sábado, 3 de novembro de 2018

Sergio Moro e a falsa ingenuidade

Por Céli Pinto, no site Sul-21:

Enquanto parte expressiva da imprensa internacional noticiou a ida de Sergio Moro para o Ministério da Justiça com espanto e desconfiança (Le Monde; Guardian; Clarín; Times), os órgãos da grande mídia brasileira encontraram no juiz paranaense a razão que precisavam para cair nos braços de Bolsonaro. O paladino da justiça, o grande balizador do bem e do mal está no governo. Agora, o eleito que prometeu matar inimigos e deixar apodrecer outros na cadeia, tornou-se um político ponderado e com escolhas corretas.

É evidente que os jornalistas das grandes redes de TV e jornais sabem tão bem quanto a imprensa internacional que a história não é bem essa. A aprovação entusiasmada da ascensão do juiz encobre um puro adesismo de primeira hora.

Sergio Moro está muito longe de ser um juiz dotado de imparcialidade e objetividade, alardeadas pela mídia. Antes de tudo porque se deixou inebriar por uma popularidade repentina, abrindo mão da descrição e parcimônia que se espera de um magistrado. Bem, poderia ser argumentado que os comportamentos dos membros do Poder Judiciário e do Ministério Público no Brasil não primam pela discrição. Isto é verdade, mas não justifica nem as atitudes do juiz-ministro nem e as de nenhum dos membros do Judiciário os do Ministério Público.

A vaidade e as caras e bocas de ator de blockbuster não são o maior problema do juiz curitibano. Há uma série de ações bem mais contundentes: 1. A escuta ilegal de telefonemas da presidenta da república Dilma Rousseff; 2. A avalanche de prisões e troca da liberdade ou a diminuição da pena por delação às vezes suspeitas. (atitude, a bem da verdade, não só do juiz em pauta); 3. A condenação do ex-presidente Lula em sentença que admite não ter provas; 4. A intervenção, estando em férias e sendo apenas um juiz de primeira instância, para impedir que fosse cumprido o habeas corpus em favor de Lula, impetrado por desembargador; 5. Liberação para a imprensa de delação premiada de Antônio Palocci, poucos dias antes da eleições em primeiro turno, quando – segundo o vice presidente da republica eleito, Gal Mourão – o juiz já havia sido sondado para o cargo no governo de Bolsonaro, o que dá razões para lhe imputar a intenção de intervir no processo eleitoral. A lista é constrangedora, mas mais constrangedor é que ela não conta para frear o adesismo galopante.

Frente a esta biografia, o centrão e os mais de 20 partidos de direita, a maioria com um deputado na Câmara de Deputados, fundados com propósitos puramente fisiológicos, devem estar festejando. O que estará pensando Eduardo Cunha na prisão? Ou alguém tem a ilusão de que a velha raposa está completamente isolada do que está se passando na política nacional? Temer e seus ministros que não conseguiram se reeleger também devem estar dormindo bem mais tranquilos.

Sergio Moro no Ministério da Justiça é o coroamento do golpe. Lula na cadeia, seu algoz premiado e os meliantes de sempre protegidos. Ou alguém acredita que o juiz ganhou um Ministério e uma promessa de posição futura no Supremo Tribunal Federal apenas porque a extrema direita agora no poder, está preocupada em acabar a corrupção? Mas os falsos ingênuos continuarão repetindo frases de efeito para justificarem o adesismo e para manter, por mais algum tempo, o entusiasmo dos eleitores bolsonarinos, estes sim, em grande medida, ingênuos.

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