Por Altamiro Borges
Por motivos óbvios, a imprensa privada fez intensa campanha pela aprovação da contrarreforma trabalhista do covil golpista de Michel Temer. Historicamente, os barões da mídia sempre detestaram a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), criada no governo de Getúlio Vargas, e nunca toleraram a organização sindical dos explorados. Neste sentido, não surpreende que mais de 90% das “reporcagens” publicadas nos jornalões e exibidas nas emissoras de tevê tenham sido favoráveis ao desmonte da CLT – conforme constatou a ONG Repórter Brasil. Quase não houve contraditório e o jornalismo deu lugar à propaganda abjeta e escancarada da “reforma” proposta pela quadrilha que assaltou o poder – com a ajuda inestimável da própria mídia golpista.
Infelizmente, alguns jornalistas de aluguel – que adoram chamar os patrões de “companheiro” – prestaram seus serviços sujos para defender a contrarreforma trabalhista aprovada no Senado na semana passada. Eles garantiram que este golpe vai gerar mais empregos e “modernizar” as relações de trabalho. A maioria destes mercenários sabe que isto é balela, mas preferiu ser mais realista do que o rei – sabe-se lá a que preço. Aos poucos, porém, os trabalhadores – inclusive os explorados dos veículos de comunicação que ainda não têm sentimento de pertencimento à classe dos escravos do salário – vão se dar conta de que foram ludibriados. Os jornalistas sentirão na pele a tal “modernização” das relações do trabalho.
Em entrevista recente ao jornal do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais, a professora de Direito do Trabalho da UFMG, Daniela Muradas Reis, alertou que a categoria será uma das mais atingidas pelo retrocesso imposto pela quadrilha de Michel Temer, com o apoio das entidades patronais e dos barões da mídia. Segundo ela, a reforma tornará a profissão de jornalista completamente precária, com graves prejuízos para toda a sociedade, em consequência da baixa qualidade das informações. “O setor da imprensa é altamente pejotizado e afetado pelo uso de novas tecnologias. A informalidade do trabalho agora está amparada por lei e vai valer o que o mercado ditar. Num setor concentrado como esse as consequências serão muito graves”.
A professora lembrou que vários pontos da reforma já foram condenados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) por violarem acordos mundiais. “Um deles é o direito de férias”, afirmou, citando ainda a renúncia de direitos possibilitada pela prevalência do negociado sobre o legislado. A reforma muda mais de 100 artigos da CLT. “São medidas de retrocesso com impactos e desdobramentos”. Entre os aspectos da reforma que atingem diretamente os jornalistas, Daniela Muradas Reis enfatizou a precarização da jornada de trabalho e o chamado teletrabalho, que regulamenta o home office.
Reproduzo abaixo o estudo produzido pela ONG Repórter Brasil acerca da manipulação da mídia no debate sobre a ‘reforma’ trabalhista. Ela enganou muita gente, inclusive vários jornalistas que se consideram uma elite bem informada:
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Reforma trabalhista: maior parte da mídia não aborda o impacto negativo das mudanças
Por Repórter Brasil - 05/06/17
Impressos e telejornais relegam a segundo plano as perdas de direitos da CLT. A adesão do Jornal da Record ao projeto do governo chegou a 100%, enquanto a Folha foi a mais crítica
“Modernizar” uma legislação “anacrônica”, privilegiando a negociação entre patrões e empregados com o objetivo de dinamizar a economia e favorecer a retomada dos empregos. Esse foi o principal argumento da cobertura sobre a reforma trabalhista nos principais veículos do país, conforme levantamento feito pela Repórter Brasil.
O Jornal da Record foi o menos crítico à proposta apresentada pelo governo, com 100% das reportagens favoráveis. O Globo foi o segundo mais alinhado, com 88% do conteúdo suportando o que defende o Palácio do Planalto. Em seguida, aparecem o Jornal Nacional (77%) e O Estado de S.Paulo (68%). A Folha de S.Paulo (42%) destoou dos outros veículos, já que criticou a proposta em mais de metade dos seus textos.
Para chegar a essa conclusão, a Repórter Brasil analisou mais de 150 textos dos três jornais de maior projeção nacional – Folha, O Globo e Estadão – e 30 minutos de matérias dos dois principais telejornais – Jornal Nacional e Jornal da Record. Foram avaliados os cinco dias anteriores e os cinco posteriores à aprovação do relatório do deputado Rogério Marinho (PSDB-RN) na comissão especial da Câmara: de 20 a 30 de abril de 2017.
Conteúdos em que prevaleciam o detalhamento da proposta, sem a apresentação de contrapontos, ou quando o apoio era explícito foram avaliados como favoráveis e alinhados ao governo. Esse é o critério utilizado pelas maiores empresas do Brasil especializadas em análise de imagem e reputação.
Entre os veículos analisados, o Jornal da Record foi o que reverberou mais explicitamente a ideia de que as mudanças pretendidas pela gestão do presidente Michel Temer abrirão novas vagas no mercado. Reforçou essa tese usando depoimentos de estudiosos e de brasileiros anônimos demonstrando “esperança”.
Os impressos, em especial o Estadão, deram a entender que se trata de uma briga entre governo e sindicatos, que podem perder a principal fonte de financiamento caso o fim do imposto sindical seja aprovado. Entre as grandes entidades, apenas a Central Única dos Trabalhadores (CUT) não depende da contribuição obrigatória para se manter.
Matérias focadas na greve geral de 28 de abril, que apenas mencionavam a reforma trabalhista como uma das insatisfações dos manifestantes, não foram consideradas na contabilização dos números para não distorcerem os resultados. Essas reportagens foram consideradas somente na análise qualitativa.
Na cobertura específica dos protestos, todos os veículos expuseram em primeiro plano ações de vandalismo, confrontos com a polícia e os prejuízos causados à população em decorrência da paralisação dos transportes.
Como escreveu a ombudsman da Folha, Paula Cesarino Costa, todos, sem exceção, olharam para o impacto sobre a árvore, deixando de olhar para a situação da floresta. Sem críticas, as razões por trás daqueles atos.
Esta é a segunda pesquisa da Repórter Brasil sobre a cobertura que a imprensa tem feito sobre as reformas do governo Temer. Leia também o levantamento sobre a Reforma da Previdência.
Veja, abaixo, detalhes do estudo feito por Repórter Brasil.
JORNAL NACIONAL: Todas as fontes foram favoráveis à reforma
Todos os entrevistados pelo Jornal Nacional no período analisado defenderam a necessidade de “modernizar” uma legislação que consideram “anacrônica”. Três das quatro reportagens são claramente alinhadas à proposta do governo. Apenas uma, de 2min31s, pode ser considerada desfavorável ao projeto de lei já aprovado pela Câmara dos Deputados. Ela mostrava que, na opinião de “centrais sindicais”, as mudanças previstas “fragilizam direitos” dos empregados.
A reportagem mais crítica foi ao ar na noite de 28 de abril, em meio a uma extensa cobertura que privilegiou “vandalismo”, “confrontos” entre manifestantes e policiais, além dos prejuízos à população durante a greve geral em diversas cidades do País. No vídeo, o âncora William Bonner elenca os principais pontos tanto da reforma trabalhista quanto da Previdência, apresentando também os argumentos do Palácio do Planalto, mas não abre espaço para as fontes falarem diretamente aos telespectadores.
Nas três reportagens favoráveis ao projeto de lei, o JN deixa claro que houve tensão e discussões exaltadas na sessão da comissão especial da reforma trabalhista e durante a votação no plenário da Câmara, mas não explora as razões das divergências entre os parlamentares e só ouve fontes que apoiam a proposta.
Sempre com o viés de que é preciso modernizar a CLT, avançar nas relações de trabalho e que as alterações previstas não mexerão em direitos assegurados pela Constituição, como jornada semanal de 44 horas e 13º salário.
O deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), relator da reforma, teve espaço para justificar essa visão. “Nós temos uma lei de 1943. Às vezes, a gente é chamado de conservador aqui neste Parlamento. Conservador é quem não quer mudar. Então, tem gente que está apegado a uma lei de 70 anos. Uma lei anacrônica, antiga, uma lei que não tem mais nada a ver com o espírito do tempo”.
Já Cláudio Sampaio, especialista em direito trabalhista, reforça essa percepção ao destacar que “na prática”, a nova lei “vai estimular a criação de empregos formais e não vai tirar direitos”.
JORNAL DA RECORD: Desemprego cairá após a reforma
Nenhuma matéria desfavorável à reforma trabalhista e também nenhuma fonte crítica ao projeto de lei apresentado pela gestão de Michel Temer. Assim foram os 19m26s da cobertura do Jornal da Record voltado ao tema. O programa também se dedicou mais que o seu concorrente às mudanças na CLT. Foi um tempo 74,5% maior que o Jornal Nacional em oito reportagens veiculadas.
Além de reiterar a necessidade de “modernização” de uma lei que considerada antiga e desatualizada, a Record buscou reverberar que as alterações serão benéficas porque valorizam a negociação entre patrões e funcionários, trarão mais empregos e ajudarão na retomada da economia.
E que pontos garantidos pela Constituição, como FGTS e seguro-desemprego, não serão mexidos. Para isso, se apoiou em entrevistas com deputados da base do governo, representantes do setor empresarial, professores de direito e também brasileiros anônimos, que dizem acreditar que mais vagas serão abertas. Um deles relata que acertar itens como férias e horários, por exemplo, será “mais tranquilo”.
A emissora incrementa o noticiário com números do desemprego, chegando a ressaltar que “a esperança” para baixar a taxa recorde de 14,2 milhões de pessoas desocupadas no Brasil é a reforma e que várias sugestões incorporadas ao projeto de lei foram dadas pelos próprios trabalhadores. Dá a entender que a proposta é positiva para ambos os lados e que não haverá perdas. Sustentado na ideia de que a CLT “trava o crescimento do Brasil”, o Jornal da Record evidencia que as discussões na Câmara dos Deputados foram tensas e que houve embate entre situação e oposição. Mas, assim como a TV Globo, não apresenta o posicionamento de parlamentares contrários às alterações na legislação.
Outras fontes mostram posições ainda mais contundentes. José Eduardo Pastore, advogado trabalhista, avalia que o objetivo é criar empregos e trazer para a formalidade os milhões de brasileiros que estão atualmente na informalidade. A reportagem não informa, contudo, que o jurista também é consultor da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Já o deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA), da base do governo, alega que a “tutela excessiva” prevista na CLT significa cerceamento de liberdade nas relações de trabalho.
O GLOBO: Jornal mais alinhado com a proposta do governo
Apesar de estar atrás da Folha e do Estadão em quantidade de textos publicados sobre a reforma, 43 no período de 20 a 30 de abril, O Globo é o impresso mais alinhado ao projeto do governo – com 88% da abordagem favorável às mudanças propostas na CLT. Também se destaca por trazer um número maior de fontes: mais de 60% superior aos concorrentes.
Entre os entrevistados pelo jornal carioca, 75% apoiam as alterações. Enquanto na Folha e no Estadão esse índice é de 44% e 42%, respectivamente. O fio condutor de O Globo, porém, se assemelha aos demais: a necessidade de reduzir os custos do emprego para ajudar na estabilidade econômica e o País poder voltar a crescer.
O jornalista Carlos Alberto Sardenberg deixa isso explícito ao escrever que, “sem a modernização das relações trabalhistas, o Brasil continuará sendo um dos países mais caros do mundo para se investir e ganhar dinheiro honestamente. Logo, não haverá retomada consistente”. Merval Pereira faz coro, responsabilizando os governos petistas pela recessão. “O mercado de trabalho hoje, muito influenciado pela globalização, já não comporta a visão getulista de um país isolado”, diz.
O Globo publicou duas reportagens de capa sobre a reforma. Uma em 26 de abril, relatando a passagem do projeto pela comissão especial, e outra no dia seguinte, valorizando a aprovação no plenário da Câmara. Embora tenha descrito que a sessão de votação foi tensa por conta de divergências entre os parlamentares, apresenta apenas uma voz dissonante em meio a outras quatro defendendo as alterações na CLT.
O deputado federal Júlio Delgado (PSB-MG) critica a fragilidade do governo Temer ao observar que o presidente obrigou ministros a deixarem temporariamente seus cargos para retomar o mandato e engrossar o apoio à proposta.
Em contraponto, o deputado Ricardo Tripoli (PSDB-SP) apelou para a “responsabilidade”. “Esse discurso dos anti-imperialistas está superado. Sem capital, não se gera emprego”, declarou. A percepção que o impresso transmite é de que os grupos contrários à flexibilização da lei defendem, na verdade, “a manutenção de vantagens de sindicatos”, conforme descreve no editorial de 29 de abril, um dia depois da greve geral.
O ESTADO DE S.PAULO: Críticas aos sindicatos alimentam cobertura
Com 68% dos textos publicados favoráveis à reforma trabalhista, incluindo duas capas, o Estadão fica em 4º lugar em alinhamento com a proposta do governo. Perde para Jornal da Record (100%), O Globo (88%) e Jornal Nacional (77%). Só está à frente da Folha (42%).
O que levou o veículo à penúltima colocação, contudo, não foi uma abordagem crítica ao projeto de Temer, mas uma cobertura que privilegiou as divergências entre os partidos, especialmente a “rebeldia” do PSB, e as expectativas quanto à repercussão da greve geral nas votações do Congresso. Ao longo dos 11 dias analisados, o Estadão reverberou que a legislação precisa ser modernizada para que o Brasil volte a crescer e gerar empregos, com colunistas e articulistas afinados.
“Goste ou não o PT, a reforma trabalhista é vital para recuperar a economia e os empregos”, escreve o ex-ministro e ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho Almir Pazzianotto Pinto. “Manter o engessamento das relações de trabalho com leis e regulamentações dos anos 40 é condenar o País à asfixia”, argumenta o jornalista Celso Ming.
Já Hélio Zylberstajn, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, questiona a “gritaria” de quem se opõe às mudanças. Em análise publicada em 27 de abril, logo depois da aprovação em plenário, ele afirma que leu e releu tanto o projeto de lei quanto a emenda elaborada pela comissão especial da Câmara e não encontrou nenhum artigo que elimina direitos dos trabalhadores.
Em boa parte da cobertura sobre o assunto nesta mesma edição, o Estadão abordou o impacto do PL sobre os sindicatos, reforçando o viés de que a paralisação programada para o dia seguinte teria como pano de fundo a luta dessas instituições para que o imposto sindical continuasse obrigatório. Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT) e do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, sustenta que o fim da contribuição é para “sufocar o movimento”.
Uma semana antes, a publicação havia trazido reportagem com declaração do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, destacada no título: “Sindicatos não querem perder a boquinha”. Das fontes entrevistadas pelo jornal, 57% questionaram a reforma. Mas as críticas ficaram concentradas em uma pequena parte dos 17 textos negativos, ante 36 positivos veiculados no período.
FOLHA DE S.PAULO: Colunistas e expectativas de greve levam à baixa adesão
Se o Jornal da Record se mostrou 100% alinhado à proposta do governo, a Folha foi a mais crítica: apenas 42% da cobertura pró-reforma trabalhista. Colunistas como Vladimir Safatle, Janio de Freitas e André Singer, assim como reportagens centradas nas expectativas quanto ao impacto da greve geral e nas divergências entre os partidos sobre a repercussão do PL para os trabalhadores, ajudaram a segurar o veículo na 5ª colocação.
A economista Laura Carvalho, por exemplo, que escreve às quintas-feiras, publicou na véspera da paralisação que a proliferação de estudos indicando que a desregulamentação do mercado não eleva, ou até prejudica, o nível de emprego parece ter levado alguns organismos multilaterais que pregavam maior flexibilidade a mudarem de posição. No mesmo dia, porém, a manchete da Folha expunha a aprovação da reforma na Câmara. Apesar de ter registrado os protestos da oposição, a edição se dedicou principalmente a detalhar o esforço do governo para atrair mais apoio para a agenda econômica, o que tornou a abordagem favorável para o Planalto.
O jornal veiculou outras duas capas sobre a reforma. Uma delas, em 20 de abril e a única considerada negativa por Repórter Brasil, relatava a “manobra” da Câmara para reverter a decisão da véspera que havia rejeitado o requerimento para acelerar a tramitação do PL. “Método Eduardo Cunha” foi uma das expressões usadas pela publicação.
O espaço aberto pela Folha, 55 textos no período analisado, também foi maior do que o dos outros jornais. Já a proporção de entrevistados que apoiaram a reforma, 44%, foi próxima aos 43% do Estadão e bem menor do que os 75% de O Globo. O sociólogo Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Dieese, chama atenção para “a lógica por trás” da reforma: “reduzir estruturalmente o custo do trabalho, impedir a proteção da legislação e dos sindicatos. É uma regressão, porque, quando você precariza as relações de trabalho, você aumenta o conflito”.
Advogados ressaltaram ainda que sindicatos fracos negociando fragiliza o trabalhador. Em sua coluna, publicada dois dias depois da greve geral, a ombudsman Paula Cesarino Costa cobra uma cobertura mais analítica e profunda. Avalia que, assim como os outros jornais, a Folha não deixou claro que está em jogo a perda de direitos em nome do ajuste fiscal.
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Infelizmente, alguns jornalistas de aluguel – que adoram chamar os patrões de “companheiro” – prestaram seus serviços sujos para defender a contrarreforma trabalhista aprovada no Senado na semana passada. Eles garantiram que este golpe vai gerar mais empregos e “modernizar” as relações de trabalho. A maioria destes mercenários sabe que isto é balela, mas preferiu ser mais realista do que o rei – sabe-se lá a que preço. Aos poucos, porém, os trabalhadores – inclusive os explorados dos veículos de comunicação que ainda não têm sentimento de pertencimento à classe dos escravos do salário – vão se dar conta de que foram ludibriados. Os jornalistas sentirão na pele a tal “modernização” das relações do trabalho.
Em entrevista recente ao jornal do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais, a professora de Direito do Trabalho da UFMG, Daniela Muradas Reis, alertou que a categoria será uma das mais atingidas pelo retrocesso imposto pela quadrilha de Michel Temer, com o apoio das entidades patronais e dos barões da mídia. Segundo ela, a reforma tornará a profissão de jornalista completamente precária, com graves prejuízos para toda a sociedade, em consequência da baixa qualidade das informações. “O setor da imprensa é altamente pejotizado e afetado pelo uso de novas tecnologias. A informalidade do trabalho agora está amparada por lei e vai valer o que o mercado ditar. Num setor concentrado como esse as consequências serão muito graves”.
A professora lembrou que vários pontos da reforma já foram condenados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) por violarem acordos mundiais. “Um deles é o direito de férias”, afirmou, citando ainda a renúncia de direitos possibilitada pela prevalência do negociado sobre o legislado. A reforma muda mais de 100 artigos da CLT. “São medidas de retrocesso com impactos e desdobramentos”. Entre os aspectos da reforma que atingem diretamente os jornalistas, Daniela Muradas Reis enfatizou a precarização da jornada de trabalho e o chamado teletrabalho, que regulamenta o home office.
Reproduzo abaixo o estudo produzido pela ONG Repórter Brasil acerca da manipulação da mídia no debate sobre a ‘reforma’ trabalhista. Ela enganou muita gente, inclusive vários jornalistas que se consideram uma elite bem informada:
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Reforma trabalhista: maior parte da mídia não aborda o impacto negativo das mudanças
Por Repórter Brasil - 05/06/17
Impressos e telejornais relegam a segundo plano as perdas de direitos da CLT. A adesão do Jornal da Record ao projeto do governo chegou a 100%, enquanto a Folha foi a mais crítica
“Modernizar” uma legislação “anacrônica”, privilegiando a negociação entre patrões e empregados com o objetivo de dinamizar a economia e favorecer a retomada dos empregos. Esse foi o principal argumento da cobertura sobre a reforma trabalhista nos principais veículos do país, conforme levantamento feito pela Repórter Brasil.
O Jornal da Record foi o menos crítico à proposta apresentada pelo governo, com 100% das reportagens favoráveis. O Globo foi o segundo mais alinhado, com 88% do conteúdo suportando o que defende o Palácio do Planalto. Em seguida, aparecem o Jornal Nacional (77%) e O Estado de S.Paulo (68%). A Folha de S.Paulo (42%) destoou dos outros veículos, já que criticou a proposta em mais de metade dos seus textos.
Para chegar a essa conclusão, a Repórter Brasil analisou mais de 150 textos dos três jornais de maior projeção nacional – Folha, O Globo e Estadão – e 30 minutos de matérias dos dois principais telejornais – Jornal Nacional e Jornal da Record. Foram avaliados os cinco dias anteriores e os cinco posteriores à aprovação do relatório do deputado Rogério Marinho (PSDB-RN) na comissão especial da Câmara: de 20 a 30 de abril de 2017.
Conteúdos em que prevaleciam o detalhamento da proposta, sem a apresentação de contrapontos, ou quando o apoio era explícito foram avaliados como favoráveis e alinhados ao governo. Esse é o critério utilizado pelas maiores empresas do Brasil especializadas em análise de imagem e reputação.
Entre os veículos analisados, o Jornal da Record foi o que reverberou mais explicitamente a ideia de que as mudanças pretendidas pela gestão do presidente Michel Temer abrirão novas vagas no mercado. Reforçou essa tese usando depoimentos de estudiosos e de brasileiros anônimos demonstrando “esperança”.
Os impressos, em especial o Estadão, deram a entender que se trata de uma briga entre governo e sindicatos, que podem perder a principal fonte de financiamento caso o fim do imposto sindical seja aprovado. Entre as grandes entidades, apenas a Central Única dos Trabalhadores (CUT) não depende da contribuição obrigatória para se manter.
Matérias focadas na greve geral de 28 de abril, que apenas mencionavam a reforma trabalhista como uma das insatisfações dos manifestantes, não foram consideradas na contabilização dos números para não distorcerem os resultados. Essas reportagens foram consideradas somente na análise qualitativa.
Na cobertura específica dos protestos, todos os veículos expuseram em primeiro plano ações de vandalismo, confrontos com a polícia e os prejuízos causados à população em decorrência da paralisação dos transportes.
Como escreveu a ombudsman da Folha, Paula Cesarino Costa, todos, sem exceção, olharam para o impacto sobre a árvore, deixando de olhar para a situação da floresta. Sem críticas, as razões por trás daqueles atos.
Esta é a segunda pesquisa da Repórter Brasil sobre a cobertura que a imprensa tem feito sobre as reformas do governo Temer. Leia também o levantamento sobre a Reforma da Previdência.
Veja, abaixo, detalhes do estudo feito por Repórter Brasil.
JORNAL NACIONAL: Todas as fontes foram favoráveis à reforma
Todos os entrevistados pelo Jornal Nacional no período analisado defenderam a necessidade de “modernizar” uma legislação que consideram “anacrônica”. Três das quatro reportagens são claramente alinhadas à proposta do governo. Apenas uma, de 2min31s, pode ser considerada desfavorável ao projeto de lei já aprovado pela Câmara dos Deputados. Ela mostrava que, na opinião de “centrais sindicais”, as mudanças previstas “fragilizam direitos” dos empregados.
A reportagem mais crítica foi ao ar na noite de 28 de abril, em meio a uma extensa cobertura que privilegiou “vandalismo”, “confrontos” entre manifestantes e policiais, além dos prejuízos à população durante a greve geral em diversas cidades do País. No vídeo, o âncora William Bonner elenca os principais pontos tanto da reforma trabalhista quanto da Previdência, apresentando também os argumentos do Palácio do Planalto, mas não abre espaço para as fontes falarem diretamente aos telespectadores.
Nas três reportagens favoráveis ao projeto de lei, o JN deixa claro que houve tensão e discussões exaltadas na sessão da comissão especial da reforma trabalhista e durante a votação no plenário da Câmara, mas não explora as razões das divergências entre os parlamentares e só ouve fontes que apoiam a proposta.
Sempre com o viés de que é preciso modernizar a CLT, avançar nas relações de trabalho e que as alterações previstas não mexerão em direitos assegurados pela Constituição, como jornada semanal de 44 horas e 13º salário.
O deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), relator da reforma, teve espaço para justificar essa visão. “Nós temos uma lei de 1943. Às vezes, a gente é chamado de conservador aqui neste Parlamento. Conservador é quem não quer mudar. Então, tem gente que está apegado a uma lei de 70 anos. Uma lei anacrônica, antiga, uma lei que não tem mais nada a ver com o espírito do tempo”.
Já Cláudio Sampaio, especialista em direito trabalhista, reforça essa percepção ao destacar que “na prática”, a nova lei “vai estimular a criação de empregos formais e não vai tirar direitos”.
JORNAL DA RECORD: Desemprego cairá após a reforma
Nenhuma matéria desfavorável à reforma trabalhista e também nenhuma fonte crítica ao projeto de lei apresentado pela gestão de Michel Temer. Assim foram os 19m26s da cobertura do Jornal da Record voltado ao tema. O programa também se dedicou mais que o seu concorrente às mudanças na CLT. Foi um tempo 74,5% maior que o Jornal Nacional em oito reportagens veiculadas.
Além de reiterar a necessidade de “modernização” de uma lei que considerada antiga e desatualizada, a Record buscou reverberar que as alterações serão benéficas porque valorizam a negociação entre patrões e funcionários, trarão mais empregos e ajudarão na retomada da economia.
E que pontos garantidos pela Constituição, como FGTS e seguro-desemprego, não serão mexidos. Para isso, se apoiou em entrevistas com deputados da base do governo, representantes do setor empresarial, professores de direito e também brasileiros anônimos, que dizem acreditar que mais vagas serão abertas. Um deles relata que acertar itens como férias e horários, por exemplo, será “mais tranquilo”.
A emissora incrementa o noticiário com números do desemprego, chegando a ressaltar que “a esperança” para baixar a taxa recorde de 14,2 milhões de pessoas desocupadas no Brasil é a reforma e que várias sugestões incorporadas ao projeto de lei foram dadas pelos próprios trabalhadores. Dá a entender que a proposta é positiva para ambos os lados e que não haverá perdas. Sustentado na ideia de que a CLT “trava o crescimento do Brasil”, o Jornal da Record evidencia que as discussões na Câmara dos Deputados foram tensas e que houve embate entre situação e oposição. Mas, assim como a TV Globo, não apresenta o posicionamento de parlamentares contrários às alterações na legislação.
Outras fontes mostram posições ainda mais contundentes. José Eduardo Pastore, advogado trabalhista, avalia que o objetivo é criar empregos e trazer para a formalidade os milhões de brasileiros que estão atualmente na informalidade. A reportagem não informa, contudo, que o jurista também é consultor da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Já o deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA), da base do governo, alega que a “tutela excessiva” prevista na CLT significa cerceamento de liberdade nas relações de trabalho.
O GLOBO: Jornal mais alinhado com a proposta do governo
Apesar de estar atrás da Folha e do Estadão em quantidade de textos publicados sobre a reforma, 43 no período de 20 a 30 de abril, O Globo é o impresso mais alinhado ao projeto do governo – com 88% da abordagem favorável às mudanças propostas na CLT. Também se destaca por trazer um número maior de fontes: mais de 60% superior aos concorrentes.
Entre os entrevistados pelo jornal carioca, 75% apoiam as alterações. Enquanto na Folha e no Estadão esse índice é de 44% e 42%, respectivamente. O fio condutor de O Globo, porém, se assemelha aos demais: a necessidade de reduzir os custos do emprego para ajudar na estabilidade econômica e o País poder voltar a crescer.
O jornalista Carlos Alberto Sardenberg deixa isso explícito ao escrever que, “sem a modernização das relações trabalhistas, o Brasil continuará sendo um dos países mais caros do mundo para se investir e ganhar dinheiro honestamente. Logo, não haverá retomada consistente”. Merval Pereira faz coro, responsabilizando os governos petistas pela recessão. “O mercado de trabalho hoje, muito influenciado pela globalização, já não comporta a visão getulista de um país isolado”, diz.
O Globo publicou duas reportagens de capa sobre a reforma. Uma em 26 de abril, relatando a passagem do projeto pela comissão especial, e outra no dia seguinte, valorizando a aprovação no plenário da Câmara. Embora tenha descrito que a sessão de votação foi tensa por conta de divergências entre os parlamentares, apresenta apenas uma voz dissonante em meio a outras quatro defendendo as alterações na CLT.
O deputado federal Júlio Delgado (PSB-MG) critica a fragilidade do governo Temer ao observar que o presidente obrigou ministros a deixarem temporariamente seus cargos para retomar o mandato e engrossar o apoio à proposta.
Em contraponto, o deputado Ricardo Tripoli (PSDB-SP) apelou para a “responsabilidade”. “Esse discurso dos anti-imperialistas está superado. Sem capital, não se gera emprego”, declarou. A percepção que o impresso transmite é de que os grupos contrários à flexibilização da lei defendem, na verdade, “a manutenção de vantagens de sindicatos”, conforme descreve no editorial de 29 de abril, um dia depois da greve geral.
O ESTADO DE S.PAULO: Críticas aos sindicatos alimentam cobertura
Com 68% dos textos publicados favoráveis à reforma trabalhista, incluindo duas capas, o Estadão fica em 4º lugar em alinhamento com a proposta do governo. Perde para Jornal da Record (100%), O Globo (88%) e Jornal Nacional (77%). Só está à frente da Folha (42%).
O que levou o veículo à penúltima colocação, contudo, não foi uma abordagem crítica ao projeto de Temer, mas uma cobertura que privilegiou as divergências entre os partidos, especialmente a “rebeldia” do PSB, e as expectativas quanto à repercussão da greve geral nas votações do Congresso. Ao longo dos 11 dias analisados, o Estadão reverberou que a legislação precisa ser modernizada para que o Brasil volte a crescer e gerar empregos, com colunistas e articulistas afinados.
“Goste ou não o PT, a reforma trabalhista é vital para recuperar a economia e os empregos”, escreve o ex-ministro e ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho Almir Pazzianotto Pinto. “Manter o engessamento das relações de trabalho com leis e regulamentações dos anos 40 é condenar o País à asfixia”, argumenta o jornalista Celso Ming.
Já Hélio Zylberstajn, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, questiona a “gritaria” de quem se opõe às mudanças. Em análise publicada em 27 de abril, logo depois da aprovação em plenário, ele afirma que leu e releu tanto o projeto de lei quanto a emenda elaborada pela comissão especial da Câmara e não encontrou nenhum artigo que elimina direitos dos trabalhadores.
Em boa parte da cobertura sobre o assunto nesta mesma edição, o Estadão abordou o impacto do PL sobre os sindicatos, reforçando o viés de que a paralisação programada para o dia seguinte teria como pano de fundo a luta dessas instituições para que o imposto sindical continuasse obrigatório. Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT) e do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, sustenta que o fim da contribuição é para “sufocar o movimento”.
Uma semana antes, a publicação havia trazido reportagem com declaração do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, destacada no título: “Sindicatos não querem perder a boquinha”. Das fontes entrevistadas pelo jornal, 57% questionaram a reforma. Mas as críticas ficaram concentradas em uma pequena parte dos 17 textos negativos, ante 36 positivos veiculados no período.
FOLHA DE S.PAULO: Colunistas e expectativas de greve levam à baixa adesão
Se o Jornal da Record se mostrou 100% alinhado à proposta do governo, a Folha foi a mais crítica: apenas 42% da cobertura pró-reforma trabalhista. Colunistas como Vladimir Safatle, Janio de Freitas e André Singer, assim como reportagens centradas nas expectativas quanto ao impacto da greve geral e nas divergências entre os partidos sobre a repercussão do PL para os trabalhadores, ajudaram a segurar o veículo na 5ª colocação.
A economista Laura Carvalho, por exemplo, que escreve às quintas-feiras, publicou na véspera da paralisação que a proliferação de estudos indicando que a desregulamentação do mercado não eleva, ou até prejudica, o nível de emprego parece ter levado alguns organismos multilaterais que pregavam maior flexibilidade a mudarem de posição. No mesmo dia, porém, a manchete da Folha expunha a aprovação da reforma na Câmara. Apesar de ter registrado os protestos da oposição, a edição se dedicou principalmente a detalhar o esforço do governo para atrair mais apoio para a agenda econômica, o que tornou a abordagem favorável para o Planalto.
O jornal veiculou outras duas capas sobre a reforma. Uma delas, em 20 de abril e a única considerada negativa por Repórter Brasil, relatava a “manobra” da Câmara para reverter a decisão da véspera que havia rejeitado o requerimento para acelerar a tramitação do PL. “Método Eduardo Cunha” foi uma das expressões usadas pela publicação.
O espaço aberto pela Folha, 55 textos no período analisado, também foi maior do que o dos outros jornais. Já a proporção de entrevistados que apoiaram a reforma, 44%, foi próxima aos 43% do Estadão e bem menor do que os 75% de O Globo. O sociólogo Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Dieese, chama atenção para “a lógica por trás” da reforma: “reduzir estruturalmente o custo do trabalho, impedir a proteção da legislação e dos sindicatos. É uma regressão, porque, quando você precariza as relações de trabalho, você aumenta o conflito”.
Advogados ressaltaram ainda que sindicatos fracos negociando fragiliza o trabalhador. Em sua coluna, publicada dois dias depois da greve geral, a ombudsman Paula Cesarino Costa cobra uma cobertura mais analítica e profunda. Avalia que, assim como os outros jornais, a Folha não deixou claro que está em jogo a perda de direitos em nome do ajuste fiscal.
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