Por Andre Araujo, no site Vermelho:
O ciclo de cinco anos do início da Lava Jato permite uma avaliação preliminar dos efeitos da operação na macroeconomia e no ambiente de negócios do Brasil. Essa observação no momento é possível a olho nu, sem precisão acadêmica e é o que faremos neste post, sujeito a contestações igualmente empíricas.
A empresa Mendes Junior chegou a ser, em certa época, a mais importante empresa privada operando no Iraque. O prestígio do seu presidente, Murilo Mendes, era tal que nos jantares oficiais se sentava ao lado do presidente Saddam Hussein, testemunhado por este articulista.
As empreiteiras brasileiras se expandiram pela África, na Mauritânia (Mendes Júnior), Angola e Moçambique (Odebrecht), na América Latina, República Dominicana, Panamá, México, Peru, Colômbia (Odebrecht) Argentina (Camargo), Venezuela (Camargo e Odebrecht), Estados Unidos (Odebrecht). Nesses mercados externos, a concorrência se dava e se dá com empreiteiras de outros países emergentes, especialmente turcas, malaias, chinesas, indianas, tailandesas, famosas operadoras de corrupção e jogo pesado nesses mercados.
O Brasil sempre teve excelente reputação técnica e um fator especial de inserção nesses países complicados: a facilidade de relacionamento social com as populações e autoridades, algo que empreiteiras asiáticas definitivamente NÃO têm. Enquanto operários asiáticos se fecham em canteiros como guetos de hábitos e comportamento, os operários e capatazes brasileiros confraternizam facilmente com as populações locais, angariando simpatia e admiração – é a cultura multiétnica brasileira tipo exportação.
Todo um imenso trabalho político, diplomático e empresarial de expansão das empreiteiras brasileiras no Exterior foi derrubado e anulado pela Lava Jato, ao transladar para o Exterior a cruzada punitivista. As batalhas contra empreiteiras liquidaram com o capital político brasileiro nesses mercados, onde dificilmente poderão reingressar, abrindo caminho para empreiteiras concorrentes cujos governos jamais iriam denunciar políticos desses países por corrupção, uma autoflagelação absurda praticada pelo Estado brasileiro – denunciar firmas brasileiras, ferindo seus interesses nesses mercados.
O capital técnico nas empreiteiras
O maior ativo de uma grande construtora de obras públicas é seu currículo de projetos realizados. É um ativo imaterial, que não está no balanço – mas é o maior capital de uma empreiteira, não só sob o aspecto de certificação mas também porque significa uma experiência acumulada que vale para realização de novos projetos. Tudo isso se perde em uma campanha de desmoralização que faz executivos encerrarem suas carreiras em desgraça, engenheiros serem demitidos, departamentos serem dissolvidos. A perda desse imenso capital técnico das grandes empreiteiras brasileiras tem um valor infinitamente maior que eventuais problemas jurídicos que em que tenham incorrido. O Brasil não vai purificar o mundo, vai ser o único santo no altar das empreiteiras.
É fundamental lembrar a história das grandes obras públicas brasileiras realizadas entre 1950 e 1990. Foram 147 usinas hidroelétricas de médio e grande porte, 13 refinarias de petróleo, dez aeroportos internacionais, dois megaportos, 58 mil quilômetros de linhas de transmissão de energia, 30 mil quilômetros de gasodutos e oleodutos, seis metrôs, centenas de pontes, túneis e viadutos inclusive pontes das maiores do mundo como a Rio-Niterói, rodovias de montanha como a Imigrantes e a Anchieta. O Brasil, nesses 40 anos, foi um canteiro de obras dos maiores do mundo.
O Acordo Judicial Brasil-EUA de 2001 jamais foi pensado para submeter estatais brasileiras à jurisdição do Departamento de Justiça dos EUA por delitos que não foram cometidos nos Estados Unidos. A Petrobras, entre as 13 grandes estatais de petróleo que estão no ranking das 20 maiores companhias do setor no Planeta, foi a única ser submetida a processo pelo Departamento de Justiça, de forma inteiramente irregular e que só foi possível porque procuradores brasileiros levaram o caso ao Departamento de Justiça para que este processasse a Petrobras, algo absurdo, insólito e contra os interesses do Brasil.
Pelo Acordo, qualquer dos Estados contratantes pode invocar “interesse nacional” em qualquer questão e com isso retirar o caso do âmbito do Acordo. O Brasil tinha esse “waiver” (escape) e não o utilizou por desídia e espírito de submissão voluntária. Pelo referido Acordo, a “autoridade central” no Brasil, quer dizer, o operador do Acordo, é o ministro da Justiça que em nenhum momento invocou essa ou qualquer outra cláusula para tirar a Petrobras da jurisdição do Departamento de Justiça, o que poderia perfeitamente fazer, já que é um direito previsto no Acordo. Nem sequer a Embaixada em Washington agiu politicamente para defender a Petrobras.
Com a petroleira estatal angolana Sonangol, fortunas bilionárias foram cavadas, como a de Isabel dos Santos, filha do então presidente José Eduardo dos Santos, a mulher mais rica da África, segundo a revista Forbes. No mesmo momento em que a Petrobras era punida, a americana Exxon assinava um acordo com a Sonangol para explorar o pré-sal angolano, acordo esse que teve a completa aprovação do governo dos Estados Unidos, que não viu nenhum problema na Sonangol, fábrica de bilionários ministros angolanos. Um país importante como o Brasil, da mesma forma que Rússia, China e Índia, jamais poderia aceitar ser processado de forma vil por outro governo.
Bloqueios, multas, indenizações ao infinito
No ambiente punitivista da operação Lava Jato, criou-se a noção de que empresas têm tesouros ilimitados ou submersos em suas contabilidades, algo demonstrado em fixação de empenhos e constrangimentos econômicos carentes de qualquer razoabilidade e emitidos por diferentes órgãos e instâncias simultaneamente, o que inviabiliza não só a sobrevivência de qualquer empresa e, pior ainda, a impede de operar e pagar as multas no futuro.
Esse mecanismo não se opera só na Lava Jato; generalizou-se nos últimos tempos. Se presume que alguém ou uma empresa causou um dano potencial de 100 milhões; emite-se um bloqueio de 200 milhões sem se indagar se tal ação tem correspondência no mundo real. A ideia não é o ressarcimento possível do dano, é punir por punir, como castigo. A ilogicidade cobra seu preço na liquidação da capacidade operacional da empresa. Perdem todos – só ganham os jornais que estampam manchetes espetaculares de punições no céu e que jamais vão gerar algum benefício ao País.
Um clima policial de caça às bruxas com escracho de reputação na mídia tem um efeito indireto na contaminação geral do ambiente de negócios. Em um Pais com um sistema burocrático absurdamente detalhista e que procura prever, regular e punir empresas por microinfringência de formalidades muitas vezes pouco claras ou contraditórias, qualquer empresário tem fundados receios de empreender novos negócios.
O risco está presente por associação para qualquer empresário, mesmo o mais correto. No mundo real dos negócios se esbarra a todo instante com situações complicadas, com parceiros que podem ter riscos subjacentes e desconhecidos, com contextos não mapeados especialmente em novos negócios. Se um Estado policial se instala, com ruína de reputações e crédito usados como forma operacional de ações policiais, o empresário pensa dez vezes em se aventurar em um investimento, em uma joint venture, em uma parceria ou associação.
Ninguém pode prever tudo. Bancos de excelente reputação fizeram negócios com Eike Batista, que era até certo momento um empresário de sucesso e até glorificado, depois revelou-se problemático e todos que negociaram com ele tiveram contaminação de problemas. Um Estado policial agressivo e onipresente desestimula um ambiente de negócios onde sempre há riscos. Basta imaginar que, se houvesse uma Lava Jato em 1956, Brasília provavelmente não teria sido construída, nem a Usina de Itaipu existiria hoje, assim como a maior parte das grandes obras de infraestrutura erguidas ente 1950 e 1990. Em quase todas houve irregularidades, especialmente em Brasília.
Aventura e vento a favor
O Brasil só cresceu em tempos de vento a favor em todos os sentidos. Em tempos punitivista, jamais cresceria. Em todo ciclo de crescimento é preciso fazer um balanço de custos e benefícios – remédios que curam a doença e matam o doente podem ser maravilhosos como experiência científica, mas o resultado final é desastroso, porque os benefícios ao fim do dia são nulos ou negativos. Operações punitivas devem ser avaliadas pelo balanço final de lucros e perdas em uma visão macro, de Estado e de Pais e não somente como estatística burocrática dentro da própria operação, que não pode ser um fim em si mesma.
Na França, pais de longa experiência geopolítica, qualquer operação policial ou investigativa que envolva um país estrangeiro só pode ser desencadeada com autorização do presidente da República. Na base dessa lógica está a proteção dos interesses maiores do Estado francês, que pode ser prejudicado por uma operação desse tipo.
A operação investigativa brasileira atingiu frontalmente políticos de quase todos os países da América Latina, resultando em suicídio, prisão e desgraça para políticos de fortes biografias. Qual o peso desse dano causado pelo Brasil em futuros relacionamentos com esses países que são importantes para a economia brasileira? O Brasil parece não se dar conta de balanços geopolíticos de longo prazo.
Na expansão e prosperidade dos países ricos estão empresas emblemáticas. Na Inglaterra, companhias ferroviárias se espalharam pelo mundo inteiro. Nos EUA, a Standard Oil já era gigante em 1900, estava firmemente implantada na China para vender querosene de lamparinas antes do automóvel e do avião. Essas empresas portavam a bandeira de seus Estados e contribuíram para a prosperidade de seus países-sede.
O Brasil tinha nas suas empreiteiras e nos marqueteiros políticos plataformas de exportação e de influência, as duas liquidadas pela Lava Jato, levando junto dois negócios especializados de projeção do Brasil, operando como pontas de lança brasileiras em territórios de projeção do País. O que ganhou o Brasil com a destruição desses negócios?
Um balanço geral
Não é preciso muita percepção do mundo real dos interesses geopolíticos para ver o papel do Brasil nesse contexto de moralismo como política de Estado. O Império Britânico, assim como os demais impérios de expansão, como o francês e o norte-americano, se construíram com ações de “realpolitik” isentas de moralismo.
A Inglaterra conquistou o mundo a seu tempo com piratas que saqueavam munidos de “cartas de corso” assinada pelo rei, sócio da pirataria. Depois conquistou a Índia e a China com guerras de ópio, roubo de mudas de seringueira (a vítima foi o Brasil), todo tipo de aventureirismos e saques para construir seu império.
Já os EUA tomaram Porto Rico e Filipinas com base numa guerra de pretexto falso e fabricado (Guerra Hispano-Americana de 1898), ganharam de papel passado duas grandes colônias e ainda de brinde enorme influência sobre a ilha de Cuba, uma quase colônia até 1960. Depois invadiram o Iraque com base em armas químicas que nunca existiram.
Agora, o Brasil vai ser o moralista do mundo das empreiteiras? Onde está o Estado brasileiro que não zela por seus interesses e joga fora seu capital internacional em cruzadas moralistas para “salvar o mundo”? Ganhamos o quê com isso?
O ciclo de cinco anos do início da Lava Jato permite uma avaliação preliminar dos efeitos da operação na macroeconomia e no ambiente de negócios do Brasil. Essa observação no momento é possível a olho nu, sem precisão acadêmica e é o que faremos neste post, sujeito a contestações igualmente empíricas.
A cruzada anticorrupção levou à recuperação judicial nove das 15 maiores empreiteiras do Brasil. O desmonte do setor foi praticamente completo. Mesmo empresas que não entraram em recuperação, como a Camargo Correia, saíram do setor de obras públicas, área em que o Brasil era um dos maiores competidores mundiais, com grande expansão internacional desde os anos 70, por apoio do então governo militar de 1964.
A empresa Mendes Junior chegou a ser, em certa época, a mais importante empresa privada operando no Iraque. O prestígio do seu presidente, Murilo Mendes, era tal que nos jantares oficiais se sentava ao lado do presidente Saddam Hussein, testemunhado por este articulista.
As empreiteiras brasileiras se expandiram pela África, na Mauritânia (Mendes Júnior), Angola e Moçambique (Odebrecht), na América Latina, República Dominicana, Panamá, México, Peru, Colômbia (Odebrecht) Argentina (Camargo), Venezuela (Camargo e Odebrecht), Estados Unidos (Odebrecht). Nesses mercados externos, a concorrência se dava e se dá com empreiteiras de outros países emergentes, especialmente turcas, malaias, chinesas, indianas, tailandesas, famosas operadoras de corrupção e jogo pesado nesses mercados.
O Brasil sempre teve excelente reputação técnica e um fator especial de inserção nesses países complicados: a facilidade de relacionamento social com as populações e autoridades, algo que empreiteiras asiáticas definitivamente NÃO têm. Enquanto operários asiáticos se fecham em canteiros como guetos de hábitos e comportamento, os operários e capatazes brasileiros confraternizam facilmente com as populações locais, angariando simpatia e admiração – é a cultura multiétnica brasileira tipo exportação.
Todo um imenso trabalho político, diplomático e empresarial de expansão das empreiteiras brasileiras no Exterior foi derrubado e anulado pela Lava Jato, ao transladar para o Exterior a cruzada punitivista. As batalhas contra empreiteiras liquidaram com o capital político brasileiro nesses mercados, onde dificilmente poderão reingressar, abrindo caminho para empreiteiras concorrentes cujos governos jamais iriam denunciar políticos desses países por corrupção, uma autoflagelação absurda praticada pelo Estado brasileiro – denunciar firmas brasileiras, ferindo seus interesses nesses mercados.
O capital técnico nas empreiteiras
O maior ativo de uma grande construtora de obras públicas é seu currículo de projetos realizados. É um ativo imaterial, que não está no balanço – mas é o maior capital de uma empreiteira, não só sob o aspecto de certificação mas também porque significa uma experiência acumulada que vale para realização de novos projetos. Tudo isso se perde em uma campanha de desmoralização que faz executivos encerrarem suas carreiras em desgraça, engenheiros serem demitidos, departamentos serem dissolvidos. A perda desse imenso capital técnico das grandes empreiteiras brasileiras tem um valor infinitamente maior que eventuais problemas jurídicos que em que tenham incorrido. O Brasil não vai purificar o mundo, vai ser o único santo no altar das empreiteiras.
É fundamental lembrar a história das grandes obras públicas brasileiras realizadas entre 1950 e 1990. Foram 147 usinas hidroelétricas de médio e grande porte, 13 refinarias de petróleo, dez aeroportos internacionais, dois megaportos, 58 mil quilômetros de linhas de transmissão de energia, 30 mil quilômetros de gasodutos e oleodutos, seis metrôs, centenas de pontes, túneis e viadutos inclusive pontes das maiores do mundo como a Rio-Niterói, rodovias de montanha como a Imigrantes e a Anchieta. O Brasil, nesses 40 anos, foi um canteiro de obras dos maiores do mundo.
O Acordo Judicial Brasil-EUA de 2001 jamais foi pensado para submeter estatais brasileiras à jurisdição do Departamento de Justiça dos EUA por delitos que não foram cometidos nos Estados Unidos. A Petrobras, entre as 13 grandes estatais de petróleo que estão no ranking das 20 maiores companhias do setor no Planeta, foi a única ser submetida a processo pelo Departamento de Justiça, de forma inteiramente irregular e que só foi possível porque procuradores brasileiros levaram o caso ao Departamento de Justiça para que este processasse a Petrobras, algo absurdo, insólito e contra os interesses do Brasil.
Pelo Acordo, qualquer dos Estados contratantes pode invocar “interesse nacional” em qualquer questão e com isso retirar o caso do âmbito do Acordo. O Brasil tinha esse “waiver” (escape) e não o utilizou por desídia e espírito de submissão voluntária. Pelo referido Acordo, a “autoridade central” no Brasil, quer dizer, o operador do Acordo, é o ministro da Justiça que em nenhum momento invocou essa ou qualquer outra cláusula para tirar a Petrobras da jurisdição do Departamento de Justiça, o que poderia perfeitamente fazer, já que é um direito previsto no Acordo. Nem sequer a Embaixada em Washington agiu politicamente para defender a Petrobras.
Com a petroleira estatal angolana Sonangol, fortunas bilionárias foram cavadas, como a de Isabel dos Santos, filha do então presidente José Eduardo dos Santos, a mulher mais rica da África, segundo a revista Forbes. No mesmo momento em que a Petrobras era punida, a americana Exxon assinava um acordo com a Sonangol para explorar o pré-sal angolano, acordo esse que teve a completa aprovação do governo dos Estados Unidos, que não viu nenhum problema na Sonangol, fábrica de bilionários ministros angolanos. Um país importante como o Brasil, da mesma forma que Rússia, China e Índia, jamais poderia aceitar ser processado de forma vil por outro governo.
Bloqueios, multas, indenizações ao infinito
No ambiente punitivista da operação Lava Jato, criou-se a noção de que empresas têm tesouros ilimitados ou submersos em suas contabilidades, algo demonstrado em fixação de empenhos e constrangimentos econômicos carentes de qualquer razoabilidade e emitidos por diferentes órgãos e instâncias simultaneamente, o que inviabiliza não só a sobrevivência de qualquer empresa e, pior ainda, a impede de operar e pagar as multas no futuro.
Esse mecanismo não se opera só na Lava Jato; generalizou-se nos últimos tempos. Se presume que alguém ou uma empresa causou um dano potencial de 100 milhões; emite-se um bloqueio de 200 milhões sem se indagar se tal ação tem correspondência no mundo real. A ideia não é o ressarcimento possível do dano, é punir por punir, como castigo. A ilogicidade cobra seu preço na liquidação da capacidade operacional da empresa. Perdem todos – só ganham os jornais que estampam manchetes espetaculares de punições no céu e que jamais vão gerar algum benefício ao País.
Um clima policial de caça às bruxas com escracho de reputação na mídia tem um efeito indireto na contaminação geral do ambiente de negócios. Em um Pais com um sistema burocrático absurdamente detalhista e que procura prever, regular e punir empresas por microinfringência de formalidades muitas vezes pouco claras ou contraditórias, qualquer empresário tem fundados receios de empreender novos negócios.
O risco está presente por associação para qualquer empresário, mesmo o mais correto. No mundo real dos negócios se esbarra a todo instante com situações complicadas, com parceiros que podem ter riscos subjacentes e desconhecidos, com contextos não mapeados especialmente em novos negócios. Se um Estado policial se instala, com ruína de reputações e crédito usados como forma operacional de ações policiais, o empresário pensa dez vezes em se aventurar em um investimento, em uma joint venture, em uma parceria ou associação.
Ninguém pode prever tudo. Bancos de excelente reputação fizeram negócios com Eike Batista, que era até certo momento um empresário de sucesso e até glorificado, depois revelou-se problemático e todos que negociaram com ele tiveram contaminação de problemas. Um Estado policial agressivo e onipresente desestimula um ambiente de negócios onde sempre há riscos. Basta imaginar que, se houvesse uma Lava Jato em 1956, Brasília provavelmente não teria sido construída, nem a Usina de Itaipu existiria hoje, assim como a maior parte das grandes obras de infraestrutura erguidas ente 1950 e 1990. Em quase todas houve irregularidades, especialmente em Brasília.
Aventura e vento a favor
O Brasil só cresceu em tempos de vento a favor em todos os sentidos. Em tempos punitivista, jamais cresceria. Em todo ciclo de crescimento é preciso fazer um balanço de custos e benefícios – remédios que curam a doença e matam o doente podem ser maravilhosos como experiência científica, mas o resultado final é desastroso, porque os benefícios ao fim do dia são nulos ou negativos. Operações punitivas devem ser avaliadas pelo balanço final de lucros e perdas em uma visão macro, de Estado e de Pais e não somente como estatística burocrática dentro da própria operação, que não pode ser um fim em si mesma.
Na França, pais de longa experiência geopolítica, qualquer operação policial ou investigativa que envolva um país estrangeiro só pode ser desencadeada com autorização do presidente da República. Na base dessa lógica está a proteção dos interesses maiores do Estado francês, que pode ser prejudicado por uma operação desse tipo.
A operação investigativa brasileira atingiu frontalmente políticos de quase todos os países da América Latina, resultando em suicídio, prisão e desgraça para políticos de fortes biografias. Qual o peso desse dano causado pelo Brasil em futuros relacionamentos com esses países que são importantes para a economia brasileira? O Brasil parece não se dar conta de balanços geopolíticos de longo prazo.
Na expansão e prosperidade dos países ricos estão empresas emblemáticas. Na Inglaterra, companhias ferroviárias se espalharam pelo mundo inteiro. Nos EUA, a Standard Oil já era gigante em 1900, estava firmemente implantada na China para vender querosene de lamparinas antes do automóvel e do avião. Essas empresas portavam a bandeira de seus Estados e contribuíram para a prosperidade de seus países-sede.
O Brasil tinha nas suas empreiteiras e nos marqueteiros políticos plataformas de exportação e de influência, as duas liquidadas pela Lava Jato, levando junto dois negócios especializados de projeção do Brasil, operando como pontas de lança brasileiras em territórios de projeção do País. O que ganhou o Brasil com a destruição desses negócios?
Um balanço geral
Não é preciso muita percepção do mundo real dos interesses geopolíticos para ver o papel do Brasil nesse contexto de moralismo como política de Estado. O Império Britânico, assim como os demais impérios de expansão, como o francês e o norte-americano, se construíram com ações de “realpolitik” isentas de moralismo.
A Inglaterra conquistou o mundo a seu tempo com piratas que saqueavam munidos de “cartas de corso” assinada pelo rei, sócio da pirataria. Depois conquistou a Índia e a China com guerras de ópio, roubo de mudas de seringueira (a vítima foi o Brasil), todo tipo de aventureirismos e saques para construir seu império.
Já os EUA tomaram Porto Rico e Filipinas com base numa guerra de pretexto falso e fabricado (Guerra Hispano-Americana de 1898), ganharam de papel passado duas grandes colônias e ainda de brinde enorme influência sobre a ilha de Cuba, uma quase colônia até 1960. Depois invadiram o Iraque com base em armas químicas que nunca existiram.
Agora, o Brasil vai ser o moralista do mundo das empreiteiras? Onde está o Estado brasileiro que não zela por seus interesses e joga fora seu capital internacional em cruzadas moralistas para “salvar o mundo”? Ganhamos o quê com isso?
1 comentários:
Nada. Perdemos um montão!
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