sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Um gibi em defesa da banda larga

Reproduzo matéria publicada no sítio do Barão de Itararé:

“Eu também quero internet com banda larga!” Este é o título do gibi que o Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé está lançando com o objetivo de ampliar o debate e a mobilização para garantir o direito ao acesso à internet de alta velocidade.

A luta pela banda larga para todos faz parte da luta pela democratização dos meios da comunicação. O gibi procura mostrar que o direito à comunicação e, portanto o direito à banda larga depende da ação direta do Estado na garantia dessa oferta através de políticas públicas de inclusão digital, fomento econômico e regulamentação do mercado.

Apresenta, como a principal iniciativa em curso nesse campo, o Plano Nacional de Banda Larga – PNBL, que define metas e responsabilidades para massificar a internet no Brasil até 2014. Tudo isso numa linguagem leve e acessível para todos os públicos.

“A ideia de fazer um gibi partiu da necessidade de transformar um debate técnico — cheio de termos complicados, como infraestrutura de backhaul e backbone — em uma discussão acessível. Muitas vezes, as discussões sobre comunicação ficam restritas a círculos de especialistas em razão dos aspectos técnicos. Mas a discussão sobre o acesso à banda larga e o direito à comunicação é, antes de tudo, um debate político que interessa e atinge a todos”, diz Renata Mielli, secretária-geral do Centro de Estudos Barão de Itararé e responsável pela elaboração do gibi.

O gibi já está disponível e será distribuído inicialmente em escolas e universidades. Sua produção foi uma parceria entre o Barão de Itararé e entidades do movimento sindical – Sindicato dos Bancários de São Paulo, Federação Única dos Petroleiros (FUP), Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) e Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Sindicato dos Engenheiros do Estado de São Paulo e Associação Nacional para Inclusão Digital (Anid).

Para saber mais ou adquirir o gibi, entre em contato através do site www.baraodeitarare.org.br ou do e-mail contato@baraodeitarare.org.br ou com Danielle Penha no telefone (11) 30541829.

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O deserto jornalístico de Ali Kamel

Reproduzo artigo de Luiz Carlos Azenha, publicado no blog Viomundo:

Gastei meia hora de meu precioso tempo noturno, ontem, para testemunhar ao vivo o Jornal Nacional.

Teve a leveza e a graça de uma autópsia.

O Jornal Nacional faz de conta que não estamos às vésperas de uma eleição histórica. Para o JN, o Brasil é um grande cenário, onde as estrelas da Globo são os protagonistas. Elas cortam os céus a jato, se protegem da chuva na cabine e usam o povo como coadjuvante para suas grandes descobertas: potiguar, sei agora, é comedor de camarão.

Higienicamente separados da cobertura política por um bloco inteiro de notícias, os artistas da Globo preocupados com a eleição não se misturam com a política partidária, que isso é coisa de bandido.

O bloco de cobertura de eleições é o bloco policial do JN.

A polícia paulista mostra serviço apurando a quebra de sigilo fiscal, que é o centro da cobertura “política” da Globo. Em seguida, os candidatos são usados como meros coadjuvantes para fazer jogo-de-cena no roteiro de Ali Kamel.

Falam José Serra e Marina Silva, martelando tudo o que já disseram dezenas de vezes ao longo dos últimos dias. Por último, Plínio de Arruda Sampaio dá seu recado de alguns segundos. É a “democracia”, versão JN.

Essa paródia jornalística nos é apresentada como “jornalismo imparcial”.

Com o cuidado de omitir toda e qualquer informação que possa jogar alguma luz sobre o momento. Ontem foi um dia especialmente farto em números da economia: as vendas de cimento cresceram 14,6% de janeiro a agosto; as vendas de material de construção devem crescer 11% em 2010; “Um milhão de brasileiros deixam a pobreza mesmo com a crise”, diz a FGV; Caixa Econômica Federal vai emprestar 70 bilhões em 2010 para a habitação, diz o G1. E por aí vai.

Mas, presumivelmente para não ajudar a candidata do governo, o JN simplesmente suspendeu as “notícias boas” — como, aliás, já fez em 2006 (Marco Aurélio Mello, então editor de Economia do JN na praça econômica mais importante do Brasil, recebeu ordens do Rio de Janeiro para “tirar o pé”).

Ou seja, se de fato Dilma Rousseff vencer pela margem que se imagina que vá vencer, em primeiro turno, o público cativo do JN certamente será pego de surpresa.

Seria exagero imaginar que Ali Kamel criou esse deserto jornalístico noturno apenas para ver brilhar a flor da indignação ensaiada de José Serra.

Hoje, ainda sem falar uma palavra, o neto da Dilma roubou a cena. Foi a “notícia política” da noite.

Além de conhecê-lo, nessa meia hora fiquei sabendo que o Ernesto Paglia gosta de comer camarões, que o sorteio do destino do jatinho é “honesto” e que a proposta do Serra… qual é mesmo a proposta do Serra?

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O oportunismo eleitoreiro de Serra

Reproduzo matéria do sítio Carta Maior:

Uma matéria feita pelo SBT Brasil revelou que o assunto de quebra de sigilos por uma máfia que atua em São Paulo já era conhecido pelo candidato tucano José Serra desde, pelo menos, outubro de 2009. Na matéria, o próprio Serra comenta a devassa de sua declaração e de sua mulher com total calma e naturalidade, sem dizer que foi o PT, ou que é por motivos eleitorais. Apesar disso, a campanha de Serra insiste em usar o tema da quebra de sigilo contra a candidatura de Dilma Rousseff. Sem sucesso até aqui.

Nesta quinta-feira, o blog do Nassif publicou uma análise de João Francisco Meira, do Vox Populi, sobre o tracking do IG-Bandeirantes: segundo esse levantamento diário, o tema da quebra do sigilo, abraçado por Serra, não está provocando nenhuma mudança na intenção de voto dos eleitores. Nassif escreve:

Não existe nenhuma oscilação significativa, diz ele. Dada a natureza do tracking, tem que se acompanhar a curva dos candidatos, não os resultados diários. E a curva não mostra nenhuma alteração significativa após o caso do tal dossiê. Metade da população ficou sabendo do assunto, diz ele. Dessa metade, os eleitores da Dilma tendem a acreditar nela, os do Serra, nele, e os indecisos tendem a acreditar mais na Dilma que no Serra.

Ele não entende o fuzuê em torno da quebra de sigilo. «Vocês, jornalistas, estão carecas de saber que sigilo fiscal no Brasil é uma peneira», diz ele. Em qualquer loja que se vá, na compra de um carro, de um eletrodoméstico, o gerente pede um instante para consultar o crédito. Liga para um sujeito denominado de analista de crédito que tem todas as informações do candidato ao financiamento, do Imposto de Renda ao Serasa. Basta uma olhada no Google para encontrar centenas de traficantes de informações sigilosas, diz ele.

Ligar esse tema à campanha é forçar a barra.


17 milhões de sigilos quebrados nos anos FHC

No site Brasilwiki, João Paulo Marat mostra como, durante o governo FHC, cerca de 17 milhões de brasileiros tiveram seu sigilo quebrado, inclusive o fiscal. Marat indica matérias e documentos da Câmara Federal sobre o assunto. Ele escreve:

A ação da quadrilha que quebra sigilos fiscais não é desta eleição, nem de ontem, nem deste ano. É uma praga que atinge o Brasil há muito, e não é uma "estratégia" da campanha de Dilma Roussef, como tanto gostariam os integrantes do PSDB e do DEM. Documentos provam que, ainda em 2009, um requerimento expedido por Arnaldo Faria de Sá ao presidente da CPI destinada a apurar a Violência Urbana pedia uma audiência pública para apurar que dados fiscais sigilosos estavam sendo vendidos por camelôs de São Paulo - em 2009. Entre os que tiveram seus sigilos violados estavam o presidente da República, Luís Inácio Lula, o ministro Mantega, o governador José Serra, Verônica Serra e outros menos cotados.

É só conferir em http://www.camara.gov.br/sileg/integras/699422.pdf

Por volta dos anos 2000 e 2001, a Receita Federal iniciava informatização dos dados fiscais e cadastrais das Pessoas físicas e Jurídicas. Em razão desta atualização, foram disponibilizados os bancos de dados completos das pessoas físicas e jurídicas por algum tempo. Em 2008, o SBT fez uma reportagem que havia, no bairro paulista da Santa Ifigênia, pessoas que vendiam a senha para acesso aos bancos de dados do Serpro. O assunto chegou a ser publicado, na época, no jornalão Folha de São Paulo:

http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u439202.shtml

Isso foi há 10 anos, quando Fernando Henrique Cardoso era presidente. Nesta ocasião, vazaram da Receita Federal os dados do Imposto de Renda do próprio FH, Sílvio Santos, Gugu Liberato e dados cadastrais de 17 milhões de brasileiros.

Atualmente, FHC, que viaja pelo exterior desde que Serra se lançou candidato, pede em seus artigos que Dilma Rouseff seja penalizada. Os dados eram vendidos em disquete, pela quantia de R$ 6 mil e a desfaçatez era tanta que chegavam a anunciar em classificados de jornal. O assunto não ganhou as manchetes dos jornais. Era um caso de polícia.


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Quebra de sigilo é antiga. Serra mente!



Reportagem produzida pelo SBT em outubro de 2009. Agora, o tucano faz escândalo por motivos eleitoreiros.

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quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Câmera Aberta Sindical completa seis anos

Reproduzo release do excelente programa "Câmera Aberta Sindical":

Com a edição levada ao ar dia 1º de setembro, o programa Câmera Aberta Sindical completou seis anos de exibição, sempre ao vivo, às quartas-feiras, das 19 às 20 horas, na TVA Aberta São Paulo, o canal comunitário da cidade (NET 9; TVA 72 ou 99). O Câmera é o único programa da televisão brasileira dedicado ao movimento sindical. Outra de suas marcas é a completa abertura a todas as correntes do sindicalismo.

O programa de aniversário, por exemplo, contou com a participação de três dirigentes sindicais metalúrgicos, de três sindicatos diferentes e três centrais também diferentes: CUT, Força e Conlutas. O tema – as campanhas salariais da categoria metalúrgica – foi debatido no ar pelos presidentes dos sindicatos de Taubaté, Guarulhos e São José dos Campos, respectivamente, Isaac do Carmo, Josinaldo José de Barros e Vivaldo Moreira. Também foi apresentada reportagem sobre o 19º Congresso Sindical Comerciário, que aconteceu de 26 a 28 de agosto.

História

O Câmera nasceu de uma proposta de Paulo Lucania, então presidente da Federação dos Empregados no Comércio do Estado de São Paulo, preocupado com a falta de espaço para o sindicalismo na mídia. Nesse período, sempre apresentado pelo jornalista João Franzin, o programa já entrevistou centenas de dirigentes, assessores e consultores sindicais, além de lideranças políticas ligadas ao mundo do trabalho – inclusive o presidente Lula.

Robson Gazzola, diretor do programa, aponta as razões do êxito do Câmera: “O programa não exige qualquer pré-condição. O participante fala o que quer. A segunda condição do nosso sucesso é a participação do telespectador, que se manifesta livremente e às vezes até contesta o apresentador ou algum dos entrevistados”. Para Dayane Silva Santos, produtora do Câmera, outra qualidade do programa está em seu conteúdo. “O Franzin conhece muito o movimento sindical e conduz o programa sempre valorizando as ações do sindicalismo e mantendo o nível das discussões”.

Produtos

Um dos desdobramentos do Câmera é a publicação de livretos com programas especiais. Em 2009, foram publicados dois livretos, um contendo entrevistas de Almino Affonso e João Guilherme Vargas Netto e outro de Paulo Pereira da Silva, presidente da Força Sindical. Um terceiro livreto está em fase de finalização, trazendo 31 entrevistas e cobertura completa da Conferência Nacional da Classe Trabalhadora, realizada em 1º de junho de 2010.

Ampliação

Além de passar em São Paulo, Guarulhos, São José do Rio Preto, São José dos Campos e Presidente Venceslau, nas emissoras comunitárias, em 2010, o Câmera passou a ser transmitido pela Rede Brasil de TV, em dezenas de emissoras em todo o Brasil, incluindo 26 Capitais. Na Rede Brasil, o programa é editado num compacto de meia hora.

Outra novidade nesses seis anos no ar é que o Câmera Aberta passou a ser transmitido também pela internet, por meio do site da TV Aberta (www.tvaberta.tv.br).

Participação

Para agendar entrevistas no programa, o sindicalista deve entrar em contato com a Agência Sindical (11) 3231.3453, falar com Dayane. Para participações ao vivo, às quartas, das 19 às 20 horas, o telefone é o 3877.0078.

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Existe ética no jornalismo brasileiro?



Reproduzo convite do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo:

Por iniciativa da Comissão de Ética do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo - SJSP, será realizado, no dia 15 de setembro, às 19 horas, no auditório Vladimir Herzog (Rua Rego Freitas, 530, sobreloja) o seminário “A liberdade de imprensa e a Ética na Comunicação”. O evento é aberto a profissionais jornalistas, representantes de empresas de comunicação e a toda a comunidade interessada em discutir a cobertura jornalística com responsabilidade e respeito aos cidadãos tanto na condição de fonte, quanto de leitor, ouvinte ou telespectador.

A mediação do seminário será da jornalista Denise Fon, integrante da Comissão de Ética, bem como, à mesa dos debates foram convidados representantes de entidades como Ordem dos Advogados do Brasil, Conselho Regional de Medicina, ACAT/ONU (Ação dos Cristãos para a Abolição da Tortura), Pastoral Carcerária, dentre outras entidades, bem como vítimas de noticiários sensacionalistas. “A abordagem preconceituosa, o pré-julgamento e o apelo à execração pública são erros cotidianamente cometidos por parte da imprensa”, diz o José Augusto de Oliveira Camargo (Guto), presidente do SJSP.

Para a integrante da Comissão de Ética, Denise Fon, o evento vem em um momento importante e o seu o objetivo “é o de alertar aos jornalistas para que observem os princípios éticos, quando da realização de seu trabalho, respeitando as fontes, ouvindo todas as partes e, especialmente, não pré-julgando suspeitos”! Denise Fon diz estar “alarmada com a quantidade de denúncias contra jornalistas que chegam à Comissão de Ética”.

Aliás, conforme constata, “já começam a chegar casos os quais não são da lavra de jornalistas, mas de ‘fazedores’ de notícias, pois, o entendimento geral depois da decisão do STF é o de que qualquer um pode ser jornalista!”

“Infelizmente, é na televisão que temos assistido o maior número de casos de flagrante desrespeito aos direitos humanos, direitos de cidadãos, e mesmo linchamentos morais, em programas os mais diversos nas emissoras de TV, tanto na capital quanto no interior de São Paulo”, aponta Alcimir Carmo, secretário do Interior e Litoral no SJSP, e um dos organizadores do seminário. Carmo cita exemplos célebres como Escola de Base, Bar Bodega, e também recentes, “como programas que expõem pessoas ao ridículo, pelo desrespeito a princípios elementares do jornalismo e da decência humana”.

Outra preocupação do Sindicato dos Jornalistas para com a categoria é a utilização de profissionais do jornalismo como garotos-propagandas em anúncios de produtos ou serviços de patrocinadores dos programas de TVs. “Além de constrangedor para o profissional, a prática desse tipo de utilização da imagem do jornalista associada ao produto ou serviço o descretida o profissional”, lembra Alcimir Carmo, mencionando, como exemplo, “o caso de uma empresa de jogos de azar que anunciava numa emissora de televisão e teve seu produto suspenso pela Justiça. O pior é que a notícia sequer foi divulgada pela emissora, a qual, não apenas veiculava a publicidade, mas, através de seu jornalista, também promovia o produto considerado ilegal!”

Esses e outros casos ilustram o dia-a-dia do jornalismo em São Paulo e, certamente, no Brasil. Integrantes das comissões de ética estão preocupados com os rumos dos programas que, parece, preocupam-se apenas com o índice de audiência e alguns “profissionais”, guiados por esses pontos, perderam a noção de respeito – inclusive a si próprios!

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Boni: acordo Globo/Time-Life foi ilegal

Assunto explosivo, ocultado pela mídia, o acordo Globo/Time-Life foi tratado como "totalmente ilegal" por um dos principais executivos da empresa, o Boni. Reproduzo a matéria do Portal Imprensa:

O emblemático acordo Globo Time-Life, que até hoje é discutido como um dos pontos mais sensíveis da televisão brasileira, é avaliado, mais de 40 anos depois, por José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni: "O acordo era totalmente ilegal, no meu ponto de vista. O pessoal do Time-Life era muito responsável e eles tinham ordem de não passar perto da redação para não contaminar o conteúdo, mas de acordo com a legislação brasileira, era ilegal. Era um acordo de assistência técnica: eles construíram o prédio da TV Globo que pagava um aluguel exorbitante, mais ou menos o que acontece hoje com a Record e a Igreja [Universal do Reino de Deus]", avalia o ex-diretor da Globo à revista Imprensa em entrevista exclusiva para a edição de setembro (nº 260).

A polêmica é antiga. Logo que Roberto Marinho adquiriu a concessão da TV Globo em, 1962, selou uma parceria com o grupo de mídia americano Time-Life. O acordo garantiu à Globo um capital de milhões de dólares para compra de equipamentos e construção da emissora; à Time-Life, cabia uma participação nos lucros da empresa.

Dois meses depois da inauguração da Globo, em 1965, a relação das empresas foi denunciada como ilegal. A participação estrangeira em empresas nacionais não era permitida na época. Além disso, a presença do consultor do Time-Life, Joe Wallach que atuava na Globo, levantou dúvidas sobre a influência do grupo no conteúdo e nas decisões estratégicas da emissora.

"Os funcionários [da Globo] sabiam da presença do Time-Life, que trouxe vários profissionais, como o Joe Wallach, que é muito importante na história da Globo. O Joe estava preocupado com a empresa e deu essa estrutura básica", explica Boni. Em 1970, Joe Wallach optou por sair do Time-Life e ficou exclusivamente na Globo, como diretor-executivo.

Em outubro de 1967, o consultor-geral da República Adroaldo Mesquita da Costa considerou que não havia uma sociedade entre as duas empresas, parecer que deixava a situação da Rede Globo legal no país. Em 1971, o acordo entre as empresas foi desfeito.

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O declínio do PSDB e de Serra

Reproduzo artigo de Maria Inês Nassif, intitulado "PSDB, um partido de quadros que perdeu quadros", publicado no jornal Valor Econômico:

O avanço de Dilma Rousseff, a candidata do PT à Presidência, no reduto tucano paulista, é um dado muito delicado para o grupo de José Serra dentro do PSDB. O partido nacional não se sairá bem das eleições de outubro, mas o tucanato paulista estará em maus lençóis mesmo que ganhe as eleições para o governo do estado.

Em São Paulo, a candidata do PT já tem votos para suplantar seu adversário tucano. Isso significa que Dilma conseguiu furar o bloqueio de uma forte rejeição petista no estado, que tem garantido eleições sucessivas de candidatos do PSDB ou apoiados pelos tucanos, no momento em que as lideranças nacionais do PSDB paulista declinam. Para o PT, este é um acontecimento.

Mário Covas, que foi o grande articulador da criação do partido e o único elemento agregador desse núcleo original do PSDB, faleceu em 2001. Fernando Henrique Cardoso foi eleito presidente duas vezes na onda do Plano Real e de uma ideia genérica de "Brasil moderno" trazido pela hegemonia liberal, do qual acabou se tornando o grande artífice no país, com a inestimável ajuda do eleitorado conservador paulista, dos votos conservadores da região Sul e dos grotões sob a influência do PFL no Nordeste e no Norte. Saiu do governo desgastado por sucessivas crises econômicas e não assumiu qualquer papel de liderança interna. Se as pesquisas se confirmarem, José Serra perderá, já no primeiro turno, para Dilma Rousseff.

Sem líderes, PSDB ficará muito parecido com PMDB

O grupo serrista tinha forte influência sobre o partido nacional e assumiu as rédeas do PSDB estadual, até então sob a órbita de influência do herdeiro de Covas, Geraldo Alckmin, um político de prestígio regional, mas afeito à política tradicional de alianças com chefes políticos locais. A máquina tucana no estado foi montada por Alckmin; o chefe da Casa Civil de Serra, Aloysio Nunes, trabalhou muito para cooptá-la. O fato, no entanto, é que Alckmin ainda tem mais votos no estado do que Serra.

Houve, portanto, um movimento claro do governador José Serra para assumir a liderança regional do partido, ao mesmo tempo em que mantinha forte influência sobre o partido nacional, apesar de emersões episódicas do governador de Minas, Aécio Neves.

Enquanto tinha o governo estadual e era tido como o preferido nas eleições presidenciais, o candidato tucano a presidente se manteve no controle das duas máquinas partidárias — a paulista e a nacional.

Se perder a eleição, Serra acumulará duas derrotas nas eleições presidenciais — foi candidato em 2002 e perdeu para Lula; é candidato em 2010 e pode perder para a candidata de Lula, num partido que depende desesperadamente de uma vitória para manter o nariz para fora da água. Está sendo cristianizado pelos candidatos tucanos ao governo e ao Senado quase no país inteiro. Dificilmente conseguirá se manter como liderança nacional sem cargo político e sem aliados internos de peso.

Além disso, apesar das aparências, manteve-se em rota de colisão constante com o DEM. Uma estratégia de articulação oposicionista, no caso de vitória de Dilma Rousseff, tem poucas chances de ter o ex-governador como elemento de coesão — interna ou com aliados.

Por força do seu estilo, e das disputas locais, o candidato a governador tucano no estado, Geraldo Alckmin, jamais alçou voos nacionais. Não se pode dizer que os grupos de Serra e de FHC tenham facilitado a vida de Alckmin, mesmo quando ele foi candidato à Presidência, em 2006. Alckmin entra pela porta da sala na política estadual; tem acesso apenas à porta da cozinha na política nacional. Se vencer a eleição, ele deterá o controle da maior parcela de um PSDB em crise. É duvidoso que consiga, no entanto, ser convidado para entrar na sala de visitas da cúpula nacional.

O PSDB, que sempre sobreviveu como partido de quadros, está com severos problemas — de quadros. Ao longo de sua existência, o partido se manteve em torno de personalidades que se desgastaram politicamente com o passar dos anos, ou estão velhas, ou morreram. A exceção é o governador Aécio Neves, uma geração abaixo da do grupo original e que, por manobras de Serra ou por esperteza, guardou-se do desgaste que o embate com um governo altamente popular traria e retirou a sua pré-candidatura a presidente da República.

São Paulo deve ainda contribuir fortemente para a bancada federal do PSDB, mas, sem líderes que sustentem essa hegemonia, o partido deve ficar muito parecido com o PMDB: cada um cuida de seus interesses eleitorais e todos brigam pelo controle regional porque isso facilita o trânsito de suas necessidades imediatas. Se Aécio não assumir o papel de líder nacional, já que chegará ao Senado com uma votação avassaladora, o PSDB estará condenado a ser uma federação de partidos regionais, a exemplo da legenda de Michel Temer.

Para o diretor da Sensus, Ricardo Guedes, a eleição foi definida, em favor de Dilma, no momento em que Serra alcançou 40% de rejeição. Do penúltimo CNT/Sensus, coletado de 31 de junho a 2 de agosto, para o último, feito de 20 a 22 de agosto, Serra passou de cerca de 30% de rejeição para 40%. Isso torna qualquer candidatura inviável, segundo Guedes.

Para Marcos Coimbra, do Instituto Vox Populi, Dilma tem grandes chances de vencer no primeiro turno porque o período de propaganda eleitoral gratuita tem sido absolutamente eficiente no trabalho de associação entre ela e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A campanha no rádio e na televisão tem servido mais como informação a um eleitor pré-disposto a votar na continuidade do que propriamente como instrumento de captação de votos.

Conforme se torna conhecida como a candidata de Lula, Dilma consolida posição. A rejeição a Serra, na opinião de Coimbra, é grande, mas decorrência da definição de voto por Dilma. Por essa razão, Coimbra duvida da eficiência da campanha negativa de Serra.

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A exploração política é exagerada

Reproduzo artigo de Renato Janine Ribeiro, publicado na Folha de S.Paulo:

"Cortem-lhe a cabeça!", disse a rainha. "Mas sem processo?", perguntou Alice. "Primeiro a condenação e depois o processo", explicou a rainha. "No meu país é o contrário", retrucou Alice. "Aqui, não", concluiu a rainha." Lembro dessa cena de Alice no País das Maravilhas quando leio o inflacionado debate sobre algo que é erradíssimo – a violação do sigilo fiscal de cinco nomes do PSDB, de centenas de outras pessoas na agência Mauá da Receita e de centenas de milhares de declarações de renda vendidas na rua 25 de Março (em SP).

Mas a exploração política do caso é exagerada. Aquele que retirou a declaração de Veronica Serra não é respeitado nem pelos jornalistas. Nada nele demonstra estilo petista, embora tenha aderido ao PT logo após a vitória de Lula – adesão que, pelo visto, não levou a nada.

Mas os jornalistas creem numa única afirmação dele: o episódio visaria a prejudicar José Serra (PSDB). Por que essa seleção do que merece crédito? Ainda mais levando em conta que, se alguém pode ser prejudicado, é Dilma Rousseff (PT).

Na verdade, afora o fato de que declarações de renda são vendidas na rua há anos, o que me preocupa de imediato são duas coisas.

A primeira é que a imprensa abriu mão de cobrir, a sério, as eleições. O Paraná, por exemplo, vive um pleito complexo, mas os jornais apenas repetem descrições, sem explicar como uma sociedade rica tem uma política pobre.

País a construir

Esse é um exemplo entre muitos. A cobertura eleitoral é função dos institutos de pesquisa, dos escândalos e, bem pouco, do trabalho dos repórteres. Isso augura mal para o futuro de uma profissão que um dia quis exercer.

O outro ponto: sem provas da ligação do detestável delito com a candidatura Dilma, o candidato que está atrás nas pesquisas quer anular na Justiça os votos dela.

Se for jogo de cena para levar ao segundo turno, não é bonito, mas vá lá. Se for uma tentativa de anular 60% dos votos válidos e empossar um presidente votado por 25% dos eleitores, será um golpe fatal na nossa democracia.

Melhor seria a oposição e a imprensa que a apoia aceitarem que nas eleições se perde e se ganha, que elas não são uma guerra em que se mata o inimigo, mas uma competição em que o povo escolhe o preferido para cada cargo.

E o povo não merece que se destrua a democracia, que a discussão política se reduza a uma crônica policial ou que os vários lados fiquem de birra um com o outro.

Teremos, todos nós, que construir este país, pelo resto de nossas vidas. Melhor evitar paixões e atos que tornem, depois, difícil a colaboração, pelo menos entre quem gosta do Brasil.

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O bombardeio do JN, como em 2006

Reproduzo artigo de Rodrigo Vianna, publicado no blog Escrevinhador:

Em 2006, a tática no “JN” da Globo, nas duas últimas semanas antes do primeiro turno, era 3 contra 1. Alckmin, Cristovam e Heloisa Helena tinham 1 minuto cada um, no telejornal da Globo, pra perguntar “De onde veio o dinheiro?”. Lula, candidato à reeleição, ganhava 1 minuto para tentar responder sobre o caso dos “aloprados”.

A campanha, no “JN”, virou samba de uma nota só: era a melodia que interessava à oposição. Parecia que nada mais existia no Brasil, a não ser o “escândalo”. Com quinze dias de bombardeio, mais a foto do dinheiro criada pelo delegado Bruno, e ainda o erro de Lula (que faltou ao último debate), a mídia virou cinco por cento dos votos e levou assim a eleição pro segundo turno.

Agora, 4 anos depois, o “JN” repete o bombardeio. Mas de forma mais sutil. Nessa quarta-feira, conferi atentamente. Primeiro, uma “reportagem” sobre os partidos: PSDB acusa PT de quebrar sigilos, e o PT se defende. É a pauta que interessa a Ali Kamel. Não ao Brasil. Na sequência, três ”reportagens” sobre o dia dos candidatos. Serra entra primeiro e fala – advinhem? – sobre a quebra de sigilo. Dilma aparece na sequência pra se defender. A repórter que narra a “reportagem” sobre Dilma ainda avisa que a candidata não falou diretamente sobre o tema. Dilma não falou diretamente, mas era isso que a Globo queria botar no ar. Então, virou a pauta do dia.

Onde está a sutileza? Na terceira candidata. Marina apareceu por último, falando… de projetos para melhorar a vida das crianças. Serra e Dilma ficam na pancadaria – desagradável para o eleitor. E Marina aparece depois, correndo por fora, como a boa moça da campanha.

A tática a essa altura é essa: bater em Dilma e no PT, durante 20 dias. A tentativa é brecar o crescimento da petista. Serra pode até não subir muito com isso. A tentativa parece ser a de empurrar Marina – pra roubar votos de Dilma com o “escândalo”.

Provavelmente, não será o suficiente pra garantir o segundo turno. Mas a “Globo” entrou no jogo. Precisa garantir que a vitória de Dilma não seja avassaladora, que a petista (mesmo vitoriosa) fique na defensiva. E que o PT não vença em São Paulo.

Serra, que na terça-feira tinha prometido deixar o escândalo de lado, não manteve a palavra nem por 24 horas. Parece não ter escolha. A essa altura, ele já não comanda a campanha, mas é pautado pelos meios de comunicação – desesperados com a derrota iminente.

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Rigotto persegue jornalista no RS

Reproduzo entrevista concedida ao jornalista Paulo Henrique Amorim, publicada no blog Conversa Afiada:

É a primeira vez que Elmar Bones tem a chance de contar sua epopéia de resistência por ousar mostrar a verdade sobre a maior fraude da história gaúcha. O irmão de Germano Rigotto, candidato a senador pelo PMDB, é a peça central da fraude que lesou o povo gaúcho em quase 800 milhões. Rigotto quer fechar o jornal e levar Elmar à penúria. Leia a entrevista completa:

O processo da família do ex-governador Germano Rigotto contra o seu jornal, o JÁ, completa dez anos, um dos mais longos da Justiça brasileira. Afinal, qual foi o crime do JÁ?

O jornal teve a ousadia de contar, em 2001, os detalhes da maior fraude contra os cofres públicos do Rio Grande do Sul. Em valores atualizados pela Justiça, representa algo em torno de R$ 800 milhões. O principal personagem da fraude, segundo a investigação do Ministério Público e o relatório final da CPI criada na Assembléia gaúcha, era Lindomar Vargas Rigotto, irmão de Germano, atual candidato do PMDB ao Senado.

Onde era a fraude?

Na Companhia Estadual de Energia Elétrica, a CEEE, a estatal de energia elétrica que nasceu nos idos de 1960, depois da encampação da americana A&TT pelo governador Leonel Brizola. Ela nem existe mais: foi privatizada no Governo Britto e fatiada em trës empresas menores. O povo gaúcho continua pagando R$ 600 milhões anuais ano de dívidas trabalhistas pela banda podre da finada CEEE…

E como foi o golpe na CEEE?

A fraude se deu em dois contratos para construção de onze subestações de transmissão de energia, obra estimada em 150 milhões de dólares, assinados no governo Pedro Simon (PMDB), em 1987. Foi a secretária de Minas e Energia do governo seguinte, o de Alceu Collares (PDT), quem mandou fazer a primeira investigação. Uma senhora chamada Dilma Rousseff.

A Dilma? E o que ela disse?

Um assessor me contou que, depois de ver os primeiros documentos da sindicância interna da CEEE, ela comentou: “Eu nunca tinha visto nada igual”. Ela só não tocou em frente o processo porque o governo do Collares precisava dos votos do PMDB de Rigotto na Assembléia. Mas ela guardou na gaveta e, em dezembro de 1994, antes de deixar a secretaria, a Dilma teve o cuidado de mandar toda a papelada do inquérito para a Contadoria e Auditoria Geral do Estado (CAGE) e para o Ministério Público. Dali nasceu a CPI.

E daí?

A CPI durou um ano e meio, produziu 350 quilos de papel. Foi a primeira comissão parlamentar do país a apontar os corruptos e também os corruptores. Foram indiciados 23 funcionários e 11 empresas que integravam os dois consórcios vencedores da licitação.

E como o irmão do Rigotto se intrometeu nesta história?

No governo Simon, Germano Rigotto era o líder do PMDB na Assembléia. Sua atuação na campanha foi decisiva para a vitória de Simon. Ele encaixou o irmão Lindomar num cargo que nem existia na CEEE, o de “assistente da diretoria financeira”. Quem contou isso na CPI foi próprio secretário de energia do Simon, Alcides Saldanha, que antecedeu Dilma. Foi neste posto, criado sob medida, que Lindomar Rigotto armou o esquema das licitações fraudadas.

Esta denúncia virou processo na Justiça? Está andando?

O processo vai completar 15 anos em fevereiro, já tem 110 volumes e ainda não saiu da primeira instância. E o pior: a maior fraude da história gaúcha corre em segredo de justiça. E ninguém sabe porque. Quem tem medo que isso venha a público? O que o povo do Rio Grande não pode saber sobre a fraude da CEEE?

O processo está parado?

Falei esta semana com a Promotoria de Defesa do Patrimônio Público. A boa notícia é que o processo está concluso ao juiz. Isso quer dizer que não cabe mais nenhum recurso, nada. O juiz vai receber a última manifestação das partes, num prazo de 10 dias, e depois vai dar a sentença. Se sair antes das eleições de outubro, deve produzir um grande estrago político. Por isso mesmo, não acredito em tanta agilidade. Para alívio de alguns candidatos, a sentença da Justiça deve sair só no fim do ano, bem depois da manifestação dos eleitores nas urnas. Mas, pelo menos saberemos quem é quem nesta história ainda secreta.

Bem, imagino que isso rendeu muita manchete na imprensa, na época…

Rendeu, mas com aquela cobertura em mosaico, meio truncada, aos saltos, com espaço fragmentado no noticiário… Depois, o assunto foi sumindo, desaparecendo, e o leitor fica se perguntando: o que foi mesmo que aconteceu?

E aí aparece o JÁ para refrescar a memória dos gaúchos…

Publicamos uma reportagem destacando aquilo que a imprensa havia negligenciado e que era talvez o mais importante: o indiciamento dos corruptores, onze empresas, todas logomarcas reluzentes e grandes anunciantes. Talvez por isso o assunto na Justiça, apesar de ser uma “ação civil pública”, acabou encoberto pelo ”segredo de Justiça”. Estava quase esquecido quando o principal personagem da fraude, Lindomar Rigotto, voltou às manchetes, agora nas páginas policiais.

Pela fraude na CEEE?

Não, agora foi pela morte de uma garota de programa, de 24 anos, que caiu nua do 14º andar de um prédio a 100 metros da Praça da Matriz, onde ficam as sedes do poder no Estado – o Palácio Piratini, o Tribunal de Justiça, a Assembléia Legislativa e a Cúria Metropolitana. A história, de setembro de 1998, nunca foi esclarecida, mas o que importa é que o dono do apartamento de onde a moça caiu era Lindomar Rigotto, o principal implicado na fraude da CEEE e que estava lá no momento da queda. Foi indiciado por homicídio culposo e omissão de socorro no inquérito que apurou a morte da moça. Lindomar só não foi a júri porque, em fevereiro, foi assassinado num assalto numa praia gaúcha.

O que ele fazia lá?

Após a sindicância da CAGE, que comprovou mesmo o desvio, ele e outros sete funcionários graduados envolvidos foram demitidos. Fora da CEEE, Lindomar e outro irmão, Julios, formaram uma rede de boates, o Ibiza Club, que chegou a ter quatro casas no litoral do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Ele estava na Ibiza de Atlântida, no início da manhã de quarta-feira de cinzas de 1999, quando os assaltantes chegaram. Lindomar e o gerente estavam fechando o balanço da noite. Lindomar saiu em perseguição aos bandidos, e acabou morrendo com um tiro no olho. A polícia informou que os ladrões levaram uns R$ 30 mil, mas o dinheiro nunca foi recuperado, embora todos os envolvidos no assalto tenham sido presos pouco depois.

E a imprensa, com isso, ressuscita o envolvimento de Lindomar com a CEEE?

Aí é que entra a ironia da história. Dois dias depois do assassinato, que obviamente rendeu grandes manchetes, o colunista mais importante da Zero Hora, Paulo Sant’Anna, escreveu uma crônica pungente sobre Lindomar Rigotto, que ele define como ”um homem que teve sua vida anatematizada pela tragédia”. Menciona a sucessão de infortúnios que culminaram com o assassinato, solidariza-se com a dor dos familiares e dá o assunto por encerrado.

Como assim, “encerrado”?

O colunista dá a entender que aquele homem marcado pela tragédia pagou com a própria vida os possíveis desatinos e que, daí em diante, mexer com sua morte era apenas mexer com a dor dos seus familiares. Na verdade, impedir que esse assunto caia no esquecimento é de certa forma uma defesa de Lindomar. Afinal, ele pode ter sido o operador, mas não fez nada sozinho. E os corruptores que foram apontados?

E foi encerrado o papo?

O Paulo Sant’Anna é o cronista mais influente do Estado e, se ele diz que um assunto está encerrado, ninguém mais duvida – principalmente nas redações da RBS, que é o maior grupo de comunicação do Sul do país, com oito jornais diários, 32 emissoras de rádio e 10 de TV no Rio Grande e Santa Catarina. Aí eu percebi que tinha um baita assunto na mão e podia trabalhar com calma, porque ninguém ia mexer com isso.

A reportagem do JÁ saiu quando?

Em 2001, mais de um ano depois da morte de Lindomar. A reportagem foi feita com grande dificuldade. Não tínhamos grana pra nada. A praia fica próxima de Porto Alegre, cerca de 120 km de distância em linha reta. E lembro que fomos ao litoral ver o processo, eu e um repórter, o tempo inteiro de olho na luzinha da gasolina. Nesse meio tempo, a circulação do jornal estava suspensa, a matéria ficou pela metade, numa gaveta. O jornal só voltou a circular no início de 2001 e aí retomamos a reportagem. Quatro repórteres trabalharam nela. Publicamos na edição de maio. Em agosto recebi a citação do juiz.

Quem processou vocês?

A autora visível da ação é a senhora Julieta Vargas Rigotto, mãe de Lindomar e do ex-governador Germano Rigotto, hoje candidato a Senador pelo PMDB.

O Rigotto é inocente nesta causa? Ele não sabe de nada? Jura?

Saber, o Rigotto sabe, é claro, desde o início da ação na justiça. Quando estávamos finalizando a matéria, o repórter Olides Canton ligou para ele em Brasilia, quando ainda era deputado federal. Ele reagiu asperamente: “Eu não trato desse assunto”. E advertiu que sua mãe iria nos processar, que já havia acionado outros veículos.

E o que a mãe do inocente Rigotto alegava?

Eles ajuizaram duas ações. Uma queixa-crime por calúnia e difamação contra o autor da matéria, no caso eu, que assinava – com outros quatro repórteres – como responsável pelo texto final. A outra, uma ação cível, por dano moral, contra a editora do jornal.

E aí?

No inicio ganhamos as duas. A ação cível teve decisão até antes, porque o nosso advogado nem discutiu o mérito. Ele alegou decadência de prazo, porque entrara mais de noventa dias depois da publicação. Estava em vigor a extinta Lei de Imprensa, que estipulava esse prazo para ações de dano moral. A outra teve um parecer do Ministério Público, uma decisão em primeira instância e uma sentença em tribunal, tudo no mesmo tom: a reportagem ateve-se aos fatos, não teve a intenção de ofender ninguém e atendia ao interesse público. Ou seja, cumpria todos os requisitos clássicos de uma boa e correta reportagem.

E o que aconteceu, então?

A sentença do juiz de primeira instância, mandando arquivar o processo civel por decadência de prazo, saiu em agosto de 2002, em plena campanha eleitoral na qual Germano Rigotto era o candidato do PMDB a governador. Em outubro, ele se elegeu consagradoramente. Em dezembro, um mês antes da posse de Rigotto, o Tribunal de Justiça do Estado acolheu inesperadamente um recurso e derrubou a decadência do prazo, sem levar em consideração a sentença do mesmo tribunal no outro processo. Julgou o mérito e acabou condenando a editora a pagar uma indenização de R$ 17 mil reais por danos morais. Resumindo o absurdo da questão: o mesmo tribunal que nos absolveu antes acaba por nos condenar depois. Assim, temos uma única reportagem e duas sentenças absolutamente contraditórias. Culpado e inocente, ao mesmo tempo, pela mesma matéria.

E vocês não recorreram ao STF?

Recorremos, claro. Acontece que fomos condenados à revelia. Houve uma audiência para a qual não recebi intimação, nem eu nem minhas quatro testemunhas… E aí fomos condenados à revelia. O STF não acolheu o nosso recurso. No nosso site www.jornal.ja.com.br está a integra da sentença e outros detalhes desta história. É uma didática leitura que vale a pena, para entender como a liberdade de expressão neste país pode ser atingida pela própria Justiça, que deveria protegê-la como ninguém.

Bem, mas, com a Justiça brasileira, a condenação deve ter demorado, não?

Que nada, foi rápida. O tribunal reabriu o processo em dezembro de 2002 e, em agosto do ano seguinte, o jornal já estava condenado. Pouco depois fomos notificados para apontar bens à penhora. Oferecemos nosso estoque de livros, uns 15 mil volumes de 35 títulos diferentes editados pela JÁ. A oferta foi recusada pela Justiça. E assim vem…

Até que, agora, bloquearam tua conta pessoal no banco…

Pois é, fiz um empréstimo consignado de R$ 10 mil para pagar as contas mais urgentes, tinha um restinho de mil e poucos reais lá. Pois o juiz mandou sequestrar para pagar os advogados da dona Julieta. E, pelo que me diz o advogado, atropelando procedimentos processuais. É incrível: perseguido há dez anos, ainda tenho que pagar os honorários dos advogados que me processam.

Que outros prejuízos você está sofrendo?

Os efeitos políticos de um processo desses sobre a editora e o jornal são devastadores. O jornal sofre uma condenação dessas, absurda, mas não sai uma linha em lugar nenhum, ninguém sabe direito o que aconteceu… O que fica no ar, de forma leviana, para todo mundo que não entende bem este caso, é que ”um jornaleco irresponsável foi condenado porque ofendeu a honra e a imagem da família do governador”. E fica por isso mesmo.

O jornal teve perdas com isso?

O governo estadual é o maior anunciante no Rio Grande, somando-se as verbas do Executivo e das estatais. Suas contas são atendidas pelas maiores agências da praça. Se você está vetado aí, qual é a consequência imediata? Ninguém quer se incomodar com o maior cliente da publicidade no Estado e, daí, ninguém programa o “jornaleco irresponsável”. Esse escândalo que estourou agora no Banrisul mostra o uso político das verbas de publicidade. Dez milhões foram tungados para pagamento de propinas e caixa de campanha.

O Banrisul patrocina o principal prêmio de jornalismo do Estado, o Prêmio ARI, da Associação Riograndense de Imprensa. Tenho várias fotos com o presidente do banco entregando prêmios ao JÁ. Mas, desde 2003, quando Germano Rigotto assumiu como governador, o Banrisul baniu o JÁ das suas programações publicitárias. O maior banco do Estado anuncia até em jornalzinho de pet shop, só não anuncia no JÁ. Será que isso tudo é mera coincidência?

E o que vai acontecer agora? Qual é a saída para o JÁ?

Nesse momento muitos interesses se juntam para tirar o jornal de circulação. Eles não vão conseguir. O JÁ vai resistir. Apesar do silêncio público, estamos recebendo muitas manifestações de apoio. Os artigos do jornalista Luiz Cláudio Cunha, em novembro e agora, no Observatório da Imprensa, abriram uma grande frente de resistência, reproduzidos em centenas de blogs pelo mundo afora. Acho que vamos comemorar os 25 anos em outubro com grandes e boas novidades.

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A estratégia de Ali Kamel no JN

Reproduzo artigo de Luiz Carlos Azenha, publicado no blog Viomundo:

Teremos mais três semanas de edições “perfeitas” do Ali Kamel no Jornal Nacional.

As notícias boas para o Brasil, especialmente na economia, serão surradas diariamente pela quebra do sigilo fiscal dos tucanos. O PT vai sempre aparecer na defensiva. Nessas reportagens, o tempo dedicado às acusações é sempre bem maior que o da defesa. Em seguida, quando quiser, José Serra aparecerá replicando as acusações da longa reportagem. Dilma será mostrada, igualmente, na defensiva. E Marina Silva? Mesmo que fale a respeito, Marina Silva será “editada” falando de temas que interessam aos eleitores. Como já aconteceu nos últimos dias.

Não foi opção dela, Marina. Foi a escolha de Kamel, atendendo aos patrões. Assim, enquanto PT e PSDB se pegam, Marina pode atrair a maior parte dos indecisos, quem sabe até roubando um pontinho ou outro dos adversários.

É essa a estratégia da Globo para levar a eleição para o segundo turno.

Ah, sim, as notícias serão calibrados para render uma novelinha, cujo gran finale se dará próximo da véspera.

Já a decisão do presidente Lula de aparecer na propaganda eleitoral acusando Serra de patrocinar a baixaria parece uma tentativa de forçar a polarização, sugando o oxigênio de Marina e forçando uma decisão ainda no primeiro turno. A ver.

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quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Greve na França: o "day after"

Reproduzo artigo de Flavio Aguiar, publicado na Rede Brasil Atual:

Foi um duro golpe para o governo de Sarkozy: a greve geral e as manifestações convocadas pelas centrais sindicais francesas, sindicatos conexos e as oposições contra a reforma da previdência foram um sucesso.

As avaliações variam muito: a oficial disse que nas 220 concentrações em todo o país acorreu 1,12 milhão de pessoas. Para as centrais, esse número variou entre 2,2 e 3 milhões. As mais equilibradas davam entre 2,2 e 2,5 milhões. Os percentuais de adesão à greve também variavam, conforme os avaliadores; mas o importante é que ela foi “percebida” com grande intensidade em todo o país e no exterior.

O foco do conflito está na idade para se aposentar: o projeto prevê a passagem de 60 para 62 anos da idade mínima para se aposentar; e de 65 para 67 para a aposentadoria plena, isto, sem descontos quanto ao teto. Alega-se a projetada insolvência do sistema se nada mudar. Mas as críticas são muitas: o projeto nivela todas as categorias, todos os tipos de trabalho, inclusive os insalubres, homens e mulheres.

Mas o mais importante foi a demonstração que isso trouxe de desconfiança em relação ao governo de Sarkozy e seu ministro do Trabalho, Eric Woerth, que é o encarregado de apresentar e defender a proposta no Parlamento. A maioria dos eleitores se disse favorável a alguma mudança na previdência, mas 60% disseram que Woerth e o governo de Sarkozy são os menos indicados para leva-la a cabo.

Woerth está envolvido até os cabelos nas denúncias referentes ao “Caso Bettencourt”. Ele diz respeito a Liliane Bettencourt, matriarca da empresa L’Oréal, de cosméticos e afins, e há juma série de denúncias sob investigação de que ela teria obtido favorecimentos fiscais milionários e irregulares do governo, sobretudo através de Woerth. O curioso é que a principal fonte dessas denúncias são gravações clandestinas feitas em 2009 e 2010 pelo seu mordomo (que, como sempre, é o “culpado”...).

Também não se pode descartar o descontentamento da população num contexto em que – não só o governo da França, mas vários de toda a Europa – fazem cair sobre os trabalhadores e aposentados o peso e o preço de uma crise financeira provocada pela orgia financeira de instituições – bancos inclusive – cujos executivos eram e são e vão continuar a ser regiamente pagos, e ainda estão recebendo e vão receber, nem que seja indiretamente, como no caso da “ajuda à Grécia” verbas bilionárias para saírem de suas dificuldades.

O governo Sarkozy também ficou sob ataque, no mesmo dia 7, no Parlamento Europeu, em Bruxelas, onde vários deputados fizeram intervenções veementes contra o que consideram uma perseguição aos Roma (ou “ciganos” – termo que eles rejeitam, assim comom o de gipsies) através de uma política de deportação para seus países de origem, Romênia e Bulgária. Há nisso, que também ocorre na Itália, além de uma situação iníqua do ponto de vista dos direitos humanos, uma questão legal: em tese, os cidadãos da União Européia tem livre circulação por seu território, e uma política de deportação desse tipo engendra uma situação discriminatória que afronta a Constituição aprovada.

No caso das aposentadorias, pode haver alguma negociação nos próximos dias, durante os debates no Parlamento. As centrais vão manter a pressão, e tudo vai depender também de como o governo de Sarkozy vai assimilar o golpe, até certo ponto inesperado.

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França pára contra reforma da Previdência

Reproduzo matéria de Luana Bonone, publicada no sítio Vermelho:

Comboios parados, ônibus que não deixaram as estações e voos cancelados. Em pelo menos cem cidades francesas este foi o cenário ontem, dia escolhido para uma greve geral, marcada em protesto contra as medidas adotadas pelo governo na reforma da previdência. Cerca de 2,5 milhões de pessoas estiveram envolvidas nas ações de protesto, em todo o país, superando os dois milhões que os sindicatos juntaram no último grande protesto social na França, dia 24 de Junho.

"Diziam que não íamos conseguir mobilizar mais pessoas do que no dia 24 de junho. Mas, segundo as informações obtidas ao meio do dia, sobre o número de pessoas que não trabalharam no setor privado, posso dizer que estamos largamente mais mobilizados do que em junho", garantiu o líder sindical, do CGT, Bernard Thibault.

O elevado número de manifestantes foi às ruas contra a medida governamental, que entrou em debate na Assembleia Nacional nesta terça-feira (7), que, entre outras alterações, aumenta a idade mínima para aposentadoria, de 60 para 62 anos. Uma medida que, se for aprovada pelo parlamento, entrará em vigor em Julho de 2011 e é mal recebida por pelo menos 63% dos franceses, segundo números adiantados pela BBC.

Impassível

Mas a elevada participação dos franceses nos protestos parece não impressionar o presidente francês Nicolas Sarkozy. Apesar dos protestos nas ruas, Sarkozy fez questão de anunciar que continuará "firme" e vai manter a decisão de aumentar a idade da reforma. Ainda assim, admite que pode negociar alguns pontos da legislação com os sindicatos. O ministro do Trabalho da França, Eric Woertg, já garantiu também que o governo continuará a defender a reforma independentemente da onda de protestos. Eric Woerth tem sua imagem muito fragilizada por escândalo envolvendo a empresa de cosméticos Loreal.

François Chereque, líder da grande confederação sindical CFDT, disse à rádio RTL que o governo fará mal em ignorar o que chamou de "o maior comparecimento popular nos últimos anos". Bernard Thibault, líder da outra grande confederação sindical, a CGT, avisou os ministros franceses: "Se não responderem e não derem ouvidos, haverá novas iniciativas, e nada está sendo excluído nesta etapa."

"Nunca na história das pesquisas a população francesa esteve tão convencida de que há injustiça social", disse o analista político Roland Cayrol, do Instituto de Ciências Políticas de Paris.

Austeridade na Europa

A mobilização de milhões de franceses canaliza o sentimento crescente de rejeição em toda a Europa às medidas de austeridade adotadas pelos governos. A greve espelha ações adotadas em outros países europeus contra medidas de austeridade. Até agora os governos da Grécia, Espanha, Itália e Romênia vêm enfrentando greves para conseguir impor cortes dolorosos nos salários e gastos públicos. O metrô de Londres ficou paralisado na terça-feira por uma greve de 24 horas contra os cortes de empregos.

O governo francês diz que a reforma é essencial para equilibrar as contas da aposentadoria até 2018, reduzir o déficit público e preservar a classificação de crédito AAA da França, que o ajuda o país a financiar sua dívida aos juros mais baixos possíveis nos mercados financeiros.

Proporção da greve

A rede de transporte metropolitano de Paris funcionou a 80% da capacidade, mas os comboios suburbanos circularam apenas a 50%. A greve geral na França afetou também o serviço de transporte aéreo: a Direção Geral de Aviação Civil (DGAC) havia pedido às companhias aéreas a supressão de um quarto dos voos programados, nos aeroportos de Paris, atendendo à greve dos controladores aéreos.

Seis voos da TAP, por exemplo, foram cancelados, e registaram-se atrasos nas viagens para diversos países. Também a Ryanair não fez, durante a tarde, voos para Lille, Paris e Bordéus, e cancelou uma viagem para Faro. Também as escolas foram afetadas pela greve, com o registro do Ministério da Educação de uma adesão de professores na ordem dos 25,8%. Já os sindicatos divulgam adesão de 55% a 60% dos docentes. Outros serviços também aderiram ao movimento: 22,3% dos empregados de correios e seis refinarias trabalham ao mínimo.

Londres

Durante as 24 horas de terça-feira (7), também o metro de Londres esteve praticamente parado, com a greve de condutores, funcionários das estações e encarregados dos serviços de manutenção. Os trabalhadores protestam contra o projeto de eliminação de 800 postos de trabalho que, dizem, pode afetar a segurança dos passageiros. De acordo com o site da Transport for London (TfL), empresa que gere os transportes na capital britânica, apenas uma [Northern] das 11 linhas funcionou normalmente. Apesar de a paralisação ser apenas de um dia, a TfL prevê perturbações nos serviços desta quarta (8). Os trabalhadores do metrô londrino ameaçam com novas greves semelhantes, previstas para 3 de outubro e 2 e 28 de novembro.

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O declínio do império da TV Globo

Reproduzo artigo do deputado Brizola Neto, publicado no blog Tijolaço:

Leio no ótimo blog do nosso amigo Cláudio Ribeiro – o Palavras Diversas - a notícia que, domingo passado, a Rede Globo teve de amargar, pela primeira vez em décadas, o segundo lugar em audiência no Rio de Janeiro. Melhor ainda, houve equilíbrio entre as três maiores emissoras. E bem melhor ainda que os números revelam que já vai longe o tempo em que a televisão ficava ligada em quase 90% dos lares.

Era fatal, mesmo, que isso viesse a acontecer. O fim do império global é como, em geral, é o fim de todo império: lento, inexorável, fruto das mudanças sociais, econômicas e tecnológicas mas, também, da perda de sua capacidade de impor seus padrões de cultura sobre a sociedade.

Mas não é de televisão que quero falar, ao ler esta notícia. É de imprensa e de liberdade de imprensa.

O privilégio de impressão dado pela nobreza e pelo clero, há cinco séculos, depois de evoluir para uma certa democratização com a pequena imprensa, que se multiplicava em pequenos jornais, no século 19 e começo do século 20, regrediu para a condição monopolista, à medida em que começaram a se formar os conglomerados de comunicação, nos últimos 50 anos.

Tendo Assis Chateaubriand como pioneiro, o poder de imprensa tornou-se tão concentrado que seus veículos se confundiam com as famílias proprietárias: os jornais eram o “da Condessa (Pereira Carneiro)”, o JB, o de Roberto Marinho (Globo), o “dos Mesquita” (Estadão) e, mais recentemente, o “do seu Frias”.

Embora se fale muito em sinergia com a televisão, isso não foi uma regra para a evolução dos jornais. A aliança entre Marinho e a ditadura fez declinar o poder do grupo de Chateaubriand na TV, que começava a se afirmar, e fechou a porta para todos os outros grupos de mídia impressa que pretendiam nele se aventurar. Quem tentou, como o JB, pagou um preço altíssimo pela ousadia de pisar no terreno do “é meu” global, porque televisão envolve custos altíssimos e inviáveis para empresários que têm mais pompa que recursos.

O advento da internet pareceu ser a área onde isso ia se materializar. À exceção do JB, já combalido, eles e as empresas de telefonia ensaiaram um controle oligopolista do novo meio. Para existir na intenet, era preciso estar “pendurado” num dos grandes portais. Estes, por sua vez, terceirizavam o custo da produção de conteúdo.

Blogueiros que viveram estes tempos podem contar muito melhor do que eu esta história.

Eu quero falar é justamente deles. Ontem à noite fiquei pensando: será que não vai aparecer, como aconteceu com o bloqueio dos grandes jornais a Getúlio Vargas, o Samuel Wainer da internet, alguém que abra um espaço de comunicação com uma ótica popular e progressista?

Quase de imediato, vi que não é isso, porque o caminho que as iniciativas vitoriosas tomaram não é o da criação de um grande empreendimento, mas o da afirmação da vontade e da capacidade (diria, até, da resistência física) que centenas, talvez milhares de pessoas em romper o monopólio e o dirigismo da informação.

Os blogs progressistas, ao contrário do que ocorreria com grupos de motivação meramente econômica, não competem por receita. Aliás, muitos de nós não as tem ou quase nada as tem, embora o sr. José Serra sustente que somos “sujos” por vivermos de publicidade (?) estatal (?!!). Vivemos uma experiência colaborativa, reproduzimos, uns nos outros, o que nos chama a atenção, não pensamos que o crescimento de nossos acessos se fará “roubando” leitores uns dos outros.

E a realidade mostra que é assim que dá certo. Quem se interessar em pesquisar a evolução do volume de acessos dos blogs de Paulo Henrique Amorim, do Azenha, do Nassif e, até, deste Tijolaço, verá que todos eles crescem de maneira quase harmônica e todos estamos cada vez mais bem situados nos ranqueamentos de sites brasileiros.

O mais legal, em tudo isso, é que acho que nenhum de nós tem a menor idéia de onde e em que isso vai parar. Numa cooperação editorial? Numa cooperação em matéria de estrutura – até porque vocês devem ver a gente saindo do ar volta e meia por problemas de suporte técnico ou, como diz uma amigo meu, “suporte o técnico”?

Querem uma resposta? Não tenho a menor idéia. Só me ocorrem os versos do Gonzaguinha: “Passado/ é um pé no chão e um sabiá/ Presente/ é a porta aberta/E futuro é o que virá..."

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O fato novo: a bomba virou um traque

Reproduzo artigo de Marcos Coimbra, sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi, publicado no Correio Braziliense:

Quem, nas duas últimas semanas, leu os colunistas dos “grandes jornais” (os três maiores de São Paulo e Rio) deve ter notado a insistência com que falaram (ou deixaram implícito) que as eleições presidenciais não estavam definidas. Contrariando o que as pesquisas mostravam (a avassaladora dianteira de Dilma), fizeram quase um coro de que “nada era definitivo”, pois fatos novos poderiam alterar o cenário.

Talvez imaginassem (desconfiassem, soubessem) que uma “bomba” iria explodir. Tão poderosa que mudaria tudo. De favorita inconteste, Dilma (quem sabe?) desmoronaria, viraria poeira.

Veio o fato novo: o “escândalo da Receita”. Durante dias, foi a única manchete dos três jornais. É muito? Certamente que sim, mas é pouco, em comparação ao auxílio luxuoso da principal emissora de televisão do país. Fazia tempo que um evento do mundo político não ganhava tanto destaque em seus telejornais. Houve noites em que recebeu mais de 10 minutos de cobertura (com direito a ser tratado com o tom circunspecto que seus apresentadores dedicam aos “assuntos graves”).

Hoje, passados 15 dias de quando “estourou” o “escândalo”, as pesquisas mostram que seu impacto foi nulo. A “bomba” esperada pelos que torciam pelo fato novo virou um traque.

Por mais que os “grandes” jornais tenham se esforçado para fazer do “escândalo da Receita” um divisor de águas, ele acabou sendo nada. Tudo continuou igual: Dilma lá na frente, Serra lá atrás.

Tivemos, nesses dias, uma espécie de dueto: um dia, essa imprensa publicava alguma coisa; no outro, a comunicação da campanha Serra a amplificava, dando-lhe “tom emocional”. No terceiro, mais um “fato” era divulgado, alimentando a campanha com um novo conteúdo. E assim por diante.

Um bom exemplo: o “lado humano” da filha de Serra ser alvo dos malfeitores por trás do “escândalo”. Noticiado ontem, virou discurso de campanha no dia seguinte, com direito a tom lacrimejante: “estão fazendo com a filha do Serra o mesmo que fizeram com a filha do Lula”.

Há várias razões para que a opinião pública tenha tratado com indiferença o “escândalo”. A primeira é que ele, simplesmente, não atingiu a imensa maioria do eleitorado, por lhe faltarem os ingredientes necessários a se tornar interessante. O mais óbvio: o que, exatamente, estava sendo imputado a Dilma na história toda? Se, há mais de ano, alguém violou o sigilo tributário de Verônica Serra e de outras pessoas ligadas ao PSDB, o que a candidata do PT tem a ver com isso? É culpa dela? Foi a seu mando? Em que sua candidatura se beneficiou?

A segunda razão tem a ver, provavelmente, com a dificuldade de convencer as pessoas que o episódio comprove o “aparelhamento do estado pelo PT” ou, nas palavras do candidato tucano, a “instrumentalização” do governo pelo partido. Será que é isso mesmo que ele revela?

Se a Receita Federal fosse “aparelhada” ou “instrumentalizada”, por que alguém, a mando do PT (ou da campanha), precisaria recorrer a um estratagema tão tosco? Por que se utilizaria dos serviços de um despachante, mancomunado com funcionários desonestos? Não seria muito mais rápido e barato acessar diretamente os dados de quem quer que seja?

Não se discute aqui se alguém quis montar um dossiê anti-Serra ou se ele chegou a existir. Sobre isso, sabemos duas coisas: 1) é prática corrente na política brasileira (e mundial) a busca de informações sobre adversários, que muitas vezes ultrapassa os limites legais; 2) o tal dossiê nunca foi usado. As vicissitudes da candidatura Serra ao longo da eleição não têm nada a ver com qualquer dossiê.

O próprio “escândalo” mostra que a Receita Federal possui sistemas que permitem constatar falhas de segurança, rastrear onde ocorrem e identificar responsáveis. É possível que, às vezes, alguém consiga driblá-los. No caso em apreço, não.

No mundo perfeito, a Receita é inexpugnável, não existem erros médicos na saúde pública, todos os professores são competentes, não há guardas de trânsito que aceitam uma “cervejinha”. Na vida real, nada disso é uma certeza.

Todos esperam que o governo faça o que deve fazer no episódio (e em todas as situações do gênero): investigue as falhas e puna os responsáveis. Ir além, fazendo dele um “escândalo eleitoral”, é outra coisa, que não convence, pelo que parece, a ninguém.

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Wikileaks: o que o Pentágono quer esconder

Reproduzo artigo de Antonio Martins, publicado no sítio Outras Palavras:

Uma batalha decisiva para o futuro da liberdade de expressão pode estar sendo travada neste instante. Seu desfecho vai se dar nas próximas semanas. Depois de ter publicado 76 mil relatos secretos sobre a guerra dos EUA contra o Afeganistão, o site global Wikileaks (“furos colaborativos”, em tradução livre) prepara-se para divulgar mais 15 mil. Aparentemente, o conteúdo do segundo lote é ainda mais devastador. Viriam à luz, especula-se, não apenas atrocidades cometidas por soldados no campo de batalha — mas relações diplomáticas perigosas que Washington manteve com governos aliados. Numa corrida contra o tempo para evitar o vazamento, o Pentágono – e, em especial, a direita norte-americana – têm recorrido a ameaças, mistificações e intimidação.

Na semana passada, o próprio secretário de Defesa, Robert Gates, lançou-se a elas. Numa atitude de enorme risco, ele admitiu implicitamente a autenticidade dos documentos que o Wikileaks tem em mãos. Afirmou que o material contém “enorme volume de informações sobre nossas táticas, técnicas e procedimentos”; que sua divulgação ameaça “os soldados norte-americanos e aliados” e terá “consequências potencialmente muito graves”; que será “de grande valia para o Teleban e a Al-Qaeda”.

O porta-voz da Casa Branca, Robert Gibbs, engrossou o coro em tom de guerra, afirmando que a publicação dos arquivos irá “ajudar o inimigo”. Ainda mais agressivo e ameaçador, o colunista neocon Marc Thiessen escreveu no Washington Post: “Os EUA têm capacidade cibernética para impedir que WikiLeaks divulgue o material. O presidente Obama ordenará que os militares usem a capacidade que têm? (…) Se [Julian] Assange, [o editor do Wikileaks] for deixado livre e os documentos em seu poder forem divulgados, Obama só poderá culpar a si mesmo.”

O esforço para impedir que as informações cheguem à opinião pública recebeu o apoio de uma ONG costumeiramente aliada a Washington: os Repórteres sem Fronteiras (RSF). Numa nota divulgada em 14/8, a entidade tenta mobilizar, contra o Wikileaks, o sentimento de defesa da vida. “Revelar a identidade de centenas de pessoas que colaboraram com a coalizão [liderada pelos EUA] no Afeganistão é altamente perigoso. Não seria difícil para o Taleban e outros grupos armados usar tais documentos para compor uma lista de alvos em ataques mortais”, diz o texto.

Ele serviu para que parte da mídia apontasse o “isolamento crescente” do Wikileaks. Entre os que acompanham em mais detalhes a conjuntura internacional, porém, a postura era previsível. Diversas análises independentes têm apontado a forte relação dos RSF com a diplomacia norte-americana – em especial com algumas de seus projetos e personagens mais controversos.

Que pode haver de tão perturbador (para Washington) nos 15 mil documentos? Segundo o jornal britânico The Guardian, que teve acesso a parte do imenso material reunido pelo Wikileaks, pode tratar-se de “um arquivo de milhares de telegramas, enviados pelas embaixadas dos EUA em todo o mundo, nos quais se trata de comércio de armas, encontros secretos e opiniões não censuradas de outros governos”. Em outras palavras, revelações capazes de abalar governantes e políticos que se aliaram, em todo o mundo, às principais iniciativas geopolíticas e militares de Washington, nos últimos anos — em especial no período Bush.

No fim-de-semana, o australiano Julian Assange, editor do Wikileaks, afirmou em entrevistas em Londres e Estocolmo que o conteúdo deverá ser publicado num período de “duas semanas a um mês”. Segundo ele, a equipe de voluntários do site está revisando “linha por linha” os arquivos vazados. A triagem visaria, em especial, remover informações que possam ameaçar a segurança pessoal de personagens citadas. Também haveria meios de imprensa ajudando a interpretar e resenhar o material, embora Assange tenha preferido não nomeá-los.

Para driblar uma eventual tentativa do Pentágono de destruir os documentos, ou colocar o site fora do ar (e talvez para proteger a si mesmos), os responsáveis pelo Wikileaks adotaram um procedimento sofisticado. Há cerca de duas semanas, disponibilizaram um imenso arquivo (o “insurance.aes256″, de 1,4Gb), que supostamente contém toda a base de dados relativa aos vazamentos passados e futuros que perturbam o Pentágono. O material está blindado por criptografia, mas os apoiadores do site foram estimulados a baixá-lo. A esperança é que, difundido dessa forma, torne-se indestrutível. Para que seja aberto, por qualquer um de seus possuidores, basta que o pessoal do Wikileaks, sentindo-se ameaçado, divulgue a senha de desencriptação.

Embora a história assemelhe-se, em alguns de seus aspectos, ao enredo de um filme sofisticado de espionagem, ela envolve uma batalha política de enorme importância. O empenho do governo Obama em tentar impedir a divulgação dos documentos sugere que estão em jogo informações muito delicadas não apenas para seu antecessor, mas para as políticas dos Estados Unidos, de forma geral. Felizmente, o Wikileaks parece não se intimdar. No fim-de-semana, ao responder às críticas dos conservadores e do RSF, Julian Assange afirmou:

“Temos um dever em relação aos mais diretamente afetados pelo material: o povo do Afeganistão e os rumos desta guerra, que está matando centenas de pessoas a cada semana. Temos um dever em relação ao registro da Hisória, sua precisão e integridade”. E foi adiante: “Se os responsáveis pela defesa dos Estados Unidos querem ser vistos como promotores da democracia, eles devem proteger o que os fundadores de sua nação consideravam o valor central: a liberdade de expressão”.

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Mídia, escândalo e mecanismos de controle

Reproduzo artigo de Dennis de Oliveira, publicado no sítio da Revista Fórum:

No dia 13 de agosto, assisti a uma conferência do professor John B. Thompson, professor da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, intitulada “The New Visbility” (A Nova Visibilidade). Thompson é autor de diversas obras que tratam de mídia e cultura, sendo as mais importantes Ideologia e Cultura Moderna, Mídia e Modernidade e O Escândalo Político: Poder e Visibilidade na Era da Mídia (todos da Editora Vozes). O evento foi a aula inaugural do Programa de Pós Graduação de Ciências da Comunicação da Escola de Comunicações e Artes da USP.

A ideia central de Thompson: há uma esfera midiática na qual a visibilidade pública se legitima e, por meio deste processo, controlam-se as ações da esfera política. Diante disto, Thompson conclui que o escândalo político divulgado pela esfera midiática funciona como um elemento de “controle” da esfera política, subjugando-a, a medida que cada vez mais os membros da esfera política dependem da visibilidade construída na esfera midiática para se manterem no poder.

Lembrei-me desta conferência recentemente ao verificar a postura dos meios de comunicação hegemônicos na cobertura da disputa eleitoral no Brasil deste ano. Um fato inequívoco está ocorrendo no país: a despeito da campanha quase que unânime dos meios hegemônicos contra a gestão de Lula, o presidente brasileiro tem tudo para eleger a sua candidata com folga. Mais que isto, o presidente bate recordes de popularidade.

A adesão da mídia hegemônica à candidatura oposicionista, praticamente isentando o ex-governador de São Paulo de qualquer crítica a sua gestão a frente do maior estado do país e, em certos momentos, transparecendo uma postura preconceituosa (como a famosa fala da “articulista” da Folha de S.Paulo chamando os delegados do PSDB de “massas cheirosas”), pouco repercutiu em termos de formação de opinião pública: a cada momento, o presidente Lula bateu recordes de popularidade e as pesquisas indicavam um crescimento vertiginoso nas intenções de voto na candidata Dilma Roussef.

Diante de tal situação, a postura da mídia hegemônica foi, num primeiro momento, de crítica áspera ao candidato da oposição, culpando-o e à sua assessoria mais próxima, pelo fracasso da investida. Cobrava um discurso oposicionista mais duro. Chorava a derrota iminente. E a preocupação redobrou com a constatação de que, junto com o crescimento das intenções de voto na candidata governista, crescia também a preferência na votação em parlamentares vinculadas a ela. Os jornais ainda alardeiam a possibilidade de a candidata governista ganhar a eleição obtendo ainda a maioria absoluta no parlamento o que possibilitaria a realização de mudanças constitucionais.

Daí, então, o sinal vermelho escuro acendeu de vez. Aproveitando um dos últimos recursos da campanha oposicionista – a tal denúncia da quebra de sigilo fiscal – a mídia hegemônica se esforça em transformar o fato em um escândalo sem proporções. Primeiro, tentando ver se tal escândalo poderia mudar o rumo das eleições. Até o momento, as pesquisas demonstram que tem sido ineficaz, as intenções de voto consolidam-se e a eleição caminha para uma definição no primeiro turno.

Agora, uma bateria de denúncias ganha as capas de jornais, com a Folha de S.Paulo à frente – requentando matérias sobre erros da tarifa social de energia elétrica e insistindo na vinculação partidária das quebras de sigilo fiscal. Mais que mudar os rumos da eleição, esta postura da mídia hegemônica está mais próxima a tese de Thompson – o escândalo aparece como forma de demonstração de poder e de dissuasão do grupo governista na sua eventual nova gestão. Isto é, demonstrar que, mesmo com a maioria absoluta, há uma outra esfera de poder que pode destruir a reputação caso seus interesses e os que representam sejam atingidos. O escândalo midiatizado age, conforme afirma Thompson, como mecanismo de controle.

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A Serra o que é de Serra: nada

Reproduzo artigo de Flávio Aguiar, publicado no sítio Carta Maior:

Na mídia européia aumentou o número de referências a que Dilma Roussef pode ganhar no primeiro turno. De Portugal à Alemanha, do Reino Unido à França, comenta-se a possibilidade.

Às vezes isso desagrada. Para comentaristas conservadores, Dilma é uma "estatista" convicta, mais do que Lula. Isso é uma dor de cabeça. O governo Lula tirou o Brasil da crise financeira rapidamente e com pouco dano porque está fazendo o contrário do que os economistas e governos conservadores - sejam social-democratas ou democrata-cristãos - estão pregando e fazendo.

Para montar o fundo de reserva para proteger o euro - e antas, ainda, para impedir que a bancarrota da Grécia arrastasse consigo os bancos alemães e franceses credores, o que faria a Europa inteira virar um Titanic e bater no iceberg de suas insolvências nacionais - tiveram de recorrer ao FMI. Mais: às receitas do FMI. A Europa virou uma gigantesca Argentina do século passado.

E passaram a foice nos direitos de trabalhadores, pensionistas, aposentados, usuários de programas sociais, etc., com danos que serão sentidos nas próximas gerações. Por exemplo: a Itália acabou com um programa chamado "professores de rua", que colocava educadores nas ruas, no sul do país, para convencer jovens a sair da tentaçào da máfia e do narcotráfico e voltar para a escola. O dano vai ser enorme.

A Alemanha cortou a renda que o governo dava às mães solteiras. O dano também vai ser enorme.

E ainda caíram de martelo em cima dos salários, partcularmente do setor público. O dano também vai ser enorme.

Mas saudando números, economistas e comentaristas conservadores deliram porque a Alemanha "dá mostras de recuperação e puxa a economia européia para cima". Claro, graças a exportações bilionárias para a China. O poder aquisitivo interno está evaporado. Aposta-se em que as exportações farão cair o nível de desemprego. Quosque tandem? Até quando? Aí cai-se na reza para que a China continue crescendo, e apostando também no seu mercado interno.

Mas acontece que no meio do caminho tem o Brasil, tem o Brasil no meio do caminho. Adotando uma saída do tipo da Malásia, que no século passado, quando da crise da dívida externa no Sudeste Asiático fez tudo o contrário do que o FMI queria, e saiu-se bem, ao contrário da Indonésia, da Tailândia, até da Coréia do Sul, o Brasil "investiu em investimentos", continuou melhorando salários, subsidiou a linha branca, etc., vocês aí devem conhecer as soluções melhor do que eu, aqui de longe, apesar da internet. O que fazer com o Brasil? Essa é uma pergunta alarmante no cenário internacional para as ortodoxias econômicas.

A esperança era José Serra. Uma virada que reintegrasse o Brasil na ortodoxia mais roxa que pano de quaresma e meia de cardeal. Não está dando certo. Por quê?

Porque Serra nada tem a oferecer. Os comentários da mídia a que aludi acima são expressivos. Porque aí vem a emenda, que para o arraial serrista é pior do que o soneto. A mesma mídia que cautelosamente aponta a possibilidade da vitória de Dilma, assinala que só um fato novo poderia virar o quadro, nem que flosse para jogar tudo para o segundo turno. Mas diz - como no caso da The Economist - esse fato novo só pode ser algo como uma denúncia que vire a mesa. Ou seja, de Serra, na verdade, nada se espera. Como dizia o Barão de Itararé: ali donde nada se espera, é que não sai nada mesmo. O The Guardian chegou a dizer que o programa de TV de Dilma arrasa com o de Serra.

Serra perdeu a voz, a vez, está mal no santinho, na paróquia, etc. Só não perdeu o grito. Dilma disse muito bem que eleição se ganha no voto, não em pesquisa. Mas há quem queira ganhar no grito, já que não tem outro recurso. E com ajuda da gritalhada da mídia conservadora brasileira, claro.

Acontece que, no caso das quebras de sigilo, o tribunal eleitoral não aceitou a denúncia contra Dilma, por falta de provas. Mais cedo ou mais tarde, isso vai prevalecer sobre a gritaria, as conjeturas, as hipóteses, as contra-hipóteses, as teses abstrusas, esse mar de lama em que se tenta sufocar a eleição brasileira e o debate das propostas. Porque um lado - o de Serra - não tem propostas que possa apresentar, só as que não pode apresentar, que envolvem a demolição dos direitos conquistados e exercidos pelo povo brasileiro nos últimos anos.

Querem nos transformar numa nova Grécia.

Esconjuro. A Serra o que é de Serra: nada.

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TV brasileira: sessentona e desregulada

Reproduzo artigo de Venício Lima, publicado no Observatório da Imprensa:

Setembro é o mês de aniversário da televisão no Brasil e 2010 marca os seus 60 anos. Uma idade respeitável, sem dúvida. Ao lado das celebrações, devemos aproveitar o calendário e fazer alguns rápidos registros sobre essa instituição formidável que alcançou importância única em nossa sociedade.

O que de relevante tem acontecido com a televisão brasileira nos últimos anos?

Certamente, ela já viveu melhores dias. Aos 60 anos, há uma significativa queda na sua audiência média – conseqüência, dentre outras causas, das profundas mudanças provocadas pelas novas tecnologias de informação e comunicação (TICs). Esse, por óbvio, não é um problema exclusivamente brasileiro. Entre nós, permanece, há décadas, a liderança da mesma rede, embora seus principais programas e gêneros não alcancem mais as incríveis audiências que tiveram no passado.

Há algum tempo, merece destaque no setor a passagem do sistema analógico para o digital. A decisão sobre qual o modelo de TV digital seria adotado no país sofreu uma guinada de 180 graus entre 2003 e 2006 e a opção pelo modelo japonês, que privilegia a mobilidade e a qualidade da imagem em detrimento da abertura para novos concessionários, acabou prevalecendo. Uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) que contestava a constitucionalidade da decisão foi recentemente julgada improcedente pelo STF.

Atraso de décadas

Um importante avanço, sem dúvida, foi a criação da primeira experiência de TV pública no país – a TV Brasil da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), em 2007. Embora previsto no artigo 223 da Constituição de 1988 para ser complementar aos sistemas privado e estatal de radiodifusão, não havia, até então, sequer uma positivação legal do que seria um sistema público de televisão. Apesar de enfrentar a sistemática e impiedosa hostilidade do sistema privado comercial dominante e de seus aliados na mídia impressa, a TV pública vai aos poucos se consolidando e, espera-se, possa, no médio prazo, se transformar em referência de qualidade para a televisão brasileira.

Há, no entanto, uma área em que continuamos onde sempre estivemos: a regulação do exercício da atividade televisiva.

A procuradora Vera Nusdeo, em belo capítulo intitulado "A lei da selva", no livro organizado pelo jornalista e professor Eugênio Bucci [A TV aos 50, Criticando a Televisão Brasileira no seu Cinqüentenário, Editora da Fundação Perseu Abramo], escreveu:

"Entre nós, a legislação não contribui para formar uma mentalidade, tanto do público como dos concessionários de televisão, baseada no direito à informação do primeiro e na obrigação dos segundos de prestar um serviço de qualidade, respeitando os valores éticos e sociais e não apenas atendendo aos interesses dos anunciantes. Comparada à legislação de outros países, a brasileira é de um laconismo que reflete com perfeição a falta de consciência da relevância do meio televisivo no mundo contemporâneo e, consequentemente, a responsabilidade social subjacente ao exercício dessa atividade".

Dez anos depois, a mesma avaliação pode ser feita, agora com uma agravante: apesar da sua óbvia necessidade, das propostas da 1ª Confecom e de seu atraso de seis décadas (o Código Brasileiro de Telecomunicações é de 1962!), não há sinais convincentes de que algum tipo de regulação do exercício da atividade televisiva esteja a caminho, pelo menos no médio prazo.

Sem regulação

Há poucas semanas comentei neste Observatório que o presidente Lula havia assinado decreto criando uma comissão interministerial para "elaborar estudos e apresentar propostas de revisão do marco regulatório da organização e exploração dos serviços de telecomunicações e de radiofusão".

Apesar de o ministro Franklin Martins, da Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom), haver declarado, à época, que "a idéia é deixar para o próximo governo propostas que permitam avançar numa área crucial e enfrentar os desafios e oportunidades abertos pela era digital na comunicação e pela convergência de mídias", circulou a informação de que o próprio presidente Lula queria enviar ao Congresso Nacional, ainda em seu governo, a proposta de marco regulatório.

Todavia, a serem verdadeiras as últimas notícias divulgadas na grande mídia sobre o assunto, "o governo desistiu de encaminhar ao Congresso Nacional, logo após as eleições, projeto de nova regulamentação das comunicações no país (...) isso, será uma tarefa do próximo governo". (cf. Luiz Carlos Azedo, "Brasília DF", Correio Braziliense, 5/9/2010, pág. 7).

Como bem disse a procuradora Vera Nusdeo, dez anos atrás, no capítulo já citado:

"No Brasil, o Estado se limita ao seu papel de conceder canais. Fora isso, o que impera, desde sempre, é a total falta de regulamentação [da atividade televisiva], talvez por medo de que qualquer discussão sobre o assunto possa dar a impressão de censura e obscurantismo."

A televisão brasileira chega, portanto, aos seus 60 anos, da mesma forma que tem estado em praticamente toda a sua história: sem um marco regulatório que discipline sua atividade.

Convenhamos, essa não é uma condição a ser celebrada.

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