Reproduzo artigo de David Bacon, publicado no sítio Opera Mundi:
No mês passado, 600 trabalhadores da rede de fast food Chipotle foram demitidos em Minnesota. Nos últimos dois anos, outros milhares foram demitidos pelo mesmo delito - 1.800 jovens costureiras em Los Angeles, 500 colhedores de maçã no leste de Washington, centenas de porteiros em Minnesota e Califórnia. Todos são vítimas da estratégia "moderada" de combate à imigração promovida pelo governo dos Estados Unidos.
Sua lógica é brutal: tornar impossível que 12 milhões de indocumentados nos EUA ganhem seu sustento - para comprar comida, pagar o aluguel ou mandar dinheiro para os filhos em seus países de origem. Assim, eles mesmos vão se deportar. Quando suas famílias souberem que não eles não conseguiram trabalho nos EUA, não vão querer se juntar aos que já estão lá.
Esta lógica desumana convenceu o Congresso a aprovar a Lei de Reforma e Controle da Imigração em 1986. Há 25 anos, os empregadores têm de verificar o status de imigração dos trabalhadores e não podem empregar legalmente pessoas sem documentos. O verdadeiro impacto, contudo, recai sobre os trabalhadores. Virou crime ter um trabalho.
Mas isso não levou os imigrantes indocumentados a deixar os Estados Unidos. Ao longo desses 25 anos, o Nafta, o Cafta e reformas pró-corporativas no México e em outros países em desenvolvimento agravaram profundamente a pobreza que expulsa as pessoas de suas casas. Vieram para os EUA mais pessoas que nunca.
Entre elas estavam aqueles 600 trabalhadores, a maioria do México, que ganhavam salário mínimo servindo comida mexicana na Chipotle. Muitos trabalharam durante anos para a companhia. E então o Departamento de Segurança Interna auditou os registros de pessoal da Chipotle, encontrou números incorretos da Seguridade Social e, em dezembro, enviou à empresa uma lista de trabalhadores que teriam de ser demitidos.
Alejandro Juarez, que trabalhava no restaurante Calhoun Lake, em Minneapolis, conta que seu gerente lhe disse que não se incomodasse em aparecer no dia seguinte. Ele passara cinco anos limpando e consertando os fogões, grelhas e refrigeradores, por US$ 9,42 a hora. "A empresa nos usou", diz ele. "Quando passamos a não servir mais, eles nos jogaram fora como lixo."
John Morton, diretor da Agência de Imigração e Alfândega (ICE, na sigla em inglês), afirma que o órgão planeja muitas outras demissões em massa. O website da ICE diz que os alvos são empregadores "que usam trabalhadores ilegais para baixar os salários (...) [aqueles] que tendem a pagar salários abaixo do padrão aos trabalhadores ilegais ou submetê-los a condições de trabalho insuportáveis".
Mas na Chipotle, assim como em todos os outros alvos de sanções, as condições de trabalho nunca melhoraram. Os salários permanecem os mesmos. Na verdade, embora Morton afirme que a ICE recolheu US$ 7 milhões em multas a empregadores em 2.740 auditorias, aqueles que cooperaram demitindo trabalhadores receberam imunidade. As únicas pessoas penalizadas foram os trabalhadores.
Felizmente, em Minneapolis, os trabalhadores primeiro buscaram assistência no Centro para os Trabalhadores Unidos na Luta. Com sua ajuda, eles fizeram uma aliança com o sindicato dos zeladores da cidade, o Empregados de Serviço Local 26. O sindicato local já havia sido afetado por auditorias que levaram à demissão de centenas de membros, incluindo serventes, funcionários e ativistas. Os zeladores haviam feito passeatas enquanto o sindicato tentava ajudá-los a sobreviver. Juntos, empregados da Chipotle e faxineiros de prédios montaram piquetes diante dos restaurantes, onde vários simpatizantes foram presos em protesto.
Na medida em que essas demissões se espalharem, muitos outros sindicatos enfrentarão a mesma situação. Alguns, como os dos zeladores em Minneapolis e San Francisco, têm buscado maneiras de lutar. Sua prioridade é a sobrevivência, e eles tentam obter prorrogações, pagamentos retroativos, férias devidas e indenizações.
Em Minneapolis, os trabalhadores também exigem que a Chipotle apoie a reforma da imigração. Isso põe os direitos humanos dos imigrantes diretamente no centro da mesa.
As abrangentes propostas de reforma da imigração no Congresso nos últimos cinco anos não teriam detido essas demissões - na verdade, a maioria dos projetos teria provocado seu aumento. No entanto, embora o Congresso esteja dando uma guinada à direita, muitos sindicatos e grupos pró-direitos dos imigrantes movem-se para a esquerda.
Eles exigem reformas que reforçariam os direitos humanos e trabalhistas de pessoas como os zeladores e os trabalhadores da Chipotle. Uma proposta, a Campanha Jantar com Dignidade, pede status legal para os indocumentados, a revogação das sanções contra os empregadores e o fim das políticas comerciais que levam à migração forçada.
Isso reflete a posição adotada pelos sindicatos na convenção da AFL-CIO de 1999. Eles argumentaram na ocasião que os trabalhadores imigrantes tinham de ser capazes de se organizar a fim de melhorar os salários e as condições tipo Chipotle. A criminalização do trabalho tornou mais difícil a organização, ao mesmo tempo jogando os trabalhadores uns contra os outros em épocas de desemprego alto. O sindicato de hotelaria de San Francisco venceu mais tarde uma ação invalidando demissões por números incorretos da Seguridade Social. Os sindicatos chegaram a obter um mandado de segurança contra a regulação de Bush que impunha essas demissões.
Depois de 1999, no entanto, alguns sindicatos apoiaram os projetos de reforma porque eles prometiam uma legalização limitada, mesmo ao preço do aumento do controle dos locais de trabalho. E, mais recentemente, o Departamento de Edifícios e Construção da AFL-CIO pediu o reforço das sanções sem legalização.
Os sindicatos terão de escolher se defendem ou não os trabalhadores. Não há dúvida de que outros milhares serão demitidos, mesmo em uma economia com 9% de desemprego. E essas demissões são indispensáveis para um regime de repressão que, no ano passado, levou a quase 400.000 deportações, e quase o mesmo número de pessoas detidas. Agora circulam rumores em Washington de que, se não houver muito protesto, a ICE retomará as incursões no estilo Bush.
Mas os zeladores e os trabalhadores da Chipotle mostraram ao país um fato crucial. Mesmo sem papéis, eles estão dispostos a resistir. "Temos de fazer nossos direitos valerem para alguma coisa", diz Juarez. "Não somos criminosos. Precisamos dizer o que pensamos e mostrar à companhia e ao governo que estamos unidos."
Agora cabe aos sindicatos e organizações pró-direitos dos imigrantes resistir a seu lado, para exigir não só o fim das demissões e deportações, mas também que uma verdadeira reforma da imigração garanta os direitos humanos e trabalhistas básicos.
No mês passado, 600 trabalhadores da rede de fast food Chipotle foram demitidos em Minnesota. Nos últimos dois anos, outros milhares foram demitidos pelo mesmo delito - 1.800 jovens costureiras em Los Angeles, 500 colhedores de maçã no leste de Washington, centenas de porteiros em Minnesota e Califórnia. Todos são vítimas da estratégia "moderada" de combate à imigração promovida pelo governo dos Estados Unidos.
Sua lógica é brutal: tornar impossível que 12 milhões de indocumentados nos EUA ganhem seu sustento - para comprar comida, pagar o aluguel ou mandar dinheiro para os filhos em seus países de origem. Assim, eles mesmos vão se deportar. Quando suas famílias souberem que não eles não conseguiram trabalho nos EUA, não vão querer se juntar aos que já estão lá.
Esta lógica desumana convenceu o Congresso a aprovar a Lei de Reforma e Controle da Imigração em 1986. Há 25 anos, os empregadores têm de verificar o status de imigração dos trabalhadores e não podem empregar legalmente pessoas sem documentos. O verdadeiro impacto, contudo, recai sobre os trabalhadores. Virou crime ter um trabalho.
Mas isso não levou os imigrantes indocumentados a deixar os Estados Unidos. Ao longo desses 25 anos, o Nafta, o Cafta e reformas pró-corporativas no México e em outros países em desenvolvimento agravaram profundamente a pobreza que expulsa as pessoas de suas casas. Vieram para os EUA mais pessoas que nunca.
Entre elas estavam aqueles 600 trabalhadores, a maioria do México, que ganhavam salário mínimo servindo comida mexicana na Chipotle. Muitos trabalharam durante anos para a companhia. E então o Departamento de Segurança Interna auditou os registros de pessoal da Chipotle, encontrou números incorretos da Seguridade Social e, em dezembro, enviou à empresa uma lista de trabalhadores que teriam de ser demitidos.
Alejandro Juarez, que trabalhava no restaurante Calhoun Lake, em Minneapolis, conta que seu gerente lhe disse que não se incomodasse em aparecer no dia seguinte. Ele passara cinco anos limpando e consertando os fogões, grelhas e refrigeradores, por US$ 9,42 a hora. "A empresa nos usou", diz ele. "Quando passamos a não servir mais, eles nos jogaram fora como lixo."
John Morton, diretor da Agência de Imigração e Alfândega (ICE, na sigla em inglês), afirma que o órgão planeja muitas outras demissões em massa. O website da ICE diz que os alvos são empregadores "que usam trabalhadores ilegais para baixar os salários (...) [aqueles] que tendem a pagar salários abaixo do padrão aos trabalhadores ilegais ou submetê-los a condições de trabalho insuportáveis".
Mas na Chipotle, assim como em todos os outros alvos de sanções, as condições de trabalho nunca melhoraram. Os salários permanecem os mesmos. Na verdade, embora Morton afirme que a ICE recolheu US$ 7 milhões em multas a empregadores em 2.740 auditorias, aqueles que cooperaram demitindo trabalhadores receberam imunidade. As únicas pessoas penalizadas foram os trabalhadores.
Felizmente, em Minneapolis, os trabalhadores primeiro buscaram assistência no Centro para os Trabalhadores Unidos na Luta. Com sua ajuda, eles fizeram uma aliança com o sindicato dos zeladores da cidade, o Empregados de Serviço Local 26. O sindicato local já havia sido afetado por auditorias que levaram à demissão de centenas de membros, incluindo serventes, funcionários e ativistas. Os zeladores haviam feito passeatas enquanto o sindicato tentava ajudá-los a sobreviver. Juntos, empregados da Chipotle e faxineiros de prédios montaram piquetes diante dos restaurantes, onde vários simpatizantes foram presos em protesto.
Na medida em que essas demissões se espalharem, muitos outros sindicatos enfrentarão a mesma situação. Alguns, como os dos zeladores em Minneapolis e San Francisco, têm buscado maneiras de lutar. Sua prioridade é a sobrevivência, e eles tentam obter prorrogações, pagamentos retroativos, férias devidas e indenizações.
Em Minneapolis, os trabalhadores também exigem que a Chipotle apoie a reforma da imigração. Isso põe os direitos humanos dos imigrantes diretamente no centro da mesa.
As abrangentes propostas de reforma da imigração no Congresso nos últimos cinco anos não teriam detido essas demissões - na verdade, a maioria dos projetos teria provocado seu aumento. No entanto, embora o Congresso esteja dando uma guinada à direita, muitos sindicatos e grupos pró-direitos dos imigrantes movem-se para a esquerda.
Eles exigem reformas que reforçariam os direitos humanos e trabalhistas de pessoas como os zeladores e os trabalhadores da Chipotle. Uma proposta, a Campanha Jantar com Dignidade, pede status legal para os indocumentados, a revogação das sanções contra os empregadores e o fim das políticas comerciais que levam à migração forçada.
Isso reflete a posição adotada pelos sindicatos na convenção da AFL-CIO de 1999. Eles argumentaram na ocasião que os trabalhadores imigrantes tinham de ser capazes de se organizar a fim de melhorar os salários e as condições tipo Chipotle. A criminalização do trabalho tornou mais difícil a organização, ao mesmo tempo jogando os trabalhadores uns contra os outros em épocas de desemprego alto. O sindicato de hotelaria de San Francisco venceu mais tarde uma ação invalidando demissões por números incorretos da Seguridade Social. Os sindicatos chegaram a obter um mandado de segurança contra a regulação de Bush que impunha essas demissões.
Depois de 1999, no entanto, alguns sindicatos apoiaram os projetos de reforma porque eles prometiam uma legalização limitada, mesmo ao preço do aumento do controle dos locais de trabalho. E, mais recentemente, o Departamento de Edifícios e Construção da AFL-CIO pediu o reforço das sanções sem legalização.
Os sindicatos terão de escolher se defendem ou não os trabalhadores. Não há dúvida de que outros milhares serão demitidos, mesmo em uma economia com 9% de desemprego. E essas demissões são indispensáveis para um regime de repressão que, no ano passado, levou a quase 400.000 deportações, e quase o mesmo número de pessoas detidas. Agora circulam rumores em Washington de que, se não houver muito protesto, a ICE retomará as incursões no estilo Bush.
Mas os zeladores e os trabalhadores da Chipotle mostraram ao país um fato crucial. Mesmo sem papéis, eles estão dispostos a resistir. "Temos de fazer nossos direitos valerem para alguma coisa", diz Juarez. "Não somos criminosos. Precisamos dizer o que pensamos e mostrar à companhia e ao governo que estamos unidos."
Agora cabe aos sindicatos e organizações pró-direitos dos imigrantes resistir a seu lado, para exigir não só o fim das demissões e deportações, mas também que uma verdadeira reforma da imigração garanta os direitos humanos e trabalhistas básicos.
1 comentários:
nem tudo é preto no branco na questão da imigração. Começa pelo fato de os EUA, assim como o Brasil, serem um país formado por imigrantes. Desde os puritanos do Mayflower. Pesa na questão da imigração ilegal nos EUA o fato de o país ter mantido por décadas as portas abertas ao ingresso de mão-de-obra mais barata e disposta a trabalhos rejeitados pelos anglo-saxões. De certa forma, podemos dizer que essa imigração foi estimulada. Essas pessoas não estão lá – gerando riqueza, movendo a economia – porque gostam. Elas precisam. Em geral, não encontram oportunidades em seus países de origem e têm na América uma fonte de renda maior. São discriminadas. Os imigrantes que conseguiram cidadania hoje representam uma boa fatia do eleitorado. Em alguns Estados, como a Flórida, a Califórnia e o Novo México, eles definem eleições. Definitivamente, os EUA poderiam ter reduzido essa massa de imigrantes ilegais se tivessem investido e cooperado mais na América Central.
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