidas pela ascensão de forças progressistas em alguns dos principais países da região, especialmente no Brasil, na Venezuela e na Argentina. A primeira década do século XXI significou um importante giro à esquerda no continente.
Ao contrário de velhos governos oligárquicos e conservadores, as novas correntes se propunham a uma estratégia de fortalecimento do poder público, expansão do mercado interno de massas, distribuição de renda e ampliação dos direitos sociais. Ainda que com fortes diferenças em cada experiência local, esse caminho colocou em cheque o modelo privatista e desnacionalizante, base fundamental para a associação subordinada desejada pelos Estados Unidos.
O novo ciclo político, acoplado ao retumbante fracasso de países que embarcaram nos tratados de livre-comércio com Washington, cujo caso mais emblemático é o México, recolocou o tema da integração. O velho programa das plutocracias latino-americanas, verticalizado pela ambição de se tornarem sócias minoritárias e lucrativas do empreendimento norte-americano, veio sendo substituído pela defesa de um bloco autônomo, amparado sobre redes comuns de infra-estrutura, fontes de financiamento, fluxos comerciais e instituições políticas, além de planos ambiciosos para unificação da moeda e do sistema de defesa.
Mesmo nações dirigidas por partidos direitistas foram levadas, em alguma medida, a se juntar a essa onda, motivadas pela propulsão econômica da área latino-americana, no contexto de um mundo em crise e repartido por grandes alianças regionais. Essa tem sido a base objetiva, afinal, para o associativismo crescente entre os países do subcontinente.
Entulho neocolonial
Apesar de seu relativo enfraquecimento no jogo regional, a Casa Branca segue com cartas poderosas nas mãos. O cerne de sua contra-ofensiva, no terreno diplomático, é o bilateralismo. Dividir para reinar. Impedir ou atenuar as iniciativas autonomistas. Atrapalhar ou minimizar a construção de espaços sem sua participação. A OEA, para essa estratégia, segue com uma função relevante, que inclui a pressão sobre governos que aceleram seu distanciamento dos interesses norte-americanos, claro que sempre em nome da democracia e dos direitos humanos.
O mesmo não pode ser dito, quanto à pertinência dessa instituição, na perspectiva dos governos progressistas e da unificação latino-americana. A existência de uma organização dessa natureza é um fator inibidor. Não tem qualquer serventia positiva um organismo que historicamente se apresentou como guarda pretoriana de interesses imperiais.
Tampouco faz sentido no próprio aprimoramento das relações com os Estados Unidos. Quanto mais freqüentes e robustas forem as negociações em bloco, maior será o poder de pressão dos países ao sul. Quanto menor for a presença político-militar de Washington no subcontinente, mais amplas serão as possibilidades de integração e soberania.
A OEA, de fato, não passa de um entulho neocolonial. Seu esvaziamento progressivo, acompanhado pela denúncia do TIAR, significaria um avanço notável no processo democrático e independentista.
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A recondução do chileno José Miguel Insulza à secretaria-geral da Organização dos Estados Americanos normalmente seria fato de pouca monta. Afinal, trata-se de uma relíquia da Guerra Fria. Qualquer que seja seu dirigente, essa entidade tem em seu código genético o papel de articular a supremacia geopolítica dos Estados Unidos abaixo do rio Bravo.
Sua nova assembléia geral, convocada para reeleger o atual secretário-geral, chama atenção apenas porque ocorre em um cenário no qual muitos países latino-americanos parecem dispostos a superar o antigo modelo de associação continental.
A ampliação do Mercosul, o nascimento da Alba, a criação da Unasul e, mais recentemente, a fundação da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e do Caribe (Celac) são sinais de que amadurece um forte sentimento autonomista na região. Por maiores que sejam as dificuldades, ganha força a percepção de que não é satisfatória a condição de quintal do vizinho ao norte, historicamente guarnecida pela OEA.
A pia batismal dessa instituição foi o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), assinado no Rio de Janeiro em 1947. Esse documento adotava um sistema de segurança coletiva no qual qualquer ataque a uma das nações do continente seria respondido pelos demais países signatários. Expressava, na prática, um contrato de adesão à hegemonia militar dos Estados Unidos na disputa contra a União Soviética e o campo socialista.
De nada serviu quando a Argentina, em 1982, foi atacada pela Inglaterra, depois de recuperar provisoriamente o controle das Ilhas Malvinas. A Casa Branca, mais do que cruzar os braços, colocou seus serviços de inteligência para auxiliar a marinha inglesa. Mas essa é outra história, fica aqui apenas um retrato da hipocrisia reinante nas tais “relações interamericanas”.
A criação da OEA
A submissão dos governos sulistas ao TIAR animou Washington a novos passos. Na 9ª Conferência Internacional dos Estados Americanos, realizada em Bogotá entre março e abril de 1948, o general George Marshall, então secretário de Estado, convocou os países presentes a um “compromisso de luta contra o comunismo”. Levou para casa uma nova organização continental, oficialmente fundada no dia 30 de abril de 1948 através de uma declaração, a Carta da OEA, que contou com a assinatura de 21 países e passou a vigorar a partir de dezembro de 1951.
A intenção dos norte-americanos, para além de estabelecer sua direção sobre questões de defesa, era criar um novo instrumento jurídico, político e econômico com o qual pudessem construir laços de subordinação que não reproduzissem o velho e fracassado colonialismo europeu. Suas ambições hegemônicas deveriam se realizar a partir da renúncia voluntária de países formalmente independentes a porções de sua soberania.
O recurso à violência viria a assumir um caráter punitivo e de ação política, respaldando oligarquias nacionais contra forças insurgentes ou governos populares, mas sem a lógica da ocupação permanente ou da anexação territorial. Uma estratégia na qual a OEA, nas palavras de Fidel Castro, desempenharia o papel de “ministério das colônias” dos Estados Unidos.
Cuba, aliás, seria a primeira vítima do tacape da entidade sediada na capital norte-americana. Acusada de se aliar ao bloco socialista, teve sua participação suspensa em 1962. Logo depois, em 1965, foi a vez da República Dominicana. Quando forças leais ao presidente constitucional Juan Bosh estavam a um passo de derrotar grupos civis e militares que tinham realizado um golpe de Estado, o país foi invadido por tropas conjuntas dos EUA e da OEA, com vergonhosa participação brasileira.
As ditaduras do continente, a propósito, sempre puderam desfilar livremente pelos corredores e encontros da instituição. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, mui seletivamente, só tinha olhos para governos que rompessem o alinhamento com a Casa Branca.
Nenhuma dessas informações consta do sítio eletrônico da organização liderada pelo socialista Insulza. Devidamente submetida a uma cirurgia plástica quando se esgotou o ciclo dos militares, no final dos anos 80, a OEA foi reinventada como articuladora de iniciativas integracionistas. Foram forjados, em seu âmbito, projetos como o da ALCA (Área de Livre Comércio das Américas), que buscavam redesenhar os mercados e Estados nacionais como espaços acessórios da economia norte-americana.
Giro à esquerda
Mas essas tentativas acabaram frustradas ou comprometidas pela ascensão de forças progressistas em alguns dos principais países da região, especialmente no Brasil, na Venezuela e na Argentina. A primeira década do século XXI significou um importante giro à esquerda no continente.
Ao contrário de velhos governos oligárquicos e conservadores, as novas correntes se propunham a uma estratégia de fortalecimento do poder público, expansão do mercado interno de massas, distribuição de renda e ampliação dos direitos sociais. Ainda que com fortes diferenças em cada experiência local, esse caminho colocou em cheque o modelo privatista e desnacionalizante, base fundamental para a associação subordinada desejada pelos Estados Unidos.
O novo ciclo político, acoplado ao retumbante fracasso de países que embarcaram nos tratados de livre-comércio com Washington, cujo caso mais emblemático é o México, recolocou o tema da integração. O velho programa das plutocracias latino-americanas, verticalizado pela ambição de se tornarem sócias minoritárias e lucrativas do empreendimento norte-americano, veio sendo substituído pela defesa de um bloco autônomo, amparado sobre redes comuns de infra-estrutura, fontes de financiamento, fluxos comerciais e instituições políticas, além de planos ambiciosos para unificação da moeda e do sistema de defesa.
Mesmo nações dirigidas por partidos direitistas foram levadas, em alguma medida, a se juntar a essa onda, motivadas pela propulsão econômica da área latino-americana, no contexto de um mundo em crise e repartido por grandes alianças regionais. Essa tem sido a base objetiva, afinal, para o associativismo crescente entre os países do subcontinente.
Entulho neocolonial
Apesar de seu relativo enfraquecimento no jogo regional, a Casa Branca segue com cartas poderosas nas mãos. O cerne de sua contra-ofensiva, no terreno diplomático, é o bilateralismo. Dividir para reinar. Impedir ou atenuar as iniciativas autonomistas. Atrapalhar ou minimizar a construção de espaços sem sua participação. A OEA, para essa estratégia, segue com uma função relevante, que inclui a pressão sobre governos que aceleram seu distanciamento dos interesses norte-americanos, claro que sempre em nome da democracia e dos direitos humanos.
O mesmo não pode ser dito, quanto à pertinência dessa instituição, na perspectiva dos governos progressistas e da unificação latino-americana. A existência de uma organização dessa natureza é um fator inibidor. Não tem qualquer serventia positiva um organismo que historicamente se apresentou como guarda pretoriana de interesses imperiais.
Tampouco faz sentido no próprio aprimoramento das relações com os Estados Unidos. Quanto mais freqüentes e robustas forem as negociações em bloco, maior será o poder de pressão dos países ao sul. Quanto menor for a presença político-militar de Washington no subcontinente, mais amplas serão as possibilidades de integração e soberania.
A OEA, de fato, não passa de um entulho neocolonial. Seu esvaziamento progressivo, acompanhado pela denúncia do TIAR, significaria um avanço notável no processo democrático e independentista.
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sexta-feira, 26 de março de 2010
Os impactos da comunicação em rede
O professor Dênis de Moraes, autor do imperdível “As batalhas da mídia”, é o organizador de um novo livro essencial para se entender as transformações em curso na estratégica área da comunicação. A obra “As mutações do visível” reúne estudos de renomados pesquisadores. Reproduzo abaixo o release enviado pela Editora Pão e Rosa:
O compromisso essencial deste livro é analisar mutações de uma época de comunicação generalizada e em rede, na qual a vida social, as mentalidades, os valores e os processos culturais parecem definitivamente vinculados a telas, monitores e ambientes virtuais, sob o imperativo da cultura tecnológica e da midiatização.
Para enfrentar este quadro desafiador, Dênis de Moraes reúne um elenco de intelectuais que se destacam internacionalmente no exame de perspectivas, contradições e dilemas na órbita da multiplicação de canais, redes, sistemas, plataformas, circuitos infoeletrônicos, suportes e dispositivos.
O livro oferece um conjunto de reflexões sobre temas que aguardavam por análises aprofundadas, tais como: modelos de mediação na interseção da comunicação de massa com a comunicação em rede; os condicionantes da geração de conteúdos no capitalismo tecnológico; a incessante circulação de informações, saberes e entretenimentos em condições desiguais de acesso, assimilação e resposta; formas de hegemonia e contra-hegemonia que se defrontam na arena simbólica; concentração monopólica nos setores infocomunicacionais e o requisito da regulação pública; estratégias midiatizadas de celebração e consagração no campo jornalístico; ideologia e representação simbólica no ciberespaço; realinhamentos culturais e educativos nas redes planetárias; e fronteiras de sociabilidade e criatividade no entorno digital.
No prefácio, o cientista político Marco Aurélio Nogueira assim avalia a obra: "Mutações do visível traduz com competência os desafios que o mundo atual está experimentando no estratégico e sempre mais central setor da comunicação e da informação. Há nele uma combinação bem-sucedida de enfoques distintos que buscam convergir para uma mesma zona de embate crítico. São reflexões que privilegiam o que existe de protagonismo da mídia sem descuidar das disputas de sentido e das lutas por hegemonia que atravessam o campo da comunicação. Essa é sua força, e nisso repousa sua enorme utilidade.”
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O terrorismo midiático contra Cuba
A “greve de fome” e a morte de Orlando Zapata desencadearam uma nova onda midiática contra Cuba. Jornalões decadentes e poderosas redes de televisão dos EUA e da Europa deflagraram a ofensiva e logo foram seguidos servilmente pelos barões da mídia colonizada do Brasil. Quase todos os dias, Estadão, Folha e Globo lotam páginas para satanizar o regime cubano, tentando fazer a cabeça dos tais “formadores de opinião”. Já as emissoras de televisão, em especial a TV Globo, massificam o terrorismo midiático para milhões de inocentes telespectadores.
A hipocrisia da mídia é repugnante. Ela tem o cinismo de transformar um deliquente comum em preso político. Zapata, o novo herói do imperialismo e da mídia, nunca sequer figurou na lista de “prisioneiros de consciência” do Conselho de Direitos Humanos da ONU, sempre tão rigoroso contra Cuba. Seus problemas com a justiça cubana eram antigos e sua folha corrida era imensa: “violação de domícilio” (1993), “lesões menos graves”, “furto”, “porte de arma branca”, “fratura do crânio de uma vítima com uso de machado” (2000) e “perturbação da ordem pública” (2002).
“Milagrosa metamorfose” de Zapata
Apesar dos crimes comuns, a justiça cubana ainda permitiu que Zapata fosse libertado sob fiança em março de 2003. Poucos meses depois, ele cometeria novos crimes, sendo detido e condenado a três anos de prisão. Mas a sentença foi dilatada devido à péssima conduta na cadeia. Foi neste período que o delinqüente comum foi abordado pela chamada “dissidência cubana”, financiada pelo Departamento de Estado dos EUA e pelas fundações de fachada da CIA.
Como relata o sociólogo Atílio Borón, “é neste marco que se produz sua milagrosa metamorfose: o meliante repetidamente encarcerado por cometer numerosos delitos comuns se converte em um ardente cidadão que decide consagrar sua vida à promoção da ‘liberdade’ e da ‘democracia’ em Cuba. Espertamente recrutado por setores da ‘dissidência política’ cubana, sempre desejosa de conta com um mártir em suas esquálidas fileiras, impulsionaram-o irresponsavelmente e com total desprezo pela sua pessoa a levar adiante uma greve de fome até o final”.
Mentiras sobre presos e torturados
A sua lamentável morte, ocorrida apesar dos esforços dos médicos cubanos para evitá-la, deu a senha para a nova ofensiva midiática contra a ilha rebelde. A desinformação é total. Fala-se em milhares de presos políticos e torturados em Cuba. Pura mentira. Até suspeitas ONGs de direitos humanos reconhecem que há “menos de 50 prisioneiros de consciência” no país – bem menos do que os 7.500 da Colômbia, que a mídia omite. Elas também nunca registraram casos de torturas em Cuba – a não ser na base militar dos EUA em Guantánamo, famosa por suas barbáries.
Além disso, a maioria dos “presos políticos cubanos” tem notórios vínculos com o imperialismo, recebe dólares da CIA e freqüenta assiduamente o Escritório de Interesses dos EUA em Havana. Em qualquer outro país, eles seriam condenados por alta traição. O Código Penal dos EUA, por exemplo, prevê pena de 20 anos para que proponha a derrubada do governo constitucional; de 10 anos de prisão para quem emita “falsas declarações com o objetivo de atentar contra os interesses da nação”; e de três anos para quem “mantenha relação com governos estrangeiros”.
O medo da revolução cubana
O veneno midiático contra Cuba, inclusive o destilado pela colonizada mídia nativa, tem vários motivos. Ela não tolera que esta ilha rebelde resista a 50 anos de criminiso bloqueio econômico, que já resultou em bilhões de prejuízos ao povo cubano. Ela não compreende porque mais de 640 tentativas de assassinato do líder da revolução, Fidel Castro, tenham falhado. Ela quer apagar os exemplos cubanos, que ainda animam as lutas de povos de vários países com as suas avançadas políticas sociais, sua heróica defesa da soberania nacional e sua solidariedade internacionalista.
Em síntese, como aponta Azaela Robles num didático artigo no sítio Rebelión, a mídia burguesa não aceita as conquistas da revolução cubana. “No autoproclamado ‘mundo livre’ (o mundo que sofre no sistema capitalista), a cada sete segundos uma criança de menos de dez anos morre de fome. Nenhuma delas é cubana. Segundo a FAO, 842 milhões de pessoas sofrem de desnutrição crônica. Nenhuma delas é cubana. No ‘mundo livre’, 200 milhões de crianças vivem e dormem nas ruas. Nehuma delas é cubana... Anualmente, quase dois milhões de jovens morrem no mundo somente por falta de água potável e saneameno básico. Nenhum morre em Cuba por esta causa”.
Manifesto “em defesa de Cuba”
Diante deste brutal terrorismo midiático, os movimentos sociais e as forças progressistas devem erguer a sua voz em defesa da soberania cubana e contra os novos intentos desastabilizadores do imperialismo. Como afirma o manifesto “Em defesa de Cuba”, assinado por intelectuais, artistas e lutadores sociais que integram a Rede Mundial em Defesa da Humanidade (RDH), é urgente se contrapor a esta nova ofensiva do imperialismo e de sua mídia venal.
“Pretender justificar a intromissão nos assuntos políticos internos do povo cubano manipulando midiaticamente o caso Orlando Zapata – deliquente comum e não um preso político – coincide com as políticas contra-insurgentes que se aplicam na América Latina para deter os processos de transformação emancipadora em curso na região... Ela se soma ao criminoso bloqueio imposto ao povo cubano pelo simples fato dele não aceitar imposições e defender o direito a decidir seu destino com dignidade e independência”, afirma o manifesto, que continua aberto às adesões.
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A hipocrisia da mídia é repugnante. Ela tem o cinismo de transformar um deliquente comum em preso político. Zapata, o novo herói do imperialismo e da mídia, nunca sequer figurou na lista de “prisioneiros de consciência” do Conselho de Direitos Humanos da ONU, sempre tão rigoroso contra Cuba. Seus problemas com a justiça cubana eram antigos e sua folha corrida era imensa: “violação de domícilio” (1993), “lesões menos graves”, “furto”, “porte de arma branca”, “fratura do crânio de uma vítima com uso de machado” (2000) e “perturbação da ordem pública” (2002).
“Milagrosa metamorfose” de Zapata
Apesar dos crimes comuns, a justiça cubana ainda permitiu que Zapata fosse libertado sob fiança em março de 2003. Poucos meses depois, ele cometeria novos crimes, sendo detido e condenado a três anos de prisão. Mas a sentença foi dilatada devido à péssima conduta na cadeia. Foi neste período que o delinqüente comum foi abordado pela chamada “dissidência cubana”, financiada pelo Departamento de Estado dos EUA e pelas fundações de fachada da CIA.
Como relata o sociólogo Atílio Borón, “é neste marco que se produz sua milagrosa metamorfose: o meliante repetidamente encarcerado por cometer numerosos delitos comuns se converte em um ardente cidadão que decide consagrar sua vida à promoção da ‘liberdade’ e da ‘democracia’ em Cuba. Espertamente recrutado por setores da ‘dissidência política’ cubana, sempre desejosa de conta com um mártir em suas esquálidas fileiras, impulsionaram-o irresponsavelmente e com total desprezo pela sua pessoa a levar adiante uma greve de fome até o final”.
Mentiras sobre presos e torturados
A sua lamentável morte, ocorrida apesar dos esforços dos médicos cubanos para evitá-la, deu a senha para a nova ofensiva midiática contra a ilha rebelde. A desinformação é total. Fala-se em milhares de presos políticos e torturados em Cuba. Pura mentira. Até suspeitas ONGs de direitos humanos reconhecem que há “menos de 50 prisioneiros de consciência” no país – bem menos do que os 7.500 da Colômbia, que a mídia omite. Elas também nunca registraram casos de torturas em Cuba – a não ser na base militar dos EUA em Guantánamo, famosa por suas barbáries.
Além disso, a maioria dos “presos políticos cubanos” tem notórios vínculos com o imperialismo, recebe dólares da CIA e freqüenta assiduamente o Escritório de Interesses dos EUA em Havana. Em qualquer outro país, eles seriam condenados por alta traição. O Código Penal dos EUA, por exemplo, prevê pena de 20 anos para que proponha a derrubada do governo constitucional; de 10 anos de prisão para quem emita “falsas declarações com o objetivo de atentar contra os interesses da nação”; e de três anos para quem “mantenha relação com governos estrangeiros”.
O medo da revolução cubana
O veneno midiático contra Cuba, inclusive o destilado pela colonizada mídia nativa, tem vários motivos. Ela não tolera que esta ilha rebelde resista a 50 anos de criminiso bloqueio econômico, que já resultou em bilhões de prejuízos ao povo cubano. Ela não compreende porque mais de 640 tentativas de assassinato do líder da revolução, Fidel Castro, tenham falhado. Ela quer apagar os exemplos cubanos, que ainda animam as lutas de povos de vários países com as suas avançadas políticas sociais, sua heróica defesa da soberania nacional e sua solidariedade internacionalista.
Em síntese, como aponta Azaela Robles num didático artigo no sítio Rebelión, a mídia burguesa não aceita as conquistas da revolução cubana. “No autoproclamado ‘mundo livre’ (o mundo que sofre no sistema capitalista), a cada sete segundos uma criança de menos de dez anos morre de fome. Nenhuma delas é cubana. Segundo a FAO, 842 milhões de pessoas sofrem de desnutrição crônica. Nenhuma delas é cubana. No ‘mundo livre’, 200 milhões de crianças vivem e dormem nas ruas. Nehuma delas é cubana... Anualmente, quase dois milhões de jovens morrem no mundo somente por falta de água potável e saneameno básico. Nenhum morre em Cuba por esta causa”.
Manifesto “em defesa de Cuba”
Diante deste brutal terrorismo midiático, os movimentos sociais e as forças progressistas devem erguer a sua voz em defesa da soberania cubana e contra os novos intentos desastabilizadores do imperialismo. Como afirma o manifesto “Em defesa de Cuba”, assinado por intelectuais, artistas e lutadores sociais que integram a Rede Mundial em Defesa da Humanidade (RDH), é urgente se contrapor a esta nova ofensiva do imperialismo e de sua mídia venal.
“Pretender justificar a intromissão nos assuntos políticos internos do povo cubano manipulando midiaticamente o caso Orlando Zapata – deliquente comum e não um preso político – coincide com as políticas contra-insurgentes que se aplicam na América Latina para deter os processos de transformação emancipadora em curso na região... Ela se soma ao criminoso bloqueio imposto ao povo cubano pelo simples fato dele não aceitar imposições e defender o direito a decidir seu destino com dignidade e independência”, afirma o manifesto, que continua aberto às adesões.
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quinta-feira, 25 de março de 2010
Os professores “amam” Gilberto Dimenstein
Numa das principais faixas da passeata dos professores de São Paulo, que mobilizou mais de 60 mil grevistas e virou “não-notícia” na mídia demotucana, foi possível ler: “Greve é cidadania. Dimenstein, vá pentear macaco”. Ela é assinada pela subsede da Apeoesp de Cotia e expressa o grau de revolta da categoria contra Gilberto Dimenstein, o paparicado colunista da FSP (Folha Serra Presidente), que vive desqualificando os docentes e os seus movimentos reivindicatórios.
Em recente artigo, ele babou: “Greve contra os pobres”. Ele elogia os programas de meritocracia do governo tucano e afirma, na maior caradura, que “não vou discutir aqui o pedido de aumento salarial” da categoria. Ele tenta jogar a sociedade contra os professores, mas se recusa a falar dos péssimos salários, das condições precárias das escolas e do péssimo nível de ensino, todos entre os piores do país. O artigo foi a gota d’água. Dimenstein até que poderia pintar num protesto dos grevistas para explicar suas “brilhantes” teorias sobre educação, difundidas na sua sinistra ONG.
Cobertura asquerosa da mídia
A revolta dos grevistas não se limita à figura patética do colunista da Folha, que é muito próximo do tucano Serra e do demo Kassab. Ela se estende a toda mídia privada. O Estadão, por exemplo, publicou opinião raivosa contra a categoria. “A greve do professorado paulista não passa de encenação”, atacou o editorial intitulado “greve política”. Já as redes de televisão não exibem as gigantescas mobilizações da categoria e quando tratam da paralisação, iniciada em 8 de março, é para insinuar que ela “congestiona o trânsito e atrapalha a vida do paulistano”.
Num dos piores exemplos da manipulação “jornalística”, a mídia tratou como verdade a nota da Secretaria de Educação que afirmou que a greve teria “apenas 1% de adesão”. Para justificar a farta publicidade do governo estadual, ela decretou o fracasso do movimento. Ela nem sequer se deu ao trabalho de ir às escolas para conferir a falsa declaração, que logo foi desmentida pelos protestos que reúnem mais de 50 mil grevistas. Além de abalar a imagem do tucano Serra, a poderosa greve dos professores serve para desmascarar, de vez, a mídia venal e seus colunistas de aluguel.
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Emprego e renda crescem. É hora de ousar
O Departamento Intersindical de Estudos e Estatísticas Socioeconômicos (Dieese) divulgou um dado surpreendente na semana passada. Em plena crise do capitalismo, que gerou uma queda de 0,2% no PIB do Brasil – não foi um tsunami, como torcia a oposição demotucana, mas também não foi uma marolinha, como despistou o presidente Lula –, 93% das negociações coletivas em 2009 arrancaram reajustes salariais iguais ou superiores à inflação medida pelo IBGE no período.
Desde o primeiro balanço realizado pelo Dieese, em 1996, o ano passado foi o melhor no que se refere aos reajustes salariais dos trabalhadores. O recorde anterior havia sido registrado em 2008, antes da eclosão da crise capitalista, quando 89% das negociações ficaram acima da inflação. O ano de 2003, ainda sob os escombros da “herança maldita” de FHC, foi o pior para as categorias no governo Lula. De cada dez negociações coletivas, seis ficaram abaixo da inflação do período.
Recorde na geração de empregos
Na mesma semana, outra informação positiva animou o sindicalismo. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, confirmaram a criação de 209.425 novas vagas formais em fevereiro. “Foi o melhor fevereiro da história de 22 anos do Caged”, comemorou Carlos Lupi, ministro do Trabalho e Emprego. Otimista, ele garante que “2010 tende a ser o melhor ano na geração de empregos na história do Brasil”.
Serviços e construção civil foram os setores que mais contrataram, o que já era esperado. O mais surpreendente, porém, foi a retomada do emprego na indústria de transformação, o que confirma as previsões sobre a arrancada da economia em 2010. Do ponto de vista político, os dados sobre geração de emprego e renda representam duro revés nos planos de retrocesso neoliberal da oposição demotucana. Como brinca o jornalista Paulo Henrique Amorim, eles significam o desejado “bye-bye Serra”.
Quadro de retomada das greves
Já do ponto de vista sindical, a retomada do crescimento cria um cenário mais favorável para a luta dos trabalhadores por melhores salários e por benefícios sociais. As empresas estão lucrando como nunca na história do país, surfando no aquecimento do mercado interno e preservando suas exportações. Várias indústrias já atingiram o pleno uso da capacidade produtiva, eliminando sua ociosidade. Muitas têm elevado a jornada de trabalho, evitando novas contratações. Elas não têm como se lamuriar das dificuldades e, sem estoques, ficam mais vulneráveis à pressão sindical.
Com a economia mais aquecida, os próprios trabalhadores elevam a sua auto-estima. Após longo período de medo do desemprego, muitos hoje pedem as contas e procuram melhores vagas. Com maior confiança, o trabalhador fica mais susceptível às mensagens dos sindicatos, mais disposto a lutar por seus direitos. Tanto que o início do ano já registra a retomada das greves, em especial no setor público, que tem sua capacidade de arrecadação elevada com o crescimento da economia.
O empurrão para a redução da jornada
A conjuntura atual, política e econômica, reforça a capacidade de pressão do sindicalismo, eleva seu poder de barganha diante do patronato e permite maior mobilização das bases. Na contramão da regressão mundial do trabalho, o Brasil tem tudo para conquistar a vitória histórica da redução da jornada – uma “reforma de caráter revolucionário”, segundo o sociólogo Ricardo Antunes. O projeto está quicando no Congresso Nacional e depende de mais um empurrão, de maior pressão, para virar realidade, o que confirmaria o quadro mais favorável à luta dos trabalhadores.
O momento exige maior ousadia do sindicalismo. É hora de chutar o balde, de exigir uma melhor distribuição dos ganhos do crescimento econômico. Do contrário, o desenvolvimento induzido pelo governo Lula, que não enfrenta os graves problemas estruturais do país, servirá para manter as distorções na distribuição de renda e riqueza. Artigo da revista “Retrato do Brasil” prova que o fosso entre ricos e pobres cresce no país, com a multiplicação dos super-ricos e da chamada alta classe média. É hora de exigir a redistribuição da renda e da riqueza. É hora de maior ousadia!
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Desde o primeiro balanço realizado pelo Dieese, em 1996, o ano passado foi o melhor no que se refere aos reajustes salariais dos trabalhadores. O recorde anterior havia sido registrado em 2008, antes da eclosão da crise capitalista, quando 89% das negociações ficaram acima da inflação. O ano de 2003, ainda sob os escombros da “herança maldita” de FHC, foi o pior para as categorias no governo Lula. De cada dez negociações coletivas, seis ficaram abaixo da inflação do período.
Recorde na geração de empregos
Na mesma semana, outra informação positiva animou o sindicalismo. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, confirmaram a criação de 209.425 novas vagas formais em fevereiro. “Foi o melhor fevereiro da história de 22 anos do Caged”, comemorou Carlos Lupi, ministro do Trabalho e Emprego. Otimista, ele garante que “2010 tende a ser o melhor ano na geração de empregos na história do Brasil”.
Serviços e construção civil foram os setores que mais contrataram, o que já era esperado. O mais surpreendente, porém, foi a retomada do emprego na indústria de transformação, o que confirma as previsões sobre a arrancada da economia em 2010. Do ponto de vista político, os dados sobre geração de emprego e renda representam duro revés nos planos de retrocesso neoliberal da oposição demotucana. Como brinca o jornalista Paulo Henrique Amorim, eles significam o desejado “bye-bye Serra”.
Quadro de retomada das greves
Já do ponto de vista sindical, a retomada do crescimento cria um cenário mais favorável para a luta dos trabalhadores por melhores salários e por benefícios sociais. As empresas estão lucrando como nunca na história do país, surfando no aquecimento do mercado interno e preservando suas exportações. Várias indústrias já atingiram o pleno uso da capacidade produtiva, eliminando sua ociosidade. Muitas têm elevado a jornada de trabalho, evitando novas contratações. Elas não têm como se lamuriar das dificuldades e, sem estoques, ficam mais vulneráveis à pressão sindical.
Com a economia mais aquecida, os próprios trabalhadores elevam a sua auto-estima. Após longo período de medo do desemprego, muitos hoje pedem as contas e procuram melhores vagas. Com maior confiança, o trabalhador fica mais susceptível às mensagens dos sindicatos, mais disposto a lutar por seus direitos. Tanto que o início do ano já registra a retomada das greves, em especial no setor público, que tem sua capacidade de arrecadação elevada com o crescimento da economia.
O empurrão para a redução da jornada
A conjuntura atual, política e econômica, reforça a capacidade de pressão do sindicalismo, eleva seu poder de barganha diante do patronato e permite maior mobilização das bases. Na contramão da regressão mundial do trabalho, o Brasil tem tudo para conquistar a vitória histórica da redução da jornada – uma “reforma de caráter revolucionário”, segundo o sociólogo Ricardo Antunes. O projeto está quicando no Congresso Nacional e depende de mais um empurrão, de maior pressão, para virar realidade, o que confirmaria o quadro mais favorável à luta dos trabalhadores.
O momento exige maior ousadia do sindicalismo. É hora de chutar o balde, de exigir uma melhor distribuição dos ganhos do crescimento econômico. Do contrário, o desenvolvimento induzido pelo governo Lula, que não enfrenta os graves problemas estruturais do país, servirá para manter as distorções na distribuição de renda e riqueza. Artigo da revista “Retrato do Brasil” prova que o fosso entre ricos e pobres cresce no país, com a multiplicação dos super-ricos e da chamada alta classe média. É hora de exigir a redistribuição da renda e da riqueza. É hora de maior ousadia!
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O papel da mídia nas eleições de 2010
Reproduzo abaixo a entrevista concedida ao Blog da Dilma e agradeço aos editores, Daniel Pearl e Jussara Seixas, pelas palavras carinhosas na abertura da matéria:
Blog da Dilma: Como você viu o crescimento da ministra Dilma Rousseff nas últimas pesquisas?
Altamiro Borges: Penso que este crescimento reflete os avanços do governo Lula e as dificuldades, ainda que momentâneas, da oposição neoliberal-conversadora. A pesquisa divulgada pelo insuspeito Ibope, um instituto com notórias ligações com os tucanos, confirma a popularidade recorde de Lula e a sua capacidade de transferência de votos para Dilma Rousseff. Mesmo ainda sendo desconhecida por parcelas do eleitorado, a ministra já é vista como continuadora do governo Lula e como uma pessoa firme, convicta e capaz de manter o rumo das mudanças e de avançar nas mudanças. Ela representa a continuidade com avanços.
Apesar das limitações e mesmo das vacilações, o governo Lula abriu um novo ciclo político no país. Na política externa, o Brasil deixou de ser capacho dos EUA – como pregava FHC com sua linha servil do “alinhamento automático” com o império – e passou a adotar uma postura mais soberana e altiva, contribuindo para a integração latino-americana e fortalecendo as relações Sul-Sul. Esta política enterrou o tratado neocolonial da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) e evitou a entrega da base militar de Alcântara (MA) para os EUA, entre outras conquistas.
Já no front interno, mesmo sem alterar o tripé macroeconômico ortodoxo das políticas monetária, fiscal e cambial, o governo passou a jogar um papel mais ativo na economia, com um viés mais desenvolvimentista. Isto é que impediu que a crise mundial do capitalismo, uma das mais graves da sua história, atingisse em cheio o nosso país. O fortalecimento do mercado interno, fruto da valorização do salário mínimo e dos programas sociais, evitou o pior. Um crescimento mais forte gerará milhões de empregos, elevará a renda do trabalhador e reforçara a capacidade indutora do Estado – para desespero dos neoliberais de plantão.
Se forem confirmadas as estimativas de que a economia brasileira crescerá cerca de 6% neste ano, aí é que o Serra se suicida! O grão-tucano FHC, com todos seus diplomas, foi culpado por recordes de desemprego, precarizou o trabalho e reduziu a renda dos brasileiros. O sindicalista Lula, com sua sensibilidade social, enfrentou a crise capitalista com políticas mais heterodoxas, desenvolvimentistas, e gerou recordes de emprego. FHC e Serra devem morrer de inveja! Mais ainda: sabem que isto será fatal para os seus planos de retrocesso neoliberal em 2010.
Não é para menos que a oposição demotucana está desesperada. Ela não tem programa, não tem discurso e ainda está rachada. O falso discurso ético dos novos udenistas, mais sujos do que pau de galinheiro, morreu junto com presidiário demo José Roberto Arruda e com as sujeiras da governadora tucana Yeda Crusius. A crise é tão brava que Serra não consegue nem seduzir um vice. Aécio Neves já oficializou sua candidatura ao senado em Minas Gerais e deu bye-bye ao Serra. O “vice-careca” dos seus sonhos, o demo Arruda, está preso. A coisa está feia para a direita. Sua única esperança é contar com as manipulações terroristas da mídia hegemônica.
Blog da Dilma: Como deverá se comportar a mídia golpista neste ano?
Altamiro Borges: Penso que esta será uma das campanhas mais sujas e torpes da nossa história republicana. Espero estar enganado, mas os sinais são preocupantes. Recentemente, os barões da mídia se reuniram em São Paulo, num seminário organizado por um instituto direitista, a Millenium, para traçar sua tática para a batalha sucessória. Os jagunços da mídia golpista, como Arnaldo Jabor, Reinaldo Azevedo, Demétrio Magnoli e outros, deram a linha. O objetivo é bater para matar em Dilma, é acabar com a esquerda no país, como afirmou o bobo da corte da Rede Globo, o Jabor.
A orgia da Casa Millenium traçou a pauta única da direita midiática para 2010. Na sequência, a revista Veja, este panfleto dos republicanos estadunidense impresso no Brasil, já produziu duas capas para atingir Dilma Rousseff. Na primeira, utilizou como “fonte primária” um promotor que é desprezado pela própria Justiça e já sofreu vários processos, inclusive de enriquecimento ilícito e proteção de contrabandistas. Na segunda, a Veja se superou e usou como “fonte primária” um doleiro famoso, que já esteve envolvido em vários casos de corrupção – escândalo do Banestado, Operação Satiagraha e até no “mensalão dos demos” do Distrito Federal. Haja baixaria.
A tendência é que o clima piore, esquente ainda mais. Há informações de que a mesma revista já produziu reportagens tentando colar em Dilma a imagem de “terrorista”, “assaltante de bancos”. O jornal Folha, da mesma famíglia Frias que emprestou as suas peruas para transportar presos políticos para tortura durante a ditadura militar, já divulgou uma falsa ficha policial contra Dilma – o que deverá ser explorado na campanha. O esquema será do “una solo voz”, como foi rotulado pelos golpistas midiáticos da Venezuela. Uma revista semanal produz um factóide no final de semana; as emissoras de televisão, em especial a TV Globo, amplificam a denúncia para milhões de telespectadores; e os jornais diários depois municiam a oposição. O jogo será pesado.
Blog da Dilma: Por isso que você alertou num artigo para o risco do salto alto?
Altamiro Borges: Exatamente. Não dá para brincar com as elites. As pesquisas hoje são positivas: Dilma cresce de forma consistente e meteórica; José Serra sofre novas quedas e está perdido, sem programa, sem discurso e sem vice. Mas, como brinca José Simão, quem fica parado é poste. A direita não vai assistir passivamente o risco da continuidade da experiência do governo Lula. Ela não tolera a idéia de ficar mais um longo período fora do poder central. Há fortes interesses externos no país. Recentemente, o jornal britânico Guardian noticiou que os EUA torcem – e agem – pela derrota de Lula por discordar da sua política externa soberana, das suas posições sobre o Irã, Cuba, etc.
Mesmo alguns setores empresariais, que lucraram como nunca nos últimos anos, mostrarão suas garras na batalha sucessória. É uma questão de classe, de interesses políticos de classe, de ódio e preconceito de classe. Vide os ruralistas, alguns deles travestidos de modernos empresários do agronegócio. Eles estão babando. Não aceitam o comportamento mais democrático do governo diante dos movimentos sociais. Eles querem sangue, repressão, prisão. É bom analisar a lista dos apoiadores da Casa Millenium, que reúne banqueiros, industriais e o grosso dos barões da mídia.
Numa batalha desta dimensão, penso que é fundamental uma acertada política de alianças, que agregue forças e neutralize possíveis inimigos. Os palanques estaduais amplos serão decisivos. Outra questão essencial é o programa. É preciso deixar explícito o que mudou e no que se pretende avançar nas mudanças. Não pode ser uma simples continuidade. O Brasil ainda tem graves problemas estruturais. Como enfrentar a dramática questão agrária, os graves problemas urbanos, a urgente reforma tributária, a democratização do sistema político, entre outros pontos. Por último, penso que a ministra Dilma deve se aproximar mais dos movimentos sociais. Ele precisa construir uma aliança ampla, mas com um núcleo de esquerda forte.
Blog da Dilma: A aliança do PT com o PMDB beneficia ou não a candidata Dilma?
Altamiro Borges: O PMDB é um partido de centro, um “ônibus”, como dizia Ulysses Guimarães. Ele possui forte capilaridade no país – maior número de prefeitos, vereadores, governadores, deputados estaduais e federais, senadores. Ele tem o maior tempo de televisão na propaganda eleitoral gratuita. O pior que poderia ocorrer era esse partido ser atraído pela oposição neoliberal-conservadora. José Serra sabe disso e utiliza todas suas armas de sedução e cooptação. Qualquer erro de cálculo, qualquer partidismo sectário, pode ser fatal. Na atual correlação de forças, penso que o PMDB é essencial para vitória de Dilma Rousseff e para garantir governabilidade à próxima gestão.
Blog da Dilma: Quais são seus planos para nova Secretaria Nacional da Mídia do PCdoB?
Altamiro Borges: Aos poucos, a esquerda brasileira vai percebendo que a luta pela democratização dos meios de comunicação é uma questão estratégica. Não haverá avanços nas lutas dos trabalhadores, nem maiores defesas diante das ações golpistas da direita, nem a construção da perspectiva socialista sem que se enfrente a ditadura midiática, que manipula informações e deforma comportamentos. A realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação, no ano passado, ajudou a reforçar esta urgente compreensão. As forças de esquerda contribuíram no processo pedagógico da Confecom, que envolveu mais de 30 mil pessoas, e arrancaram conquistas importantes na conferência.
O PCdoB vem debatendo este tema estratégico faz algum tempo. Em outubro de 2007, aprovou resolução propondo medidas concretas para a democratização dos meios de comunicação. Em 2008, incluiu esta questão como uma das seis reformas estruturais que o Brasil necessita com urgência, encarando a comunicação como um direito humano e uma premissa da democracia. A militância comunista procurou, em aliança fraterna com outras forças, contribuir no processo da Confecom. A bancada dos comunistas foi a maior da chamada sociedade civil na conferência.
Em decorrência desta compreensão, o partido decidiu agora montar uma secretaria especial para tratar deste tema. Ela terá basicamente quatro funções: ajudar a construir uma militância coesa e permanente na luta pela democratização dos meios de comunicação; fortalecer os movimentos já existentes e criar novos espaços no combate à ditadura midiática; reforçar as experiências de mídia alternativa no país, que crescem com a internet, as rádios e televisões comunitárias, com a articulação de blogueiros; e ajudar no processo de formação dos comunicadores populares.
Será um desafio muito instigante, em parceria com vários atores que lutam pela democratização do setor e pela construção de mídias alternativas. Nesta luta estratégica, penso que três questões são decisivas: desmascarar a mídia hegemônica, já que não é possível democratizar os veículos dirigidos ditatorialmente pelas famílias Marinho, Civita, Frias, Civita, entre outras; construir e fortalecer os veículos alternativos, como o Blog da Dilma, que façam a disputa de idéias na sociedade; e conquistar leis e políticas públicas que ajudem a enfrentar o monopólio midiático.
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Blog da Dilma: Como você viu o crescimento da ministra Dilma Rousseff nas últimas pesquisas?
Altamiro Borges: Penso que este crescimento reflete os avanços do governo Lula e as dificuldades, ainda que momentâneas, da oposição neoliberal-conversadora. A pesquisa divulgada pelo insuspeito Ibope, um instituto com notórias ligações com os tucanos, confirma a popularidade recorde de Lula e a sua capacidade de transferência de votos para Dilma Rousseff. Mesmo ainda sendo desconhecida por parcelas do eleitorado, a ministra já é vista como continuadora do governo Lula e como uma pessoa firme, convicta e capaz de manter o rumo das mudanças e de avançar nas mudanças. Ela representa a continuidade com avanços.
Apesar das limitações e mesmo das vacilações, o governo Lula abriu um novo ciclo político no país. Na política externa, o Brasil deixou de ser capacho dos EUA – como pregava FHC com sua linha servil do “alinhamento automático” com o império – e passou a adotar uma postura mais soberana e altiva, contribuindo para a integração latino-americana e fortalecendo as relações Sul-Sul. Esta política enterrou o tratado neocolonial da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) e evitou a entrega da base militar de Alcântara (MA) para os EUA, entre outras conquistas.
Já no front interno, mesmo sem alterar o tripé macroeconômico ortodoxo das políticas monetária, fiscal e cambial, o governo passou a jogar um papel mais ativo na economia, com um viés mais desenvolvimentista. Isto é que impediu que a crise mundial do capitalismo, uma das mais graves da sua história, atingisse em cheio o nosso país. O fortalecimento do mercado interno, fruto da valorização do salário mínimo e dos programas sociais, evitou o pior. Um crescimento mais forte gerará milhões de empregos, elevará a renda do trabalhador e reforçara a capacidade indutora do Estado – para desespero dos neoliberais de plantão.
Se forem confirmadas as estimativas de que a economia brasileira crescerá cerca de 6% neste ano, aí é que o Serra se suicida! O grão-tucano FHC, com todos seus diplomas, foi culpado por recordes de desemprego, precarizou o trabalho e reduziu a renda dos brasileiros. O sindicalista Lula, com sua sensibilidade social, enfrentou a crise capitalista com políticas mais heterodoxas, desenvolvimentistas, e gerou recordes de emprego. FHC e Serra devem morrer de inveja! Mais ainda: sabem que isto será fatal para os seus planos de retrocesso neoliberal em 2010.
Não é para menos que a oposição demotucana está desesperada. Ela não tem programa, não tem discurso e ainda está rachada. O falso discurso ético dos novos udenistas, mais sujos do que pau de galinheiro, morreu junto com presidiário demo José Roberto Arruda e com as sujeiras da governadora tucana Yeda Crusius. A crise é tão brava que Serra não consegue nem seduzir um vice. Aécio Neves já oficializou sua candidatura ao senado em Minas Gerais e deu bye-bye ao Serra. O “vice-careca” dos seus sonhos, o demo Arruda, está preso. A coisa está feia para a direita. Sua única esperança é contar com as manipulações terroristas da mídia hegemônica.
Blog da Dilma: Como deverá se comportar a mídia golpista neste ano?
Altamiro Borges: Penso que esta será uma das campanhas mais sujas e torpes da nossa história republicana. Espero estar enganado, mas os sinais são preocupantes. Recentemente, os barões da mídia se reuniram em São Paulo, num seminário organizado por um instituto direitista, a Millenium, para traçar sua tática para a batalha sucessória. Os jagunços da mídia golpista, como Arnaldo Jabor, Reinaldo Azevedo, Demétrio Magnoli e outros, deram a linha. O objetivo é bater para matar em Dilma, é acabar com a esquerda no país, como afirmou o bobo da corte da Rede Globo, o Jabor.
A orgia da Casa Millenium traçou a pauta única da direita midiática para 2010. Na sequência, a revista Veja, este panfleto dos republicanos estadunidense impresso no Brasil, já produziu duas capas para atingir Dilma Rousseff. Na primeira, utilizou como “fonte primária” um promotor que é desprezado pela própria Justiça e já sofreu vários processos, inclusive de enriquecimento ilícito e proteção de contrabandistas. Na segunda, a Veja se superou e usou como “fonte primária” um doleiro famoso, que já esteve envolvido em vários casos de corrupção – escândalo do Banestado, Operação Satiagraha e até no “mensalão dos demos” do Distrito Federal. Haja baixaria.
A tendência é que o clima piore, esquente ainda mais. Há informações de que a mesma revista já produziu reportagens tentando colar em Dilma a imagem de “terrorista”, “assaltante de bancos”. O jornal Folha, da mesma famíglia Frias que emprestou as suas peruas para transportar presos políticos para tortura durante a ditadura militar, já divulgou uma falsa ficha policial contra Dilma – o que deverá ser explorado na campanha. O esquema será do “una solo voz”, como foi rotulado pelos golpistas midiáticos da Venezuela. Uma revista semanal produz um factóide no final de semana; as emissoras de televisão, em especial a TV Globo, amplificam a denúncia para milhões de telespectadores; e os jornais diários depois municiam a oposição. O jogo será pesado.
Blog da Dilma: Por isso que você alertou num artigo para o risco do salto alto?
Altamiro Borges: Exatamente. Não dá para brincar com as elites. As pesquisas hoje são positivas: Dilma cresce de forma consistente e meteórica; José Serra sofre novas quedas e está perdido, sem programa, sem discurso e sem vice. Mas, como brinca José Simão, quem fica parado é poste. A direita não vai assistir passivamente o risco da continuidade da experiência do governo Lula. Ela não tolera a idéia de ficar mais um longo período fora do poder central. Há fortes interesses externos no país. Recentemente, o jornal britânico Guardian noticiou que os EUA torcem – e agem – pela derrota de Lula por discordar da sua política externa soberana, das suas posições sobre o Irã, Cuba, etc.
Mesmo alguns setores empresariais, que lucraram como nunca nos últimos anos, mostrarão suas garras na batalha sucessória. É uma questão de classe, de interesses políticos de classe, de ódio e preconceito de classe. Vide os ruralistas, alguns deles travestidos de modernos empresários do agronegócio. Eles estão babando. Não aceitam o comportamento mais democrático do governo diante dos movimentos sociais. Eles querem sangue, repressão, prisão. É bom analisar a lista dos apoiadores da Casa Millenium, que reúne banqueiros, industriais e o grosso dos barões da mídia.
Numa batalha desta dimensão, penso que é fundamental uma acertada política de alianças, que agregue forças e neutralize possíveis inimigos. Os palanques estaduais amplos serão decisivos. Outra questão essencial é o programa. É preciso deixar explícito o que mudou e no que se pretende avançar nas mudanças. Não pode ser uma simples continuidade. O Brasil ainda tem graves problemas estruturais. Como enfrentar a dramática questão agrária, os graves problemas urbanos, a urgente reforma tributária, a democratização do sistema político, entre outros pontos. Por último, penso que a ministra Dilma deve se aproximar mais dos movimentos sociais. Ele precisa construir uma aliança ampla, mas com um núcleo de esquerda forte.
Blog da Dilma: A aliança do PT com o PMDB beneficia ou não a candidata Dilma?
Altamiro Borges: O PMDB é um partido de centro, um “ônibus”, como dizia Ulysses Guimarães. Ele possui forte capilaridade no país – maior número de prefeitos, vereadores, governadores, deputados estaduais e federais, senadores. Ele tem o maior tempo de televisão na propaganda eleitoral gratuita. O pior que poderia ocorrer era esse partido ser atraído pela oposição neoliberal-conservadora. José Serra sabe disso e utiliza todas suas armas de sedução e cooptação. Qualquer erro de cálculo, qualquer partidismo sectário, pode ser fatal. Na atual correlação de forças, penso que o PMDB é essencial para vitória de Dilma Rousseff e para garantir governabilidade à próxima gestão.
Blog da Dilma: Quais são seus planos para nova Secretaria Nacional da Mídia do PCdoB?
Altamiro Borges: Aos poucos, a esquerda brasileira vai percebendo que a luta pela democratização dos meios de comunicação é uma questão estratégica. Não haverá avanços nas lutas dos trabalhadores, nem maiores defesas diante das ações golpistas da direita, nem a construção da perspectiva socialista sem que se enfrente a ditadura midiática, que manipula informações e deforma comportamentos. A realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação, no ano passado, ajudou a reforçar esta urgente compreensão. As forças de esquerda contribuíram no processo pedagógico da Confecom, que envolveu mais de 30 mil pessoas, e arrancaram conquistas importantes na conferência.
O PCdoB vem debatendo este tema estratégico faz algum tempo. Em outubro de 2007, aprovou resolução propondo medidas concretas para a democratização dos meios de comunicação. Em 2008, incluiu esta questão como uma das seis reformas estruturais que o Brasil necessita com urgência, encarando a comunicação como um direito humano e uma premissa da democracia. A militância comunista procurou, em aliança fraterna com outras forças, contribuir no processo da Confecom. A bancada dos comunistas foi a maior da chamada sociedade civil na conferência.
Em decorrência desta compreensão, o partido decidiu agora montar uma secretaria especial para tratar deste tema. Ela terá basicamente quatro funções: ajudar a construir uma militância coesa e permanente na luta pela democratização dos meios de comunicação; fortalecer os movimentos já existentes e criar novos espaços no combate à ditadura midiática; reforçar as experiências de mídia alternativa no país, que crescem com a internet, as rádios e televisões comunitárias, com a articulação de blogueiros; e ajudar no processo de formação dos comunicadores populares.
Será um desafio muito instigante, em parceria com vários atores que lutam pela democratização do setor e pela construção de mídias alternativas. Nesta luta estratégica, penso que três questões são decisivas: desmascarar a mídia hegemônica, já que não é possível democratizar os veículos dirigidos ditatorialmente pelas famílias Marinho, Civita, Frias, Civita, entre outras; construir e fortalecer os veículos alternativos, como o Blog da Dilma, que façam a disputa de idéias na sociedade; e conquistar leis e políticas públicas que ajudem a enfrentar o monopólio midiático.
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quarta-feira, 24 de março de 2010
O trabalho escravo e a rede Marisa
Já aprovada no Senado, a Proposta de Emenda Constitucional que determina a expropriação das terras e o confisco de bens de empresas flagradas explorando mão-de-obra escrava ainda aguarda votação na Câmara dos Deputados. Para agilizar a sua tramitação, foi criada a Frente Parlamentar pela Erradicação do Trabalho Escravo. O demora na votação desta PEC comprova que ela afeta fortes interesses e que não se trata apenas, como difunde a mídia, de atingir pequenos negócios.
Segundo dados recentes da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ainda há no país mais de 25 mil pessoas vivendo em condições análogas à escravidão. O trabalho escravo da atualidade tem características distintas da escravidão existente na época do Império. Segundo a OIT, ele não pode ser comparado ao trabalho precário ou com baixa remuneração. As pessoas são vítimas do trabalho escravo quando trabalham contra sua vontade e estão sujeitas a penalidades ou sanções.
Escravidão chega aos centros urbanos
No Brasil, esta situação aviltante é encontrada principalmente no campo, o que revela o cinismo dos latifundiários que se travestem de modernos empresários do agronegócio. Os trabalhadores rurais submetidos ao trabalho escravo são impedidos de se descolaram devido ao isolamento geográfico, tornam-se reféns das dívidas fraudulentas e são ameaçados por jagunços armados. Mas o problema não atinge apenas a pecuária (80% dos casos registrados) e a agricultura (17%).
Nos centros urbanos, crescem as denúncias de trabalho escravo. Na semana passada, a rede de lojas Marisa foi autuada em R$ 633 mil pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), após auditores encontrarem funcionários estrangeiros em condições análogas à escravidão numa oficina que presta serviço à poderosa empresa. A Marisa ainda tentou fugir da multa, alegando desconhecimento. Mas os fiscais comprovaram que ela tem controle de todos os processos da cadeia produtiva e que utilizou empresas interpostas para não contratar diretamente os trabalhadores.
Marisa é autuada em R$ 633 mil
O Grupo de Combate à Fraude e à Terceirização Irregular do MTE entregou 43 autos de infração à loja. Eles detalham condições degradantes no ambiente, na segurança e na saúde do trabalhador constatadas na oficina GSV, na Vila Nova Cachoeirinha, zona norte da capital. A fiscalização foi feita em fevereiro por uma equipe de cinco fiscais, após denúncia do Sindicato das Costureiras. Da autuação de R$ 633 mil, mais da metade (R$ 394 mil) se refere a valores sonegados do FGTS de 17 trabalhadores bolivianos e um peruano – que não tinham carteira assinada.
“A Marisa tinha conhecimento do problema e vinha sendo alertada pelos órgãos públicos desde a CPI do Trabalho Escravo, em 2007”, afirma Renato Bignami, chefe da fiscalização do MTE. Sua equipe provou que ela montou “uma cadeia produtiva fraudulenta para mascarar o emprego dos bolivianos. Na oficina GSV, encontramos blusas com etiquetas da Marisa, notas fiscais e, no dia da fiscalização, constatamos que ela trabalhava com exclusividade para a rede”, relata Bignami.
Boicote à rede Marisa
O MTE estima que 10 mil oficinas de São Paulo, que empregam quase 100 mil sul-americanos, também exploram mão-de-obra de forma irregular. Além da Marisa, outras três redes de varejo já estão sob investigação. “Há indícios de outras situações idênticas à constatada na Marisa nas redes C&A, Renner e Riachuelo”, afirma Bignami. Diante da denúncia, alguns sítios já propõem uma campanha de boicote aos produtos da Marisa. Também sugerem que a rede seja incluída na “lista suja” do MTE, com seu nome amplamente divulgado para coibir o uso do trabalho escravo.
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Segundo dados recentes da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ainda há no país mais de 25 mil pessoas vivendo em condições análogas à escravidão. O trabalho escravo da atualidade tem características distintas da escravidão existente na época do Império. Segundo a OIT, ele não pode ser comparado ao trabalho precário ou com baixa remuneração. As pessoas são vítimas do trabalho escravo quando trabalham contra sua vontade e estão sujeitas a penalidades ou sanções.
Escravidão chega aos centros urbanos
No Brasil, esta situação aviltante é encontrada principalmente no campo, o que revela o cinismo dos latifundiários que se travestem de modernos empresários do agronegócio. Os trabalhadores rurais submetidos ao trabalho escravo são impedidos de se descolaram devido ao isolamento geográfico, tornam-se reféns das dívidas fraudulentas e são ameaçados por jagunços armados. Mas o problema não atinge apenas a pecuária (80% dos casos registrados) e a agricultura (17%).
Nos centros urbanos, crescem as denúncias de trabalho escravo. Na semana passada, a rede de lojas Marisa foi autuada em R$ 633 mil pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), após auditores encontrarem funcionários estrangeiros em condições análogas à escravidão numa oficina que presta serviço à poderosa empresa. A Marisa ainda tentou fugir da multa, alegando desconhecimento. Mas os fiscais comprovaram que ela tem controle de todos os processos da cadeia produtiva e que utilizou empresas interpostas para não contratar diretamente os trabalhadores.
Marisa é autuada em R$ 633 mil
O Grupo de Combate à Fraude e à Terceirização Irregular do MTE entregou 43 autos de infração à loja. Eles detalham condições degradantes no ambiente, na segurança e na saúde do trabalhador constatadas na oficina GSV, na Vila Nova Cachoeirinha, zona norte da capital. A fiscalização foi feita em fevereiro por uma equipe de cinco fiscais, após denúncia do Sindicato das Costureiras. Da autuação de R$ 633 mil, mais da metade (R$ 394 mil) se refere a valores sonegados do FGTS de 17 trabalhadores bolivianos e um peruano – que não tinham carteira assinada.
“A Marisa tinha conhecimento do problema e vinha sendo alertada pelos órgãos públicos desde a CPI do Trabalho Escravo, em 2007”, afirma Renato Bignami, chefe da fiscalização do MTE. Sua equipe provou que ela montou “uma cadeia produtiva fraudulenta para mascarar o emprego dos bolivianos. Na oficina GSV, encontramos blusas com etiquetas da Marisa, notas fiscais e, no dia da fiscalização, constatamos que ela trabalhava com exclusividade para a rede”, relata Bignami.
Boicote à rede Marisa
O MTE estima que 10 mil oficinas de São Paulo, que empregam quase 100 mil sul-americanos, também exploram mão-de-obra de forma irregular. Além da Marisa, outras três redes de varejo já estão sob investigação. “Há indícios de outras situações idênticas à constatada na Marisa nas redes C&A, Renner e Riachuelo”, afirma Bignami. Diante da denúncia, alguns sítios já propõem uma campanha de boicote aos produtos da Marisa. Também sugerem que a rede seja incluída na “lista suja” do MTE, com seu nome amplamente divulgado para coibir o uso do trabalho escravo.
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terça-feira, 23 de março de 2010
Tucanos e mídia desviam recursos públicos
Sem maior alarde, o Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (Denasus) acaba de descobrir que três governos tucanos (São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul), além de um apêndice dos demos (Distrito Federal), desviaram recursos do SUS para o mercado financeiro nos últimos quatro anos. O desfalque serviu para incrementar os programas estaduais de ajuste fiscal, como manda a cartilha neoliberal do “choque de gestão”, em detrimento do atendimento à saúde de uma população estimada em 74,8 milhões de habitantes.
Numa excelente reportagem na revista Carta Capital, o jornalista Leandro Fortes denunciou este esquema criminoso. “Ao todo, o prejuízo gerado aos sistemas de saúde desses estados passa de 6,5 bilhões de reais, sem falar nas conseqüências para os seus usuários, justamente os brasileiros mais pobres”, revela. As auditorias do Denasus, feitas nos 26 estados e no DF, foram iniciadas em março de 2009 e entregues ao ministro da Saúde, José Gomes Temporão, em janeiro último. A intenção era saber quanto cada estado recebeu do SUS e o que fez com os recursos federais.
Ética do PPS foi para o esgoto
O primeiro caso de desvio foi descoberto no Distrito Federal. O ex-secretário da Saúde, Augusto Carvalho, expoente do PPS que se jactava de paladino da ética, “aplicou tudo em Certificados de Depósitos Bancários (CDBs). Em março do ano passado, a aplicação somava 238,4 milhões de reais. Parte do dinheiro, segundo investiga o Ministério Público Federal, pode ter sido usada no megaesquema de corrupção que resultou no afastamento e na prisão do governador José Roberto Arruda”. Será difícil o partido de Augusto Carvalho e Roberto Freire voltar a falar em ética.
Já nos governos tucanos de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, os auditores tiveram dificuldades para vasculhar as suas contas. Badalados pela mídia como “gestores modernos”, que zelam pela “transparência nas contas púbicas” eles fizeram de tudo para sabotar a investigação. O Denasus precisou recorrer ao Ministério Público Federal para descobrir que a governadora Yeda Crusius, entrincheirada na sua mansão sob suspeita de corrupção, reteve 164,7 milhões de recursos do SUS em aplicações financeiras até junho de 2009. Afetado atualmente por um surto de dengue, o estado aplicou apenas 0,29% dos seus recursos na vigilância sanitária. Um crime!
Discurso de Serra desmontado
“Com exceção do DF, a maior parte do recurso retido em São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul diz respeito às áreas de vigilância epidemiológica e sanitária, ai incluído os programas de combate à AIDS e outras doenças sexualmente transmissíveis (DSTs). Mas também há dinheiro do SUS no mercado financeiro desses três estados que deveria ter sido utilizado em programas de gestão à saúde e capacitação de profissionais do setor”, denuncia Leandro Fortes.
A investigação complica ainda mais a vida de José Serra. “No caso de São Paulo, a descoberta dos auditores desmonta um discurso muito caro ao governador, virtual candidato do PSDB à Presidência, que costuma vender a imagem de ter sido o mais pródigo dos ministros da Saúde do país, cargo ocupado por ele entre 1998/2000, durante o governo Fernando Henrique Cardoso”, aponta Leandro Fortes. Pelos cálculos do Denasus, apenas em 2007, José Serra deixou de aplicar na saúde R$ 1,1 bilhão. Apesar disto, o Tribunal de Contas do Estado aprovou as suas contas.
Mídia é devedora da Previdência Social
Apesar da gravidade dos fatos denunciados pela Carta Capital, a mídia demotucana tem evitado tratar do assunto. O seu “espírito investigativo” não funciona quando se trata de apurar os crimes da oposição neoliberal-conservadora, principalmente quando afetam o blindado José Serra. Mas, além das razões político-eleitoreiras, o silêncio da mídia tem outros motivos escusos. Ela mesma procura tirar vantagens econômicas do desmonte do setor público. A defesa do “estado mínimo” e contra a “gastança pública” tem também objetivos funcionais, de expropriação explícita.
O sítio Conversa Afiada, do jornalista Paulo Henrique Amorim, denunciou recentemente que os principais veículos de comunicação desfalcam a Previdência Social. Os demo-tucanos roubam a saúde e os barões da mídia roubam os aposentados e os pensionistas. “E depois eles reclamam do déficit da previdência”, ironiza Amorim. Os dados enviados ao blogueiro são bombásticos:
- A Infoglobo Comunicações, empresa das Organizações Globo, tem nove processos por dívidas com a Previdência Social, totalizando R$ 17.664.500,51;
- A Editora Abril deve R$ 1.169.560,41;
- A Rádio e Televisão Bandeirantes tem sete processos, totalizando R$ 2.646.664,15, sendo que três deles são de “Pedido de Penhora e/ou Reforço de Penhora”;
- A Folha de S.Paulo tem quinze processos e deve à Previdência Social R$ R$ 3.740.776,10;
- O Estado de S.Paulo tem dois processos e deve R$ 2.078.955,87;
- A Editora Globo tem dois processos e deve R$ 2.078.955,87.
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Numa excelente reportagem na revista Carta Capital, o jornalista Leandro Fortes denunciou este esquema criminoso. “Ao todo, o prejuízo gerado aos sistemas de saúde desses estados passa de 6,5 bilhões de reais, sem falar nas conseqüências para os seus usuários, justamente os brasileiros mais pobres”, revela. As auditorias do Denasus, feitas nos 26 estados e no DF, foram iniciadas em março de 2009 e entregues ao ministro da Saúde, José Gomes Temporão, em janeiro último. A intenção era saber quanto cada estado recebeu do SUS e o que fez com os recursos federais.
Ética do PPS foi para o esgoto
O primeiro caso de desvio foi descoberto no Distrito Federal. O ex-secretário da Saúde, Augusto Carvalho, expoente do PPS que se jactava de paladino da ética, “aplicou tudo em Certificados de Depósitos Bancários (CDBs). Em março do ano passado, a aplicação somava 238,4 milhões de reais. Parte do dinheiro, segundo investiga o Ministério Público Federal, pode ter sido usada no megaesquema de corrupção que resultou no afastamento e na prisão do governador José Roberto Arruda”. Será difícil o partido de Augusto Carvalho e Roberto Freire voltar a falar em ética.
Já nos governos tucanos de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, os auditores tiveram dificuldades para vasculhar as suas contas. Badalados pela mídia como “gestores modernos”, que zelam pela “transparência nas contas púbicas” eles fizeram de tudo para sabotar a investigação. O Denasus precisou recorrer ao Ministério Público Federal para descobrir que a governadora Yeda Crusius, entrincheirada na sua mansão sob suspeita de corrupção, reteve 164,7 milhões de recursos do SUS em aplicações financeiras até junho de 2009. Afetado atualmente por um surto de dengue, o estado aplicou apenas 0,29% dos seus recursos na vigilância sanitária. Um crime!
Discurso de Serra desmontado
“Com exceção do DF, a maior parte do recurso retido em São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul diz respeito às áreas de vigilância epidemiológica e sanitária, ai incluído os programas de combate à AIDS e outras doenças sexualmente transmissíveis (DSTs). Mas também há dinheiro do SUS no mercado financeiro desses três estados que deveria ter sido utilizado em programas de gestão à saúde e capacitação de profissionais do setor”, denuncia Leandro Fortes.
A investigação complica ainda mais a vida de José Serra. “No caso de São Paulo, a descoberta dos auditores desmonta um discurso muito caro ao governador, virtual candidato do PSDB à Presidência, que costuma vender a imagem de ter sido o mais pródigo dos ministros da Saúde do país, cargo ocupado por ele entre 1998/2000, durante o governo Fernando Henrique Cardoso”, aponta Leandro Fortes. Pelos cálculos do Denasus, apenas em 2007, José Serra deixou de aplicar na saúde R$ 1,1 bilhão. Apesar disto, o Tribunal de Contas do Estado aprovou as suas contas.
Mídia é devedora da Previdência Social
Apesar da gravidade dos fatos denunciados pela Carta Capital, a mídia demotucana tem evitado tratar do assunto. O seu “espírito investigativo” não funciona quando se trata de apurar os crimes da oposição neoliberal-conservadora, principalmente quando afetam o blindado José Serra. Mas, além das razões político-eleitoreiras, o silêncio da mídia tem outros motivos escusos. Ela mesma procura tirar vantagens econômicas do desmonte do setor público. A defesa do “estado mínimo” e contra a “gastança pública” tem também objetivos funcionais, de expropriação explícita.
O sítio Conversa Afiada, do jornalista Paulo Henrique Amorim, denunciou recentemente que os principais veículos de comunicação desfalcam a Previdência Social. Os demo-tucanos roubam a saúde e os barões da mídia roubam os aposentados e os pensionistas. “E depois eles reclamam do déficit da previdência”, ironiza Amorim. Os dados enviados ao blogueiro são bombásticos:
- A Infoglobo Comunicações, empresa das Organizações Globo, tem nove processos por dívidas com a Previdência Social, totalizando R$ 17.664.500,51;
- A Editora Abril deve R$ 1.169.560,41;
- A Rádio e Televisão Bandeirantes tem sete processos, totalizando R$ 2.646.664,15, sendo que três deles são de “Pedido de Penhora e/ou Reforço de Penhora”;
- A Folha de S.Paulo tem quinze processos e deve à Previdência Social R$ R$ 3.740.776,10;
- O Estado de S.Paulo tem dois processos e deve R$ 2.078.955,87;
- A Editora Globo tem dois processos e deve R$ 2.078.955,87.
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segunda-feira, 22 de março de 2010
“Babaca” do Otavinho e a política externa
O chefão da Folha, Otavio Frias Filho, saiu da moita para atacar pessoalmente a política externa do governo Lula. Antes, ele terceirizava esta tarefa para seus jagunços de aluguel. Mas, parece, Otavinho está muito preocupado com a postura “ingênua e errática” do Itamaraty. O seu temor é que ela agrave as tensões com os EUA, o império tão endeusado pelas elites nativas. Para ele, o Brasil não deveria se intrometer nos conflitos internacionais, em especial no Oriente Médio.
Em artigo publicado na semana passada, ele soltou várias pérolas do servilismo colonizado. Ele avalia que o atual governo só comete erros na política externa – bem diferente do que pensam famosas lideranças mundiais, que inclusive passaram a defender o nome de Lula para secretário-geral da ONU. “Talvez seja a nossa inexperiência no palco do mundo, combinada à afoiteza do governo Lula em projetar a todo custo o peso geopolítico que o país já alcançou, o que nos leva a cometer equívocos em cascata e enveredar por um caminho temerário”, afirmou o sabichão.
Porta-voz do império e dos sionistas
Como porta-voz do império, Otavinho opina que os EUA “influem e se intrometem nos conflitos [do Oriente Médio] não para pavonear seu peso mundial, como parecem supor o nosso simplório presidente e o seu trêfego chanceler”. Dependente do petróleo, o império teria motivos reais para interferir; já o Brasil, uma nação periférica, deveria ficar caladinho no seu canto. Ele critica ainda a postura mais altiva do governo Lula na questão palestina. “A nossa ‘diplomacia do futebol’ tem pouco a fazer ali, exceto passar ridículo”, garante Otavinho, que mais parece um lobista sionista.
Ele também rejeita qualquer relação do Brasil com o Irã. “O que estamos fazendo é uma política errática, cheia de distorções seletivas, de modo que a questão dos direitos humanos, por exemplo, deixa de ter qualquer valor no trato com inimigos de Washington, os quais adulamos para sermos vistos como ‘independentes’”. Para ele, esta conduta é pura provocação. Ele lembra que o novo embaixador dos EUA no Brasil, Thomas Shannon, recentemente fez ameaças veladas ao governo Lula. “Vamos começar a nos esbarrar por ai”, rosnou o prepotente serviçal de Barack Obama.
Otavinho para chanceler de Serra
Otavinho deve ter urinado nas calças. “Não precisamos buscar sarnas para nos coçar”, lamuriou. Por isso, ele propõe uma postura mais passiva e dócil da diplomacia brasileira, talvez um retorno ao “alinhamento automático” de FHC com os EUA. “Vamos confrontar os Estados Unidos, sim, e cada vez mais. Mas vamos fazê-lo quando for relevante ao Brasil, não para realizar as fantasias ideológicas da militância que aplaude o presidente Lula e seu chanceler Celso Amorim, o qual errou mais uma vez quando se filiou no ano passado ao PT. Chanceler não deveria ter partido”.
Por que o diretor da Folha nunca criticou Celso Lafer, o chanceler de FHC que ficou famoso ao tirar seus sapatinhos nos aeroportos dos EUA num gesto de servilismo, por ele ser um quadro do PSDB? Já que propõe cautela diante do império, por que não aproveitou para criticar a chanceler Hilary Clinton pela liderança no Partido Democrata dos EUA? Será que o “simplório” Otavinho – no dicionário, o termo também equivale a “tolo” e a “babaca” – já estaria postulando a vaga de ministro das Relações Exteriores num futuro, e cada vez mais distante, governo José Serra?
Por coincidência, na mesma semana em que Otavinho saiu da moita, o ex-presidente FHC voltou à carga contra a política externa do governo Lula. A insônia de José Serra deve ter se piorado, já que cada vez que ele arrota as suas besteiras, o presidenciável tucano perde pontos nas pesquisas. Numa palestra na Academia Brasileira de Letras, registrada na FSP (Folha Serra Presidente), ele pregou “uma relação mais estreita com os Estados Unidos” e defendeu que o Brasil exerça uma “ação de moderação na América Latina” – com certeza, contra o “radicalismo” de Hugo Chávez, Evo Morales, Raul Castro e outros governantes da região. Otavinho, FHC e Serra se merecem!
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Em artigo publicado na semana passada, ele soltou várias pérolas do servilismo colonizado. Ele avalia que o atual governo só comete erros na política externa – bem diferente do que pensam famosas lideranças mundiais, que inclusive passaram a defender o nome de Lula para secretário-geral da ONU. “Talvez seja a nossa inexperiência no palco do mundo, combinada à afoiteza do governo Lula em projetar a todo custo o peso geopolítico que o país já alcançou, o que nos leva a cometer equívocos em cascata e enveredar por um caminho temerário”, afirmou o sabichão.
Porta-voz do império e dos sionistas
Como porta-voz do império, Otavinho opina que os EUA “influem e se intrometem nos conflitos [do Oriente Médio] não para pavonear seu peso mundial, como parecem supor o nosso simplório presidente e o seu trêfego chanceler”. Dependente do petróleo, o império teria motivos reais para interferir; já o Brasil, uma nação periférica, deveria ficar caladinho no seu canto. Ele critica ainda a postura mais altiva do governo Lula na questão palestina. “A nossa ‘diplomacia do futebol’ tem pouco a fazer ali, exceto passar ridículo”, garante Otavinho, que mais parece um lobista sionista.
Ele também rejeita qualquer relação do Brasil com o Irã. “O que estamos fazendo é uma política errática, cheia de distorções seletivas, de modo que a questão dos direitos humanos, por exemplo, deixa de ter qualquer valor no trato com inimigos de Washington, os quais adulamos para sermos vistos como ‘independentes’”. Para ele, esta conduta é pura provocação. Ele lembra que o novo embaixador dos EUA no Brasil, Thomas Shannon, recentemente fez ameaças veladas ao governo Lula. “Vamos começar a nos esbarrar por ai”, rosnou o prepotente serviçal de Barack Obama.
Otavinho para chanceler de Serra
Otavinho deve ter urinado nas calças. “Não precisamos buscar sarnas para nos coçar”, lamuriou. Por isso, ele propõe uma postura mais passiva e dócil da diplomacia brasileira, talvez um retorno ao “alinhamento automático” de FHC com os EUA. “Vamos confrontar os Estados Unidos, sim, e cada vez mais. Mas vamos fazê-lo quando for relevante ao Brasil, não para realizar as fantasias ideológicas da militância que aplaude o presidente Lula e seu chanceler Celso Amorim, o qual errou mais uma vez quando se filiou no ano passado ao PT. Chanceler não deveria ter partido”.
Por que o diretor da Folha nunca criticou Celso Lafer, o chanceler de FHC que ficou famoso ao tirar seus sapatinhos nos aeroportos dos EUA num gesto de servilismo, por ele ser um quadro do PSDB? Já que propõe cautela diante do império, por que não aproveitou para criticar a chanceler Hilary Clinton pela liderança no Partido Democrata dos EUA? Será que o “simplório” Otavinho – no dicionário, o termo também equivale a “tolo” e a “babaca” – já estaria postulando a vaga de ministro das Relações Exteriores num futuro, e cada vez mais distante, governo José Serra?
Por coincidência, na mesma semana em que Otavinho saiu da moita, o ex-presidente FHC voltou à carga contra a política externa do governo Lula. A insônia de José Serra deve ter se piorado, já que cada vez que ele arrota as suas besteiras, o presidenciável tucano perde pontos nas pesquisas. Numa palestra na Academia Brasileira de Letras, registrada na FSP (Folha Serra Presidente), ele pregou “uma relação mais estreita com os Estados Unidos” e defendeu que o Brasil exerça uma “ação de moderação na América Latina” – com certeza, contra o “radicalismo” de Hugo Chávez, Evo Morales, Raul Castro e outros governantes da região. Otavinho, FHC e Serra se merecem!
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domingo, 21 de março de 2010
Samuel Pinheiro responde ao Estadão
O jornal O Estado de S.Paulo não faz entrevistas, mas sim “fuzila” seus adversários políticos. Neste domingo, a publicação da oligárquica famíglia Mesquita tentou encurralar o “ex-número 2 do Itamaraty e sucessor do ministro Mangabeira Unger na Secretaria de Assuntos Estratégicos, Samuel Pinheiro Guimarães”. Ele é apresentado como “ideólogo da política externa do governo Luiz Inácio Lula da Silva” e as perguntas disparadas parecem de inquisitores – não de jornalistas. Mas o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães nunca foi de se curvar diante dos prepotentes.
Tive o primeiro contato com ele num Congresso dos Farmacêuticos da América Latina, promovido pela Fenafar em Florianópolis. Pouco antes, ele havia sido exonerado pelo ex-presidente FHC do cargo do coordenador do Instituto de Pesquisas em Relações Internacionais (IPRI), vinculado ao Itamaraty, por ter sido o pioneiro na denúncia da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA). Na sequência, participamos de vários debates contra a assinatura deste tratado neocolonial dos EUA. Tive a honra de escrever com ele o livro “Para entender e combater a Alca”. Fiquei muito feliz quando soube da sua nomeação para secretário-geral do Ministério de Relaçoes Exteriores.
Na entrevista ao Estadão, Samuel Pinheiro Guimarães demonstra que não perdeu sua coerência e sua combatividade. É um patriota convicto, um homem que defende soberania nacional e os interesses do Brasil. O título da matéria já revela sua altivez, para desgosto da famíglia Mesquita – “Quem invadiu o Iraque não tem moral para cobrar o Irã”. Reproduzo a entrevista abaixo:
Por que o Brasil não assina o protocolo adicional do TNP [Tratado de Não-Proliferação Nuclear]?
O Brasil tem a sexta maior reserva de urânio do mundo e o conhecimento completo do ciclo de enriquecimento. Nossa Constituição obriga o uso de tecnologia nuclear somente para fins pacíficos e é preciso lembrar que o TNP, do qual somos signatários, tem duas partes. De um lado, o compromisso dos países nucleares de promover seu próprio desarmamento - e completo. De outro, países não nuclearmente armados se comprometem a não desenvolver a bomba, mas têm o direito a programas para fins pacíficos, incluindo com enriquecimento de urânio. A primeira parte do TNP não foi cumprida, mas os desenvolvidos exigem dos outros o cumprimento estrito de suas obrigações.
O presidente Barack Obama prometeu cortes drásticos nos arsenais americanos. EUA e Rússia estão prestes a concluir um acordo que substituirá o START e terá reduções significativas, e nos próximos meses haverá duas cúpulas sobre o tema. Há sinais claros de desarmamento. Isso não pode mudar a posição brasileira?
Mas existe ainda outro problema, a da redução de ogivas e de aperfeiçoamento da letalidade do armamento. Deveríamos ter um protocolo adicional para países que continuam a desenvolver armamento nuclear e não cumprem suas obrigações. Quem não cumpre o TNP não tem moral para cobrar os outros. Sem contar que há países armados dos quais não se exige nada, muitos nem signatários do TNP são.
O sr. se refere a Israel?
Tire suas conclusões.
O sr. já escreveu que o "TNP é apresentado como uma vitória pacifista e progressista", mas na verdade trata-se de "uma violência unilateral". O sr. mantém essa visão?
Usei essa expressão "violência unilateral"? Estranho. De todo modo, o TNP visa impedir uma guerra nuclear, não apenas a "proliferação horizontal". Não se pode partir do princípio de que são os desarmados que ameaçam a paz internacional. Isso não é lógico.
O País aderiu ao pacto sob o governo de FHC. Foi um erro?
O Brasil, já em 1998, era um dos poucos que tinha em sua Constituição a obrigação de desenvolver atividades nucleares apenas para fins pacíficos. Só se justifica nossa participação no TNP na medida em que potências nucleares reduzam e eliminem arsenais.
Mas o sr. não se arriscaria a dizer que foi um erro assinar o tratado.
Não é que não me arriscaria. Mas é preciso observar a Constituição. E qualquer tratado em que o Brasil não esteja em igualdade de condições não corresponde ao princípio de igualdade soberana entre os Estados. O TNP é um tratado desigual.
Existe, então, a possibilidade de o Brasil denunciar o tratado?
De maneira nenhuma.
O sr. disse que quem não cumpre o TNP não tem "autoridade moral" para exigir dos outros. O presidente Lula usou uma expressão semelhante para se referir ao caso iraniano, disse que as potências "não tem superioridade moral para cobrar o Irã".
Eu concordo com o presidente. E lhe acrescento: antes da segunda guerra do Iraque (em 2003), foi propalado em todos os países que Bagdá tinha armas de destruição em massa e, por isso, seria uma ameaça internacional. Diziam que armas iraquianas destruiriam capitais europeias em segundos. O sr. Colin Powell (então secretário de Estado dos EUA) discursou com fotos no Conselho de Segurança da ONU. O Iraque foi invadido e não foi descoberta nenhuma arma de destruição em massa. Isso dá moral a alguém?
Mas o caso do Irã é muito distinto do iraquiano. Hoje sabe-se, por exemplo, que iranianos esconderam uma usina nuclear por anos na cidade de Qom. O sr. realmente acredita que Teerã negocia de boa-fé?
Não participamos diretamente das negociações. O Brasil acredita no diálogo e defende que o uso da força é improdutivo. Não podemos partir do princípio de que há países responsáveis e outros irresponsáveis. Mas não quero falar de política externa, quem se encarrega disso é o Ministério das Relações Exteriores.
Em 2001, o então chanceler Celso Lafer o destituiu do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais do Itamaraty depois que o sr. veio a público criticar a Alca. Como o sr. vê, hoje, esse episódio?
Cumpri o que achei que devia fazer. Julguei que se tratava de um momento de perigo à soberania brasileira. Por isso dei minha opinião.
Ao olhar para trás, o sr. acredita que essa posição foi correta?
Corretíssima. A adoção de um acordo como Alca - com tarifas a zero, impossibilidade de controle de fluxo de capitais, total abertura - teria levado, por exemplo, à privatização de todo sistema financeiro. Privatizariam o BNDES, Banco do Brasil, Petrobrás; instrumentos que foram de grande importância na crise financeira. Há muitos anos, um sociólogo brasileiro disse: "o Brasil não é mais um país subdesenvolvido, é um país injusto." (A frase iniciava o plano de governo de FHC). Esse pensamento denota que podemos ter políticas econômicas de países desenvolvidos. Isso tem uma implicação horrível do ponto de vista de conhecimento da realidade.
A política externa está excessivamente partidarizada? Como o sr. vê, por exemplo, o fato de o chanceler Celso Amorim ter se filiado ao PT?
Outros chanceleres foram de partidos. Ou não? Nesse Ministério das Relações Exteriores, nenhum funcionário que exerceu cargos importantes em outros governos foi prejudicado. Basta ver onde estão servindo. Não houve perseguição.
Há ex-funcionários que fazem forte oposição, como o embaixador Rubens Barbosa.
Mas esses são aposentados. E têm todo direito de fazer oposição. Eu não tenho oposição à oposição (risos). Esse é um debate saudável e o fato de ele ter crescido reflete o próprio êxito da política externa. Não se discute tema desimportante.
O ex-chanceler mexicano Jorge Castañeda afirmou que foi o sr. quem arquitetou a volta do presidente deposto Manuel Zelaya a Honduras.
Não conheço o ex-chanceler. Nunca o vi na minha vida e não tenho a menor ideia de onde ele tirou isso. Se me lembro bem do texto, ele diz algo como "isso (a volta de Zelaya) é algo que só pode ter saído da cabeça de Pinheiro Guimarães".
E o sr. avalia que o retorno de Zelaya foi bom para Honduras?
Não falo de política externa.
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Tive o primeiro contato com ele num Congresso dos Farmacêuticos da América Latina, promovido pela Fenafar em Florianópolis. Pouco antes, ele havia sido exonerado pelo ex-presidente FHC do cargo do coordenador do Instituto de Pesquisas em Relações Internacionais (IPRI), vinculado ao Itamaraty, por ter sido o pioneiro na denúncia da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA). Na sequência, participamos de vários debates contra a assinatura deste tratado neocolonial dos EUA. Tive a honra de escrever com ele o livro “Para entender e combater a Alca”. Fiquei muito feliz quando soube da sua nomeação para secretário-geral do Ministério de Relaçoes Exteriores.
Na entrevista ao Estadão, Samuel Pinheiro Guimarães demonstra que não perdeu sua coerência e sua combatividade. É um patriota convicto, um homem que defende soberania nacional e os interesses do Brasil. O título da matéria já revela sua altivez, para desgosto da famíglia Mesquita – “Quem invadiu o Iraque não tem moral para cobrar o Irã”. Reproduzo a entrevista abaixo:
Por que o Brasil não assina o protocolo adicional do TNP [Tratado de Não-Proliferação Nuclear]?
O Brasil tem a sexta maior reserva de urânio do mundo e o conhecimento completo do ciclo de enriquecimento. Nossa Constituição obriga o uso de tecnologia nuclear somente para fins pacíficos e é preciso lembrar que o TNP, do qual somos signatários, tem duas partes. De um lado, o compromisso dos países nucleares de promover seu próprio desarmamento - e completo. De outro, países não nuclearmente armados se comprometem a não desenvolver a bomba, mas têm o direito a programas para fins pacíficos, incluindo com enriquecimento de urânio. A primeira parte do TNP não foi cumprida, mas os desenvolvidos exigem dos outros o cumprimento estrito de suas obrigações.
O presidente Barack Obama prometeu cortes drásticos nos arsenais americanos. EUA e Rússia estão prestes a concluir um acordo que substituirá o START e terá reduções significativas, e nos próximos meses haverá duas cúpulas sobre o tema. Há sinais claros de desarmamento. Isso não pode mudar a posição brasileira?
Mas existe ainda outro problema, a da redução de ogivas e de aperfeiçoamento da letalidade do armamento. Deveríamos ter um protocolo adicional para países que continuam a desenvolver armamento nuclear e não cumprem suas obrigações. Quem não cumpre o TNP não tem moral para cobrar os outros. Sem contar que há países armados dos quais não se exige nada, muitos nem signatários do TNP são.
O sr. se refere a Israel?
Tire suas conclusões.
O sr. já escreveu que o "TNP é apresentado como uma vitória pacifista e progressista", mas na verdade trata-se de "uma violência unilateral". O sr. mantém essa visão?
Usei essa expressão "violência unilateral"? Estranho. De todo modo, o TNP visa impedir uma guerra nuclear, não apenas a "proliferação horizontal". Não se pode partir do princípio de que são os desarmados que ameaçam a paz internacional. Isso não é lógico.
O País aderiu ao pacto sob o governo de FHC. Foi um erro?
O Brasil, já em 1998, era um dos poucos que tinha em sua Constituição a obrigação de desenvolver atividades nucleares apenas para fins pacíficos. Só se justifica nossa participação no TNP na medida em que potências nucleares reduzam e eliminem arsenais.
Mas o sr. não se arriscaria a dizer que foi um erro assinar o tratado.
Não é que não me arriscaria. Mas é preciso observar a Constituição. E qualquer tratado em que o Brasil não esteja em igualdade de condições não corresponde ao princípio de igualdade soberana entre os Estados. O TNP é um tratado desigual.
Existe, então, a possibilidade de o Brasil denunciar o tratado?
De maneira nenhuma.
O sr. disse que quem não cumpre o TNP não tem "autoridade moral" para exigir dos outros. O presidente Lula usou uma expressão semelhante para se referir ao caso iraniano, disse que as potências "não tem superioridade moral para cobrar o Irã".
Eu concordo com o presidente. E lhe acrescento: antes da segunda guerra do Iraque (em 2003), foi propalado em todos os países que Bagdá tinha armas de destruição em massa e, por isso, seria uma ameaça internacional. Diziam que armas iraquianas destruiriam capitais europeias em segundos. O sr. Colin Powell (então secretário de Estado dos EUA) discursou com fotos no Conselho de Segurança da ONU. O Iraque foi invadido e não foi descoberta nenhuma arma de destruição em massa. Isso dá moral a alguém?
Mas o caso do Irã é muito distinto do iraquiano. Hoje sabe-se, por exemplo, que iranianos esconderam uma usina nuclear por anos na cidade de Qom. O sr. realmente acredita que Teerã negocia de boa-fé?
Não participamos diretamente das negociações. O Brasil acredita no diálogo e defende que o uso da força é improdutivo. Não podemos partir do princípio de que há países responsáveis e outros irresponsáveis. Mas não quero falar de política externa, quem se encarrega disso é o Ministério das Relações Exteriores.
Em 2001, o então chanceler Celso Lafer o destituiu do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais do Itamaraty depois que o sr. veio a público criticar a Alca. Como o sr. vê, hoje, esse episódio?
Cumpri o que achei que devia fazer. Julguei que se tratava de um momento de perigo à soberania brasileira. Por isso dei minha opinião.
Ao olhar para trás, o sr. acredita que essa posição foi correta?
Corretíssima. A adoção de um acordo como Alca - com tarifas a zero, impossibilidade de controle de fluxo de capitais, total abertura - teria levado, por exemplo, à privatização de todo sistema financeiro. Privatizariam o BNDES, Banco do Brasil, Petrobrás; instrumentos que foram de grande importância na crise financeira. Há muitos anos, um sociólogo brasileiro disse: "o Brasil não é mais um país subdesenvolvido, é um país injusto." (A frase iniciava o plano de governo de FHC). Esse pensamento denota que podemos ter políticas econômicas de países desenvolvidos. Isso tem uma implicação horrível do ponto de vista de conhecimento da realidade.
A política externa está excessivamente partidarizada? Como o sr. vê, por exemplo, o fato de o chanceler Celso Amorim ter se filiado ao PT?
Outros chanceleres foram de partidos. Ou não? Nesse Ministério das Relações Exteriores, nenhum funcionário que exerceu cargos importantes em outros governos foi prejudicado. Basta ver onde estão servindo. Não houve perseguição.
Há ex-funcionários que fazem forte oposição, como o embaixador Rubens Barbosa.
Mas esses são aposentados. E têm todo direito de fazer oposição. Eu não tenho oposição à oposição (risos). Esse é um debate saudável e o fato de ele ter crescido reflete o próprio êxito da política externa. Não se discute tema desimportante.
O ex-chanceler mexicano Jorge Castañeda afirmou que foi o sr. quem arquitetou a volta do presidente deposto Manuel Zelaya a Honduras.
Não conheço o ex-chanceler. Nunca o vi na minha vida e não tenho a menor ideia de onde ele tirou isso. Se me lembro bem do texto, ele diz algo como "isso (a volta de Zelaya) é algo que só pode ter saído da cabeça de Pinheiro Guimarães".
E o sr. avalia que o retorno de Zelaya foi bom para Honduras?
Não falo de política externa.
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Caiu a casa do jornalismo da Veja
Reproduzo artigo do midialivrista Gustavo Barreto, editor do sítio Consciência.net:
É no mínimo curioso que o promotor de Justiça José Carlos Blat, fonte primária da “reportagem” da Veja contra o PT (edição de 10/03/2010)), já tenha pedido à própria Veja ressarcimento por danos morais no valor de R$ 20 mil, alegando que a revista extrapolou o direito de liberdade de informação e violou a sua honra, ao qualificá-lo como “pioneiro da era dos promotores heróis”.
A matéria que causou o litígio entre Blat e Veja é de 5 de fevereiro de 2006, sob o título “Intocável sob suspeita”, e sustento ser importante começar por este relato para chegar ao caso atual da Bancoop. Ela abordava processos administrativos aos quais o promotor respondia no Ministério Público de São Paulo. Blat perdeu: “Duarte Camacho [juiz da 4ª Vara Cível de São Paulo] entendeu que a revista apenas noticiou um inquérito verídico que envolvia uma figura pública”. Cabia recurso.
Relatou o juiz na sentença de dezembro de 2008: “Os procedimentos administrativos narrados na reportagem são verdadeiros. A reportagem divulgou a notícia dos procedimentos administrativos respondidos pelo autor porque o autor é um profissional que, freqüentemente, está na mídia em razão do seu trabalho”. E ainda: “O magistrado ressaltou que, assim como os grupos criminosos que o promotor combate estão expostos aos holofotes da mídia, Blat também deveria estar acostumado a ser notícia”.
Acusações contra Blat
Na edição citada, os “procedimentos administrativos respondidos pelo autor”, segundo o juiz, são os seguintes:
Acusação 1: “Em 1998, entrou para o Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), do qual foi afastado em 2004, em circunstâncias confusas. A Corregedoria o investigava por uma tentativa de livrar-se de multas no Detran e por um episódio estranho em que um carro oficial do Gaeco foi apreendido fora da cidade de São Paulo – com um criminoso ao volante. No fim de 2004, a Corregedoria do Ministério Público decidiu levar essas investigações a fundo. Ouviu o depoimento de onze pessoas, entre elas quatro promotores. Com base nesses depoimentos e em documentos levantados, a Corregedoria disse ter encontrado indícios de crimes mais graves”.
Acusação 2: “As primeiras investigações contra Blat colocaram em xeque suas ações contra desmanches de veículos roubados. Promotores afirmaram que uma seguradora de veículos indicava quais locais deveriam ser invadidos e quem deveria ser preso. Nessas ações três funcionários dessa seguradora apresentavam-se como peritos. Todo o estoque era apreendido e, em vez de seguir para a polícia, a maior parte das peças era desviada para depósito de terceiros”.
Acusação 3: “Blat também foi acusado de proteger o contrabandista chinês Law Kin Chong, preso em São Paulo. Em 2002, quando participou de uma força-tarefa antipirataria, ele teria dirigido o foco da investigação somente contra os pequenos contrabandistas, deixando Law livre para atuar. Uma advogada que trabalhava para o contrabandista visitava Blat periodicamente no Gaeco”.
Acusação 4: “As investigações descobriram ainda que Blat mora num apartamento de Alfredo Parisi, que já foi condenado por bancar o jogo do bicho. Blat admite que, antes de se tornar promotor, foi sócio do filho de Ivo Noal, outro banqueiro do bicho, numa loja de conveniência – o que não é crime”.
Acusação 5: “Os bens do promotor também entraram na mira da Corregedoria. Segundo os depoimentos, Blat comprou de uma só tacada dois carros importados e blindados. A Corregedoria recebeu denúncia de que um apartamento no Guarujá também seria de Blat. Mais tarde, descobriu-se que, na verdade, estava em nome do ex-sogro do promotor, René Pereira de Carvalho, um procurador de Justiça. Carvalho tentou pagar 200.000 reais em dinheiro vivo, mas, diante da recusa da vendedora, usou cheques administrativos. A origem dos recursos não foi esclarecida. Por isso foi aberto um inquérito específico sobre seu patrimônio”.
A revista Veja conclui:
“Sobre Blat pesam também as seguintes suspeitas: usar veículos e pessoal do Gaeco para interesses pessoais, negociar com um delegado a liberação de seu pai, que teria sido preso em flagrante por armazenar bens roubados, abuso de autoridade, truculência e suspeita de enriquecimento ilícito. É possível que Pinho esteja correto, e que nenhum crime tenha sido cometido. No entanto, por muito menos, políticos e empresários são duramente investigados pelo Ministério Público paulista – é o caso do ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Enquanto seu destino no Ministério Público não é definido, Blat já traça outros planos. Disse a Veja: ‘Eu me desiludi com o Ministério Público. Estou pensando em me candidatar a deputado federal’”.
Isso foi em 2006. Blat estava pensando em virar político, oficialmente. Agora, em 2010, Blat diz outra coisa, conforme nota no site Consultor Jurídico: “Estou fazendo meu trabalho. Um trabalho técnico. E não tenho nenhuma simpatia por partido algum. Não sou tucano nem petista, nem nada… É sempre a mesma coisa. O que acontece é que quando você investiga um caso envolvendo um partido A, eles te acusam de trabalhar para o partido B. Na verdade, eu só trabalho para o Ministério Público”.
Resta saber por qual partido o promotor estava “pensando” em se candidatar. Ou então precisa avisar urgentemente que, para se candidatar, é preciso ter partido.
Sobre a reportagem da Bancoop
A reportagem de Veja é até engraçada ao deduzir que já é lugar comum petista saindo por aí com dinheiro na meia, na cueca etc.: “Os depoimentos colhidos pelo MP indicam que o esquema de desvio de dinheiro da Bancoop obedeceu a uma trajetória que já se tornou um clássico petista. Começou para abastecer campanhas eleitorais do partido e acabou servindo para atender a interesses particulares de petista”.
O “clássico petista” é, entre outras expressões, uma das que me faz pensar por que pessoas com massa cinzenta (responsável por processar a informação no cérebro) ainda leem a Veja. Seria desinteresse pela política? A revista é inútil, um mero panfleto político, financiada por um segmento empresarial-partidário e que só age em prol de seus interesses particulares.
É óbvio que qualquer cidadão com senso ético deseja a punição de todo e qualquer corrupto e, especificamente neste caso, também a Justiça às famílias que investiram pesado no sonho de ter uma casa própria. Mas acreditar que a solução é transformar todo e qualquer problema em plataforma eleitoral é uma piada de mau gosto. Jornalismo marrom, nada mais do que isso.
A “reportagem” nem sequer ouviu os acusados. É absolutamente inacreditável. No mínimo, os leitores inteligentes (e não creio que são todos) da revista gostariam de saber o que falam os acusados. E por que Veja não considerou entrevistá-los? Simples: por que a “reportagem” poderia cair. Por que Veja teme o contraditório?
Eu fui atrás desta informação. A Bancoop emitiu uma nota. O primeiro parágrafo é uma vergonha para os jornalistas, para a classe: “A Bancoop (Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo) não foi ouvida em momento algum pelos jornalistas responsáveis pela matéria da revista Veja, em clara violação a princípio elementar de ética jornalística”. Ouvir isso de bancários dá certo desconforto… corretíssimos, exigem ética.
Um dos trechos mais importantes para subsidiar a investigação jornalística (se tivesse ocorrido): “A matéria é extremamente fantasiosa quanto aos fatos, como demonstra a informação de que teriam sido emitidos, para saque em dinheiro, cheques nominais à própria Bancoop em valor total superior a R$ 31 milhões. Na verdade, há uma intensa movimentação bancária entre contas da própria Bancoop, já que cada empreendimento da cooperativa, por força inclusive do Acordo Judicial celebrado com o Ministério Publico, tem conta bancária específica, sendo necessária a transferência de recursos utilizados para o custeio das respectivas obras”.
Além disso, segundo informa a Bancoop (e ninguém questionou publicamente), já foram entregues 84% das unidades prometidas. Quanto às demais, a Bancoop admite publicamente que houve problemas administrativos em 2003 e 2004. Depois que eu li, de curiosidade (devido à repercussão da matéria da Veja), fiquei com a sensação de que milhões de pessoas estavam morando debaixo das pontes, tudo por culpa da Bancoop. A revista fala em “um dos mais espantosos esquemas de desvio de dinheiro perpetrados pelo núcleo duro do Partido dos Trabalhadores”.
O site Consultor Jurídico fez o mínimo: o dever de casa de ouvir os lados. É muito importante que se apure a transferência dos 31 milhões de reais, neste caso em questão, ou outras supostas irregularidades encontradas. Sabendo que o promotor e a revista Veja devem enfrentar a Justiça, caso seja um factóide ou uma jogada política.
No entanto, é preciso registrar que, quando o caso envolveu José Roberto Arruda – cujo Governo do Distrito Federal está com R$ 894 milhões sob suspeita –, a mesma revista Veja decidiu estampar na capa uma mulher seminua, para ilustrar a matéria “O fim do efeito sanfona”, este terrível problema que atinge milhares de brasileiros.
O motivo? Já denunciamos aqui em outra oportunidade: parte do mensalão foi diretamente para a Veja. Foram R$ 442 mil para a compra de exemplares da revista, sem licitação…
Reflexões sobre o jornalismo político
A imprensa privada é tida, no discurso liberal, como a mais apta a praticar o jornalismo independente. Qual o argumento principal? Segundo Judith Brito, presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), em artigo recente no Observatório da Imprensa:
“O modelo ideal de empresa jornalística é a que se sustenta por meio da venda dos exemplares e também, necessariamente, pela receita publicitária oriunda de uma carteira ampla e diversificada de anunciantes. Somente empresas jornalísticas financeiramente sólidas podem manter a desejável independência editorial em relação a governos ou a interesses privados, o que lhes permite eleger como prioridade absoluta o direito dos cidadãos de acesso às informações, e assim garantir a publicação de notícias e análises que podem contrariar interesses políticos e econômicos.”
Muito bonito. No caso de Veja, com financiamento de craques da política como José Roberto Arruda e José Serra, fica um pouco mais complicado. E o pior é que toda a imprensa brasileira aumenta e “evolui” a gritaria político-partidária.
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É no mínimo curioso que o promotor de Justiça José Carlos Blat, fonte primária da “reportagem” da Veja contra o PT (edição de 10/03/2010)), já tenha pedido à própria Veja ressarcimento por danos morais no valor de R$ 20 mil, alegando que a revista extrapolou o direito de liberdade de informação e violou a sua honra, ao qualificá-lo como “pioneiro da era dos promotores heróis”.
A matéria que causou o litígio entre Blat e Veja é de 5 de fevereiro de 2006, sob o título “Intocável sob suspeita”, e sustento ser importante começar por este relato para chegar ao caso atual da Bancoop. Ela abordava processos administrativos aos quais o promotor respondia no Ministério Público de São Paulo. Blat perdeu: “Duarte Camacho [juiz da 4ª Vara Cível de São Paulo] entendeu que a revista apenas noticiou um inquérito verídico que envolvia uma figura pública”. Cabia recurso.
Relatou o juiz na sentença de dezembro de 2008: “Os procedimentos administrativos narrados na reportagem são verdadeiros. A reportagem divulgou a notícia dos procedimentos administrativos respondidos pelo autor porque o autor é um profissional que, freqüentemente, está na mídia em razão do seu trabalho”. E ainda: “O magistrado ressaltou que, assim como os grupos criminosos que o promotor combate estão expostos aos holofotes da mídia, Blat também deveria estar acostumado a ser notícia”.
Acusações contra Blat
Na edição citada, os “procedimentos administrativos respondidos pelo autor”, segundo o juiz, são os seguintes:
Acusação 1: “Em 1998, entrou para o Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), do qual foi afastado em 2004, em circunstâncias confusas. A Corregedoria o investigava por uma tentativa de livrar-se de multas no Detran e por um episódio estranho em que um carro oficial do Gaeco foi apreendido fora da cidade de São Paulo – com um criminoso ao volante. No fim de 2004, a Corregedoria do Ministério Público decidiu levar essas investigações a fundo. Ouviu o depoimento de onze pessoas, entre elas quatro promotores. Com base nesses depoimentos e em documentos levantados, a Corregedoria disse ter encontrado indícios de crimes mais graves”.
Acusação 2: “As primeiras investigações contra Blat colocaram em xeque suas ações contra desmanches de veículos roubados. Promotores afirmaram que uma seguradora de veículos indicava quais locais deveriam ser invadidos e quem deveria ser preso. Nessas ações três funcionários dessa seguradora apresentavam-se como peritos. Todo o estoque era apreendido e, em vez de seguir para a polícia, a maior parte das peças era desviada para depósito de terceiros”.
Acusação 3: “Blat também foi acusado de proteger o contrabandista chinês Law Kin Chong, preso em São Paulo. Em 2002, quando participou de uma força-tarefa antipirataria, ele teria dirigido o foco da investigação somente contra os pequenos contrabandistas, deixando Law livre para atuar. Uma advogada que trabalhava para o contrabandista visitava Blat periodicamente no Gaeco”.
Acusação 4: “As investigações descobriram ainda que Blat mora num apartamento de Alfredo Parisi, que já foi condenado por bancar o jogo do bicho. Blat admite que, antes de se tornar promotor, foi sócio do filho de Ivo Noal, outro banqueiro do bicho, numa loja de conveniência – o que não é crime”.
Acusação 5: “Os bens do promotor também entraram na mira da Corregedoria. Segundo os depoimentos, Blat comprou de uma só tacada dois carros importados e blindados. A Corregedoria recebeu denúncia de que um apartamento no Guarujá também seria de Blat. Mais tarde, descobriu-se que, na verdade, estava em nome do ex-sogro do promotor, René Pereira de Carvalho, um procurador de Justiça. Carvalho tentou pagar 200.000 reais em dinheiro vivo, mas, diante da recusa da vendedora, usou cheques administrativos. A origem dos recursos não foi esclarecida. Por isso foi aberto um inquérito específico sobre seu patrimônio”.
A revista Veja conclui:
“Sobre Blat pesam também as seguintes suspeitas: usar veículos e pessoal do Gaeco para interesses pessoais, negociar com um delegado a liberação de seu pai, que teria sido preso em flagrante por armazenar bens roubados, abuso de autoridade, truculência e suspeita de enriquecimento ilícito. É possível que Pinho esteja correto, e que nenhum crime tenha sido cometido. No entanto, por muito menos, políticos e empresários são duramente investigados pelo Ministério Público paulista – é o caso do ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Enquanto seu destino no Ministério Público não é definido, Blat já traça outros planos. Disse a Veja: ‘Eu me desiludi com o Ministério Público. Estou pensando em me candidatar a deputado federal’”.
Isso foi em 2006. Blat estava pensando em virar político, oficialmente. Agora, em 2010, Blat diz outra coisa, conforme nota no site Consultor Jurídico: “Estou fazendo meu trabalho. Um trabalho técnico. E não tenho nenhuma simpatia por partido algum. Não sou tucano nem petista, nem nada… É sempre a mesma coisa. O que acontece é que quando você investiga um caso envolvendo um partido A, eles te acusam de trabalhar para o partido B. Na verdade, eu só trabalho para o Ministério Público”.
Resta saber por qual partido o promotor estava “pensando” em se candidatar. Ou então precisa avisar urgentemente que, para se candidatar, é preciso ter partido.
Sobre a reportagem da Bancoop
A reportagem de Veja é até engraçada ao deduzir que já é lugar comum petista saindo por aí com dinheiro na meia, na cueca etc.: “Os depoimentos colhidos pelo MP indicam que o esquema de desvio de dinheiro da Bancoop obedeceu a uma trajetória que já se tornou um clássico petista. Começou para abastecer campanhas eleitorais do partido e acabou servindo para atender a interesses particulares de petista”.
O “clássico petista” é, entre outras expressões, uma das que me faz pensar por que pessoas com massa cinzenta (responsável por processar a informação no cérebro) ainda leem a Veja. Seria desinteresse pela política? A revista é inútil, um mero panfleto político, financiada por um segmento empresarial-partidário e que só age em prol de seus interesses particulares.
É óbvio que qualquer cidadão com senso ético deseja a punição de todo e qualquer corrupto e, especificamente neste caso, também a Justiça às famílias que investiram pesado no sonho de ter uma casa própria. Mas acreditar que a solução é transformar todo e qualquer problema em plataforma eleitoral é uma piada de mau gosto. Jornalismo marrom, nada mais do que isso.
A “reportagem” nem sequer ouviu os acusados. É absolutamente inacreditável. No mínimo, os leitores inteligentes (e não creio que são todos) da revista gostariam de saber o que falam os acusados. E por que Veja não considerou entrevistá-los? Simples: por que a “reportagem” poderia cair. Por que Veja teme o contraditório?
Eu fui atrás desta informação. A Bancoop emitiu uma nota. O primeiro parágrafo é uma vergonha para os jornalistas, para a classe: “A Bancoop (Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo) não foi ouvida em momento algum pelos jornalistas responsáveis pela matéria da revista Veja, em clara violação a princípio elementar de ética jornalística”. Ouvir isso de bancários dá certo desconforto… corretíssimos, exigem ética.
Um dos trechos mais importantes para subsidiar a investigação jornalística (se tivesse ocorrido): “A matéria é extremamente fantasiosa quanto aos fatos, como demonstra a informação de que teriam sido emitidos, para saque em dinheiro, cheques nominais à própria Bancoop em valor total superior a R$ 31 milhões. Na verdade, há uma intensa movimentação bancária entre contas da própria Bancoop, já que cada empreendimento da cooperativa, por força inclusive do Acordo Judicial celebrado com o Ministério Publico, tem conta bancária específica, sendo necessária a transferência de recursos utilizados para o custeio das respectivas obras”.
Além disso, segundo informa a Bancoop (e ninguém questionou publicamente), já foram entregues 84% das unidades prometidas. Quanto às demais, a Bancoop admite publicamente que houve problemas administrativos em 2003 e 2004. Depois que eu li, de curiosidade (devido à repercussão da matéria da Veja), fiquei com a sensação de que milhões de pessoas estavam morando debaixo das pontes, tudo por culpa da Bancoop. A revista fala em “um dos mais espantosos esquemas de desvio de dinheiro perpetrados pelo núcleo duro do Partido dos Trabalhadores”.
O site Consultor Jurídico fez o mínimo: o dever de casa de ouvir os lados. É muito importante que se apure a transferência dos 31 milhões de reais, neste caso em questão, ou outras supostas irregularidades encontradas. Sabendo que o promotor e a revista Veja devem enfrentar a Justiça, caso seja um factóide ou uma jogada política.
No entanto, é preciso registrar que, quando o caso envolveu José Roberto Arruda – cujo Governo do Distrito Federal está com R$ 894 milhões sob suspeita –, a mesma revista Veja decidiu estampar na capa uma mulher seminua, para ilustrar a matéria “O fim do efeito sanfona”, este terrível problema que atinge milhares de brasileiros.
O motivo? Já denunciamos aqui em outra oportunidade: parte do mensalão foi diretamente para a Veja. Foram R$ 442 mil para a compra de exemplares da revista, sem licitação…
Reflexões sobre o jornalismo político
A imprensa privada é tida, no discurso liberal, como a mais apta a praticar o jornalismo independente. Qual o argumento principal? Segundo Judith Brito, presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), em artigo recente no Observatório da Imprensa:
“O modelo ideal de empresa jornalística é a que se sustenta por meio da venda dos exemplares e também, necessariamente, pela receita publicitária oriunda de uma carteira ampla e diversificada de anunciantes. Somente empresas jornalísticas financeiramente sólidas podem manter a desejável independência editorial em relação a governos ou a interesses privados, o que lhes permite eleger como prioridade absoluta o direito dos cidadãos de acesso às informações, e assim garantir a publicação de notícias e análises que podem contrariar interesses políticos e econômicos.”
Muito bonito. No caso de Veja, com financiamento de craques da política como José Roberto Arruda e José Serra, fica um pouco mais complicado. E o pior é que toda a imprensa brasileira aumenta e “evolui” a gritaria político-partidária.
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Sean Penn e as mentiras da mídia nos EUA
Reproduzo matéria publicada no jornal Hora do Povo desta semana:
Durante entrevista com Bill Maher, no programa Real Time, da HBO, o ator e diretor de cinema Sean Penn afirmou que, lamentavelmente, o povo norte-americano não conhece a realidade de América Latina e da Venezuela, em particular.
“Nós, nos Estados Unidos, temos dificuldades para entrar na pele do que tem sido a história da Venezuela, a história da América Latina e de muitos outros lugares. Somos muito monoculturais. Estamos hipnotizados pelos meios de comunicação que só divulgam o que interessa aos grandes interesses econômicos”, afirmou Penn, no dia 10 de março.
“Por exemplo, Hugo Chávez. Quem sabe aqui que ele passou por 14 das eleições mais transparentes do mundo e foi eleito democraticamente em todas elas?”, acrescentou o também produtor de cinema.
Sean Penn assinalou que “dia após dia, este líder eleito pelo seu povo é chamado de ditador aqui, nos principais meios de comunicação. Suas medidas, sua política de inclusão de amplas camadas da população, as melhorias na qualidade de vida dos venezuelanos, a aprovação popular de seu governo não são divulgadas pelos grandes meios de comunicação comerciais”. “Deveria existir um limite para as mentiras dessa mídia”, acrescentou.
Depois de sua primeira visita à Venezuela, em 2007, Penn foi entrevistado no programa The Late Show por David Letterman, onde refutou os argumentos do jornalista sobre o suposto fechamento irregular da RCTV. “Essa rede de televisão incitava constantemente até ao assassinato do presidente, só promovia a desordem na base de mentiras. Se neste país [nos EUA] os dirigentes de qualquer meio de comunicação fizessem a metade do que a RCTV fez, estariam presos”, constatou.
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Sionismo de Israel. Gafe de Lula?
Reproduzo artigo do professor Gilson Caroni Filho, publicado na Agência Carta Maior:
O “incidente diplomático” provocado pela decisão da delegação brasileira de não incluir na agenda do presidente Lula uma visita ao túmulo do criador do movimento sionista precisa ser visto na exata dimensão de seu significado político. E não há dúvidas quanto ao acerto da recusa a um convite feito de última hora. Afinal, o que propõe o sionismo e quais suas implicações para a paz na região conflagrada? Haveria compatibilidade entre a carga simbólica do evento e um posterior encontro com autoridades palestinas?
O jornalismo de programa entrou em ação: censurou os elogios do presidente israelense a Lula, dando destaque a uma suposta gafe, uma recusa inusitada a um ato supostamente protocolar. Comprou a descortesia da extrema-direita de Israel como justa indignação frente a uma diplomacia desastrada. A operação " tempestade no cerrado", denunciada pelo jornalista Mauro Carrara, desconhece fronteiras e senso de medida.
Como já registrei, em artigo escrito com o economista Carlos Eduardo Martins, a incompatibilidade entre sionismo e diálogo democrático não é um dado conjuntural, mas fato de origem. A premissa de Theodor Herzl é que os judeus não podem se fiar na “opinião pública mundial” ou na “comunidade das nações”, que sempre assistiram impassíveis às incontáveis perseguições sofridas pelo seu povo através dos séculos. Os judeus teriam que assegurar sua sobrevivência, como povo e como indivíduos, por seus próprios meios. O que só seria possível com o estabelecimento de seu Estado nacional soberano, para o que Herzl indica a Palestina (então sob domínio turco), local do último Reino de Israel.
É bom lembrar que Herzl foi um ativo militante do movimento sionista na Europa, além de conduzir negociações com a Turquia e o Egito. A ideologia territoralista é excludente. Em momento algum ela advoga pública e explicitamente o extermínio ou a expulsão violenta dos palestinos não-judeus. Mas deixa claro, em seus diários, que eles deveriam ser “persuadidos a se retirarem” por meios econômicos, como o confisco de suas terras e outras propriedades, e a recusa em lhes dar emprego. Ou seja, em instância final, Israel deveria ser o lar exclusivamente dos judeus – e inclusiva e idealmente de todos os judeus do mundo, que só ali teriam assegurada sua sobrevivência.
Herzl tampouco define fronteiras específicas para o Estado judeu, referindo-se genericamente à “Palestina”. Mas, da mesma forma, antevê o caráter necessariamente expansionista de tal Estado, até mesmo para acomodar a desejada imigração em massa. É significativo que, nos documentos oficiais do governo israelense, o território de Israel englobe hoje toda a Palestina, Gaza, Cisjordânia e Golan incluídas.
Embora haja quem afirme que “a origem do Estado de Israel não está na religião”, é óbvio que as propostas de Herzl estão imbuídas da visão toráica de “povo escolhido” (à exclusão de todos os demais) e de “destino manifesto” – de resto não diferentes da professada pelos proponentes do PNAC, Plano para um Novo Século Americano, que norteou o “bushismo” nos Estados Unidos – a começar pela escolha da “Terra Prometida” para lar do Estado de Israel.
Mas o discurso herzliano parece totalmente laico (o que foi desprezado pela “esquerda sionista”, que acedeu em criar Israel como um Estado confessional, vide a Estrela de David em sua bandeira). E seus objetivos, estritamente materiais: terra e poder. Quer seu criador estivesse consciente delas ou não, as implicações da ideologia sionista são inescapáveis. E o jornalista inglês Daniel Finkelstein as explicita: “Assim, quando se pede a Israel que respeite a opinião mundial e confie na comunidade internacional, não se está compreendendo o ponto fundamental. A própria idéia de Israel é uma rejeição dessa opção. Israel só existe porque os judeus não se sentem seguros como tutelados da opinião mundial.”
Daí se depreende inevitavelmente que quaisquer “negociações” ou “acordos” não têm valor para Israel, que os usará, se conveniente, assim como os ignorará se e quando, a seu exclusivo juízo, forem necessários para sua segurança. Finkelstein continua sua explanação sem se dar conta de que explicita o que a propaganda sionista tenta ocultar: “Israel entregará suas armas quando os judeus estiverem em segurança, mas não o fará enquanto não estiverem.” E só a Israel compete dizer se a “segurança” foi alcançada ou não, bem como até onde o Grande Israel terá que se estender até então.
Mas o sionismo não recorreu à comunidade internacional, representada pela ONU, para formalizar a partilha da Palestina e a criação do Estado de Israel? Sim, mas por mero oportunismo, valendo-se da “consciência culpada” dos gentios face ao Holocausto e explorando as tensões geopolíticas entre as antigas potências coloniais européias, Inglaterra (já detentora do “mandato palestino”) e França à frente, Estados Unidos e União Soviética, além da divisão entre os países árabes. E só o fez por constatar que o caminho da violência e do terrorismo não levaria à consecução de seus objetivos.
Portanto, por sua própria origem e seu cerne ideológico, o Estado de Israel se definiu como uma nação que despreza a opinião mundial, não reconhece a comunidade internacional e ignora quaisquer decisões colegiadas que não lhe pareçam convenientes. A "gafe" de Lula demonstra uma inequívoca compreensão do tabuleiro geopolítico do Oriente Médio. Que outras sejam cometidas.
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O “incidente diplomático” provocado pela decisão da delegação brasileira de não incluir na agenda do presidente Lula uma visita ao túmulo do criador do movimento sionista precisa ser visto na exata dimensão de seu significado político. E não há dúvidas quanto ao acerto da recusa a um convite feito de última hora. Afinal, o que propõe o sionismo e quais suas implicações para a paz na região conflagrada? Haveria compatibilidade entre a carga simbólica do evento e um posterior encontro com autoridades palestinas?
O jornalismo de programa entrou em ação: censurou os elogios do presidente israelense a Lula, dando destaque a uma suposta gafe, uma recusa inusitada a um ato supostamente protocolar. Comprou a descortesia da extrema-direita de Israel como justa indignação frente a uma diplomacia desastrada. A operação " tempestade no cerrado", denunciada pelo jornalista Mauro Carrara, desconhece fronteiras e senso de medida.
Como já registrei, em artigo escrito com o economista Carlos Eduardo Martins, a incompatibilidade entre sionismo e diálogo democrático não é um dado conjuntural, mas fato de origem. A premissa de Theodor Herzl é que os judeus não podem se fiar na “opinião pública mundial” ou na “comunidade das nações”, que sempre assistiram impassíveis às incontáveis perseguições sofridas pelo seu povo através dos séculos. Os judeus teriam que assegurar sua sobrevivência, como povo e como indivíduos, por seus próprios meios. O que só seria possível com o estabelecimento de seu Estado nacional soberano, para o que Herzl indica a Palestina (então sob domínio turco), local do último Reino de Israel.
É bom lembrar que Herzl foi um ativo militante do movimento sionista na Europa, além de conduzir negociações com a Turquia e o Egito. A ideologia territoralista é excludente. Em momento algum ela advoga pública e explicitamente o extermínio ou a expulsão violenta dos palestinos não-judeus. Mas deixa claro, em seus diários, que eles deveriam ser “persuadidos a se retirarem” por meios econômicos, como o confisco de suas terras e outras propriedades, e a recusa em lhes dar emprego. Ou seja, em instância final, Israel deveria ser o lar exclusivamente dos judeus – e inclusiva e idealmente de todos os judeus do mundo, que só ali teriam assegurada sua sobrevivência.
Herzl tampouco define fronteiras específicas para o Estado judeu, referindo-se genericamente à “Palestina”. Mas, da mesma forma, antevê o caráter necessariamente expansionista de tal Estado, até mesmo para acomodar a desejada imigração em massa. É significativo que, nos documentos oficiais do governo israelense, o território de Israel englobe hoje toda a Palestina, Gaza, Cisjordânia e Golan incluídas.
Embora haja quem afirme que “a origem do Estado de Israel não está na religião”, é óbvio que as propostas de Herzl estão imbuídas da visão toráica de “povo escolhido” (à exclusão de todos os demais) e de “destino manifesto” – de resto não diferentes da professada pelos proponentes do PNAC, Plano para um Novo Século Americano, que norteou o “bushismo” nos Estados Unidos – a começar pela escolha da “Terra Prometida” para lar do Estado de Israel.
Mas o discurso herzliano parece totalmente laico (o que foi desprezado pela “esquerda sionista”, que acedeu em criar Israel como um Estado confessional, vide a Estrela de David em sua bandeira). E seus objetivos, estritamente materiais: terra e poder. Quer seu criador estivesse consciente delas ou não, as implicações da ideologia sionista são inescapáveis. E o jornalista inglês Daniel Finkelstein as explicita: “Assim, quando se pede a Israel que respeite a opinião mundial e confie na comunidade internacional, não se está compreendendo o ponto fundamental. A própria idéia de Israel é uma rejeição dessa opção. Israel só existe porque os judeus não se sentem seguros como tutelados da opinião mundial.”
Daí se depreende inevitavelmente que quaisquer “negociações” ou “acordos” não têm valor para Israel, que os usará, se conveniente, assim como os ignorará se e quando, a seu exclusivo juízo, forem necessários para sua segurança. Finkelstein continua sua explanação sem se dar conta de que explicita o que a propaganda sionista tenta ocultar: “Israel entregará suas armas quando os judeus estiverem em segurança, mas não o fará enquanto não estiverem.” E só a Israel compete dizer se a “segurança” foi alcançada ou não, bem como até onde o Grande Israel terá que se estender até então.
Mas o sionismo não recorreu à comunidade internacional, representada pela ONU, para formalizar a partilha da Palestina e a criação do Estado de Israel? Sim, mas por mero oportunismo, valendo-se da “consciência culpada” dos gentios face ao Holocausto e explorando as tensões geopolíticas entre as antigas potências coloniais européias, Inglaterra (já detentora do “mandato palestino”) e França à frente, Estados Unidos e União Soviética, além da divisão entre os países árabes. E só o fez por constatar que o caminho da violência e do terrorismo não levaria à consecução de seus objetivos.
Portanto, por sua própria origem e seu cerne ideológico, o Estado de Israel se definiu como uma nação que despreza a opinião mundial, não reconhece a comunidade internacional e ignora quaisquer decisões colegiadas que não lhe pareçam convenientes. A "gafe" de Lula demonstra uma inequívoca compreensão do tabuleiro geopolítico do Oriente Médio. Que outras sejam cometidas.
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Omissão do STF favorece radiodifusores
Reproduzo artigo do professor Venício A. de Lima, publicado no Observatório da Imprensa:
Na sexta-feira, 19 de março, completam-se exatos nove meses que a Procuradoria Geral da República (PGR) emitiu parecer sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3944) protocolada pelo PSOL no Supremo Tribunal Federal (STF) em 21 de agosto de 2007. O parecer da PGR é totalmente favorável a ADI e, à época, o relator, ministro Carlos Ayres Brito, informou, por intermédio de sua assessoria, que sua decisão sairia em 30 dias. Até hoje, nem a decisão do relator e, por óbvio, nem o julgamento no plenário do STF aconteceram.
A relevância do tema para o país e a magnitude dos interesses em jogo fizeram com que a escolha do modelo tecnológico para a TV digital brasileira fosse objeto de debate público à época das decisões tomadas pelo governo Lula (2003-2006). No entanto, como costuma acontecer entre nós, quase quatro anos depois, embora não se tenha ainda uma decisão final sobre a legalidade dessas decisões, o assunto praticamente "desapareceu" da agenda pública e se considera "favas contadas" a adoção do modelo japonês.
O que os nossos jornalões estão a noticiar, sem mais, é que o ministro das Comunicações, Hélio Costa, viaja para "vender" a TV digital brasileira (?!) para a América Latina, cujo modelo, aliás, já teria sido adotado por Peru, Argentina, Chile e Venezuela.
De que se trata?
A ADI 3944 sustenta a inconstitucionalidade de quatro artigos (7º, 8º, 9º e 10º) do decreto nº 5.820, de 29 de junho de 2006. O Decreto5.820/2006 é, na verdade, uma continuação do decreto nº 4.901/2003 e, ambos, instituem e definem as regras de implantação do SBTVD, isto é, o sistema brasileiro de televisão digital. Os artigos cuja constitucionalidade se questiona são os seguintes:
Art. 7º Será consignado, às concessionárias e autorizadas de serviço de radiodifusão de sons e imagens, para cada canal outorgado, canal de radiofreqüência com largura de banda de seis megahertz, a fim de permitir a transição para a tecnologia digital sem interrupção da transmissão de sinais analógicos.
§ 1º O canal referido no caput somente será consignado às concessionárias e autorizadas cuja exploração do serviço esteja em regularidade com a outorga, observado o estabelecido no Plano Básico de Distribuição de Canais de Televisão Digital – PBTVD.
§ 2º A consignação de canais para as autorizadas e permissionárias do serviço de retransmissão de televisão obedecerá aos mesmos critérios referidos no § 1o e, ainda, às condições estabelecidas em norma e cronograma específicos.
Art. 8º O Ministério das Comunicações estabelecerá, no prazo máximo de sessenta dias a partir da publicação deste Decreto, cronograma para a consignação dos canais de transmissão digital.
Parágrafo único. O cronograma a que se refere o caput observará o limite de até sete anos e respeitará a seguinte ordem:
I – estações geradoras de televisão nas Capitais dos Estados e no Distrito Federal;
II – estações geradoras nos demais Municípios;
III – serviços de retransmissão de televisão nas Capitais dos Estados e no Distrito Federal; e
IV – serviços de retransmissão de televisão nos demais Municípios.
Art. 9º A consignação de canais de que trata o art. 7o será disciplinada por instrumento contratual celebrado entre o Ministério das Comunicações e as outorgadas, com cláusulas que estabeleçam ao menos:
I – prazo para utilização plena do canal previsto no caput, sob pena da revogação da consignação prevista; e
II – condições técnicas mínimas para a utilização do canal consignado.
§ 1º O Ministério das Comunicações firmará, nos prazos fixados no cronograma referido no art. 8o, os respectivos instrumentos contratuais.
§ 2º Celebrado o instrumento contratual a que se refere o caput, a outorgada deverá apresentar ao Ministério das Comunicações, em prazo não superior a seis meses, projeto de instalação da estação transmissora.
§ 3º A outorgada deverá iniciar a transmissão digital em prazo não superior a dezoito meses, contados a partir da aprovação do projeto, sob pena de revogação da consignação prevista no art. 7o.
Art. 10º O período de transição do sistema de transmissão analógica para o SBTVD-T será de dez anos, contados a partir da publicação deste Decreto.
§ 1º A transmissão digital de sons e imagens incluirá, durante o período de transição, a veiculação simultânea da programação em tecnologia analógica.
§ 2º Os canais utilizados para transmissão analógica serão devolvidos à União após o prazo de transição previsto no caput.
Entre as razões apresentadas pela ADI 3944, acatadas pelo parecer da PGR, vale destacar:
"O artigo 223 da Constituição foi violado de duas formas. A primeira, com a utilização no texto do Decreto, do termo ‘consignação’ para o que é, na verdade, uma concessão. Ou seja, o Decreto, atropelando a competência do Congresso Nacional, concede às emissoras atuais um canal inteiro de 6 megahertz...
A tecnologia digital (...) é uma nova tecnologia. Se ela não acrescentasse uma capacidade maior de produzir informações e programas, tal ‘consignação’, em tese, poderia ser aceita, sob o argumento de que se trataria de uma mera modificação de natureza técnica. Mas trata-se de uma tecnologia que concede, e a palavra é significativa, um espaço ou espectro maior de atuação às emissoras atuais...
Ainda que se considere que a nova tecnologia não implicaria nova concessão, estaríamos, no mínimo, falando em renovação das concessões existentes. Perceba-se que a ‘migração’ estabelece prazos e condições às concessionárias...
Num canal de 6 megahertz, várias programações podem ser transmitidas simultaneamente, no que se convencionou denominar multiprogramação. Ao ‘consignar’ às emissoras um canal com tamanha capacidade, está-se, paralelamente, impedindo a entrada de outros atores na programação. Ao invés de se ampliarem as possibilidades de ingresso de outros canais, incluindo novas emissoras e permitindo acesso a programações variadas (...) tem-se uma verdadeira outorga de espaço maior às concessionárias que já atuam no mercado. O que provavelmente ocorrerá é o que a norma constitucional visa a impedir: o oligopólio, ou, melhor dizendo, um aprofundamento do oligopólio já existente.
Quem ganha e quem perde
Logo depois da assinatura do Decreto nº 5.820 escrevi neste Observatório que “uma das maneiras de se identificar os interesses em jogo em determinada decisão é verificar como se manifestam sobre ela os principais atores envolvidos ou seus representantes. No caso da adoção pelo Brasil do modelo japonês para a TV digital, não poderia haver clareza maior sobre quem ganhou e quem perdeu ou sobre quais, de fato, foram os interesses atendidos”.
Basta consultar agora a lista dos amicus curiae aceitos para apresentar suas razões no julgamento ainda a ser feito pelo STF para se constatar a verdade dessa afirmação.
O que sempre esteve em jogo é a oportunidade ímpar para se democratizar o mercado brasileiro de televisão. A opção feita pelo Decreto nº 5.820 favorece inquestionavelmente aos atuais concessionários deste serviço público e impede a ampliação do número de concessionários. Contraria, portanto, o princípio da “máxima dispersão da propriedade” (maximum dispersal of ownership), vale dizer, da pluralidade e da diversidade.
Mais do que isso: o Decreto 5.820/2006 impede a extensão da liberdade de expressão a um maior número de brasileiros que, a não ser acatada a ADI 3944, continuará sendo exercida prioritariamente por aqueles poucos grupos que controlam a grande mídia e equacionam liberdade de expressão com sua liberdade de imprensa.
Às vésperas da assinatura do Decreto 5.820/2006, a Frente Nacional por um Sistema Democrático de Rádio e TV Digital, que reunia cerca de 40 entidades, divulgou um manifesto que terminava com a afirmação: "O governo estará cometendo um erro histórico, que não poderá ser revertido nas próximas décadas".
Quanto mais tempo demorar a decisão do STF sobre a ADI 3944, mais o Decreto 5820/2006 se tornará "irreversível". É urgente, portanto, que o STF faça o julgamento e, sobretudo, tome uma decisão que evite a confirmação deste "erro histórico".
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Na sexta-feira, 19 de março, completam-se exatos nove meses que a Procuradoria Geral da República (PGR) emitiu parecer sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3944) protocolada pelo PSOL no Supremo Tribunal Federal (STF) em 21 de agosto de 2007. O parecer da PGR é totalmente favorável a ADI e, à época, o relator, ministro Carlos Ayres Brito, informou, por intermédio de sua assessoria, que sua decisão sairia em 30 dias. Até hoje, nem a decisão do relator e, por óbvio, nem o julgamento no plenário do STF aconteceram.
A relevância do tema para o país e a magnitude dos interesses em jogo fizeram com que a escolha do modelo tecnológico para a TV digital brasileira fosse objeto de debate público à época das decisões tomadas pelo governo Lula (2003-2006). No entanto, como costuma acontecer entre nós, quase quatro anos depois, embora não se tenha ainda uma decisão final sobre a legalidade dessas decisões, o assunto praticamente "desapareceu" da agenda pública e se considera "favas contadas" a adoção do modelo japonês.
O que os nossos jornalões estão a noticiar, sem mais, é que o ministro das Comunicações, Hélio Costa, viaja para "vender" a TV digital brasileira (?!) para a América Latina, cujo modelo, aliás, já teria sido adotado por Peru, Argentina, Chile e Venezuela.
De que se trata?
A ADI 3944 sustenta a inconstitucionalidade de quatro artigos (7º, 8º, 9º e 10º) do decreto nº 5.820, de 29 de junho de 2006. O Decreto5.820/2006 é, na verdade, uma continuação do decreto nº 4.901/2003 e, ambos, instituem e definem as regras de implantação do SBTVD, isto é, o sistema brasileiro de televisão digital. Os artigos cuja constitucionalidade se questiona são os seguintes:
Art. 7º Será consignado, às concessionárias e autorizadas de serviço de radiodifusão de sons e imagens, para cada canal outorgado, canal de radiofreqüência com largura de banda de seis megahertz, a fim de permitir a transição para a tecnologia digital sem interrupção da transmissão de sinais analógicos.
§ 1º O canal referido no caput somente será consignado às concessionárias e autorizadas cuja exploração do serviço esteja em regularidade com a outorga, observado o estabelecido no Plano Básico de Distribuição de Canais de Televisão Digital – PBTVD.
§ 2º A consignação de canais para as autorizadas e permissionárias do serviço de retransmissão de televisão obedecerá aos mesmos critérios referidos no § 1o e, ainda, às condições estabelecidas em norma e cronograma específicos.
Art. 8º O Ministério das Comunicações estabelecerá, no prazo máximo de sessenta dias a partir da publicação deste Decreto, cronograma para a consignação dos canais de transmissão digital.
Parágrafo único. O cronograma a que se refere o caput observará o limite de até sete anos e respeitará a seguinte ordem:
I – estações geradoras de televisão nas Capitais dos Estados e no Distrito Federal;
II – estações geradoras nos demais Municípios;
III – serviços de retransmissão de televisão nas Capitais dos Estados e no Distrito Federal; e
IV – serviços de retransmissão de televisão nos demais Municípios.
Art. 9º A consignação de canais de que trata o art. 7o será disciplinada por instrumento contratual celebrado entre o Ministério das Comunicações e as outorgadas, com cláusulas que estabeleçam ao menos:
I – prazo para utilização plena do canal previsto no caput, sob pena da revogação da consignação prevista; e
II – condições técnicas mínimas para a utilização do canal consignado.
§ 1º O Ministério das Comunicações firmará, nos prazos fixados no cronograma referido no art. 8o, os respectivos instrumentos contratuais.
§ 2º Celebrado o instrumento contratual a que se refere o caput, a outorgada deverá apresentar ao Ministério das Comunicações, em prazo não superior a seis meses, projeto de instalação da estação transmissora.
§ 3º A outorgada deverá iniciar a transmissão digital em prazo não superior a dezoito meses, contados a partir da aprovação do projeto, sob pena de revogação da consignação prevista no art. 7o.
Art. 10º O período de transição do sistema de transmissão analógica para o SBTVD-T será de dez anos, contados a partir da publicação deste Decreto.
§ 1º A transmissão digital de sons e imagens incluirá, durante o período de transição, a veiculação simultânea da programação em tecnologia analógica.
§ 2º Os canais utilizados para transmissão analógica serão devolvidos à União após o prazo de transição previsto no caput.
Entre as razões apresentadas pela ADI 3944, acatadas pelo parecer da PGR, vale destacar:
"O artigo 223 da Constituição foi violado de duas formas. A primeira, com a utilização no texto do Decreto, do termo ‘consignação’ para o que é, na verdade, uma concessão. Ou seja, o Decreto, atropelando a competência do Congresso Nacional, concede às emissoras atuais um canal inteiro de 6 megahertz...
A tecnologia digital (...) é uma nova tecnologia. Se ela não acrescentasse uma capacidade maior de produzir informações e programas, tal ‘consignação’, em tese, poderia ser aceita, sob o argumento de que se trataria de uma mera modificação de natureza técnica. Mas trata-se de uma tecnologia que concede, e a palavra é significativa, um espaço ou espectro maior de atuação às emissoras atuais...
Ainda que se considere que a nova tecnologia não implicaria nova concessão, estaríamos, no mínimo, falando em renovação das concessões existentes. Perceba-se que a ‘migração’ estabelece prazos e condições às concessionárias...
Num canal de 6 megahertz, várias programações podem ser transmitidas simultaneamente, no que se convencionou denominar multiprogramação. Ao ‘consignar’ às emissoras um canal com tamanha capacidade, está-se, paralelamente, impedindo a entrada de outros atores na programação. Ao invés de se ampliarem as possibilidades de ingresso de outros canais, incluindo novas emissoras e permitindo acesso a programações variadas (...) tem-se uma verdadeira outorga de espaço maior às concessionárias que já atuam no mercado. O que provavelmente ocorrerá é o que a norma constitucional visa a impedir: o oligopólio, ou, melhor dizendo, um aprofundamento do oligopólio já existente.
Quem ganha e quem perde
Logo depois da assinatura do Decreto nº 5.820 escrevi neste Observatório que “uma das maneiras de se identificar os interesses em jogo em determinada decisão é verificar como se manifestam sobre ela os principais atores envolvidos ou seus representantes. No caso da adoção pelo Brasil do modelo japonês para a TV digital, não poderia haver clareza maior sobre quem ganhou e quem perdeu ou sobre quais, de fato, foram os interesses atendidos”.
Basta consultar agora a lista dos amicus curiae aceitos para apresentar suas razões no julgamento ainda a ser feito pelo STF para se constatar a verdade dessa afirmação.
O que sempre esteve em jogo é a oportunidade ímpar para se democratizar o mercado brasileiro de televisão. A opção feita pelo Decreto nº 5.820 favorece inquestionavelmente aos atuais concessionários deste serviço público e impede a ampliação do número de concessionários. Contraria, portanto, o princípio da “máxima dispersão da propriedade” (maximum dispersal of ownership), vale dizer, da pluralidade e da diversidade.
Mais do que isso: o Decreto 5.820/2006 impede a extensão da liberdade de expressão a um maior número de brasileiros que, a não ser acatada a ADI 3944, continuará sendo exercida prioritariamente por aqueles poucos grupos que controlam a grande mídia e equacionam liberdade de expressão com sua liberdade de imprensa.
Às vésperas da assinatura do Decreto 5.820/2006, a Frente Nacional por um Sistema Democrático de Rádio e TV Digital, que reunia cerca de 40 entidades, divulgou um manifesto que terminava com a afirmação: "O governo estará cometendo um erro histórico, que não poderá ser revertido nas próximas décadas".
Quanto mais tempo demorar a decisão do STF sobre a ADI 3944, mais o Decreto 5820/2006 se tornará "irreversível". É urgente, portanto, que o STF faça o julgamento e, sobretudo, tome uma decisão que evite a confirmação deste "erro histórico".
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A crise da imprensa é ética
Reproduzo artigo do sociólogo Emir Sader, publicado na Agência Carta Maior:
Chovem os artigos na imprensa internacional sobre a crise da imprensa, enquanto crescente numero de jornais fecham, despedem jornalistas, diminuem suas tiragens. Os diagnósticos, ao serem feitos, em grande medida por pessoal ligado a essa imprensa, não conseguem sair do rame rame usual: a difusão da internet grátis, dos jornais grátis, etc., etc., seriam os responsáveis. Será?
Mas um artigo, desta vez da prestigiosa publicação norteamericana The Nation – “How to save jornalism?”, de John Nichols e Robert W. McChesney, de 25 de janeiro deste ano – aponta para um diagnóstico um pouco diferente. Em primeiro lugar, classifica o jornalismo como um “bem público”, considerando que deveria ser considerado da mesma forma que se considera a educação, saúde pública, o transporte, a infra estrutura.
Considerado dessa maneira, o fato de ser financiado por publicidade já desvia ou deforma esse caráter público, porque a publicidade visa interesses privados, venda de mercadorias, prestação de serviços na esfera privada. Essa concepção remeteria ao tema do financiamento público da imprensa.
Quanto ao diagnóstico que aponta para a difusão da internet, os autores recordam que a crise começou muito antes, já nos anos 1970, apontando para a busca de maximização dos lucros pelas grandes corporações, que foram tornando as mídias empresas como outras quaisquer de seu imenso leque de investimentos, tendo como resultado, entre outros, a diminuição da qualidade e a banalização do jornalismo, cada vez mais longe de ser um bem público.
As propostas atuais de tentativa de superação da crise financeira apontam normalmente para o pagamento das páginas de internet, dado que a publicidade nestas representa um ganho de 10% do que se perde nas publicações impressas. No entanto, apenas um ou outro jornal que acredita na sua capacidade de manter audiência sendo pago – como o The Wall Street Journal – se arriscam nessa direção. Ainda assim é duvidoso que possam arrecadar uma proporção minimamente significativa do que perdem com a diminuição da tiragem e, principalmente, com a retração da publicidade, canalizada para outros meios.
Na realidade a crise da imprensa é a da perda de credibilidade, é uma crise ética, de sua transformação em um instrumento da publicidade, do ponto de vista econômico, e da sua constituição em mentor político e ideológico da direita.
Os dados, publicados recentemente, demonstram como todos os grandes jornais brasileiros perdem leitores, mas, sobretudo, perdem influência. Embora todos os maiores jornais e quase todas as revistas semanais – à exceção da Carta Capital – sejam de férrea oposição ao governo, este mantêm 83% de apoio e eles conseguem apenas 5% de rejeição do governo. Temos aí uma idéia da baixíssima produtividade desses órgãos de oposição.
Jornais progressistas como La Jornada, do México, Página 12, da Argentina, Público, da Espanha, que gozam de alta credibilidade, se consolidam e se expandem, tendo páginas abertas amplamente visitadas. Seu patrimônio é sua ética social, suas posições políticas democráticas, o espírito pluralista dos seus comentaristas, a originalidade da suas coberturas jornalísticas.
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Chovem os artigos na imprensa internacional sobre a crise da imprensa, enquanto crescente numero de jornais fecham, despedem jornalistas, diminuem suas tiragens. Os diagnósticos, ao serem feitos, em grande medida por pessoal ligado a essa imprensa, não conseguem sair do rame rame usual: a difusão da internet grátis, dos jornais grátis, etc., etc., seriam os responsáveis. Será?
Mas um artigo, desta vez da prestigiosa publicação norteamericana The Nation – “How to save jornalism?”, de John Nichols e Robert W. McChesney, de 25 de janeiro deste ano – aponta para um diagnóstico um pouco diferente. Em primeiro lugar, classifica o jornalismo como um “bem público”, considerando que deveria ser considerado da mesma forma que se considera a educação, saúde pública, o transporte, a infra estrutura.
Considerado dessa maneira, o fato de ser financiado por publicidade já desvia ou deforma esse caráter público, porque a publicidade visa interesses privados, venda de mercadorias, prestação de serviços na esfera privada. Essa concepção remeteria ao tema do financiamento público da imprensa.
Quanto ao diagnóstico que aponta para a difusão da internet, os autores recordam que a crise começou muito antes, já nos anos 1970, apontando para a busca de maximização dos lucros pelas grandes corporações, que foram tornando as mídias empresas como outras quaisquer de seu imenso leque de investimentos, tendo como resultado, entre outros, a diminuição da qualidade e a banalização do jornalismo, cada vez mais longe de ser um bem público.
As propostas atuais de tentativa de superação da crise financeira apontam normalmente para o pagamento das páginas de internet, dado que a publicidade nestas representa um ganho de 10% do que se perde nas publicações impressas. No entanto, apenas um ou outro jornal que acredita na sua capacidade de manter audiência sendo pago – como o The Wall Street Journal – se arriscam nessa direção. Ainda assim é duvidoso que possam arrecadar uma proporção minimamente significativa do que perdem com a diminuição da tiragem e, principalmente, com a retração da publicidade, canalizada para outros meios.
Na realidade a crise da imprensa é a da perda de credibilidade, é uma crise ética, de sua transformação em um instrumento da publicidade, do ponto de vista econômico, e da sua constituição em mentor político e ideológico da direita.
Os dados, publicados recentemente, demonstram como todos os grandes jornais brasileiros perdem leitores, mas, sobretudo, perdem influência. Embora todos os maiores jornais e quase todas as revistas semanais – à exceção da Carta Capital – sejam de férrea oposição ao governo, este mantêm 83% de apoio e eles conseguem apenas 5% de rejeição do governo. Temos aí uma idéia da baixíssima produtividade desses órgãos de oposição.
Jornais progressistas como La Jornada, do México, Página 12, da Argentina, Público, da Espanha, que gozam de alta credibilidade, se consolidam e se expandem, tendo páginas abertas amplamente visitadas. Seu patrimônio é sua ética social, suas posições políticas democráticas, o espírito pluralista dos seus comentaristas, a originalidade da suas coberturas jornalísticas.
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