domingo, 23 de maio de 2010

A dor da gente não sai no jornal

Reproduzo artigo de Beto Almeida, presidente da TV Cidade Livre de Brasília, publicado no sítio Carta Maior:

O verso da canção de Luiz Reis e Haroldo Barbosa, gravada pelo Chico, me socorre diante do elevadíssimo grau de anti-jornalismo a que alcança hoje a imprensa brasileira, merecendo certamente a crítica de Lula logo ao chegar de sua gira internacional. A mídia nativa torce abertamente pelo fracasso da iniciativa do Brasil junto ao Irã. Prefere novas sanções, a lógica do castigo, o que cria perigosos riscos de desdobrar-se em guerra, em destruição e morte como se vê agora mesmo no Iraque. A mídia americana torceu fervorosamente pela invasão militar aquele país. Chegou a mentir sobre a existência de armas de destruição em massa.. Depois, o jornal New York Times pediu desculpas aos leitores pela desinformação, mas aí já havia mais de um milhão de iraquianos mortos. A mídia brasileira vai pela mesma linha? Se as potências mundiais resolverem aplicar uma sanção contra o programa nuclear brasileiro a partir de pretexto de que aqui também se constrói uma bomba, o que já foi insinuado, a mídia brasileira ficará contra o Brasil e o seu povo?

Recuperemos alguns momentos na nossa história para saber como nossa imprensa, agora mídia, tem se colocado. Nos momentos de crise, episódios dramáticos, encruzilhadas históricas, momentos de decisão, vamos constatar que freqüentemente esta mídia, aquela que é majoritariamente representante dos interesses dominantes na sociedade, esteve divorciada de soluções nacionais, opondo-se raivosamente aos interesses populares, descumprindo descaradamente sua auto-proclamada vocação democrática, assumindo, repetidas vezes, o viés golpista, oligárquico e anti-nacional.

Ela se opôs quando o país conquistava uma legislação de defesa dos direitos trabalhistas e, coerente com esta vocação oligárquica, até hoje estes mesmos segmentos midiáticos, - agora modernizados pela eletrônica, mas não nos padrões civilizatórios - continuam a conspirar e a pretender a destruição da CLT implantada na Era Vargas. Antes da CLT era comum patrões espancarem seus empregados.... Há pouco vimos o brutal assassinato de uma jovem jornalista cometido pelo diretor de um destes grandes jornais oligárquicos simplesmente porque ela teve a “ousadia” de terminar o namoro. Esta mentalidade desdobra-se muitas vezes em linha editorial eivada de ódio social contra o povo. E qual não deve ser a dose deste ódio contra um retirante Lula quando ele “ousa” cruzar não apenas os mares e os continentes - com a agilidade que o moderno avião permite - mas, também cruzar e questionar com coragem os padrões de uma diplomacia convencional, conservadora e hipócrita que não apenas se conforma mas também cultiva sanções e guerras, desprezando a priori o diálogo entre os povos?

Se lá atrás, estes barões da imprensa foram capazes de festejar, escondidos e amedrontados, a morte de Vargas porque ela significaria o fracasso de uma política de industrialização de um país agrário, do estabelecimento de direitos trabalhistas e previdenciários, como não estarão agora os herdeiros destes barões a torcer para a derrota generalizada das iniciativas de Lula? Sobretudo quando Lula já bradou em momentos mais complexos que não se suicidaria como Vargas, não renunciaria como Jânio e não sairia do País como Jango!

Noticiaram: o Brasil não tem petróleo!!!

Para se medir até onde poderá chegar este anti-jornalismo, basta citar apenas um exemplo histórico: praticamente toda a imprensa fez campanha contra Vargas quando ele criava a Petrobrás. Essa mesma imprensa noticiava reiteradamente que não havia petróleo no Brasil, conforme diziam os relatórios de espertíssimos técnicos norte-americanos. Pode-se medir o tamanho da desinformação, do anti-jornalismo, pelo tamanho dos trilionários poços de petróleo pré-sal recém descobertos!

Pelo grau de precariedade jornalística, pode-se medir também que as elites jornalistas criticadas na fala presidencial estariam engrossando ainda mais, com a vassalagem de sempre, o coro da mídia internacional que percebeu claramente que na sua dialética de retirante Lula contraria interesses da indústria bélica, patrocinadora da lógica das sanções pelo Conselho de Segurança da ONU, avesso ao diálogo. Provavelmente veremos que em certos segmentos da mídia internacional aquele espaço editorial que reconheceu em Lula um mandatário com iniciativas para enfrentar a fome e a miséria, para integrar os povos e também para promover soluções democráticas, poderá passar a ser ocupado, também, com críticas a um presidente que “afronta a segurança e a paz internacional”, tradução esperta que dão para os interesses imperialistas, sobretudo do comércio internacional de armas. No dia em que Lula desembarcava no Irã a manchete do Estadão era “Farc tem acampamento na Amazônia”. Ou seja, Lula “tolerante com o terrorismo” lá e cá, era a mensagem subliminar.

Armas: lucros em cheque

Quando a Princesa Diana libertou-se do ambiente arrogante e despótico da realeza britânica e passou a fazer campanha contra a instalação de minas terrestres instaladas em Angola e outros países - e que ainda matarão ou mutilarão inocentes por décadas - logo a grande mídia sustentada por anunciantes ligados à indústria bélica tratou de estampar como controvertidos alguns de seus aspectos pessoais, suas pretensões pacíficas "inconseqüentes" e ,inclusive, o ”inaceitável” namoro com um árabe, peça que compunha a novelinha midiática para a destruição de sua imagem.. Estes poderosos interesses bélicos poderão insinuar que Lula estaria “passando dos limites”... Mas, até o Obama, em carta a Lula recomendou o acordo com o Irã. Agora foi enquadrado. O fantasma de Kennedy, ronda...

Por isso mesmo, é preciso ver o outro lado da crítica de Lula à imprensa. E talvez isto signifique encorajar as forças progressistas a uma reflexão que está presente nos esforços para realizar a Conferência Nacional de Comunicação, para aplicar o que ali se decidiu, mas, nem sempre encontra a capacidade para organizar as forças sociais que podem preencher a lacuna gigantesca que fere de morte a cidadania brasileira: a inexistência de um grande jornal popular, de massas, capaz de um jornalismo que promova os interesses nacionais, que encontre o seu lugar como ferramenta criativa e necessária para a construção de um Brasil verdadeiramente Nação!

Última Hora

Voltemos nossos olhos novamente para nossa própria experiência histórica. Já tivemos o jornal Última Hora, popular, nacionalista, capaz de refletir os interesses das classes trabalhadoras diuturnamente atacados pelo conjunto da imprensa oligárquica. Era um respiro democrático! Havia a polarização, a diversidade opinativa e política. Hoje há uma asfixia midiática anti-democrática. Não há sequer a controvérsia! E aquele jornal, que chegou a ter duas edições diárias, circulação nacional massiva, foi uma iniciativa encorajada por Vargas. Quando em 1954 a mídia conservadora comemorou a morte de Vargas, o Última Hora chorou e resistiu ao lado do povo que saiu às ruas. Quando em 1964, esta mesma mídia oligárquica suplicou e colaborou com o golpe de estado, o Última Hora resistia e defendia a democracia.

Jornalismo estratégico

Dentro da visão estratégica de um país que pretende desempenhar legitimamente um papel importante e protagonista no jogo do poder internacional - e era assim na Era Vargas e é assim novamente agora com Lula - nós, como povo brasileiro e como Nação, não podemos deixar de lado esta questão que continua a nos desafiar. Vários passos importantes foram dados, entre eles a conquista simbolizada na criação da TV Brasil. E mais ainda agora quando na próxima segunda-feira será lançada a TV Brasil Internacional, inicialmente para dialogar com os quase três milhões de brasileiros espalhados mundo afora. A iniciativa, louvável, trará com mais realismo a necessidade do Brasil também dialogar com outros povos já que pretende atuar para que as relações internacionais sejam democratizadas, reequilibradas e marcadas pela cooperação.

Vale lembrar que a Rádio Nacional, também criada na Era Vargas, chegou a ser a quarta mais potente emissora do mundo, além de ter programação em quatro idiomas, alcançando vários continentes e tendo em seu corpo de redatores brasileiros como Nestor de Hollanda, Carlos Drummond de Andrade, Manoel Bandeira, Cecília Meirelles etc. A TV Brasil Internacional tem uma herança em que se apoiar e tem um caminho que pode recuperar para levar a mensagem de uma nação brasileira que se empenha por um mundo mais justo e baseado na cooperação, não nas sanções.

Será que as forças progressistas não deveriam encarar de fato esta tarefa da construção de um jornal popular, nacional, de ampla circulação, fazendo jornalismo na verdadeira acepção da palavra e recuperando para o jornalismo a missão de bem público e de ferramenta civilizatória hoje ignorada em boa medida pela mídia hegemônica no Brasil?

Será que estas forças que foram capazes de articular, se organizar, para resistir à ditadura, enfrentar o neoliberalismo e se fortalecer para chegar à presidência - um feito de proporções históricas numa sociedade com os arraigados esquemas dos donos do poder - não teria também a capacidade de construir um jornal e de praticar um jornalismo público, civilizador, humanista? Não se trata de estimular aqui nada contra as iniciativas para democratizar a informação no espaço digital. Trata-se de complementar, de articular, até porque com toda a importância e o grande efeito que comprovamos na internet, tuitar não esgota a necessidade de fazer jornalismo. Não se deve pretender apenas repercutir, contestar, confrontar a unanimidade conservadora da mídia hegemônica e seu anti-jornalismo em vias de deterioração acelerada.

Surra midiática diária

Há iniciativas importantes, a realização da Confecom é uma delas, a TV Brasil já citada, a recriação da Telebrás estatal, aliás, uma clara aplicação de decisão tomada na Confecom, são outras. Surgiram a Altercom, o Barão de Itararé, o Mídia Livre, todos os blogs e portais, os jornais e revistas alternativas, as TVs e rádios comunitárias etc mas, ainda assim, estamos em boa medida dispersos, desarmados no campo da comunicação e os interesses nacionais, populares, democráticos, levam várias surras por dia, todos os dias.

Vemos que algumas das forças que se articularam para levar Lula á presidência também poderiam coordenar-se para que milhões de brasileiros pudessem entrar também na Era de Guttemberg, ao mesmo tempo em que este seria, obviamente, um jornal também digital. Um jornal que permitisse chegar aos grotões, urbanos ou não, um instrumento para a discussão, a mobilização, a ação e a organização política nas mãos de uma militância carente de ações organizadas que já teve no passado.. Será que a união de certos fundos de pensão (tão lucrativos), centrais sindicais, empresários vinculados ao mercado interno não poderia enfrentar esta tarefa que sempre volta à baila?.

Há dois anos foi aprovado num congresso do PT a prioridade para a criação de um jornal de massas, mas não se realizou. Hoje, na Argentina há um Página 12, no México, há o La Jornada, na Bolívia, o jornal Cambio, criado por Evo Morales e que já é o de maior tiragem no país, com apenas 7 meses de nascido, rivalizando com o jornal conservador La Razón, que tem 70 anos. Na Venezuela, nasceu o Correio do Orenoco, está em todas as bancas, ainda que o governo tenha fortalecido a mídia pública de rádio e TV, sem contar que Hugo Chávez tem mais de 300 mil seguidores no twitter, que usa com entusiasmo. Aqui, desde o desaparecimento do Última Hora, estamos sem um jornal de ampla circulação e com capacidade de sustentar uma visão jornalística dos interesses nacionais e populares. É uma grande lacuna.

E nós?

Assim, a bronca de Lula nesta elite de jornalistas que se posiciona claramente contra o sucesso das iniciativas que visam levar o Brasil a ter um papel construtivo no mundo, sendo correta, será que não deveria também servir para provocar uma reflexão, certamente autocrítica, nas forças populares? O jornalismo ou o anti-jornalismo das elites cumpre o triste papel que lhes reserva a subordinação a interesses anti-nacionais. Mas, onde está o jornal das forças progressistas?

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A “nova” máquina de guerra dos EUA

Reproduzo artigo de Jack Smith, editor do Hudson Valley Activist Newsletter, traduzido por Caia Fittipaldi e publicado no sítio Outras Palavras:

Há mais guerra no futuro dos EUA – muito mais, a julgar pelos relatórios, pronunciamentos e ações do governo Obama nesses últimos meses.

Esses documentos incluem o Relatório de Revisão Quadrianual da Defesa [Quadrennial Defense Review (QDR)], a Revisão da Postura Nuclear [Nuclear Posture Review (NPR-2010)], o Relatório da Defesa de Mísseis Balísticos [Ballistic Missile Defense Report], o encontro de segurança nuclear em New York e a conferência da ONU, de 3 a 28 de maio, de revisão do Tratado de Não-proliferação Nuclear, além, claro, das guerras em curso no Oriente Médio e na Ásia Central, e das exigências do orçamento de guerra do Pentágono.

O governo dos EUA comanda um colosso militar sem par, mas a [QDR], publicada em fevereiro, sugere que Washington entende que os EUA estejam constantemente sob ameaça de ataque por inúmeras forças terríveis, decididas a destruí-los. Por isso, mais trilhões de dólares têm de ser consumidos em guerras presentes e futuras – ostensivamente para salvaguardas a pátria amada ameaçada.

A Revisão da Postura Nuclear (NPR-2010) diz que o objetivo de longo prazo é um mundo “livre de bombas nucleares”, mas, apesar de reduções simbólicas dos arsenais desse tipo de armas, o Pentágono só faz ampliar sua capacidade nuclear, temperando a ampliação com uma devastadora “contenção convencional” capaz de atacar vários alvos pelo mundo, no período de uma hora. Além disso, esse documento, publicado em abril, preserva a prontidão para disparar ataque nuclear imediato, não limita a força nuclear à função de contenção, sugere uso ofensivo e, pela primeira vez, autoriza ataque nuclear, se necessário, contra Estado não-nuclear (o Irã).

Entre um e outro documento, Obama expande vigorosamente as guerras que herdou do governo de George W. Bush, ampliando e operando o maior poder militar que os EUA jamais tiveram.

Feito a elogiar do governo Obama foi ter assinado, dia 9 de abril, em Praga, o novo Tratado Estratégico de Redução de Armas Nucleares com a Rússia, que reduz em 1.500 o arsenal de ogivas nucleares de cada lado. Foi passo positivo, mas todos sabem que excessivamente tímido, e nem de longe reduz efetivamente o risco de guerra nuclear.

A Revisão Quadrianual da Defesa (QDR) é um relatório de 128 páginas que o Departamento de Defesa envia ao Congresso a cada quatro anos, com uma projeção do planejamento militar dos EUA para os 20 anos seguintes. Comissão de 20 membros civis, selecionados pelo Pentágono e pelo Congresso, analisam o documento e sugerem alterações, para acrescentar uma perspectiva dita “independente”. 11 dos 20 membros ‘independentes’, inclusive o co-presidente dessa comissão – ex-secretário da Defesa William Perry; e o ex-conselheiro de segurança nacional Stephen Hadley – são empregados da indústria da Defesa.

Embora o Pentágono trabalhe nos preparativos de uma possível III Guerra Mundial e novo pós-guerra, o relatório que está sendo apresentado concentra-se no futuro relativamente mais próximo, e só acrescenta rápidas generalizações sobre o futuro de longo prazo. Três das prioridades do QDR merecem comentário extra.

A primeira dessas prioridades é “vencer as guerras em andamento” no Afeganistão, Paquistão, Iraque, Iêmen e onde mais houver intrusão militar da Washington pós-11/9 nos anos vindouros. Na apresentação da Revisão Quadrianual, dia 1/2/2010, o secretário de Defesa de Bush-Obama Robert Gates fez declaração importante: “O sucesso nas guerras futuras dependerá do sucesso nas guerras em andamento.” As “guerras futuras” não foram identificadas. Além disso, a Revisão Quadrianual declara que a vitória militar no Iraque e no Afeganistão “é apenas o primeiro passo rumo a nossos objetivos estratégicos”.

Segundo, enquanto no passado os EUA concentraram-se em construir capacidade para combater duas grandes guerras simultâneas, a Revisão Quadrianual sugere que não basta isso. Hoje, o governo Obama afirma “a necessidade de força robusta, capaz de proteger os interesses dos EUA contra uma multiplicidade de ameaças, inclusive as que advenham de sofrer ataque simultâneo por dois Estados-nação”.

Hoje se trata de mais de duas guerras – sendo o “a mais”, a obrigação de “lutar de contra-insurgência em larga escala, [montar e operar] operações de estabilização e contra-terrorismo em ampla variedade de ambientes”, sobretudo em países pequenos e pobres como o Afeganistão. Outros alvos “a mais” incluem “atores não estatais”, como a Al-Qaeda; “Estados fracassados”, como a Somália; e Estados de tamanho médio, mas bem defendidos, que não se curvem ao Tio Sam, como o Irã e a República Popular Democrática da Coréia ou, algum dia, talvez, a Venezuela.

Terceiro, é absolutamente evidente, na Revisão Quadrianual, embora não assumidamente reconhecido, que o governo Obama crê que China e Rússia sejam os dois possíveis “Estados-nação” contra os quais Washington deve preparar-se para defender-se. Nem Pequim nem Moscou têm qualquer iniciativa que justifique o pressuposto do Pentágono de que seriam suficientemente suicidários a ponto de atacar os poderosos EUA.

Afinal, os EUA, com 4,54% da população mundial, investem mais na preparação para a guerra que todo o resto do mundo somado. O orçamento de Obama em 2010 para o Pentágono é de US$ 680 bilhões, mas o total real alcança o dobro disso, se se consideram que os gastos de Washington em segurança nacional e gastos de outros departamentos devem ser somados, como o custo da manutenção e armazenamento das armas nucleares, as 16 agências de segurança, a Segurança Nacional e lucros das dívidas de guerra, dentre outros programas.

Gastos anuais relacionados à guerra alcançam facilmente o trilhão de dólares. Ao falar de um congelamento seletivo de programas nacionais, em janeiro, no discurso “State of the Union”, Obama especificamente excluiu do congelamento os gastos do Pentágono/segurança nacional. Obama é gastador pródigo em guerras. A atribuição de US$ 708 bilhões que fez ao Pentágono, para o ano fiscal 2011 (sem contar os US$ 33 bilhões que esperam aprovação no Congresso para o “surge” afegão) excede o mais alto orçamento de Bush, de US$ 651 bilhões, para o ano fiscal de 2009.

Hoje, o poder militar dos EUA está presente em todo o planeta. Como se lê na Revisão Quadrianual: “Os EUA são potência global, com responsabilidades globais. Incluindo operações no Afeganistão e no Iraque, cerca de 400 mil soldados e pessoal militar em geral estão estacionados ou na alocação militar rotativa, em todo o mundo.”

O Pentágono comanda mais de 1.000 bases militares em todo o mundo (inclusive nas zonas de guerra), grandes frotas em todos os oceanos, força aérea em expansão, satélites militares no espaço e mísseis nucleares em prontidão e alerta totais, pré-direcionados para “o inimigo” ou para cidades e instalações militares potencial emente “inimigas”.

Leitura da Revisão Quadrianual mostra que nada disso será modificado, senão da direção da modernização e da ampliação (o Pentágono acaba de ocupar seis novas bases na Colômbia) e do acrescentamento de novos sistemas, como o Prompt Global Strike, importante sistema de armas ofensivas, que discutiremos adiante.

A expressão “dominação militar de pleno espectro” – que os neoconservadores cunharam nos anos 1990s e foi adotada pelo governo Bush para definir sua estratégia militar agressiva – não foi incluída, espertamente, na Revisão Quadrianual de 2010, mas conservar e aumentar sua capacidade de dominação militar plena continuam a ser a principal preocupação do Pentágono.

A Revisão Quadrianual vem apimentada com expressões como “os interesses dos EUA e seu papel no mundo exigem forças armadas com capacidades superiores a tudo que se conhece” e proclama a importância do “domínio continuado pelas Forças Armadas dos EUA, nas guerras de larga escala de exército contra exército”. Gates foi ainda mais longe, na conferência de imprensa dia 1/2/2010: “Os EUA precisam ter amplo portfólio de capacidades militares, com versatilidade máxima no espectro mais amplo possível de conflitos”. Recentemente, Obama pavoneou-se de comandar “os mais poderosos exércitos da história do mundo”.

Evidentemente o Pentágono planeja engajar-se em várias guerras futuras, interrompidas por rápidos períodos de paz, durante os quais se preparará para a guerra seguinte. Dado que a única entidade que já manifestou claro interesse em atacar os EUA é a Al-Qaeda – organização paramilitar de fanáticos religiosos extremistas, com cerca de mil membros ativos e aproveitáveis em todo o mundo – é evidentemente claro que o poderio militar sem precedentes que os EUA acumulam hoje visa a outro objetivo.

Na minha opinião, esse “outro objetivo” é geopolítico – aumentar o poderio militar do Pentágono para assegurar que os EUA consigam tentar manter a posição hegemônica global de dominação, em tempos de endividamento pesado, erosão severa de sua base econômica, impasse quase absoluto na política doméstica e aparição, no cenário global, de outras nações e blocos interessados em contestar a hegemonia dos EUA.

A Revisão Quadrianual toca nesse ponto sensível com admirável delicadeza: “A distribuição global do poder político, econômico e militar está em transformação, tornando-se mais difusa. O aparecimento da China no quadro global, o país mais populoso do mundo; da Índia, a maior democracia do mundo, continuarão a reformatar o sistema internacional. Embora os EUA continuem como ator mais poderoso, é indispensável que cada vez mais cooperem com seus aliados e parceiros-chave para manter a paz e a segurança. O modo como os poderes hoje emergentes integrar-se-ão ao sistema global é questão das que definirão esse século e que, portanto, são centrais para os interesses dos EUA”.

No presente momento, a Revisão Quadrianual indica que Washington está preocupada com estratégias estrangeiras “antiacesso” que limitam o “poder [dos EUA] para projetar capacidades” em várias partes do mundo. Isso significa que alguns países, como China e Rússia, estão desenvolvendo novas armas sofisticadas que equivalem ao armamento dos EUA, o que “limita” o deslocamento das forças dos EUA para onde o Pentágono bem entenda. Por exemplo:

“A China está desenvolvendo e instalando em campo grande número de mísseis balísticos e cruzadores avançados de médio alcance, novos submarinos de ataque equipados com armas avançadas, sistemas de defesa antiaérea de longo alcance cada vez mais efetivos, capacidades para guerra eletrônica e redes de computadores, aviação de ataque sofisticada e sistemas espaciais de defesa. A China tem divulgado informação limitada sobre o ritmo, o escopo e os objetivos estratégicos de seus programas de modernização militar, o que faz aumentar o número de interrogações legítimas quanto a suas intenções de longo prazo.

Para contrabalançar esse movimento dos chineses – e não só deles –, o Pentágono planeja, com custos astronômicos e não divulgados, os seguintes avanços: “Expandir as capacidades de ataque a longa distância; explorar as vantagens das operações subterrâneas; garantir acesso ao espaço e ao uso de recursos espaciais; aumentar a robustez de capacidades-chave de Inteligência, Vigilância e Reconhecimento; derrotar sistemas inimigos de sensores e engajamento; aumentar a presença e a prontidão para responder, das forças dos EUA, em todo o mundo.”

Além disso, os EUA não só mantêm a China na mira de seus mísseis e bombas; estão também cercando o país (e também a Rússia, é claro) com balísticas antimísseis. O objetivo é evidente: no caso de os EUA acharem “necessário” lançar mísseis contra a China, o sistema antimíssil lá estará para destruir a capacidade limitada de retaliação dos chineses.

Matéria publicada dia 22/2/2010 no China Daily, diário chinês editado em inglês: “Washington parece determinada a cercar a China com sistemas balísticos antimísseis produzidos nos EUA, observaram hoje especialistas chineses… Para o coronel Dai Xu da Força Aérea, renomado estrategista militar, em artigo distribuído esse mês, “a China está sob cercamento em formato de meia-lua. O anel começa no Japão, estende-se pelas nações do sul do Mar da China até a Índia e termina no Afeganistão”.

Em comparação com a Revisão Quadrienal do governo Bush em 2006, no documento de 2010 constata-se que houve esforço consciente para baixar o tom da retórica anti-China. Mas é absolutamente evidente que a China é a referência número 1, nos pontos em que a Revisão Quadrienal de 2010 fala de “Estados-nação potencialmente hostis”.

Para a revista Defense News, de 18/2/2010, publicação dirigida ao complexo industrial-militar: “Dizem os analistas que a Revisão Quadrianual da Defesa visa a enfrentar o problema chinês, sem enfurecer ainda mais Pequim. ‘Se se considera a lista de novas ampliações e reforços nas forças e capacidades dos EUA (…), vê-se que são forças e capacidades necessárias para derrotar a China, não o Irã nem a Coréia do Norte nem o Hizbollah’ – disse Roger Cliff, especialista em questões militares chinesas da Rand Institution. ‘Assim, embora pouco se cite a China (…), é a ameaça chinesa, sim, que inspira muitos dos programas de modernização descritos na Revisão Quadrianual da Defesa de 2010’.”

Incidentalmente, segundo o Center for Arms Control and Non-Proliferation, o orçamento chinês de defesa para esse ano, para país quatro vezes maior que os EUA, é de US$ 78 bilhões, bem inferior aos US$ 664 bilhões reservados para o Pentágono (sem contar todos os extras para segurança nacional, espalhados nos orçamentos de outros departamentos). A China possui entre 100 e 200 ogivas nucleares; os EUA, 9.326 (se se somam as ogivas montadas em mísseis e as estocadas). A China considera a construção de um porta-aviões; os EUA mantêm 11 em atividade. E a China não tem base militar fora do território chinês.

Tudo faz crer que a China esteja construindo instrumentos, sistemas e armas de defesa, não de ataque contra os EUA. E a política exterior chinesa baseia-se a não se deixar prender no corner, pelos EUA, fazendo todo o possível para evitar confrontação mais séria.

Também a Rússia recebe melhor tratamento na nova Revisão Quadrianual da Defesa, que na de 2006, mas aparece incluída ao lado da China em vários casos. Apesar do imenso poder de contenção de Moscou, e das reservas abundantes de petróleo e gás, a Rússia aparece sempre como “inimigo potencial” número dois, entre as grandes potências. Washington sente-se mais ameaçada por Pequim. Isso, em larga medida, por causa das dimensões territoriais da China, do rápido desenvolvimento, do sucesso da economia capitalista guiada pelo Estado dirigido pelo Partido Comunista; e pelo fato de que, ao ritmo em que vamos hoje, a China ultrapassará os EUA como principal potência econômica do mundo, nos próximos de 20 a 40 anos.

Parece já bem evidente, por menos que se fale sobre isso, que essa situação é extremamente perigosa. A China não dá qualquer sinal de que aspire a dominar o mundo, mas tampouco se deixará dominar. Pequim trabalha sob o conceito de ordem mundial multipolar, no qual vários países e blocos atuam em diferentes papéis. Pode-se discutir, no máximo, quem será o primeiro entre iguais.

Washington prefere a situação que existe nos últimos 20 anos posteriores à implosão da URSS, quando os EUA ficaram com a posição de única superpotência militar remanescente e líder do bloco capitalista expandido. Nesse período, Washington operou como potência hegemônica em mundo unipolar, e não quer perder esse título.

Tudo isso parece estar mudando hoje, com a emergência de outros países, o principal deles a própria China; e os EUA dão sinais de entrar em declínio gradual. O modo como for encaminhada a transição na direção da multipolaridade nas próximas duas, três décadas, determinará se se evitará, ou não, mais uma guerra desastrosa.

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Serra e a morte de Deus

Reproduzo artigo de Gilson Caroni Filho, publicado no sítio Carta Maior:

José Serra precisa de ajuda. Não basta aquela que lhe é oferecida por uma mídia favorável. É necessário que alguém reavive seu senso de oportunidade. Um dos males que costumava atacar com muita freqüência o brasileiro, principalmente aquele que vivia de salário (a maioria, portanto) consistia na tendência de ser enganado com facilidade. Faz cerca de oito anos que o PSDB deixou o governo e ainda não se deu conta de que a percepção da realidade mudou. Jogar palavras ao vento, com fez o pré-candidato tucano para uma platéia de militantes (?) do PPS, é um exercício arriscado, uma manifestação que mescla soberba e desespero em dosagem tão hilariante quanto assustadora. Mas nada disso nos permite duvidar de sua capacidade e argúcia analítica. Afinal, como diz o slogan de campanha dos tucanos: "o Brasil pode mais". Resta saber o quê. E para quem.

Ao afirmar, em uma tentativa de crítica à política econômica do governo Lula, que "nós estamos voltando rapidamente a um modelo que não atende à demanda de emprego que o país possui", o ex-governador paulista aposta no total alheamento do eleitor brasileiro. Tamanha credulidade espanta, tendo em vista que o mundo do trabalho - a principal vítima do modelo neoliberal orquestrado pelo tucanato - aprendeu direitinho, na própria pele, o que significou o mercado desregulado como chave para o crescimento econômico e as virtudes do “Estado musculoso", elementos centrais no discurso serrista.

A afirmação sobre empregos não é piada, nem brincadeira de um notívago diletante, mas desespero de um candidato que, em face de uma conjuntura que lhe é totalmente adversa, tem que produzir discursos a todo e qualquer custo. E de Serra, pode-se afirmar várias coisas, menos a de não ser um ator político que sabe o que faz. Sua eventual perdição, entretanto, antes de ser festejada pelas forças progressistas, deve causar desconfiança e vigilância redobrada. Pois é inevitável que os ânimos se acirrem em seus dois principais pólos de apoio: a mídia corporativa e o Poder Judiciário.

Mas a comparação suscitada por suas declarações é inevitável. Segundo dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), o número de vagas criadas no mercado de trabalho bateu recorde no primeiro trimestre de 2010, com um saldo acumulado até março somando 657.259 empregos. Convém retornar no tempo e observar como se comportava a economia brasileira quando o pré-candidato tucano era ministro do Planejamento e Orçamento do primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso.

O desemprego na indústria atingia 5,7% em 1997 em relação a 1996, resultado fortemente influenciado pela taxa de dezembro, quando a queda foi de 2,6% em relação a novembro, a pior desde dezembro de 1990, segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Para se ter uma idéia do tamanho da retração nos empregos, os dados do instituto mostravam uma queda anualizada de 7,3%.

Quando Serra pôde mais, o trabalhador pôde menos.

Até então, o governo FHC registrava um desemprego industrial de 19,77%. Mas o “Brasil que não podia mais", aquele que os colunistas econômicos tanto enaltecem, vivia um amargo processo de ajuste, acentuado em 1996, com a atividade econômica represada e a queda no emprego apresentando taxas expressivas. Ao contrário do que afirma Serra foi sob a batuta tucana que “o Brasil adotou uma política econômica desastrosa."

Mas o discurso do tucano foi além, mirando também o campo da ética, com críticas a supostas práticas de corrupção no governo petista. Como fazem as vestais tucanas, destampou um poço de demônios para sentenciar: "se aquele que era o guardião da moral, da ética, do antipatrimonialismo toma outro rumo, o rumo oposto, para muita gente Deus morreu". Que metafísica, o ex-governador paulista quer superar com essa alusão a Nietzsche?

Decerto não deve ser a do governo ao qual serviu em dois ministérios. Fernando Henrique não teve escrúpulos de usar métodos condenáveis para evitar investigação da banda podre da administração federal. A retirada de assinaturas para esvaziar a criação da CPI da Corrupção, em 2001, é um belo exemplo. O arrastão de favores para livrar o governo de qualquer constrangimento ficou como um dos mais baixos momentos de um presidente eleito e reeleito pela ansiedade ética na vida brasileira.

Fernando Henrique liberou por bravata os parlamentares de sua base política para subscrever a CPI e, na hora H, liberou verbas estocadas e fez nomeações para cargos públicos. Junto com ACM e José Roberto Arruda, FHC afrontou o sentimento ético da cidadania falando em “linchamento precipitado" quando sua posição anterior incentivava a punição exemplar e imediata. E onde estava José Serra em meio a tudo isso? No Ministério da Saúde, definindo a criação da CPI como uma “brincadeira", "pretexto eleitoral", " instrumento para prejudicar a governabilidade.”

Em sua campanha, o tucano terá que se confrontar com questões sobre ética e economia. Mas com muita cautela, evitando o reaparecimento de fantasmas incômodos. Eles podem dizer que foi naquela época, e não hoje, que “para muita gente Deus morreu". Um deus imanente, amoral e, tal como os dirigentes aboletados no Estado, servil ao mercado que o pagou.

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Manual do jornalista para entrevistar Serra

Reproduzo artigo do jornalista Paulo Henrique Amorim, publicado no Conversa Afiada:

Este modesto blogueiro foi um dos primeiros a denunciar que o Serra liga para os patrões e pede a cabeça de repórter que faz pergunta de que ele não gosta.

Este modesto blogueiro contou que, por duas vezes, ele ligou para o Presidente da Record e pediu a cabeça deste modesto blogueiro.

Serra é o nosso Putin.

Ele gostava do tempo em que bastava dar três telefonemas para controlar o PIG: para o Dr. Roberto (ou o Jorge Serpa, a quem ele também recorria com freqüência); o “Seu” Frias, a quem dedicou uma ponte em São Paulo; e ao Ruy Mesquita (o Robert(o) Civita vinha no vácuo).

Foi assim que ele construiu uma reputação que não resistiu a uma campanha que o PIG não consegue controlar mais, sozinho.

O Conversa Afiada defende a tese de que, sem o PIG, esses tucanos de São Paulo não passavam de Resende.

E Serra é o neo-Silvio Santos: um candidato a Presidente que só tem mídia.

Agora, como se sabe, o Serra deu para atacar jornalistas.

Em nome da liberdade de expressão, o Conversa Afiada tenta prestar um modesto serviço. Um manual para jornalistas que vão entrevistar o Serra.

(Especialmente dedicado a mulheres repórteres, a quem ele dedica fúria especial. Ele parece preferir as que calam.)

Sugestão 1: Não se atemorize.

2: Tenha certeza de que há outros jornalistas em volta dele, munidos de câmera, máquina fotográfica, gravador ou celular – você vai precisar de testemunhas.

3: Não faça pergunta numa situação em que você esteja sozinho com ele.

4: Faça uma pergunta curta, direto ao ponto: “o senhor vai vender a Petrobrás ?”, por exemplo.

5: Não responda à pergunta que ele fizer. Esse é um dos truques dele. Ele tenta desqualificar a sua pergunta com outra pergunta: é isso o que o seu patrão quer saber?; quem te disse isso?; você realmente acredita nisso?; quem te mandou fazer essa pergunta?

Jamais responda ao Serra. Você não é candidato a nada. O candidato é ele; ele é quem tem que dar satisfações à sociedade.

6: Insista com a sua pergunta. Além de tentar desqualificar a sua pergunta, ele vai tentar não responder à sua pergunta.

7: Faça a sua pergunta até que ele responda.

8: Não se deixe encurralar pelos outros repórteres do PIG.

O Serra vai tentar desviar a entrevista para os repórteres que ele conhece e sabe que são do PIG. É o pessoal que faz as perguntas do tipo “púlpito”.

9: Tenha uma segunda pergunta na agulha: “o senhor vai esconder o Fernando Henrique da sua campanha, como fez o Alckmin em 2006?”

Se ele der uma resposta que não quer dizer nada sobre a Petrobrás, você terá essa do FHC na ponta da língua. Mas, insisto: faça a pergunta direto, curta e tão alto que os outros repórteres ouçam (e possam gravar, fotografar, filmar, etc.). Um exemplo: quando o delegado Bruno se deixou “surpreender” pelos repórteres do PIG e divulgou as notas dos aloprados, um deles gravou a conversa do delegado com os repórteres e vazou para o Conversa Afiada. Quando você (e o Serra) menos espera, tem um aliado, ao lado.

10: Não se esqueça: ele foge. Um dos traços da personalidade do Serra é que ele é feroz quando percebe que o interlocutor está com medo. E, sobretudo, ele é valente pelas costas. Se você o enfrentar – ou seja, se não renunciar à função de repórter e insistir na pergunta – se você o enfrentar, ele foge. Não tenha medo dele.

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Pernambuco radicaliza na TV pública

Reproduzo artigo do professor Laurindo Lalo Leal Filho, publicado no sítio Carta Maior:

Atenção historiadores da TV brasileira: em Pernambuco escreve-se hoje uma página inédita dessa história. Pela primeira vez no Brasil uma TV pública está sendo reconstruída de baixo para cima. Trata-se da TV Pernambuco, criada pelo governo do Estado em 1984, tendo tornado-se durante os governos pós-ditadura de Miguel Arraes (1987-1990 e 1995-1999) um importante veículo de informação e entretenimento regional, com significativa audiência. Abandonada na gestão Jarbas Vasconcelos (1999-2006), foi entregue em março deste ano pelo governador Eduardo Campos ao movimento social, comprometido com a democratização da comunicação, para conduzi-la.

Na tarde da quarta-feira, 19/5, cerca de 150 pessoas participaram de um encontro organizado pela nova direção da emissora para discutir a sua forma de gestão. Produtores, artistas, professores, estudantes, jornalistas e telespectadores em geral, reunidos no auditório do Porto Digital, no Recife Antigo, puderam dar livremente as suas opiniões de como a TV Pernambuco deve se organizar para se tornar efetivamente pública.

Dois encontros anteriores discutiram as finalidades de uma televisão pública e as novas tecnologias. O resultado desses debates será sintetizado em documento a ser entregue ao governador, no começo de junho, como proposta da sociedade para a reconstrução da TV. Nessa tarefa, a diretoria é assessorada por um grupo de trabalho composto por nomes reconhecidamente comprometidos com a comunicação democrática, como Ivan Moraes Filho e Eduardo Homem, por exemplo.

Mas a mudança já começou. O novo presidente da TV é o apresentador e produtor cultural Roger de Renor, que de burocrata não tem nada. Brincando, mas revelando o tipo de gestão que começa a ser feita, diz que os primeiros novos departamentos por ele inaugurados foram os "do bom dia, boa tarde, boa noite; o do por favor e o do muito obrigado". Pode haver coisa melhor, num meio marcado pelo egocentrismo e pelo autoritarismo?

Na música Macô, o falecido Chico Science pergunta ? Cadê Roger, Cadê Roger, Cadê Roger, Ô?? Se pudesse ouvir diríamos ao Chico que agora ele está na TV Pernambuco e que até há alguns meses apresentava um excelente musical na TV Brasil chamado "Som na Rural", com estúdio móvel instalado numa antiga Rural Willys.

Mas além de pessoas como Roger e o seu competente diretor jurídico Adriano Araujo na direção da emissora, o governador colocou também dinheiro. Dois milhões e quatrocentos mil reais foram liberados para melhorar o sinal da TV, hoje precário em parte do Estado e principalmente no grande Recife. Na capital, nas regiões em que é possível sintonizá-la, a TV Pernambuco pode ser assistida no canal 46 (UHF). Até o governo Jarbas era possível ver a TV estatal em VHF, no canal 9, ao lado das grandes redes comerciais. Mas a concessão foi perdida e ocupada, rapidamente, pela Bandeirantes.

O desafio agora é afinar as propostas no sentido de que a ousadia do governo atual não seja derrotada por governos futuros. Daí a importância dos debates que estão sendo realizados no Recife. Deles deve sair um projeto capaz de garantir o financiamento constante da emissora, imune aos humores dos governos "do dia" e uma forma de gestão que permita a maior independência possível em relação a esses mesmos governos.

Que possibilite também a criação de barreiras para conter as investidas dos setores mais conservadores da sociedade, sempre prontos a detonar tudo aquilo que não conseguem controlar de forma privada. Por isso, o conselho gestor antes de ser um controlador da empresa, deve ser o seu defensor diante das ofensivas reacionárias.

No entanto, mesmo com tudo aprovado oficialmente, a prática efetiva só será possível se a sociedade tiver clareza de que a emissora lhe pertence. Para tanto são necessários canais amplos de participação na gestão, acompanhados de um programação na qual o telespectador perceba que está recebendo um serviço público de radiodifusão de alta qualidade que, de alguma forma, contribui para melhorar a sua vida.

Os passos dados até agora vão nessa direção. E mesmo sofrendo algum percalço, já são suficientes para entrar na história da televisão brasileira. Daqui para frente servirão de modelo para qualquer outra construção participativa de um meio de comunicação de massa que vier a ser feita em nosso país.

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sábado, 22 de maio de 2010

Sem pressão, Confecom não sairá do papel

Reproduzo artigo de Candice Cresqui, publicado no sítio do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação:

Tramitam mais de 200 projetos sobre temas de comunicação na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados. Esse número, que inclui as propostas apensadas, pode ultrapassar a casa dos 300 se forem contabilizados os projetos que estão em outras comissões. A maioria das proposições antecede à 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom).

A recente manifestação do deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), sugerindo a autorregulamentação das empresas de comunicação, é um exemplo significativo do distanciamento que os parlamentares mantêm das deliberações da Confecom. Ao que tudo indica, eles pouco as consideram, e só o farão mediante a pressão dos movimentos sociais.

A Confecom, realizada em dezembro passado, marcou o cenário da comunicação no país ao reunir empresários, sociedade civil e o poder público em torno do tema. Do debate surgiram 672 diretrizes para a formulação de um novo marco legal das comunicações. Nos quatro meses posteriores ao encontro foram apresentados na Câmara dos Deputados 25 novos projetos, mas ainda não se vê, entre a maioria dos parlamentares, empenho pela implementação das propostas da Confecom.

Para Nascimento Silva, coordenador da Federação Interestadual dos Trabalhadores em Radiodifusão e Televisão (Fitert) e um dos coordenadores executivos do FNDC, isso só ocorrerá com intensa mobilização dos movimentos sociais comprometidos com a democratização da comunicação. “Nós fizemos junto com o Executivo o grande debate, agora temos que fazer junto com os parlamentares as deliberações virarem efetivamente leis. Sem esse trabalho não vamos chegar a lugar nenhum”, avalia o dirigente.

Vaccarezza apoia proposta empresarial

Durante a 5ª Conferência Legislativa sobre Liberdade de Imprensa, realizada em Brasília no dia 04 de maio, o líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), defendeu a autorregulamentação apresentada por representantes das empresas de comunicação. A proposta de criar um órgão nos moldes do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) foi defendida pelo parlamentar como adequada para o “equilíbrio” da mídia e para a proteção da liberdade de imprensa.

Para Roseli Goffman, representante do Conselho Federal de Psicologia (CFP) na Coordenação Executiva do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), a fala do parlamentar representa um retrocesso inconcebível e desconsidera o pleito da sociedade pelo Conselho Nacional de Comunicação, que represente todos os segmentos sociais. “Proposta aprovada por consenso durante a Confecom”, salienta.

A psicóloga acredita que posicionamentos como o de Vaccarezza revelam um grande desconhecimento sobre as propostas da Conferência. Além disso, a morosidade do legislativo federal em absorver a Confecom revela a ação dos empresários do setor contrários à regulação dos seus negócios. “O problema é que as frentes parlamentares pela radiodifusão presentes no Congresso são as mesmas que sempre garantiram às hegemonias a ausência de regulação”, observa.

Na opinião de Roseli, o fato de a página oficial da Confecomnão disponibilizar mais o relatório final da Conferência demonstra certo desinteresse também do Executivo. Como a Confecom mobilizou o país inteiro, formulou questões importantes para o Parlamento e para as campanhas presidenciais deste ano, é preocupante que os seus resultados sejam omitidos à sociedade. Situações como essa servem aos interesses dos setores empresarias que se desligaram da Confecom e “não querem ver as deliberações tiradas lá tomando forma”, acrescenta.

Audiência debaterá pós-Confecom

A implementação das propostas aprovadas na Confecom será pauta de uma Audiência Pública na CCTCI. Ainda sem data marcada, foi requerida pela deputada Luiza Erundina (PSB-SP). Além disso, em reunião da Comissão Nacional Pró-Conferência, realizada na semana passada, entidades da sociedade civil traçaram ações para o período pós Conferência. Entre elas está a definição das propostas prioritárias e a realização de seminários nacionais sobre comunicação e participação social.

Segundo José Sóter, Coordenador Geral da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço) e também integrante da Executiva do FNDC, algumas providências estão sendo tomadas pelo Executivo, pois a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República está sistematizando as propostas prioritárias para o Governo. “O Executivo irá preparar, por exemplo, um Projeto de Lei com as mudanças aprovadas na Confecom para radiodifusão comunitária”, informa Sóter.

Entre os projetos sobre comunicação tramitando na Câmara Federal destaca-se o Projeto de Lei (PL) 29/2007, referente à organização e exploração das atividades audiovisuais. As mudanças propostas causarão um forte impacto no setor de TV por assinatura. O PL, já aprovado na CCTCI, recebeu parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) na terça-feira, 11, e aguarda o período de recursos antes de seguir para o Senado.

Confira abaixo outros projetos que estão na Câmara dos Deputados sobre temas importantes como a regulação da publicidade infantil, as mudanças na radiodifusão comunitária e a tipificação dos crimes digitais.

Mais canais para rádios comunitárias

Em meio às proposições aprovadas na Confecom e voltadas à radiodifusão comunitária estão o aumento da potência das emissoras e a destinação de mais canais às localidades. Tais mudanças estão sugeridas também em um projeto de lei que tramita há 12 anos na Câmara - o PL 4186/1998. Apresentado em março de 1998, logo após a aprovação da Lei 9612, de 19 de fevereiro de 1998 que institui o serviço de radiodifusão comunitária, o projeto prevê ainda a alteração dos critérios de penalidade às infrações cometidas pelas emissoras comunitárias. A proposição é considerada positiva pelo coordenador da Abraço. O enorme tempo de tramitação do referido projeto, entretanto, demonstra o limitado apoio que tem recebido. Tramitam apensados ao PL 4186/1998 outros 15 projetos.

Proibição de publicidade infantil

A Confecom também aprovou a proibição de publicidade infantil. Dois projetos de lei se destacam nesse tema. O PL 5921/2001 torna abusiva, dentre outras práticas, o aproveitamento da deficiência de julgamento e pouca experiência das crianças para induzi-las ao consumo excessivo. O PL altera a Lei de Proteção ao Consumidor (Lei 8.078/1990). Aprovado nas Comissões de Defesa do Consumidor (CDC) e de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio (CDEIC), o projeto foi encaminhado para a CCTCI.

O PL 4315/2008 dobra o valor da pena para a publicidade enganosa ou abusiva dirigida à criança, também modificando a lei de proteção ao consumidor. A proposta foi tema de recente audiência pública na Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF). Para Roseli Goffman, os projetos refletem os anseios da sociedade por uma publicidade mais comprometida com uma formação sadia de crianças e adolescentes. Hoje, afirma a psicóloga, a sociedade está mais aberta ao debate sobre os limites da publicidade.

Banda larga como direito fundamental

Paralelamente às discussões sobre o Programa Nacional de Banda Larga (PNBL), lançado pelo governo federal, tramitam na Câmara proposições sobre o tema. A PEC 479/2010 inclui na Constituição, como um dos direitos fundamentais do cidadão, o acesso à internet de alta velocidade. O projeto está sendo analisado pela CCJC.

Já o PL 1481/2007 prevê o uso de 75% do Fundo de Universalização das Telecomunicações (FUST) para garantir que até 2013 todos os estabelecimentos de educação básica e superior do país disponham de acesso à Internet. A matéria está sendo analisada por uma Comissão Especial. Na última quarta-feira, 12, o Plenário da Câmara aprovou a tramitação do projeto em regime de urgência.

Tramita ainda o PL 4361/2004, estabelecendo limites ao funcionamento de estabelecimentos que oferecem jogos e diversões eletrônicos destinados ao público infanto-juvenil. O PL está sendo analisado por uma comissão especial.

Obrigatoriedade do diploma de jornalista

Em julho de 2009, o Supremo Tribunal Federal extinguiu a obrigatoriedade de curso superior em jornalismo para o exercício da profissão de jornalista. Buscando reverter a decisão, foram apresentadas três Propostas de Emenda à Constituição (PEC) estabelecendo a obrigatoriedade do diploma. As Propostas 388/2009 e 389/2009 tramitam anexadas à PEC 386/2009. Já aprovada na CCJC, a matéria será debatida em uma Comissão Especial, ainda em fase de instalação.

Tipificação dos crimes digitais

Aguarda-se na Câmara a instalação de Comissão Especial para debater o Projeto de Lei do Senado (PLS) 5403/2001, que obriga os provedores a manter registradas todas as conexões realizadas pelos seus usuários pelo período mínimo de um ano. A matéria será analisada juntamente com mais seis propostas que visam solucionar o problema da identificação do usuário em caso de utilização ilícita da rede, cometidas, em geral, pelos chamados hackers. Sobre crimes digitais destaca-se também o PL 84/99, que tipifica os delitos praticados com o uso da internet. Já aprovado pela Câmara em 2003, o projeto foi encaminhado ao Senado e retornou para a análise das mudanças feitas pelos senadores.

Novos projetos sobre comunicação

Os 25 novos projetos apresentados sobre o tema comunicação, após o retorno do recesso parlamentar em fevereiro de 2010, tratam de temas diversos. Destacam-se quatro deles, que buscam modificar a lei do FUST para utilizar os recursos retidos no fundo em outras áreas, como a educação à distância. Há ainda projetos relacionados ao setor de telecomunicações, de combate a pedofilia na rede e sobre regulação da publicidade e propaganda de tabaco e bebidas alcoólicas.

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Lançada a campanha em defesa do PNDH-3

Na quinta-feira (20), entidades da socidedade civil e movimentos sociais lançaram a “campanha pela integralidade e implementação do Plano Nacional de Direitos Humanos”. Desde que foi anunciado pelo governo Lula, em dezembro de 2009, o PNDH-3 sofre duros ataques das forças conservadores – sobretudo da alta hierarquia da Igreja, dos barões da mídia, dos chefões do agronegócio e de saudosos da ditadura das Forças Armadas. Diante desta pressão, o governo cedeu e alterou vários pontos do plano. Daí a importância da reação urgente e ativa dos setores organizados da socidade. Reproduzo abaixo o manifesto deste importante movimento:

Nós, organizações sociais, movimentos sociais, sindicatos, redes e outras da sociedade civil brasileira, historicamente comprometidas com a promoção dos direitos humanos, manifestamos publicamente nossa posição sobre o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Entendemos que:

1. O PNDH-3 é resultado de amplo processo participativo. Resultou das diretrizes aprovadas na 11ª Conferência Nacional de Direitos Humanos, realizada em dezembro de 2008, e da sistematização de resoluções de mais de 50 conferências nacionais sobre diversos temas. A participação direta da população, das organizações sociais e populares, dos gestores públicos das três esferas de governo, dos legislativos e de setores do judiciário na construção de propostas de políticas públicas é um grande avanço consagrado na Constituição Federal de 1988. Múltiplos agentes e agendas estão articulados no PNDH-3, cuja marca é, acima de tudo, a convergência e expressa a participação efetiva da pluralidade e da diversidade.

2. O PNDH-3 traduz de consistente a transversalidade, a indivisibilidade e a interdependência dos direitos humanos. Articula diretrizes, objetivos estratégicos e ações programáticas em seis eixos estratégicos que expressam o conjunto dos direitos humanos, atendendo ao recomendado pela II Conferência Mundial de Direitos Humanos (Viena, 1993). Neste sentido, constitui-se num avanço de formulação em relação às duas primeiras versões do PNDH (de 1996 e de 2002).

3. O PNDH-3 dá visibilidade aos diversos sujeitos de direitos humanos. Reconhece que os sujeitos de direitos, em sua diversidade e multidimensionalidade são os verdadeiros agentes da formulação e também os destinatários prioritários das ações de direitos humanos. O reconhecimento da diversidade e da pluralidade dos sujeitos se traduz em propostas de ação que têm no fortalecimento desses mesmos sujeitos o caminho central para a efetivação dos direitos humanos.

4. O PNDH-3 traduz os preceitos consagrados na Constituição Federal de 1988 e assume os compromissos internacionais com a realização dos direitos humanos. O PNDH-3 compromete os agentes públicos e as instituições do Estado, respeitando a independência republicana dos poderes, com a efetivação de ações para efetivar os direitos humanos, dando um passo à frente para que os direitos humanos tenham força programática e possam se traduzir em ações efetivas dos órgãos públicos que possam ser amplamente monitoradas pela sociedade.

5. O PNDH-3 carrega uma concepção contemporânea de direitos humanos que se opõe aos conservadorismos e às compreensões restritas e restritivas de direitos humanos. Estas concepções ainda estão fortemente presentes na sociedade brasileira e se manifestaram de forma contundente na reação de setores conservadores que tem publicamente se dito contrários ao PNDH-3. Por isso, a defesa do PNDH-3 é também a defesa de uma compreensão ampla e que abre espaço para os sujeitos populares e sua cada vez mais inclusão nos processos de luta e de reconhecimento dos direitos humanos.

6. O PNDH-3 é instrumento de política pública Apresenta várias propostas de ações programáticas que incidem sobre os diversos temas da política pública, propõe-se a ser de Estado, mais do que de governo. Por isso, induz processos que deverão se traduzir em previsões orçamentárias, em indicadores de monitoramento e, acima de tudo, em dinâmicas permanentes de participação e de controle social público com ampla participação da sociedade civil. Neste sentido, o PNDH-3 abre caminho para que sejam implementados avanços na perspectiva de um Sistema Nacional de Direitos Humanos, na linha do que aprovou a IX Conferência Nacional de Direitos Humanos (2004).

7. O PNDH-3 é processo em construção. Boa parte das proposições nele contidas demandam debate, processos legislativos, iniciativas judiciais e implementação de políticas públicas. Como se pretende decenal, está aberto à definição de prioridades que haverão de se traduzir em Plano Bienais a serem incorporados aos diversos instrumentos de planejamento da ação e do financiamento do Estado. Também convoca as unidades federadas a participar do processo aderindo ao PNDH-3 e, sobretudo, atualizando e/ou instituindo Programas Estaduais e Municipais de Direitos Humanos.

Desta forma, manifestamos nossa oposição frontal às seguintes medidas, concretizadas após a publicação do PNDH-3 em dezembro de 2009:

1. O Decreto nº 7.177, assinado pelo Presidente Lula e pelo Ministro Paulo Vannuchi, e publicado em 13/05/2010, que altera vários pontos do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) originalmente publicado em dezembro de 2009, por ter sido feito sem o devido respeito ao processo democrático e participativo.

2. O Projeto de Decreto Legislativo nº 16, de 10/02/2010, apresentado pelo Líder do PSDB no Senado Federal, Senador Arthur Virgílio, que susta os efeitos do Decreto que instituiu o PNDH-3, rejeitando o argumento de que o PNDH-3 é eleitoreiro e lembrando que, se o PNDH-3 foi publicado há oito meses da eleição presidencial, o PNDH-2, obra do governo FHC, foi publicado há cinco meses da eleição e nem por isso foi compreendido como eleitoreiro.

3. Os Projetos de Decreto Legislativo que tramitam na Câmara dos Deputados: nº 2386, 2397, 2398 e 2399/2010, do deputado Antônio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP), nº 2550/2010, do deputado Moreira Mendes (PPS-RO) e nº 2552/2010, do deputado Luiz Carlos Heinze (PP-RS), por não respeitarem o processo democrático participativo de construção do PNDH-3 e a autonomia do Poder Executivo para legislar sobre temas programáticos.

Pelos motivos acima expressos, lançaremos uma campanha nacional que visa mobilizar a sociedade brasileira na defesa e implementação do PNDH-3. Por isso, cobramos do governo federal:

1. A revogação do Decreto nº 7.177, de 13/05/2010, em respeito ao processo democrático e participativo de construção do PNDH-3.

2. Imediata instalação do Comitê de Acompanhamento e Monitoramento do PNDH-3 com ampla participação da sociedade civil para viabilizar o previsto no artigo 4º do Decreto que instituiu o PNDH-3.

3. Abertura de processo público e participativo para a elaboração do primeiro Plano Bienal previsto no artigo 3º do Decreto que instituiu o PNDH-3.

4. Aprovação do Projeto de Lei que cria o novo Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) em tramitação no Congresso Nacional, e sua instalação a fim de que seja efetivado o espaço público de participação e controle social da política nacional de direitos humanos.

A fim de ampliar a base de apoio e a dinâmica de organização da Campanha, propomos que as organizações que a apóiam promovam atividades no sentido de:

1. Proposição para que Estados e Municípios que já tem Programa de Direitos Humanos expressem publicamente sua adesão ao PNDH-3 e se comprometam com atualização e/ou instituição de Programas nas respectivas esferas administrativas.

2. Criação de Comitês que reúnam diversos agentes sociais e públicos comprometidos com a defesa do PNDH-3 e de sua implementação a fim de se constituir em espaços de mobilização da sociedade brasileira e de ampliação e capilarização dos propósitos da Campanha Nacional.

3. Promoção da informação sobre o PNDH-3 através de diversos meios a fim de alertar a sociedade sobre a importância do PNDH-3 e da defesa de sua integralidade e da exigência de sua implementação, como forma de fazer frente aos ataques conservadores.

4. Realização de ações de capacitação de lideranças sociais e públicas para a compreensão do PNDH-3 e para a defesa de sua implementação através de processos de educação social e de educação popular, além de propor debates em instituições educacionais e em diversos espaços e instituições públicas.

Para realizar o que aqui expressam, as organizações promotoras da campanah nacional se comprometem a mobilizar esforços e a construir um amplo processo de convergência de agendas e de ações de tal maneira a efetivar os objetivos e as ações aqui propostas. Para aderir à campanha, visite www.pndh3.com.br.

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O império manda e as colônias obedecem

Reproduzo artigo de Frei Betto e João Pedro Stédile:

Após a Segunda Guerra Mundial, quando as forças aliadas saíram vitoriosas, o governo dos EUA tentou tirar o máximo proveito de sua vitória militar. Articulou a Assembléia das Nações Unidas dirigida por um Conselho de Segurança integrado pelos sete países mais poderosos, com poder de veto sobre as decisões dos demais.

Impôs o dólar como moeda internacional, submeteu a Europa ao Marshall, de subordinação econômica, e instalou mais de 300 bases militares na Europa e na Ásia, cujos governos e mídia jamais levantam a voz contra essa intervenção branca.

O mundo inteiro só não se curvou à Casa Branca porque existia a União Soviética para equilibrar a correlação de forças. Contra ela, os EUA travaram uma guerra sem limites, até derrotá-la política, militar e ideologicamente.

A partir da década de 90, o mundo ficou sob hegemonia total do governo e do capital estadunidenses, que passaram a impor suas decisões a todos os governos e povos, tratados como vassalos coloniais.

Quando tudo parecia calmo no império global, dominado pelo Tio Sam, eis que surgem resistências. Na América Latina, além de Cuba, outros povos elegem governos antiimperialistas. No Oriente Médio, os EUA tiveram que apelar para invasões militares a fim de manter o controle sobre o petróleo, sacrificando milhares de vidas de afegãos, iraquianos, palestinos e paquistaneses.

Nesse contexto surge no Irã um governo decidido a não se submeter aos interesses dos EUA. Dentro de sua política de desenvolvimento nacional, instala usinas nucleares e isso é intolerável para o Império.

A Casa Branca não aceita democracia entre os povos. Que significa todos os países terem direitos iguais. Não aceita a soberania nacional de outros povos. Não admite que cada povo e respectivo governo controlem seus recursos naturais.

Os EUA transferiram tecnologia nuclear para o Paquistão e Israel, que hoje possuem bomba atômica. Mas não toleram o acesso do Irã à tecnologia nuclear, mesmo para fins pacíficos. Por quê? De onde derivam tais poderes imperiais? De alguma convenção internacional? Não, apenas de sua prepotência militar.

Em Israel, há mais de vinte anos, Moshai Vanunu, que trabalhava na usina atômica, preocupado com a insegurança que isso representa para toda a região, denunciou que o governo já tinha a bomba. Resultado: foi sequestrado e condenado à prisão perpetua, comutada para 20 anos, depois de grande pressão internacional. Até hoje vive em prisão domiciliar, proibido de contato com qualquer estrangeiro.

Todos somos contra o armamento militar e bases militares estrangeiras em nossos países. Somos contrários ao uso da energia nuclear, devido aos altos riscos, e ao uso abusivo de tantos recursos econômicos em gastos militares.

O governo do Irã ousa defender sua soberania. O governo usamericano só não invadiu militarmente o Irã porque este tem 60 milhões de habitantes, é uma potência petrolífera e possui um governo nacionalista. As condições são muito diferentes do atoleiro chamado Iraque.

Felizmente, a diplomacia brasileira e de outros governos se envolveu na contenda. Esperamos que sejam respeitados os direitos do Irã, como de qualquer outro país, sem ameaças militares.

Resta-nos torcer para que aumentem as campanhas, em todo mundo, pelo desarmamento militar e nuclear. Oxalá o quanto antes se destinem os recursos de gastos militares para solucionar problemas como a fome, que atinge mais de um bilhão de pessoas.

Os movimentos sociais, ambientalistas, igrejas e entidades internacionais se reuniram recentemente em Cochabamba, numa conferência ecológica mundial, convocada pelo presidente Evo Morales. Decidiu-se preparar um plebiscito mundial, em abril de 2011.

As pessoas serão convocadas a refletir e votar se concordam com a existência de bases militares estrangeiras em seus países; com os excessivos gastos militares e que os países do Hemisfério Sul continuem pagando a conta das agressões ao meio ambiente praticadas pelas indústrias poluidoras do Norte.

A luta será longa, mas nessa semana podemos comemorar uma pequena vitória antiimperialista.

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Emir Sader e a sucessão presidencial

Reproduzo entrevista de Emir Sader concedida às jornalistas Paula Coutinho e Gisele Ortolan e publicada no Jornal do Comércio:

O cientista político Emir Sader é um dos principais pensadores da política de esquerda no Brasil. Em entrevista ao Jornal do Comércio, de Porto Alegre, ele analisa o cenário eleitoral deste ano e sustenta que não há como fugir do debate plebiscitário entre a candidatura de Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB), a partir das gestões do tucano Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e do petista Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010).

Ele argumenta que, num cenário de avaliação entre as duas gestões, a eleição acabará sendo decidida com os votos dos setores populares que, amparados pelas políticas sociais, melhoraram suas condições de vida e tiveram acesso a bens fundamentais.

Forte crítico da administração tucana, acrescenta que o plano de Serra é chegar ao governo para implementar um pacote econômico com duro ajuste fiscal, repetindo a fórmula do PSDB.

Em contraposição, como colaborador na formatação do plano de governo de Dilma, Sader informa que, além da manutenção da política econômica, as diretrizes do programa serão educação, habitação e saneamento básico. “O pré-sal vai ser a grande fonte para fazer isso”, acrescenta.

Qual é o cenário da disputa à presidência da República?

Há duas interpretações. Uma estrutural, com dois tipos de governo. São os mesmos blocos que pleiteiam candidatos similares. Portanto, é justo compará-los. O governo tucano tinha maioria absoluta no Parlamento e, comprando votos ou não, mudou a Constituição para aprovar um segundo mandato. Ainda teve apoio da imprensa nacional e internacional, além de alianças amplas. Depois veio o governo Lula, em condições diferentes. Saiu ileso da pior crise do capitalismo internacional desde 1929.

O governo Fernando Henrique Cardoso, ao contrário, subiu a taxa de juros e levou o Brasil à crise excessiva, profunda e prolongada, só recuperada com o governo Lula. Eles (os tucanos) têm que ter vergonha do que fizeram. Serra estava lá, apoiou tudo. Foi quem mais quis a privatização da Vale do Rio Doce. Ao que se sabe não fizeram autocrítica, portanto, assumem. Isso é a comparação de fundo. Querem sustentar que há um tal consenso lulista de que todos continuariam. Não é verdade. Já veio à tona, pela equipe econômica de Serra, que seus planos começam com um pacote econômico, com um duro ajuste fiscal. O famoso choque de gestão que eles adoram.

A governadora Yeda Crusius (PSDB) usou esse termo no Rio Grande do Sul.

Sabe-se muito bem o que significa a gestão pública-privada da governadora. Mas Serra quer esconder. A campanha eleitoral está separada do governo. A campanha de cada candidato é feita não na base do que se quer fazer, ou do que se vai fazer, mas sobre o que quer a opinião pública. O que pesa melhor? Dizer que sou contra o Lula ou que sou a favor? É um expediente de marketing do qual Serra se utiliza. Vamos ver até onde, pois há uma grande margem do eleitorado, sobretudo de origem mais pobre, que diz que votará no candidato de Lula. Serra quer disputar esse eleitorado.

Os setores que emergiram para a classe média?

Não exatamente para a classe média, mas que melhoraram suas condições e estão tendo acesso a bens fundamentais. Eles vão decidir a eleição. No Brasil, o país mais injusto do continente, a maioria da população é pobre e se beneficiaria das políticas sociais do governo. Ela, portanto, será decisiva. São setores emergentes em termos econômicos, mas que ainda não são emergentes em termos políticos.

Estes setores ainda não têm uma consciência política?

Têm certa consciência social, mas não têm auto-organização para expressar suas opiniões diretamente e ter interferência no processo político.

Lula é o principal cabo eleitoral de Dilma?

O governo é expresso em Lula, no qual a Dilma tinha um papel fundamental. Então, não é um elemento alheio a ela. Toda a projeção dela acontece pela dinâmica que o governo assumiu desde 2005. Dilma é a representante mais significativa da mudança interna do governo.

Questiona-se a capacidade que Lula teria de transferir votos para Dilma.

Já transferiu. Essa primeira interrogação foi decifrada. O problema é saber como será a continuidade disso. Mas Dilma era candidata com 5%, depois 10%. Agora chega a um empate técnico. Isso é óbvio e evidente.

E qual o reflexo terá na candidatura do PT a ausência da de Ciro Gomes (PSB) na disputa?

Tudo o que tende a uma polarização entre os dois governos favorece Dilma. O que significa a candidatura da Marina Silva (PV)? Nada. Ela se alinha com os tucanos. A polarização é forte de tal maneira que Marina sequer consegue definir o espaço de uma terceira via.

Há quem diga que Marina fica com os votos de eleitores insatisfeitos e desacreditados com a política.

É a cantilena de que o tema ecológico é transversal. Se for, vira terceira via e supera todas as outras. Então, não é verdade. O fato de Marina se associar, no Rio de Janeiro, com o palanque tucano mostra que ela está reiterando que a eleição é plebiscitária. Não é o que foi a Heloísa Helena (PSOL), uma crítica de esquerda ao PT. Agora, Marina está à direita do PT, claramente. Sempre que os verdes se autonomizaram da esquerda foram para a direita.

A comparação entre Lula e FHC vai dominar o debate eleitoral?

O Brasil vai decidir se o governo Lula foi um parêntese e as oligarquias tradicionais voltarão a dirigir o Estado ou se vai apoiar os avanços do governo Lula e sair definitivamente do modelo neoliberal, construindo na primeira metade do século uma sociedade justa, soberana e solidária. Pela primeira vez diminuiu a desigualdade no Brasil. São dados estatísticos reais. Qualquer comparação da gestão Lula com o governo FHC é acachapante, devastadora. Por isso, querem deslocar a discussão para outras coisas.

Dilma e Serra estão empatados nas pesquisas. Ela pode ultrapassá-lo?

Fará isso no momento em que for mais socializada a informação de que ela é a candidata do Lula. A última informação do comando tucano é de que precisariam ter vantagem de 8 milhões de votos em São Paulo e Minas Gerais para neutralizar os votos do Nordeste e de outras regiões do Brasil. É hercúlea essa tarefa. Conseguir 5 milhões em São Paulo já não é fácil e 3 milhões em Minas é duro. O PSDB incorporou a ideia de que a tendência normal lhe é desfavorável. Daí é apelação, é baixaria.

Pode cair o nível?

Tudo que eles consideram tropeço e gafe da Dilma tem um destaque extraordinário. O Serra chegou a falar uma aberração em Santa Catarina. Reuniu-se com evangélicos e disse que fumante é adepto do diabo, algo desse tipo. É uma barbaridade. Se estivesse na boca de um vereador do PT, seria uma gafe pública. Então, é uma manipulação evidente das informações. Além do mais, é uma imprensa monopólica, financiada pelas grandes empresas de publicidade e que se interpõe entre a voz dos governantes e o povo. Lula não consegue falar para o povo. A imprensa pesca só o que acha que vale a pena.

Lula tem o histórico de não ganhar no Rio Grande do Sul. O fato de Dilma ter tido uma trajetória política no Estado favorece o voto no PT?

Criou-se uma certa classe média de São Paulo aqui no Sul, com sentimento discriminatório com o PT, um antipetismo. Mas quem deu prestígio à administração pública de Porto Alegre foi o PT. Criou-se esse mecanismo, alimentado pela imprensa, de diabolização do PT. Acho que está se caminhando para quebrar isso. Menos no Paraná, um pouco em São Paulo, provavelmente em Santa Catarina, que é menor, mas no Rio Grande do Sul, dessa vez, isso não existe. Dilma pode ganhar aqui.

Apoiada por setores da classe média?

Dividindo a classe média.

Ela foi bem recebida pelos empresários, na Fiergs.

Segundo pesquisa recente, todo o empresariado é a favor da política econômica do governo Lula, mas vai votar no Serra. Quem tem tucanos como Tasso Jereissati, Serra, FHC para administrar o Estado não vai querer negociar com o PT.

Serra afirma que o governo federal não tem um plano para integrar seus projetos de desenvolvimento.

Eles aparentemente querem incorporar os projetos sociais, mas a crítica é ao PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), como se fosse uma farsa. Se o PAC não avançou mais é porque, como diz a Dilma, eles reduziram o Estado a uma instância cercada por órgãos de controle desarticulando os órgãos de execução.

O senhor participa do grupo de trabalho do plano de governo de Dilma?

Estou participando dos debates e assessorando Dilma. Estou organizando uma reunião dela com os intelectuais em São Paulo, no Rio de Janeiro. Estou sempre conversando com ela, mas não tenho participação formal na campanha.

Qual é o extrato do plano de governo?

Privilegiar educação, habitação e saneamento básico. O pré-sal vai ser a grande fonte para se fazer isso. Serra não fala do pré-sal. Eles tentaram privatizar a Petrobras. Estão salivando. Imagina o pré-sal nas mãos deles. Nossa proposta é utilizar esses recursos para terminar com a pobreza nessa década no Brasil.

E as reformas política e tributária?

O que está pendente para fazer é terminar com a hegemonia do capital financeiro através da subordinação real do Banco Central ao plano geral do governo. Taxa de juros alta atrai capital especulativo e fortalece a hegemonia do capital financeiro. Em segundo lugar, mudar o modelo de agronegócio, no qual tem que ter um papel determinante a pequena e média empresa que produz alimentos para o mercado interno e gera emprego. Em terceiro lugar, democratizar a formação da opinião pública, quebrar a hegemonia dessas quatro ou cinco famílias que forjam a opinião pública no Brasil.

Qual sua avaliação sobre o ingresso da Venezuela no Mercosul?

Os tucanos teriam levado o Brasil e a América Latina à Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Estaríamos na situação em que está o México, 90% do comércio é com os Estados Unidos, retrocesso de 7% da economia, acordo com FMI e carta de intenções. Se o Serra ganhar, romperá as alianças com a América do Sul e o Sul do mundo. Eles são pelas alianças subordinadas ao centro capitalista, que é o que o FHC fazia. Não fosse a vitória do Lula, que brecou a fase final em que Brasil e EUA administrariam a composição da Alca, a América Latina teria entrado.

Apesar de reconhecido como liderança internacional, Lula foi bastante criticado por sua política externa.

A política externa não é separada da política interna. É porque o Brasil é soberano lá fora que é soberano aqui dentro. O Brasil não está colocando dinheiro em auxílio externo para deixar de fazer política social aqui dentro. O governo Fernando Henrique Cardoso não foi nada solidário lá fora. E foi solidário com o povo brasileiro?

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Os desejos virulentos da antiga imprensa

Reproduzo o enfático editorial do sítio Carta Maior:

Esta semana reforçou a percepção de que a chamada grande imprensa brasileira – ou antiga imprensa, como afirma, entre outros, o cineasta Jorge Furtado – está não apenas desempenhando o papel de uma “oposição fragilizada”, mas também defendendo, sem mediações ou sutilezas, os interesses da política externa dos Estados Unidos. Estariam fragilizados também estes interesses? Em certo sentido, sim. A iniciativa do governo brasileiro, em conjunto com o governo da Turquia, de buscar uma solução negociada para a crise nuclear envolvendo o Irã mostrou que é possível outro caminho do que aquele das “guerras preventivas”, dos “bombardeios cirúrgicos”, do “choque e do pavor”. O presidente Lula, representando o Estado brasileiro, fez um movimento ousado e corajoso. E acertou em cheio.

Nas horas seguintes aos primeiros anúncios do acordo, começaram a surgir vozes e textos tentando diminuir ou simplesmente desqualificar o feito alcançado. A pressa é compreensível. Dias antes, o pré-candidato do PSDB à presidência da República, José Serra, havia dito durante uma entrevista em Porto Alegre, que jamais receberia ou se reuniria, caso fosse eleito, com o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad. Além da postura submissa às ordens que o Departamento de Estado norte-americano ainda insiste em querer ditar ao mundo, a declaração de Serra mostrou a pequenez do horizonte de visão do postulante ao cargo mais importante da República brasileira e um dos mais importantes hoje para todos os países que apostam na desmilitarização da agenda política das nações.

Ao caminhar na direção oposta daquela defendida por Serra, Lula mostrou coragem pessoal, ousadia estratégica e, acima de tudo, compromisso com a construção de um mundo onde os conflitos e diferenças sejam resolvidos através da conversa e das negociações – que podem, sim, muitas vezes, ser exaustivas e mesmo pouco frutíferas no curto prazo – ao invés da solução eficiente da morte e da destruição. Eficiente para quê? – cabe perguntar. Não certamente para a vida de milhões de pessoas que pode ser salva em função de uma dessas conversas complicadas que algumas pessoas preferem não ter. A omissão e a covardia andam de mãos dadas com a impossibilidade de se dizer abertamente o que se está pensando.

Isso ficou muito claro no discurso de vários articulistas da imprensa nacional, preocupados em desdobrar a fala de Serra. Na verdade, a crítica principal dirigida a Lula era a crítica à iniciativa de ir conversar com Ahmadinejad. Como assim? Quem esse sujeito (o presidente da República, no caso) pensa que é? Quem o Brasil pensa que é? Não foi por acaso que a repercussão do acordo na imprensa internacional foi maior e mais positivo do que no Brasil. A diferença de horizonte só expõe o tamanho, a qualidade da visão e o compromisso de quem fala. Mas, se a visão é curta, por um lado, é crescentemente virulenta, por outro. E o grau dessa virulência parece ser proporcional aos acertos do governo brasileiro. Dois dias após o anúncio do acordo, o jornal Zero Hora comemorava com um destaque de capa: “EUA atropelam acordo de Lula”. O desejo virulento do atropelamento pelo menos foi transparente quanto ao alvo: o Lula. É disso que se trata.

Há outros pressupostos neste discurso de submissão a um passado recente quando o Brasil e a América Latina sabiam qual era o seu lugar. E aí, mais uma vez, a antiga imprensa tenta socorrer as palavras de suas referências políticas. Quando Serra qualificou o Mercosul como uma “farsa” e defendeu a adoção de acordos de livre comércio, retomando a já esquecida agenda da ALCA, estava simplesmente repetindo a agenda de seu partido que integra o campo conservador brasileiro: a prioridade não é a integração regional, é o livre comércio e o salve-se quem puder; a prioridade não é a construção de laços de solidariedade e de complementaridade entre os povos e as nações, mas sim a Lei do Gérson, tentar levar vantagem em tudo; a prioridade não é colocar a economia a serviço da vida, especialmente a vida de milhões de pessoas que vivem em situação de pobreza, mas sim flexibilizar, promover “choques de gestão”, deixar os mercados livres.

Não deixa de ser ilustrativa a associação cínica da palavra liberdade aos mercados, neste momento em que a Grécia e outros países da Europa (sempre apontada como referência de modernidade e civilização) são obrigados a tomar o remédio amargo, ineficaz e criminoso do Fundo Monetário Internacional. Não por acaso, muitos dos defensores dessa receita criticam também a iniciativa diplomática do governo brasileiro. A matriz de pensamento é a mesma, tem nome, sobrenome, endereço e tipificação do ponto de vista penal. O que está acontecendo com a Grécia agora deixa isso claro.

Em 2007, as já tristemente famosas agências classificadoras de risco elevaram às nuvens a cotação de “papéis” que mais tarde se revelaram títulos podres. Os governos foram chamados a socorrer bancos e outras instituições financeiras privadas que trabalhavam com esses papéis tão bem avaliados. Bilhões de dólares que supostamente não existem quando se fala da necessidade de investir em saúde e educação, surgiram do dia para a noite para o socorro bancário. Muitos dos socorridos dizem agora que o Banco Central europeu não pode emprestar aos Estados. Afinal, ele emprestou aos bancos valores colossais a juros baixos durante o auge da crise financeira. E este dinheiro serve agora para que esses bancos emprestem aos Estados, com juros bem maiores... Um negócio simples, lucrativo e criminoso. E, atualizando uma velha máxima, muito menos arriscado do que assaltar um banco.

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Data-da-Folha registra “fenômeno sísmico”



Reproduzo divertido texto de Paulo Henrique Amorim, publicado no imperdível Conversa Afiada:

Em 15 de abril, o Data-da-Folha deu Serra 42, Dilma 30.

Serra estava apoteoticamente eleito.

Hoje, Dilma tem 37, tanto quanto Serra, com margem de erro de dois pontos (isso é um perigo!).

Trata-se de uma desorganização profunda das estruturas geológicas.

Uma revolução vulcânica.

Dilma sobe sete e Serra cai 5.

Em tão pouco tempo!

O que terá sido?

Serra atacar os repórteres?

A Dilma triturar a Miriam na CBN?

Inacreditável.

Precisamos consultar a NASA para ver se há algum registro excepcional que compromete o movimento da Terra em torno do Sol.

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O que houve com as propostas da Confecom?

Reproduzo artigo do professor Venício Lima, publicado no sítio Carta Maior:

Chega a ser intrigante a velocidade com que temas de interesse público são omitidos ou desaparecem da agenda de debates no nosso país. As propostas aprovadas na 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada entre 14 e 17 de dezembro de 2009, certamente constituem um caso emblemático.

Enquanto a cada semana pipocam no Rio e/ou São Paulo seminários patrocinados, em sua maioria, pela grande mídia para discutir as ameaças autoritárias à liberdade de expressão, a Confecom só entrou na pauta para ser devidamente satanizada. E não se falou mais nisso.

Propostas

Quais, afinal, foram as propostas que, segundo o Jornal Nacional, teriam levado os empresários de mídia a boicotar a conferência e acabaram sendo aprovadas estabelecendo “uma forma de censurar os órgãos de imprensa, cerceando a liberdade de expressão, o direito à informação e à livre iniciativa, que são todos previstos na Constituição”?

Para reavivar nossa memória, valho-me de relação feita pelo Coletivo Intervozes e reproduzo abaixo 13 das principais propostas “ameaçadoras” aprovadas pela Confecom:

1. A afirmação da comunicação como direito humano, e o pleito para que esse direito seja incluído na Constituição Federal;

2. A criação de um Conselho Nacional de Comunicação que possa ter caráter de formulação e monitoramento de políticas públicas;

3. O combate à concentração no setor, com a determinação de limites à propriedade horizontal, vertical e cruzada;

4. A garantia de espaço para produção regional e independente;

5. A regulamentação dos sistemas público, privado e estatal de comunicação, que são citados na Constituição Federal, mas carecem de definição legal, com reserva de espaço no espectro para cada um destes;

6. O fortalecimento do financiamento do sistema público de comunicação, inclusive por meio de cobrança de contribuição sobre o faturamento comercial das emissoras privadas;

7. A descriminalização da radiodifusão comunitária e a abertura de mais espaço para esse tipo de serviço, hoje confinado a 1/40 avos do espectro;

8. A definição de regras mais democráticas e transparentes para concessões e renovações de outorgas, visando à ampliação da pluralidade e diversidade de conteúdo;

9. A definição do acesso à internet banda larga como direito fundamental e o estabelecimento desse serviço em regime público, que garantiria sua universalização, continuidade e controle de preços;

10. A implementação de instrumentos para avaliar e combater violações de direitos humanos nas comunicações;

11. O combate à discriminação de gênero, orientação sexual, etnia, raça, geração e de credo religioso nos meios de comunicação;

12. A garantia da laicidade na exploração dos serviços de radiodifusão;

13. A proibição de outorgas para políticos em exercício de mandato eletivo.

O que aconteceu?

Decorridos mais de cinco meses do término da Confecom, o que aconteceu com as 672 propostas aprovadas? Até agora, rigorosamente nada.

Entre nós é assim que funciona. A realização da Confecom provocou reação “barulhenta” na grande mídia, mas corre-se o risco de que seus resultados concretos sejam nulos.

Na hora de transformar proposta em ação, entram em campo os atores que de fato são determinantes na formulação das políticas públicas do setor de comunicações e os não-atores ficam, como sempre, excluídos. Historicamente tem sido assim.

Louve-se, portanto, a audiência pública que, atendendo a requerimento da deputada Luiza Erundina (PSB-SP), será realizada na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados, na terça-feira (25/05), para tratar do assunto.

Sem pressão da sociedade organizada que luta pelo reconhecimento do direito à comunicação, nem o Legislativo nem o Executivo respeitarão o resultado da Confecom.

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Folha aciona general para caluniar Dilma

Reproduzo artigo de Celso Lungaretti, publicado no sítio Vermelho:

O general Maynard Marques Santa Rosa, encrenqueiro de extrema-direita, esperou passar à reserva para soltar de vez os cachorros. Na ativa, ele frequentou o noticiário em três episódios:

– em 2007 criticou a conduta do Governo Lula na demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima;

– em 2009, juntamente com dois outros generais linha-dura, combateu o novo organograma das Forças Armadas, que afastava ainda mais os militares do poder;

– em fevereiro/2010, qualificou a Comissão Nacional da Verdade de "Comissão da Calúnia" num e-mail que vazou ou foi plantado na imprensa.

As duas primeiras indisciplinas saíram relativamente baratas, mas a terceira lhe acarretou a humilhante exoneração do Departamento-Geral de Pessoal do Exército, para encerrar a carreira "indo fazer nada no gabinete do comandante até 31 de março, quando cai na reserva", conforme escreveu então a colunista Eliane Cantanhêde.

Agora, com a pensão garantida, ele se permite ser mais inconveniente e boquirroto ainda.

Diz que 95% do Exército pensa como ele, mas, nesta eventualidade, o Governo Lula já teria sido derrubado; o mais provável é que a proporção seja a inversa, restando apenas 5% de velhos gorilas obcecados em esconder os esqueletos que têm no armário.

Quem liga, afinal, para as rabugices de um milico em pijamas?

A Folha de S. Paulo, claro! O jornal adora dar espaço para um personagem bizarro como esse.

Serve para despertar algum interesse, nem que seja pela rejeição que provoca. E isto sempre dá algum fôlego para um veículo que está perdendo leitores a olhos vistos.

Afora o fato de que, contestando e até zombando da direita mais caricata, a Folha se faz passar por equilibrada, apesar de compartilhar várias posições com os trogloditas. Quanto aos que resistiram pelas armas à ditadura de 1964/85, por exemplo, a postura do jornal da ditabranda em nada difere da do Ternuma.

De resto, vou resumir o besteirol ao qual a Folha dedicou uma página de sua edição desta 2ª feira (17). As palavras são do general, o que eu fiz foi reagrupá-las para não desperdiçar mais espaço ainda.

"O presidente Lula está rodeado de pessoas impregnadas de preconceito e ideologia. O governo tem várias caras. Ideologicamente, é intolerante, autoritário. Não sei se o presidente é usado ou se ele usa esse grupo para promover seus interesses.

"O Programa Nacional de Direitos Humanos pretende regular uma sociedade inteira institucionalizando mecanismos ilegais. Casos da inserção no processo judicial de reintegração de posse, que transcende a lei; e da estimulação da degradação dos costumes à revelia da tradição cristã que temos, ao estimular a homoafetividade — contra a qual, na estrutura militar, existe uma rejeição inata.

"O PNDH-3 foi fabricado de fora. Se você pesquisar a similitude entre a Constituição venezuelana, equatoriana e boliviana, que são clones adaptados aos seus países, vai verificar qual é a origem. Isso tudo é uma composição internacional, organizada para implantar uma ditadura comunista. Primeiro, transformar os costumes da sociedade, para, por último, implementar o sistema totalitário.

"Se se conseguisse abrir a Comissão da Verdade, o resto seria facilmente alastrado. Houve uma reação institucional à qual até o ministro Nelson Jobim aderiu, reconhecendo que iria causar uma desarmonia grande. Então, ele contrapôs aquele protesto que levou o presidente a flexibilizar a redação do plano.

"O regime militar foi autoritário, mas não totalitário. A imprensa, p. ex., foi amplamente livre. Só teve censura no momento de pico, a partir do AI-5. Se não houvesse um enrijecimento político naquela oportunidade, poderia se perder o controle. Tratou-se, enfim, de um regime emergencial, um mal que livrou o país de um mal maior.

"A tortura nunca foi institucionalizada, é um subproduto do conflito. A tortura começou com os chamados subversivos. Inúmeros foram justiçados e torturados por eles próprios, porque queriam mudar de opinião. A tortura nunca foi oficial.

"Sinceramente, não sei de nenhum caso [de pessoas torturadas e/ou assassinadas, de moças grávidas torturadas depois de presas], o que existe é produto de imaginação.

"A ex-ministra Dilma Rousseff diz que foi torturada, mas... só no Brasil, a pessoa que sobrevive, e está com boa saúde, alega a tortura para ganhar os benefícios, sejam políticos ou de pensão.

"Vocês conhecem algum ex-torturado cubano, russo ou chinês? Não existe, porque lá não se deixava sair da prisão. Então foi a bondade, entre aspas, dos torturadores brasileiros que permitiram que saíssem. Institucionalmente, legalmente, não houve tortura. Não posso afirmar que, fora do controle, não tenha havido.

"Instituir a Comissão da Verdade seria justo se os dois lados dissessem a verdade. Se você perguntar a Dilma Rousseff quantas pessoas ela assaltou, torturou, matou... Ela alega que não matou ninguém, mas sabe-se que tem vítima."


Preconceitos, falácias, contradições e asneiras à parte, há uma providência inescapável a ser tomada: para defender e honrar sua biografia, Dilma Rousseff tem de interpelar judicialmente o general Maynard, que a qualificou de assaltante, torturadora e assassina, colocando-o na saia justa de apresentar provas do que afirma ou admitir que fez falsas acusações.

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Mídia se torna exército contra Dilma

Reproduzo artigo de Maurício Dias, publicado no sítio da CartaCapital:

Não há nessa afirmação nenhuma surpresa. Foi assim nas cinco eleições diretas anteriores, após o ciclo militar, marcadas por uma constante: a presença do PT na disputa com um candidato competitivo.

Esse é o fator que tem desequilibrado o jornalismo brasileiro no momento do mais importante ritual das democracias políticas.

Recentemente, o deputado Cândido Vaccarezza, líder do governo na Câmara, propôs, esperançoso, a criação de um “conselho de autorregulamentação”, com o objetivo de obter “um equilíbrio no comportamento da mídia”.

“Isso impede a partidarização ou cobertura dirigida, principalmente quando o processo eleitoral é polarizado”, observou o parlamentar.

Não há conselho igual a esse em lugar nenhum do mundo. É verdade. Mas, também, em lugar nenhum do mundo vinga uma mídia — jornal, revista, rádio e televisão — dirigida por uma única orientação: o candidato do PT não pode vencer.

Não se trata aqui de contestar posições políticas mais ou menos conservadoras de todos os grandes veículos de comunicação. Mas, sim, de lamentar a inexistência de pluralismo de informação, da diversidade de opinião que permita ao leitor julgar, avaliar e decidir.

Seria possível repetir o que Annita Dunn, diretora de Comunicações da Casa Branca, disse sobre a Fox News: “Ela opera praticamente (...) como o setor de comunicações do Partido Republicano”.

A senhora Dunn chora de barriga cheia. Lá, bem ou mal, existe diversidade. Por aqui a imprensa brasileira, como admitiu Judith Brito, presidente do Conselho Nacional de Jornais (CNJ), está “tomando de fato a posição oposicionista, já que a oposição está profundamente fragilizada”.

Essa afirmação leva água para o moinho daqueles que, crentes no discurso da isenção e da imparcialidade, chegam à beira de um compreensível desespero e a um passo de injustificáveis reações autoritárias. A proposta de monitoramento da imprensa é uma delas.

“Há certa resistência, da parte dos jornalistas, em admitir a legitimidade da análise de mídia. Ainda são poucos os observatórios e analistas, e os próprios meios dedicam pouco espaço ao tema, as exceções confirmando a regra pelo barulho que provocam — como foi o caso da reportagem de CartaCapital sobre o episódio da divulgação das fotos do dinheiro apreendido pela Polícia Federal, em 17 de outubro.” Essa é a constatação do estudo sobre a imprensa nas eleições de 2006, feito pelo Instituto Doxa, do Iuperj, sob orientação do cientista político Marcus Figueiredo.

Naquele ano, em busca da reeleição, Lula enfrentou um problema que Figueiredo aponta com coragem e clareza: “Os grandes jornais de circulação nacional, no Brasil, adotam um híbrido entre os dois modelos de pluralismo: formalmente, no discurso ético de autoqualificação diante dos leitores, procuram associar-se aos conceitos e rituais de objetividade do jornalismo americano, como é possível constatar nos slogans, diretrizes oficiais, manuais de redação, cursos de jornalismo. No entanto, na produção do impresso diário, o que vimos são diferenças no tratamento conferido aos candidatos, de amplificação de certos temas negativamente associados a Lula, contraposto à benevolência no tratamento de temas espinhosos relacionados aos seus adversários”.

E tudo tende a se repetir, em versão piorada e ampliada, com Dilma Rousseff na medida em que a eleição de 2010 se avizinha.

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Acordo Brasil-Irã e o mal-estar da mídia

Reproduzo artigo do professor Dennis de Oliveira, publicado no sítio da Revista Fórum:

Este final de semana foi cômico para a mídia conservadora que não conseguiu disfarçar o seu mal-estar e incômodo com o acordo obtido pelo governo brasileiro com o Irã a respeito da contenda do programa nuclear da nação persa.

Na sexta e no sábado, a tônica unânime da mídia hegemônica brasileira foi que o presidente Lula estaria “perdendo tempo”, que estava “arriscando a credibilidade internacional do país” ao tentar negociar com um governo já qualificado como “pária”, “autoritário”, “desequilibrado”, entre outros

No domingo, a Folha de S.Paulo estampou na matéria sobre o tema o título “Irã dá ao Brasil um polêmico protagonismo” com duas linhas finas: “Gestões de Lula conseguem reduzir isolamento de Teerã e adiar sanções na ONU, mas dificilmente resultarão em recuo iraniano” e “Esforços por acordo com país persa têm gerado críticas à política externa brasileira; presidente se reúne hoje com Ahmadinejad e Khamenei”.

A matéria do jornalista enviado especial a Teerã, Sammy Adghirni começa com o seguinte lide: “A despeito do discurso otimista, a mediação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas conversas sobre o programa nuclear iraniano provavelmente não surtirá efeito”.

As críticas citadas na linha fina vieram de um analista do jornal Washington Post e de um ex-assessor do governo dos EUA, Bill Clinton. Fontes dos EUA, país diretamente interessado em isolar o Irã por conta da sua estratégia geopolítica internacional que privilegia o enfraquecimento dos países adversários de Israel e o fortalecimento deste (que, diga-se de passagem, possui armas atômicas).

O jornal O Estado de S. Paulo vai na mesma linha e busca apoio para esta posição na aparentemente insuspeita candidata do Partido Verde, a senadora ex-petista Marina Silva, que critica a tentativa de um diálogo com um “governo que desrespeita os direitos humanos”.

Bem, chega o domingo à noite e o acordo é acertado entre Brasil, Irã e Turquia. A aposta no fracasso dá lugar ao ceticismo com misto de inveja e dor de cotovelo. O portal da revista Veja lembra que o Irã já “descumpriu” acordos anteriores e por isto, nada garante que este vai ser cumprido. Lembra ainda que o acordo está restrito a uma das usinas, mas a secretária Hillary Clinton acredita existir outras instalações nucleares no Irã.

O portal da Veja só esqueceu de lembrar que o governo Bush também disse que o Iraque tinha armas de destruição em massa e por isto invadiu-o. As investigações posteriores mostraram que esta informação era falsa e tudo não passou de um pretexto para aquela guerra absurda.

Na mesma toada de ser cético — agora não quanto a fazer o acordo, mas sim quanto à eficácia do acordo — vieram Folha e Estadão. O jornalão dos Mesquita novamente usou Marina Silva para reforçar o ceticismo. Para a senadora, a estratégia do Irã ao fechar acordos como o do ano passado e o atual é ganhar tempo. “É bom não perder a perspectiva histórica, de que aquele país tem perseguido a construção de artefatos nucleares e da bomba atômica. Há indícios que preocupam”, avaliou (trecho da matéria publicada no portal Estadão hoje).

Na Folha Online, a forma de tentar reduzir a importância do acordo foi destacar o anúncio de que o Irã afirmou que irá continuar enriquecendo urânio a 20% (em uma linha final de um dos vários textos do portal UOL, é dada a informação — sonegada em quase todas notícias — de que para fazer uma bomba atômica é necessário enriquecer urânio a 90%!).

Também repercutiu as opiniões céticas de “analistas internacionais” — sempre dos EUA e das potências nucleares europeias, interessadas diretas em bloquear o acesso dos países em desenvolvimento à tecnologia nuclear, porém deu espaço a um articulista iraniano que deu uma visão diferenciada, enfatizando o papel importante de mediação do Brasil e da Turquia, vistos como países “amigos” do Irã, ao contrário dos demais membros do Conselho de Segurança da ONU.

O que chama a atenção nesta cobertura? Primeiro, o alinhamento ideológico da mídia conservadora a uma política internacional de submissão aos Estados Unidos e demais potências mundiais, criticando qualquer iniciativa internacional independente da chancelaria brasileira, em especial a geopolítica Sul-Sul.

Segundo, a transformação do espaço de noticiário em lugar de manifestação explícita de opinião e uma “quase torcida” para que estas iniciativas da chancelaria brasileira fracassem e, quando dão certo, a recusa em reconhecer o erro de avaliação.

E, terceiro, a postura desavergonhada de ocultação de informações (por exemplo, que este enriquecimento do urânio no Irã não é suficiente, nem de longe, para a fabricação de armas nucleares), de escolha ideológica de fontes (todas elas das grandes potências, em especial dos EUA) e a tentativa de construção de um consenso de que a ação política das “potências ocidentais” é o lado do bem e o Irã, o lado “mau”.

E, travestidos de vestais do bem, os jornais pouco deram espaço — como dão, por exemplo, quando a China ou Cuba expulsam um dissidente político — ao fato de que Israel impediu o pensador judeu norte-americano Noam Chomsky de fazer uma palestra em Ramallah porque ele é um crítico áspero da política israelense para os palestinos. Será que isto não é ataque à “liberdade de expressão” ou isto acontece só quando vem do Chávez, do Castro ou do Lula?

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sexta-feira, 21 de maio de 2010

Carta de Obama a Lula e a mídia colonizada

Reproduzo artigo de Rodrigo Vianna, publicado no blog Escrevinhador:

Acabo de ler no Portal "Terra" - que é mantido por uma empresa estrangeira, mas por incrível que pareça está entre os menos comprometidos com a velha imprensa anti-nacional - que Obama mandou carta sugerindo o acordo com o Irã.

Como ficam as manchetes e os comentários canhestros de nossa velha imprensa anti-nacional?

Nos últimos dias, veículos como "Financial Times" (como se sabe, mantido com dinheiro cubano), "New York Times" (perigoso diário sustentado pelo lulo-petismo) e "Le Monde" (infiltrado pela retórica chavista e pelo esquerdismo de Marco Aurélio Garcia) dedicaram-se a analisar os fatos e a reconhecer: o Brasil saiu maior, muito maior, desse acordo fechado em Teerã.

No caso desses jornais, não se trata de concordar com o Irã, nem de discordar das sanções que podem vir contra aquele país. Mas as três publicações procuram não brigar com os fatos. E os fatos indicam que o Brasil agiu com independência, inteligência, e no melhor interesse da paz. Indicam que o Brasil conquistou a maioridade diplomática.

Isso foi reconhecido pela imprensa internacional. Não por "subserviência a Lula", mas porque é um dado da realidade. Aqui no Brasil, em compensação, comentaristas que babam de raiva e jornais tresloucados de inveja saíram a atacar Lula.

Não reconhecem o óbvio. Preferem o Brasil que tira os sapatos para os EUA.

Jornais brasileiros chegaram a orgasmos jornalísticos quando Hillary Clinton atacou Brasil e Turquia.

Agora, revela-se que os EUA incentivaram o Brasil a tentar um acordo. Mais um sinal de que os EUA vivem uma disputa surda de poder: os democratas mais liberais chegaram à Casa Branca, mas os falcões seguem a mandar no Departamento de Estado.

O Terra reproduz a apuração feita pela Reuters:

"O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, afirmou em uma carta ao seu colega brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva que o acerto de troca de combustível nuclear com o Irã criaria "confiança" no mundo, segundo trechos do documento enviado há 15 dias, antes do acordo de Teerã.

A Reuters teve acesso a trechos da correspondência e comparou alguns de seus pontos com o acordo assinado na última segunda-feira. Nela, Obama retoma os termos do acordo que o Grupo de Viena havia proposto no ano passado, cujos principais elementos constam no acerto entre Brasil, Turquia e Irã. ‘Do nosso ponto de vista, uma decisão do Irã de enviar 1.200 kg de urânio de baixo enriquecimento para fora do país geraria confiança e diminuiria as tensões regionais por meio da redução do estoque iraniano’ de LEU (urânio levemente enriquecido na sigla em inglês), diz Obama, segundo trechos obtidos da carta.

Após o anúncio do acordo, no entanto, os Estados Unidos anunciaram que os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (EUA, Grã-Bretanha, França, China, Rússia) concordaram com um esboço de resolução contendo novas sanções à República Islâmica”.

Obama, como se sabe, é um muçulmano esquerdista infiltrado na Casa Branca. Incentivou Lula a fazer o acordo.

Mas os homens bons nos EUA (e na imprensa brasileira) conseguiram barrar esse absurdo.

Vamos agora falar sério: a velha imprensa brasileira já estava desmoralizada - pelo seu moralismo seletivo, pelas mentiras, pela cara-de-pau, pela tentativa de se mostrar "isenta" enquanto atua feito partido conservador.
Só faltava revelar, sem máscaras, seu caráter anti-nacional.
Agora, não falta mais nada.

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A mídia “vira-lata” e o acordo Brasil-Irã

Apesar da bronca recente que levou do irritadiço José Serra, a jornalista Miriam Leitão mantém-se uma seguidora canina das teses demo-tucanas. No programa Espaço Aberto, da Globo News desta quinta-feira (20), ele entrevistou dois “renomados especialistas” sobre o acordo Brasil-Irã: Luiz Felipe Lampreia e Sérgio Amaral. Excitada com as opiniões emitidas, ela só não informou aos ingênuos telespectadores que ambos são tucanos de carteirinha, serviram ao entreguista FHC e hoje viraram as estrelas da TV Globo no combate hidrófobo à política externa do governo Lula.

Ex-porta-voz e ex-ministro de FHC, Sérgio Amaral nem disfarçou o seu ressentimento e inveja. Para ele, o Brasil não deveria se meter nos conflitos na região. Explicitando o seu servilismo, ele tentou desqualificar o “atual protagonismo” do Itamaraty, afirmando que isto pode prejudicar as relações com os EUA. Repetindo os relatórios da CIA, também garantiu que o Irã é uma ameaça à paz mundial – mas não falou uma linha sobre as ogivas e as ações belicistas do governo ianque. Mais “diplomático”, Lampreia, outro serviçal de FHC, também ridicularizou o acordo Brasil-Irã.

Sucursais rastaqüeras da mídia dos EUA

Miriam Leitão não é a única a usar os meios de comunicação, inclusive as concessões públicas, para repetir as velhas teses colonizadas. Na prática, a maior parte da mídia nativa mais se parece com uma sucursal rastaqüera da imprensa ianque – e do Departamento do Estado dos EUA. Ela é a expressão acabada do “complexo de vira-lata”, ironizado pelo dramaturgo Nelson Rodrigues. Foi uma entusiasta da política de “alinhamento automático com os EUA”, praticado por FHC, e defendeu acriticamente o tratado neocolonial da Área de Livre Comércio das Américas (Alca).

A mídia demotucana sempre foi covarde diante do império e prepotente diante das nações mais sofridas. Ela embarcou com tudo nas 938 mentiras alardeadas pelo presidente-terrorista George W. Bush para justificar a invasão e o genocídio no Iraque, num patriotismo às avessas. Já quando Evo Morales nacionalizou o petróleo da Bolívia, ela exigiu do presidente Lula o rompimento das relações diplomáticas e até o envio de tropas para a fronteira. A mesma arrogância se manifestou quando das negociações sobre Itaipu, num discurso agressivo contra o governo do Paraguai.

Ceticismo, inveja e dor de cotovelo

Esta visão colonizada ficou, mais uma vez, escancarada nas negociações de paz entre Brasil-Irã-Turquia. Num primeiro momento, a mídia apostou no total fracasso da iniciativa. Como relata o professor Dennis de Oliveira, os jornalões conservadores afirmaram que o presidente Lula estaria “perdendo tempo” e “arriscando a credibilidade internacional do país”. A Folha estampou em sua manchete que “Irã dá ao Brasil um polêmico protagonismo”, num artigo carregado de ceticismo. O Estadão também menosprezou as negociações, prognosticando seu insucesso.

Já quando o acordo foi assinado, a mídia, ainda meio desnorteada, procurou desqualificá-lo. Em nenhum momento, ela enfatizou que os termos do acordo são os mesmos propostos pelo próprio Conselho de Segurança da ONU. O que antes ela defendia, agora se opõe – numa típica postura ideologizada contra o governo Lula. “A aposta no fracasso deu lugar ao ceticismo com misto de inveja e dor de cotovelo”, constata Dennis de Oliveira. Na sua oposição ao acordo, o Estadão usou até as declarações infelizes da candidata Marina Silva, que se prestou ao trabalho sujo.

Repercussão mundial omitida

No seu complexo de vira-lata, a mídia colonizada nem sequer repercutiu análises mais isentas da imprensa mundial. O jornal francês Le Monde, por exemplo, elogiou o Brasil e destacou que “o Sul emergente já aparecera antes, em cena que provocou frisson e alarido no palco internacional, em domínios do meio ambiente e comércio. Essa semana, inaugura nova etapa, importante sinal de quanto aumenta o poder desses países. Ei-los ativos em terreno que, até agora, permanecia quase monopólio das tradicionais ‘grandes potências’: a proliferação nuclear no Oriente Médio”.

Já o jornal britânico The Guardian realçou que o acordo “marca o nascimento de uma nova força altamente promissora no cenário internacional: a parceria Brasil-Turquia... O que se viu foi que negociadores competentes em negociações bem encaminhadas por dois líderes mundiais destruíram a versão, difundida por Washington, de que o Irã não faria acordos e teria de ser ‘atacado’”. Miriam Leitão, Sérgio Amaral, Lampreia, FHC e o presidenciável Serra devem morrer de inveja diante de tantos elogios, que a mídia nativa omite. Podem até cortar os pulsos!

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