segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Odebrecht e PT: história mal contada

Por Tereza Cruvinel, em seu blog:

Muito mal contada a história de uma tentativa de delação da Odebrecht revelando o pagamento de R$ 100 milhões ao PT através do ex-ministro Guido Mantega.

Segundo a matéria de O Globo, tais pagamentos - que terão de ser provados, desafia a defesa do ex-ministro - teriam relação com medidas tributárias favoráveis a empreiteiras, mais precisamente com a medida provisória 647, convertida em lei em 2014. Ela reduziu de 35% para 25% o imposto de renda sobre lucros obtidos por empresas brasileiras no exterior.

O enredo se enrosca é quando aparece o elenco de pessoas que negociaram a aprovação da MP no Congresso. E a mais destacada entre elas não foi nenhum líder ou deputado do PT mas o então líder do PMDB, Eduardo Cunha, que atuou como relator da matéria.

Cunha então trabalhou de graça para o PT e os empreiteiros? Senão, vejamos o que conta a matéria de O Globo, “Odebrecht diz ter dado R$ 100 milhões ao PT”.

1) “Acho que conseguimos trazer praticamente todas as empresas para um acordo”, teria escrito a Odebrecht em email a um assessor do então ministro da Fazenda. Acordos entre o empresariado e o governo acontecem todos os dias neste país que é governado pelo estamento, onde os negócios públicos, desde a Colônia, são tocados assim. Vamos em frente.

2) Aqui aparece algo muito interessante. Dias depois o diretor jurídico da empreiteira, Maurício Ferro, teria escrito a seu patrão: “Será importante você ter a reunião com GM (Guido Mantega) amanhã depois da PR (Dilma). Receita continua criando dificuldades e Dyogo vai precisar do apoio do ministro”. Em nenhum momento a matéria procura saber quem é Dyogo mas todo mundo, até pela grafia do nome. Trata-se de um ministro de Temer, o do Planejamento, Dyogo Henrique Oliveira. Na época da MP, ele era secretário-executivo adjunto da Fazenda. Depois, foi secretário-executivo do ex-ministro Nelson Barbosa. Gato de sete fôlegos, com o afastamento de Dilma permaneceu no governo Temer como secretário-adjunto de Romero Jucá no Planejamento. Com a queda de Jucá, virou ministro. Ajustou perfeitamente suas convicções ao giro de 180 graus na política econômica. Se Dyogo ia precisar do apoio do ministro (supostamente de Mantega), ele era uma peça importante na articulação para aprovar a dita medida provisória. A matéria, entretanto, não dá a mínima importância à citação de seu nome. Nem as “fontes” que vazaram os termos de uma negociação que ainda está em curso. Mas vamos em frente.

3) Em mensagem capturada no celular de Octavio Azevedo, da Andrade Gutierrez, que também participou da negociação, o relator da matéria, Eduardo Cunha, aparece discutindo os termos e as mudanças a serem feitas na medida provisória. A transcrição da íntegra, entretanto, não foi vazada. Mas prossigamos.

4) A matéria diz ainda que o debate sobre a medida foi acompanhado de perto pelo líder do PMDB no Senado, Eduardo Braga, pelo vice-presidente Michel Temer e pelo então ministro Guido Mantega. Os dois primeiros, entretanto, não merecem a menor atenção da matéria, ou da fonte que revelou os termos da tentativa de negociação de delação. Por que Braga e Temer tinham tanto interesse nesta MP? Esta pergunta devia ter sido feita?

5) A conclusão é de que a história casa com revelações de Monica Moura, mulher e sócia de João Santana, de que recebeu indicações de Mantega sobre pessoas que deveria procurar para receber pagamentos por trabalhos de campanha para o PT, via caixa dois. É uma dedução. Nos tais R$ 100 milhões estariam incluídos os pagamentos ao casal.

6) Mas se houve pagamento pela edição (Governo) e aprovação (Congresso) da medida provisória, não foi apenas para um partido. Ainda mais tendo Cunha como relator da matéria. Mas o único vilão apontando neste vazamento da delação, ainda em negociação, a ser feita pela Odebrecht, é o PT. Entende-se. Está se aproximando o julgamento de Dilma pelo Senado e é hora de desovar matérias que contribuam para criar o clima, envenenar o imaginário e justificar votos contra Dilma, inclusive de seus ex-ministros. E para isso, as historias não podem ser contadas por inteiro. Deve-se contar apenas a parte que incrimina o PT.

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