domingo, 22 de maio de 2016

Dilma e a história no último grau

Renato Rovai, em seu blog:

A presidenta Dilma Rousseff esteve ontem em Belo Horizonte para participar do V Encontro dos Blogueiros. Foi a primeira vez que ela veio ao evento. Ao mesmo tempo acontecia na cidade um protesto contra o governo interino e ilegítimo de Michel Temer. A manifestação terminou na frente do hotel onde acontece o encontro.

Aproximadamente 20 mil pessoas esperaram Dilma chegar durante uma hora. Um ato organizado sem grandes pretensões e que acabou se tornando um dos maiores da cidade desde a eleição de 2014.

Dilma chorou quando viu o que a aguardava. E contou isso na sua fala de ontem ao ver que na frente do palco dos blogueiros estava Débora, uma garota de 16 anos, chorando sem parar enquanto aguardava o discurso.

Foi no meio deste turbilhão de emoções que envolve a política brasileira que a presidenta Dilma fez sua primeira fala pública desde que foi afastada da presidência.

Dilma falou muito sobre os avanços do seu governo e também do de Lula, mas o que parece ser o foco desta sua nova fase é a de buscar demonstrar o que será o governo Temer se ela vier, de fato, a sofrer o impeachment.

Na avaliação de Dilma, Temer e os seus caminhos tortos no governo seriam a sua melhor propaganda.

Dilma está absolutamente certa.

Porque o que está acontecendo neste momento no Brasil, no meio de toda essa crise política, é uma grande reflexão. É uma emocionante reflexão.

Boa parte da população brasileira estava querendo saber o que a oposição que gritava ‘Fora Dilma’ tinha para apresentar como solução ao país. E o que está sendo apresentado não vai até a esquina de uma disputa eleitoral. Façamos um teste rápido, pois.

Qual a porcentagem de votos que você acha que teria um candidato que defendesse o seguinte programa no debate eleitoral?

– Fim do Ministério da Cultura.

– Diminuição do SUS e ampliação do atendimento por planos de saúde.

– Aposentadoria no mínimo aos 65 anos para homens e mulheres.

– Reajuste diferenciado do salário mínimo para trabalhadores da ativa
e aposentados.

– Fim do reajuste do salário mínimo com base na inflação e no
crescimento do PIB.

– Interrupção do Minha Casa Minha Vida.

– Redução em até 30% dos recursos para o Bolsa Família.

– Privatização de bancos públicos como o BB e a CEF.

– Privatização da Petrobras.

– Abrir o governo para indicações políticas de Eduardo Cunha.

– Convocação de sete políticos investigados na Lava Jato para assumir
cargos em ministérios.

Quantos votos você acha que este candidato teria?

Em uma semana, Temer foi e voltou ou ficou em vários desses pontos. E não foi eleito para fazer nada disso.

E, nunca, nem ele e nem um outro candidato seria ou será eleito nos próximos tempos com um programa desses.

E, por este motivo, Dilma está certa em forçar o debate sobre o governo provisório e ilegítimo de Temer a partir do que ele tem anunciado e do que ele tem voltado atrás.

E, por este motivo, é muito provável que o governo Temer não se legitime.

Dilma parece ter convicção de que isso vai acontecer.

E, ao mesmo tempo em que luta para reassumir o governo, parece estar disposta a negociar uma outra solução, se necessário for, para defender a democracia.

Ela não diz isso claramente, mas deixa nos detalhes de algumas de suas falas frestas abertas para essa possibilidade.

Por isso, não é exagero dizer que o que está acontecendo no Brasil hoje é história no último grau.

Uma febre transformadora com emoções à flor da pele.

Por incrível que pareça, ouvindo Dilma, vendo a manifestação imensa aqui em BH e participando do encontro de blogueiros, além de todas as outras atividades em que tive nos últimos dias, começo a desconfiar que o Brasil não tem só a perder com tudo o que está acontecendo.

É também nas crises que as máscaras caem, como disse Dilma na conversa reservada que teve com a organização do evento. E é nesses momentos que tudo fica mais claro. E que as pessoas também podem escolher melhor os seus caminhos.

O governo Temer está fazendo o Brasil discutir profundamente os seus rumos.

E as ocupações culturais são apenas o primeiro sinal disso.

E o fato de Dilma parecer ter entendido esse recado das ruas e das emoções que brotam é muito importante. Porque Dilma assumir a resistência ao golpe é fundamental do ponto de vista simbólico para as lutas que virão.

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