Por Altamiro Borges
O jornal O Globo noticia hoje (22) que tramita nos EUA um projeto de lei de censura à internet. Batizado de Combating Online Infringement and Counterfeits Act, ele dá poder ao governo para mandar bloquear sítios e domínios. “E não é só essa a ameaça à privacidade na rede mundial. Segundo o The New York Times, diretores do FBI já se reuniram com executivos da Google e Facebook, entre outras empresas, para discutir uma proposta que torne mais fácil grampear internautas”.
O projeto em tramitação visa reforçar uma lei de 1994, chamada de Communications Assistance for Law Enforcement Act. Ela define que as operadoras de telecomunicações e os provedores de internet e banda larga devem cumprir as ordens judiciais que exijam escutas telefônicas. Agora, o FBI quer estender o controle também às gigantes do setor, como Google e Facebook. A desculpa usada é o da defesa do direito autoral, mas o intento evidente é censurar o conteúdo na internet.
Censura prévia na rede
De autoria do senador democrata Patrick Leahy, o projeto de lei está recebendo duras críticas das entidades defensoras da liberdade de expressão. A Electronic Frontier Foundation (EFF) chegou a compilar uma lista dos sítios e blogs que terão de sair da rede se ele for aprovado. Segundo a EFF, apesar da repressão já existente nos EUA, hoje ainda há um equilíbrio entre “as punições devido ao copyright violado e à liberdade dos sites de inovar”. Com a nova lei, os grupos de defesa da liberdade na internet avaliam que será instaurada de vez a censura prévia na rede.
Brian Contos, diretor de Estratégia de Segurança Global e Gestão de Risco da McAfee, afirmou ao jornal O Globo que o projeto gera fortes temores. “Há sempre uma preocupação com o que é censurado agora e o que será censurado depois”. Já para David Post, professor da Universidade de Temple, “se virar lei, o projeto criará um perigoso precedente com sérias conseqüências em potencial para a liberdade de expressão e a liberdade da internet global”. Isto porque o projeto prevê também o bloqueio unilateral de sítios e domínios produzidos fora dos EUA.
AI-5 digital do senador tucano
O projeto de lei em tramitação nos EUA evidencia que a liberdade na internet corre sérios riscos. As poderosas empresas do setor querem restringir seu uso por motivos econômicos, para coibir a livre circulação de conteúdo na rede; já os governos e legisladores autoritários tentam controlar a internet por motivos políticos, para impedir a pluralidade e diversidade informativas. Não é para menos que também no Brasil tramita, de forma sorrateira, um projeto para censurar a internet.
De autoria do senador Eduardo Azeredo, do PSDB de Minas Gerais, o projeto de lei (PL) 84/99 representa duro golpe na liberdade de expressão. Tanto é que ele já foi batizado de AI-5 digital, numa referência ao ato institucional que os generais baixaram em 1968 endurecendo ainda mais a ditadura. Em outubro, em pleno embate eleitoral, o PL foi aprovado às pressas, numa manobra legislativa na calada da noite, em duas comissões da Câmara Federal.
Como aponta Luiz Carvalho, num artigo ao sítio da CUT, o projeto do senador tucano viola os direitos civis, transfere à sociedade a responsabilidade sobre a segurança na internet que deveria ser das empresas, dificulta a inclusão digital e trata como crime sujeito à prisão de até três anos a transferência ou fornecimento não autorizado de dados – o que pode incluir desde baixar músicas até a mera citação de trechos de uma matéria num blog. Entre as aberrações do PL, ele pontua:
Quebra de sigilo
Ironicamente, o PL do parlamentar ligado ao partido que se diz vítima de uma suposta quebra de sigilo nas eleições, determina que os dados dos internautas possam ser divulgados ao Ministério Público ou à polícia sem a necessidade de uma ordem judicial. Na prática, será possível quebrar o sigilo de qualquer pessoa sem autorização da Justiça, ao contrário do que diz a Constituição.
Internet para ricos
Azeredo quer ainda que os provedores de acesso à Internet e de conteúdo (serviços de e-mail , publicadores de blog e o Google) guardem o registro de toda a navegação de cada usuário por três anos, com a origem, a hora e a data da conexão. Além de exemplo de violação à privacidade, o projeto deixa claro: para os tucanos, internet é para quem pode pagar, já que nas redes sem fio que algumas cidades já estão implementando para aumentar a inclusão digital, várias pessoas navegam com o mesmo número de IP (o endereço na internet).
Ajudinha aos banqueiros
Um dos argumentos do deputado ficha suja reeleito em 2010 – responde a ação penal por peculato e lavagem ou ocultação de bem – é que o rastreamento das pessoas que utilizam a internet ajudará a acabar com as fraudes bancárias. Seria mais eficaz que os bancos fossem obrigados a adotar uma assinatura digital nas transações para todos os clientes. Mas isso geraria mais custos aos bancos e o parlamentar não quer se indispor com eles.
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segunda-feira, 22 de novembro de 2010
Meirelles ainda quer mais autonomia
Por Altamiro Borges
Ávida por interferir na montagem do ministério do governo Dilma Rousseff, a mídia oligárquica parece preocupada com o futuro do atual presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Há boatos de que a presidenta eleita não o manterá no cargo. Os tais “agentes do mercado”, que têm espaço privilegiado nos veículos de comunicação, dizem temer pela “estabilidade da economia” – na verdade, eles temem por seus lucros exorbitantes e criminosos na especulação financeira.
Diante a boataria, Henrique Meirelles tentou um golpe de mestre, mas parece que se deu mal. Ele teria dito à imprensa que foi convidado a permanecer na função, mas que “impôs condições”. A principal seria maior autonomia do Banco Central. É muita petulância. Hoje, a instituição já goza de uma baita autonomia. Nos últimos oito anos, o BC manteve o tripé neoliberal da política macroeconômica – com juros elevados, superávit primário e libertinagem cambial.
O rentismo do BC
Essa autonomia já beira a irresponsabilidade. Em plena crise capitalista mundial, contrariando o próprio presidente, o BC elevou os juros, arrochando o crédito. Diante da atual guerra comercial, deflagrada pelos EUA, ele mantém os câmbio flutuante, o que penaliza a produção interna e gera déficits comerciais. Meirelles, que não nega seu passado de banqueiro, de ex-presidente do Bank of Boston, insiste na tese da autonomia operacional do BC, quando na maior parte das economias do mundo o movimento é exatamente o contrário – disciplinando o tal “mercado”.
A entrevista do presidente do BC – que agora diz que nunca deu – causou mal-estar na equipe de transição. “A presidente eleita se irritou com Henrique Meirelles por ele ter divulgado que impõe condições para ficar no Banco Central, mas que não descarta negociar a sua permanência por um período tampão. De acordo com auxiliares de Dilma, Meirelles perdeu ‘muitos pontos’ e deve ‘baixar o tom’ para que os dois possam negociar sua posição no futuro governo”, relata a Folha.
Desenvolvimentistas X neoliberais
Até agora, Dilma confirmou apenas a manutenção de Guido Mantega no Ministério da Fazenda. As discordâncias entre Mantega, mais ligado às teses desenvolvimentistas, e Meirelles, vinculado à ortodoxia neoliberal, podem agora resultar na exclusão do atual presidente do BC – o que seria uma excelente sinalização da presidenta Dilma. Os especuladores ficarão ouriçados; a mídia oligárquica fará escarcéu; mas o país só tem a ganhar em desenvolvimento e maior justiça.
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Ávida por interferir na montagem do ministério do governo Dilma Rousseff, a mídia oligárquica parece preocupada com o futuro do atual presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Há boatos de que a presidenta eleita não o manterá no cargo. Os tais “agentes do mercado”, que têm espaço privilegiado nos veículos de comunicação, dizem temer pela “estabilidade da economia” – na verdade, eles temem por seus lucros exorbitantes e criminosos na especulação financeira.
Diante a boataria, Henrique Meirelles tentou um golpe de mestre, mas parece que se deu mal. Ele teria dito à imprensa que foi convidado a permanecer na função, mas que “impôs condições”. A principal seria maior autonomia do Banco Central. É muita petulância. Hoje, a instituição já goza de uma baita autonomia. Nos últimos oito anos, o BC manteve o tripé neoliberal da política macroeconômica – com juros elevados, superávit primário e libertinagem cambial.
O rentismo do BC
Essa autonomia já beira a irresponsabilidade. Em plena crise capitalista mundial, contrariando o próprio presidente, o BC elevou os juros, arrochando o crédito. Diante da atual guerra comercial, deflagrada pelos EUA, ele mantém os câmbio flutuante, o que penaliza a produção interna e gera déficits comerciais. Meirelles, que não nega seu passado de banqueiro, de ex-presidente do Bank of Boston, insiste na tese da autonomia operacional do BC, quando na maior parte das economias do mundo o movimento é exatamente o contrário – disciplinando o tal “mercado”.
A entrevista do presidente do BC – que agora diz que nunca deu – causou mal-estar na equipe de transição. “A presidente eleita se irritou com Henrique Meirelles por ele ter divulgado que impõe condições para ficar no Banco Central, mas que não descarta negociar a sua permanência por um período tampão. De acordo com auxiliares de Dilma, Meirelles perdeu ‘muitos pontos’ e deve ‘baixar o tom’ para que os dois possam negociar sua posição no futuro governo”, relata a Folha.
Desenvolvimentistas X neoliberais
Até agora, Dilma confirmou apenas a manutenção de Guido Mantega no Ministério da Fazenda. As discordâncias entre Mantega, mais ligado às teses desenvolvimentistas, e Meirelles, vinculado à ortodoxia neoliberal, podem agora resultar na exclusão do atual presidente do BC – o que seria uma excelente sinalização da presidenta Dilma. Os especuladores ficarão ouriçados; a mídia oligárquica fará escarcéu; mas o país só tem a ganhar em desenvolvimento e maior justiça.
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Conferência do Ipea debate desenvolvimento
Reproduzo artigo de Marco Aurélio Weissheimer, publicado no sítio Carta Maior:
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) promove, entre os dias 24 e 26 de novembro, em Brasília, a 1ª Conferência do Desenvolvimento (Code), um encontro destinado a discutir planejamento e estratégias de desenvolvimento para o Brasil. Será uma conferência diferente das tradicionais lembrando um pouco o formato do Fórum Social Mundial. Um espaço de 10 mil metros quadrados foi construído no canteiro central da Esplanada dos Ministérios (em frente à Catedral de Brasília) para a Code.
Durante os três dias, serão nove painéis temáticos sobre o desenvolvimento, 88 oficinas, 50 lançamentos de livros, vídeos, exposições e shows artísticos e culturais. São esperados mais de 200 palestrantes e debatedores, entre conselheiros, diretores e técnicos de planejamento e pesquisa do instituto e acadêmicos de autoridades de todas as regiões do país. Até sexta-feira, já havia cerca de 4 mil inscritos para o encontro.
Possivelmente, será um dos maiores eventos sobre o tema já realizados no Brasil, diz Marcio Pochmann, presidente do Ipea. A Code se assemelha às grandes conferências temáticas realizadas no governo Lula, explica Pochmann, com a diferença de que não tratará de apenas um tema. Ao tratar da questão do desenvolvimento, estaremos discutindo estratégias e políticas sobre saúde, educação, ciência e tecnologia, entre outras áreas.
O objetivo do encontro é criar um espaço nacional de debates no coração do Brasil, no momento em que o país volta a discutir planejamento e estratégias de desenvolvimento. Esses debates estarão organizados em torno de sete grandes eixos temáticos do desenvolvimento definidos pelo Ipea: inserção internacional soberana; macroeconomia para o desenvolvimento; fortalecimento do Estado, das instituições e da democracia; estrutura tecnoprodutiva integrada e regionalmente articulada; infraestrutura econômica, social e urbana; proteção social, garantia de direitos e geração de oportunidades; e sustentabilidade ambiental.
“Para nós do Ipea”, diz Pochmann, “é uma mudança institucional de grande porte”. “Até aqui, historicamente, os nossos debates sempre foram mais internos. Agora, estamos nos abrindo ao público e convidando representantes da sociedade a debater o presente e o futuro do país”. Essa novidade apareceu já na organização do evento, que conta com o apoio de 45 instituições da sociedade civil, entre sindicatos de trabalhadores e de empresários, entidades de classe, instituições de pesquisa e outras organizações.
O debate de fundo sobre o desenvolvimento do Brasil, observa o presidente do Ipea, ficou congelado durante cerca de 25 anos, a partir das crises que o país enfrentou nas décadas de 80 e de 90. Entre 1930 e 1980, assinala, o Brasil teve um grande salto de crescimento que não foi capaz, contudo, de enfrentar o problema da desigualdade social. A crise da dívida, a partir da década de 80, acabou por desfazer uma maioria política que até então governava o país. Nesse período, a economia brasileira que chegou a ser a oitava do mundo caiu para o 14° lugar. “A desigualdade, que já era grande, ficou congelada”, assinala Pochmann. E acrescenta:
“Agora, na primeira década do século 21, tivemos uma reorganização de uma maioria política em torno dos dois mandatos do presidente Lula. Com ela, abriu-se a possibilidade de um novo padrão de desenvolvimento capaz de combinar crescimento econômico, redução da desigualdade social e sustentabilidade ambiental”.
Os desafios e oportunidades colocados por esse novo padrão de desenvolvimento serão o tema central do encontro de três dias em Brasília. “Estaremos discutindo temas que representam gargalos e entraves ao nosso desenvolvimento. Alguns carregamos do passado, outros são temas do futuro”, resume Pochmann. Entre os temas do passado, destaca-se, por exemplo, o perfil da economia brasileira, ainda preso à produção e exportação de bens primários. “Já sabemos que esse modelo não é capaz de gerar empregos de qualidade, educação de qualidade e melhores salários. O Brasil precisa mudar sua relação com o mundo e isso passa, entre outras coisas, pela integração regional, por investimentos pesados em educação, epelo aprimoramento da nossa estrutura de Defesa que hoje não tem condições de defender todas as nossas fronteiras e recursos naturais”.
Em relação aos temas do futuro, Pochmann destaca a necessidade da refundação do Estado brasileiro, especialmente no que diz respeito ao seu funcionamento. Neste debate, a Reforma Tributária ocupa um lugar central. O Brasil precisa mudar o atual padrão regressivo de tributação, onde quem tem menos acaba pagando mais. Essa mudança é condição básica também para a implementação de investimentos massivos em educação, sem os quais o país não desatará os nós que ainda o amarram a um passado de desigualdades econômicas, sociais e regionais.
O presidente do Ipea também chama a atenção para a mudança do perfil demográfico brasileiro, registrada na última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e que deve ser confirmada no Censo que está sendo realizado este ano. A partir de 2030, o Brasil deve ter regressão populacional, ou seja, o número de pessoas que vão nascer deve ser menor do que o número de pessoas que vão morrer. Essa tendência, destaca Pochmann, é diferente das previsões que eram feitas para o Brasil. “O cenário que temos pela frente é de redução da população jovem e de alteração radical da estrutura familiar. Em pouco tempo, teremos que discutir políticas de estímulo à natalidade”.
Outro ponto fundamental neste debate, destaca ainda Pochmann, é o da transição do trabalho material para o trabalho imaterial. “O conhecimento passa a ser cada vez mais estratégico, exigindo uma educação continuada, uma educação para toda a vida. As grandes empresas já perceberam isso e passaram a investir pesadamente em universidades corporativas”. O debate sobre a melhoria do sistema educacional brasileiro deverá enfrentar esse tema que hoje não está elaborado. Pochmann resume assim um dos principais problemas relacionados a esse tema:
Hoje, no Brasil, os filhos dos pobres estão condenados ao ingresso no mercado de trabalho muito cedo, o que implica, muitas vezes, o abandono da escola, quando não a combinação de brutais jornadas de atividades de 16 horas por dia (8 horas de trabalho, 2 a 4 horas de deslocamentos e 4 horas de freqüência escolar). A aprendizagem de qualidade torna-se muito distante nessas condições. Os filhos dos ricos, por sua vez, permanecem mais tempo na escola, ingressam mais tardiamente no mercado de trabalho e acabam ocupando os principais postos, com maior remuneração e status social, enquanto os filhos dos pobres seguem disputando a base da pirâmide do mercado de trabalho, transformado num mecanismo de reprodução das desigualdades no país.
Esse é um dos principais entraves para que o novo modelo de desenvolvimento que se quer implementar no Brasil alie crescimento econômico com justiça social. E esse será também um dos pontos centrais da conferência que ocorrerá esta semana em Brasília.
Maiores informações sobre a conferência, como a programação completa do encontro, podem ser acessadas no site do evento. As principais conferências serão transmitidas ao vivo pela internet.
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O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) promove, entre os dias 24 e 26 de novembro, em Brasília, a 1ª Conferência do Desenvolvimento (Code), um encontro destinado a discutir planejamento e estratégias de desenvolvimento para o Brasil. Será uma conferência diferente das tradicionais lembrando um pouco o formato do Fórum Social Mundial. Um espaço de 10 mil metros quadrados foi construído no canteiro central da Esplanada dos Ministérios (em frente à Catedral de Brasília) para a Code.
Durante os três dias, serão nove painéis temáticos sobre o desenvolvimento, 88 oficinas, 50 lançamentos de livros, vídeos, exposições e shows artísticos e culturais. São esperados mais de 200 palestrantes e debatedores, entre conselheiros, diretores e técnicos de planejamento e pesquisa do instituto e acadêmicos de autoridades de todas as regiões do país. Até sexta-feira, já havia cerca de 4 mil inscritos para o encontro.
Possivelmente, será um dos maiores eventos sobre o tema já realizados no Brasil, diz Marcio Pochmann, presidente do Ipea. A Code se assemelha às grandes conferências temáticas realizadas no governo Lula, explica Pochmann, com a diferença de que não tratará de apenas um tema. Ao tratar da questão do desenvolvimento, estaremos discutindo estratégias e políticas sobre saúde, educação, ciência e tecnologia, entre outras áreas.
O objetivo do encontro é criar um espaço nacional de debates no coração do Brasil, no momento em que o país volta a discutir planejamento e estratégias de desenvolvimento. Esses debates estarão organizados em torno de sete grandes eixos temáticos do desenvolvimento definidos pelo Ipea: inserção internacional soberana; macroeconomia para o desenvolvimento; fortalecimento do Estado, das instituições e da democracia; estrutura tecnoprodutiva integrada e regionalmente articulada; infraestrutura econômica, social e urbana; proteção social, garantia de direitos e geração de oportunidades; e sustentabilidade ambiental.
“Para nós do Ipea”, diz Pochmann, “é uma mudança institucional de grande porte”. “Até aqui, historicamente, os nossos debates sempre foram mais internos. Agora, estamos nos abrindo ao público e convidando representantes da sociedade a debater o presente e o futuro do país”. Essa novidade apareceu já na organização do evento, que conta com o apoio de 45 instituições da sociedade civil, entre sindicatos de trabalhadores e de empresários, entidades de classe, instituições de pesquisa e outras organizações.
O debate de fundo sobre o desenvolvimento do Brasil, observa o presidente do Ipea, ficou congelado durante cerca de 25 anos, a partir das crises que o país enfrentou nas décadas de 80 e de 90. Entre 1930 e 1980, assinala, o Brasil teve um grande salto de crescimento que não foi capaz, contudo, de enfrentar o problema da desigualdade social. A crise da dívida, a partir da década de 80, acabou por desfazer uma maioria política que até então governava o país. Nesse período, a economia brasileira que chegou a ser a oitava do mundo caiu para o 14° lugar. “A desigualdade, que já era grande, ficou congelada”, assinala Pochmann. E acrescenta:
“Agora, na primeira década do século 21, tivemos uma reorganização de uma maioria política em torno dos dois mandatos do presidente Lula. Com ela, abriu-se a possibilidade de um novo padrão de desenvolvimento capaz de combinar crescimento econômico, redução da desigualdade social e sustentabilidade ambiental”.
Os desafios e oportunidades colocados por esse novo padrão de desenvolvimento serão o tema central do encontro de três dias em Brasília. “Estaremos discutindo temas que representam gargalos e entraves ao nosso desenvolvimento. Alguns carregamos do passado, outros são temas do futuro”, resume Pochmann. Entre os temas do passado, destaca-se, por exemplo, o perfil da economia brasileira, ainda preso à produção e exportação de bens primários. “Já sabemos que esse modelo não é capaz de gerar empregos de qualidade, educação de qualidade e melhores salários. O Brasil precisa mudar sua relação com o mundo e isso passa, entre outras coisas, pela integração regional, por investimentos pesados em educação, epelo aprimoramento da nossa estrutura de Defesa que hoje não tem condições de defender todas as nossas fronteiras e recursos naturais”.
Em relação aos temas do futuro, Pochmann destaca a necessidade da refundação do Estado brasileiro, especialmente no que diz respeito ao seu funcionamento. Neste debate, a Reforma Tributária ocupa um lugar central. O Brasil precisa mudar o atual padrão regressivo de tributação, onde quem tem menos acaba pagando mais. Essa mudança é condição básica também para a implementação de investimentos massivos em educação, sem os quais o país não desatará os nós que ainda o amarram a um passado de desigualdades econômicas, sociais e regionais.
O presidente do Ipea também chama a atenção para a mudança do perfil demográfico brasileiro, registrada na última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e que deve ser confirmada no Censo que está sendo realizado este ano. A partir de 2030, o Brasil deve ter regressão populacional, ou seja, o número de pessoas que vão nascer deve ser menor do que o número de pessoas que vão morrer. Essa tendência, destaca Pochmann, é diferente das previsões que eram feitas para o Brasil. “O cenário que temos pela frente é de redução da população jovem e de alteração radical da estrutura familiar. Em pouco tempo, teremos que discutir políticas de estímulo à natalidade”.
Outro ponto fundamental neste debate, destaca ainda Pochmann, é o da transição do trabalho material para o trabalho imaterial. “O conhecimento passa a ser cada vez mais estratégico, exigindo uma educação continuada, uma educação para toda a vida. As grandes empresas já perceberam isso e passaram a investir pesadamente em universidades corporativas”. O debate sobre a melhoria do sistema educacional brasileiro deverá enfrentar esse tema que hoje não está elaborado. Pochmann resume assim um dos principais problemas relacionados a esse tema:
Hoje, no Brasil, os filhos dos pobres estão condenados ao ingresso no mercado de trabalho muito cedo, o que implica, muitas vezes, o abandono da escola, quando não a combinação de brutais jornadas de atividades de 16 horas por dia (8 horas de trabalho, 2 a 4 horas de deslocamentos e 4 horas de freqüência escolar). A aprendizagem de qualidade torna-se muito distante nessas condições. Os filhos dos ricos, por sua vez, permanecem mais tempo na escola, ingressam mais tardiamente no mercado de trabalho e acabam ocupando os principais postos, com maior remuneração e status social, enquanto os filhos dos pobres seguem disputando a base da pirâmide do mercado de trabalho, transformado num mecanismo de reprodução das desigualdades no país.
Esse é um dos principais entraves para que o novo modelo de desenvolvimento que se quer implementar no Brasil alie crescimento econômico com justiça social. E esse será também um dos pontos centrais da conferência que ocorrerá esta semana em Brasília.
Maiores informações sobre a conferência, como a programação completa do encontro, podem ser acessadas no site do evento. As principais conferências serão transmitidas ao vivo pela internet.
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Mídia é a pauta da vez na América Latina
Reproduzo artigo de Marcelo Salles, publicado no sítio Opera Mundi:
Nossa América dá sinais, cada vez mais constantes, da necessidade de rever o modelo de comunicação a que estamos submetidos. Primeiro foi a Venezuela, que impulsionou a criação de uma televisão multi-estatal, a Telesur, em parceria com Cuba, Argentina e Uruguai. A medida foi tomada logo após a tentativa de golpe de Estado contra o presidente Chávez, em 2002 – golpe esse que contou com apoio decisivo das corporações da mídia privada venezuelana.
Em 2007, o Brasil cria a EBC (Empresa Brasileira de Comunicação), que une a Radiobrás e a TV Educativa do Rio de Janeiro num projeto de comunicação pública – ainda imperfeito, mas com capacidade suficiente incomodar, a ponto de jornais neoliberais dedicarem editoriais exigindo o fim da iniciativa.
No ano seguinte foi a vez da Bolívia criar um jornal estatal, El Cambio, de formato tablóide e preço popular. Inicialmente com 5 mil exemplares, dois anos depois o jornal boliviano já alcançou o primeiro lugar em vendas e desbancou os tradicionais La Prensa e El Razón.
A Argentina enfrenta o monopólio dos grupos privados e o governo Kirchner leva adiante a Ley de Medios, que atinge duramente as corporações privadas.
Ainda no Cone Sul, no último dia 14 de outubro o ministro da Informação e Comunicação do Paraguai, Augusto dos Santos, anunciou a circulação de um jornal semanal público para informar a população sobre as políticas do Estado. O nome da publicação será Infogob, terá alcance nacional e distribuição gratuita.
Santos disse que o objetivo do semanário é divulgar informações das secretarias, ministérios, entes públicos e demais poderes do Estado a serviço da cidadania. Segundo o ministro paraguaio, o Infogob apresentará opiniões e pontos de vista externos ao olhar governamental para que exista um contraste permanente dos demais, com interesse cidadão.
A mudança necessária no paradigma das comunicações não pode ter apenas caráter técnico. As novas ferramentas, as mídias sociais, sites e blogs da Internet são importantes, mas não são suficientes. As grandes transformações que precisam acontecer em Nuestra América necessitam de uma revolução na forma de comunicar. Não estou falando do momento eleitoral, em que essas ferramentas podem jogar um papel decisivo. Em termos de mudança de consciência, por exemplo, ou de erradicação de preconceitos, ou de respeito aos direitos humanos, nada vai mudar se as corporações privadas de mídia continuarem donas de oligopólios a serviço da exploração dos povos.
Em outras palavras: enquanto vigorar a propriedade cruzada – mesmo grupo controlando jornal, rádio e televisão na mesma praça; enquanto meia dúzia de empresas capitalistas forem donas de mais de 90% da audiência e da maior parte das verbas públicas publicitárias; e enquanto esses grupos continuarem, como no Brasil, a ter mais influência junto aos parlamentares do que os cidadãos que os elegeram.
Democratizar televisão, rádio e jornais é importante porque a mídia é, hoje, a instituição com maior poder de produção e reprodução de subjetividades. Ou seja, a mídia determina formas de sentir, de pensar e de agir dos indivíduos e, conseqüentemente, influencia posicionamentos da sociedade como um todo. Se divulga mensagens de ódio, se divulga informações distorcidas, então teremos um povo irracional e desinformado, caldo de cultura perfeito para a violência. Por outro lado, se a mídia divulga informações corretas e mensagens de respeito ao outro, então será mais provável criarmos uma sociedade mais harmônica.
Comparação
O governo do presidente Lula seguramente avançou mais que o anterior, pois além da TV Brasil está em curso o Plano Nacional de Banda Larga, que pretende universalizar o acesso à Internet de alta velocidade. Entretanto, em comparação com nossos vizinhos, estamos atrasados. O Brasil perdeu sua grande chance com o decreto da TV Digital, quando era possível ter investido na multi-programação e fomentado a participação de novos atores no cenário da radiodifusão.
Estamos atrasados não apenas por conta das dificuldades do governo atual. Toda a esquerda brasileira tem enorme dificuldade de compreender a importância dos meios de comunicação de massa para a construção de uma sociedade verdadeiramente democrática. Partidos políticos, estudantes, sindicalistas, integrantes de movimentos sociais organizados, acadêmicos, artistas. A tendência ainda é acreditar que se pode negociar com as corporações privadas, em vez de modificar a atual estrutura – o que, diga-se de passagem, seria apenas cumprir a Constituição de 1988.
A história recente do Brasil nos oferece incansáveis provas de que essa crença não passa de uma ilusão, incluindo o fato de as últimas duas eleições terem sido levadas para o segundo turno, sem falar da famosa manipulação do debate em 1989. Vamos ver se a nossa esquerda acorda, e se acorda a tempo.
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Nossa América dá sinais, cada vez mais constantes, da necessidade de rever o modelo de comunicação a que estamos submetidos. Primeiro foi a Venezuela, que impulsionou a criação de uma televisão multi-estatal, a Telesur, em parceria com Cuba, Argentina e Uruguai. A medida foi tomada logo após a tentativa de golpe de Estado contra o presidente Chávez, em 2002 – golpe esse que contou com apoio decisivo das corporações da mídia privada venezuelana.
Em 2007, o Brasil cria a EBC (Empresa Brasileira de Comunicação), que une a Radiobrás e a TV Educativa do Rio de Janeiro num projeto de comunicação pública – ainda imperfeito, mas com capacidade suficiente incomodar, a ponto de jornais neoliberais dedicarem editoriais exigindo o fim da iniciativa.
No ano seguinte foi a vez da Bolívia criar um jornal estatal, El Cambio, de formato tablóide e preço popular. Inicialmente com 5 mil exemplares, dois anos depois o jornal boliviano já alcançou o primeiro lugar em vendas e desbancou os tradicionais La Prensa e El Razón.
A Argentina enfrenta o monopólio dos grupos privados e o governo Kirchner leva adiante a Ley de Medios, que atinge duramente as corporações privadas.
Ainda no Cone Sul, no último dia 14 de outubro o ministro da Informação e Comunicação do Paraguai, Augusto dos Santos, anunciou a circulação de um jornal semanal público para informar a população sobre as políticas do Estado. O nome da publicação será Infogob, terá alcance nacional e distribuição gratuita.
Santos disse que o objetivo do semanário é divulgar informações das secretarias, ministérios, entes públicos e demais poderes do Estado a serviço da cidadania. Segundo o ministro paraguaio, o Infogob apresentará opiniões e pontos de vista externos ao olhar governamental para que exista um contraste permanente dos demais, com interesse cidadão.
A mudança necessária no paradigma das comunicações não pode ter apenas caráter técnico. As novas ferramentas, as mídias sociais, sites e blogs da Internet são importantes, mas não são suficientes. As grandes transformações que precisam acontecer em Nuestra América necessitam de uma revolução na forma de comunicar. Não estou falando do momento eleitoral, em que essas ferramentas podem jogar um papel decisivo. Em termos de mudança de consciência, por exemplo, ou de erradicação de preconceitos, ou de respeito aos direitos humanos, nada vai mudar se as corporações privadas de mídia continuarem donas de oligopólios a serviço da exploração dos povos.
Em outras palavras: enquanto vigorar a propriedade cruzada – mesmo grupo controlando jornal, rádio e televisão na mesma praça; enquanto meia dúzia de empresas capitalistas forem donas de mais de 90% da audiência e da maior parte das verbas públicas publicitárias; e enquanto esses grupos continuarem, como no Brasil, a ter mais influência junto aos parlamentares do que os cidadãos que os elegeram.
Democratizar televisão, rádio e jornais é importante porque a mídia é, hoje, a instituição com maior poder de produção e reprodução de subjetividades. Ou seja, a mídia determina formas de sentir, de pensar e de agir dos indivíduos e, conseqüentemente, influencia posicionamentos da sociedade como um todo. Se divulga mensagens de ódio, se divulga informações distorcidas, então teremos um povo irracional e desinformado, caldo de cultura perfeito para a violência. Por outro lado, se a mídia divulga informações corretas e mensagens de respeito ao outro, então será mais provável criarmos uma sociedade mais harmônica.
Comparação
O governo do presidente Lula seguramente avançou mais que o anterior, pois além da TV Brasil está em curso o Plano Nacional de Banda Larga, que pretende universalizar o acesso à Internet de alta velocidade. Entretanto, em comparação com nossos vizinhos, estamos atrasados. O Brasil perdeu sua grande chance com o decreto da TV Digital, quando era possível ter investido na multi-programação e fomentado a participação de novos atores no cenário da radiodifusão.
Estamos atrasados não apenas por conta das dificuldades do governo atual. Toda a esquerda brasileira tem enorme dificuldade de compreender a importância dos meios de comunicação de massa para a construção de uma sociedade verdadeiramente democrática. Partidos políticos, estudantes, sindicalistas, integrantes de movimentos sociais organizados, acadêmicos, artistas. A tendência ainda é acreditar que se pode negociar com as corporações privadas, em vez de modificar a atual estrutura – o que, diga-se de passagem, seria apenas cumprir a Constituição de 1988.
A história recente do Brasil nos oferece incansáveis provas de que essa crença não passa de uma ilusão, incluindo o fato de as últimas duas eleições terem sido levadas para o segundo turno, sem falar da famosa manipulação do debate em 1989. Vamos ver se a nossa esquerda acorda, e se acorda a tempo.
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Retomada da indústria naval e a soberania
Reproduzo artigo de Beto Almeida, integrante da junta diretiva da Telesur:
Marinheiro, marinheiro,
Quero ver você no mar
Eu também sou marinheiro
Eu também sei navegar
Geraldo Vandré
Muitas lições podem ser tiradas da retomada da indústria naval no Brasil que nesta sexta-feira lançou, no Estaleiro Mauá, em Niterói, mais uma grande embarcação ao mar, o navio Sérgio Buarque de Hollanda. Mas, certamente, deve-se discutir com prioridade que não é possível pensar um Brasil soberano sem uma indústria naval desenvolvida.
Para aqueles que, até mesmo nas fileiras da esquerda, chegaram a dizer que os candidatos presidenciais eram todos iguais, eis aqui uma estupenda diferença: enquanto os neoliberais conseguiram demolir e paralisar uma das mais expandidas indústrias navais do mundo, a brasileira - fazendo com que desde 2000 não se produzissem mais navios aqui - o governo Lula acaba por transformar o setor em fonte geradora de emprego, desenvolvimento tecnológico, promoção de justiça social e, especialmente, alavanca indispensável para se alcançar a soberania.
O que pensar de um país com costa superior a 8 mil e 500 quilômetros sem uma indústria naval desenvolvida? Eis aí a tarefa dos neoliberais que se ocuparam de destruir o que havia sido levantado na Era Vargas em particular. O Brasil chegou a ter a sua empresa estatal no setor, a Loyd Brasileiro, e a ocupar uma posição de destaque no cenário mundial da construção naval. A própria navegação de cabotagem teve expressivo desenvolvimento e nem podia ser diferente. Vargas chegou a criar a frota do álcool e do petróleo.
Com o neoliberalismo dos anos 90 tem início a demolição devastadora. Ela alcançou todos os pilares estruturais do transporte, seja ferroviário (privatização da Rede Ferroviária), aéreo (privatização da Embraer) e o naval, com a privatização do Loyd Brasileiro seguida de uma programada desindustrialização. O desemprego foi dramático, generalizado.
Organizadores de derrotas
Demolir a indústria naval é organizar a dependência, é organizar a derrota de uma nação. Mais que isto, é programar sua incapacitação para a defesa, pois sem indústria naval não há como ter também uma Marinha equipada à altura dos potenciais de riqueza que devem ser defendidos. As autoridades de defesa já indicaram, em numerosas oportunidades, a situação de desarmamento em que se encontra e ainda se encontra a Marina Brasileira, agora em fase de recuperação. É certo que ainda falta muito, porém, recuperar a indústria naval é condição indispensável para organizar uma capacidade de defesa do porte das magníficas riquezas que o petróleo pré-sal representa. Aí está o desafio. Nesta linha de raciocínio podemos concluir que uma indústria naval recuperada é fator que se junta à Nova Estratégia de Defesa Nacional.
Há alguns anos, antes da divulgação da existência do petróleo pré-sal, a imprensa noticiou a existência de um estranho relatório da CIA indicando que as plataformas da Petrobrás em alto-mar eram muito vulneráveis a atentados terroristas. Seria um relatório ou seria uma espécie torta de ameaça, ainda que velada? Agora, vemos a Quarta Frota dos EUA ser retomada e se insinuar pelos mares do sull depois de décadas paralisada. Junte-se a isto, a discussão recente na OTAN sobre a mudança de sua doutrina militar, cujo raio de operação deverá incluir o Atlântico Sul.
De fato, na situação atual a Marinha não tem ainda as condições para realizar uma defesa efetiva de todo o potencial de riquezas contido na plataforma continental brasileira. Esta área, agora ampliada para 350 milhas, também chamada Amazônia Azul, possui, além de petróleo, gigantescas reservas de biodiversidade sempre desafiando nossas universidades e os centros de tecnologia da Marinha para o desenvolvimento das tecnologias apropriadas ao seu adequado aproveitamento em favor do nosso povo.
Em resposta à proposta de intervencionismo ampliado da OTAN, o governo brasileiro, pela voz do Ministro da Defesa, Nelson Jobim, já afirmou que as nações desta região sul deverão capacitar-se para ter a condição de dizer não quando chegar a situação de ter que dizê-lo concretamente, ou seja, tendo capacidade de defesa para fazê-lo. Sem indústria naval, sem tecnologia própria, sem indústria de defesa, não há como falar de soberania efetiva.
A retomada da indústria naval, o projeto do submarino nuclear, o reequipamento da Marinha, e, sobretudo, sua modernização, são medidas que sintonizam-se plenamente com a renacionalização da Petrobrás, sua consolidação e com medidas que recuperam o papel do estado na formulação das diretrizes econômicas. Ou seja, exatamente ao contrário dos governos neoliberais, para quem o estado deve ser mínimo. Afinal, ricos não precisam de estado.
A informação de que há centenas de navios e embarcações encomendadas pela Petrobrás, gerando milhares e milhares de empregos qualificados e com carteira assinada, reforçam o movimento sindical, a previdência, o mercado interno. Até mesmo a Escola Técnica do Arsenal de Marinha, que há 10 anos estava paralisada, voltou a ativa e está formando técnicos imediatamente contratados pela construção naval. Até a estatal venezuelana, a PDVSA, tem encomendados no Brasil a construção de 17 embarcações petroleiras. Integração produtiva latino-americana é o outro ingrediente neste episódio.
Soberania em vários quadrantes
Mas, para além desta conclusão que liga recuperação naval e soberania, o lançamento do novo navio, cuja madrinha é a cantora Miúcha, estimula a reflexão sobre outras medidas necessárias. Se era absurdo um país do porte do Brasil não tivesse uma indústria naval, também o é não ter sob controle público a indústria aeronáutica, sobretudo porque a Embraer foi produto de um esforço da poupança nacional, irresponsavelmente entregue aos interesses internacionais, quando há todo um potencial de aproveitamento da aviação regional por desenvolver aqui no Brasil.
O resultado da privatização da Embraer e sua dependência do mercado internacional foi a demissão de mais de 4 mil trabalhadores da ex-estatal quando a crise estourou no capitalismo do primeiro mundo. Certamente, a estratégia deve voltar-se para o mercado interno. Como disse Lula no lançamento do “Sérgio Buarque de Hollanda” enquanto os EUA estão perdendo 70 mil empregos, o Brasil está gerando este ano mais de 2 milhões e meio de novos postos de trabalho. Aqui nasce uma nova classe médica, nos EUA há uma erosão na classe média, que está sendo despejada, dormindo nas praças públicas... Com a imensidão do Brasil e sem sistema de transporte ferroviário eficiente - também foi demolido - a aviação regional poderia receber um grande impulso no Brasil, mas não sem antes recuperar o controle sobre a Embraer, como está fazendo na área naval e de petróleo.
Cultura e soberania
Assim sucessivamente. Todas as medidas neoliberais resultaram em enormes prejuízos para a poupança popular, ou para a tecnologia nacional, ou para a soberania. Ou tudo junto. Se fôssemos analisar o cinema, por exemplo, quando existia a Embrafilme, cerca de 40 por cento do mercado cinematográfico era ocupado por produção nacional. Bons filmes e maus filmes, como em todo lado. Mas, havia uma indústria viva, gerando empregos, absorvendo talentos, renovando-se e superando em linguagem e em capacidade produtiva. O fim da Embrafilme jogou o cinema brasileiro no chão. Sob aplausos do cinema norte-americano que passou a ocupar 95 por cento do mercado brasileiro. E cinema também é soberania, como parte da construção da identidade nacional.
A retomada da indústria naval, do papel protagonista do estado, são medidas inequivocamente necessárias. E respondem concretamente aos sinais de aprofundamento da crise nos centros do capitalismo. E bem sabemos, pela história, que as crises mais agudas do capitalismo tendem a buscar superação na economia de guerra. Por isto o intervencionismo crescente, sem que Obama possa mudar quase nada. Por isso o reforço orçamentário da indústria bélica dos EUA, a principal rubrica do orçamento, o que equivale a uma ameaça contra os países que possuem grandes reservas de riqueza, como é o nosso caso. E ainda não nos recuperamos plenamente da devastadora demolição organizada pelos neoliberais, um desarmamento unilateral, em favor dos que pretendem tomar conta dos mares, ignorando soberanias e o direito dos povos.
Há um conjunto de sinais sombrios indicando que o mundo cobrará de nós brasileiros a coragem e a rebeldia de João Cândido, da Revolta da Chibata, o almirante negro da música de Aldir Branco e João Bosco. Mas, a embarcação do Brasil Nação está encontrando o rumo certo.
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Marinheiro, marinheiro,
Quero ver você no mar
Eu também sou marinheiro
Eu também sei navegar
Geraldo Vandré
Muitas lições podem ser tiradas da retomada da indústria naval no Brasil que nesta sexta-feira lançou, no Estaleiro Mauá, em Niterói, mais uma grande embarcação ao mar, o navio Sérgio Buarque de Hollanda. Mas, certamente, deve-se discutir com prioridade que não é possível pensar um Brasil soberano sem uma indústria naval desenvolvida.
Para aqueles que, até mesmo nas fileiras da esquerda, chegaram a dizer que os candidatos presidenciais eram todos iguais, eis aqui uma estupenda diferença: enquanto os neoliberais conseguiram demolir e paralisar uma das mais expandidas indústrias navais do mundo, a brasileira - fazendo com que desde 2000 não se produzissem mais navios aqui - o governo Lula acaba por transformar o setor em fonte geradora de emprego, desenvolvimento tecnológico, promoção de justiça social e, especialmente, alavanca indispensável para se alcançar a soberania.
O que pensar de um país com costa superior a 8 mil e 500 quilômetros sem uma indústria naval desenvolvida? Eis aí a tarefa dos neoliberais que se ocuparam de destruir o que havia sido levantado na Era Vargas em particular. O Brasil chegou a ter a sua empresa estatal no setor, a Loyd Brasileiro, e a ocupar uma posição de destaque no cenário mundial da construção naval. A própria navegação de cabotagem teve expressivo desenvolvimento e nem podia ser diferente. Vargas chegou a criar a frota do álcool e do petróleo.
Com o neoliberalismo dos anos 90 tem início a demolição devastadora. Ela alcançou todos os pilares estruturais do transporte, seja ferroviário (privatização da Rede Ferroviária), aéreo (privatização da Embraer) e o naval, com a privatização do Loyd Brasileiro seguida de uma programada desindustrialização. O desemprego foi dramático, generalizado.
Organizadores de derrotas
Demolir a indústria naval é organizar a dependência, é organizar a derrota de uma nação. Mais que isto, é programar sua incapacitação para a defesa, pois sem indústria naval não há como ter também uma Marinha equipada à altura dos potenciais de riqueza que devem ser defendidos. As autoridades de defesa já indicaram, em numerosas oportunidades, a situação de desarmamento em que se encontra e ainda se encontra a Marina Brasileira, agora em fase de recuperação. É certo que ainda falta muito, porém, recuperar a indústria naval é condição indispensável para organizar uma capacidade de defesa do porte das magníficas riquezas que o petróleo pré-sal representa. Aí está o desafio. Nesta linha de raciocínio podemos concluir que uma indústria naval recuperada é fator que se junta à Nova Estratégia de Defesa Nacional.
Há alguns anos, antes da divulgação da existência do petróleo pré-sal, a imprensa noticiou a existência de um estranho relatório da CIA indicando que as plataformas da Petrobrás em alto-mar eram muito vulneráveis a atentados terroristas. Seria um relatório ou seria uma espécie torta de ameaça, ainda que velada? Agora, vemos a Quarta Frota dos EUA ser retomada e se insinuar pelos mares do sull depois de décadas paralisada. Junte-se a isto, a discussão recente na OTAN sobre a mudança de sua doutrina militar, cujo raio de operação deverá incluir o Atlântico Sul.
De fato, na situação atual a Marinha não tem ainda as condições para realizar uma defesa efetiva de todo o potencial de riquezas contido na plataforma continental brasileira. Esta área, agora ampliada para 350 milhas, também chamada Amazônia Azul, possui, além de petróleo, gigantescas reservas de biodiversidade sempre desafiando nossas universidades e os centros de tecnologia da Marinha para o desenvolvimento das tecnologias apropriadas ao seu adequado aproveitamento em favor do nosso povo.
Em resposta à proposta de intervencionismo ampliado da OTAN, o governo brasileiro, pela voz do Ministro da Defesa, Nelson Jobim, já afirmou que as nações desta região sul deverão capacitar-se para ter a condição de dizer não quando chegar a situação de ter que dizê-lo concretamente, ou seja, tendo capacidade de defesa para fazê-lo. Sem indústria naval, sem tecnologia própria, sem indústria de defesa, não há como falar de soberania efetiva.
A retomada da indústria naval, o projeto do submarino nuclear, o reequipamento da Marinha, e, sobretudo, sua modernização, são medidas que sintonizam-se plenamente com a renacionalização da Petrobrás, sua consolidação e com medidas que recuperam o papel do estado na formulação das diretrizes econômicas. Ou seja, exatamente ao contrário dos governos neoliberais, para quem o estado deve ser mínimo. Afinal, ricos não precisam de estado.
A informação de que há centenas de navios e embarcações encomendadas pela Petrobrás, gerando milhares e milhares de empregos qualificados e com carteira assinada, reforçam o movimento sindical, a previdência, o mercado interno. Até mesmo a Escola Técnica do Arsenal de Marinha, que há 10 anos estava paralisada, voltou a ativa e está formando técnicos imediatamente contratados pela construção naval. Até a estatal venezuelana, a PDVSA, tem encomendados no Brasil a construção de 17 embarcações petroleiras. Integração produtiva latino-americana é o outro ingrediente neste episódio.
Soberania em vários quadrantes
Mas, para além desta conclusão que liga recuperação naval e soberania, o lançamento do novo navio, cuja madrinha é a cantora Miúcha, estimula a reflexão sobre outras medidas necessárias. Se era absurdo um país do porte do Brasil não tivesse uma indústria naval, também o é não ter sob controle público a indústria aeronáutica, sobretudo porque a Embraer foi produto de um esforço da poupança nacional, irresponsavelmente entregue aos interesses internacionais, quando há todo um potencial de aproveitamento da aviação regional por desenvolver aqui no Brasil.
O resultado da privatização da Embraer e sua dependência do mercado internacional foi a demissão de mais de 4 mil trabalhadores da ex-estatal quando a crise estourou no capitalismo do primeiro mundo. Certamente, a estratégia deve voltar-se para o mercado interno. Como disse Lula no lançamento do “Sérgio Buarque de Hollanda” enquanto os EUA estão perdendo 70 mil empregos, o Brasil está gerando este ano mais de 2 milhões e meio de novos postos de trabalho. Aqui nasce uma nova classe médica, nos EUA há uma erosão na classe média, que está sendo despejada, dormindo nas praças públicas... Com a imensidão do Brasil e sem sistema de transporte ferroviário eficiente - também foi demolido - a aviação regional poderia receber um grande impulso no Brasil, mas não sem antes recuperar o controle sobre a Embraer, como está fazendo na área naval e de petróleo.
Cultura e soberania
Assim sucessivamente. Todas as medidas neoliberais resultaram em enormes prejuízos para a poupança popular, ou para a tecnologia nacional, ou para a soberania. Ou tudo junto. Se fôssemos analisar o cinema, por exemplo, quando existia a Embrafilme, cerca de 40 por cento do mercado cinematográfico era ocupado por produção nacional. Bons filmes e maus filmes, como em todo lado. Mas, havia uma indústria viva, gerando empregos, absorvendo talentos, renovando-se e superando em linguagem e em capacidade produtiva. O fim da Embrafilme jogou o cinema brasileiro no chão. Sob aplausos do cinema norte-americano que passou a ocupar 95 por cento do mercado brasileiro. E cinema também é soberania, como parte da construção da identidade nacional.
A retomada da indústria naval, do papel protagonista do estado, são medidas inequivocamente necessárias. E respondem concretamente aos sinais de aprofundamento da crise nos centros do capitalismo. E bem sabemos, pela história, que as crises mais agudas do capitalismo tendem a buscar superação na economia de guerra. Por isto o intervencionismo crescente, sem que Obama possa mudar quase nada. Por isso o reforço orçamentário da indústria bélica dos EUA, a principal rubrica do orçamento, o que equivale a uma ameaça contra os países que possuem grandes reservas de riqueza, como é o nosso caso. E ainda não nos recuperamos plenamente da devastadora demolição organizada pelos neoliberais, um desarmamento unilateral, em favor dos que pretendem tomar conta dos mares, ignorando soberanias e o direito dos povos.
Há um conjunto de sinais sombrios indicando que o mundo cobrará de nós brasileiros a coragem e a rebeldia de João Cândido, da Revolta da Chibata, o almirante negro da música de Aldir Branco e João Bosco. Mas, a embarcação do Brasil Nação está encontrando o rumo certo.
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Encontro de blogueiros de Juiz de Fora
Reproduzo matéria enviada pela comissão organizadora:
O Iº Encontro Regional de Blogueiros Progressistas, desdobramento do Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, realizado em agosto, em São Paulo, acontece nos próximos dias 26, 26 e 27 de novembro, em Juiz de Fora, com eventos que vão desde a exibição do filme Utopia e Barbárie do cineasta Sílvio Tendler a palestras e debates, além de do show Sertão da Palavra.
O Iº Encontro Regional de Blogueiros Progressistas deve reunir blogueiros de
várias cidades da região e acontece num momento em que a Internet vê confirmada sua importância no processo de comunicação. Pesquisa realizada logo após as eleições presidenciais de outubro mostraram que a rede mundial de computadores foi o segundo veículo de comunicação mais usado entre partidos, candidatos e eleitores. Um dos pontos mais importantes do encontro será, a exemplo que vem acontecendo em todo o país, manifestar repúdio ao projeto de lei do senador Eduardo Azeredo (PSDB/MG) que tenta criar mecanismos de censura na rede. O encontro está sendo organizado pela Casa da América Latina.
Utopia e Barbárie
Um dos mais renomados cineastas brasileiros, com vários prêmios no país e no exterior, o cineasta Sílvio Tendler estará em Juiz de Fora no dia 25 para a um
debate com os participantes do Iº Encontro Regional de Blogueiros Progressistas,
logo após a exibição de seu filme Utopia e Barbárie. O evento acontecerá no anfiteatro João Carriço (FUNALFA), na sede da antiga Prefeitura (Parque Halfeld), a partir das 19 horas.
Tendler entre outros filmes dirigiu Os anos JK, O governo João Goulart, Marighella, e é considerado um humanista dentre os cineastas brasileiros. Já produziu mais de 40 filmes entre curtas, médias e longas metragens.Seus filmes são um resgate da memória brasileira e buscam levar o espectador a refletir sobre a realidade do País e da América Latina, essencialmente. É detentor da maior bilheteria de documentários do cinema nacional. Um milhão e oitocentos mil espectadores em O mundo mágico dos trapalhões.
Entre os prêmios recebidos está o Prêmio Salvador Allende do Festival de Trieste, Itália, em 2005, pelo documentário Encontro com Milton Santos, o célebre geógrafo brasileiro, eleito também melhor filme do Júri Popular na última edição do Festival de Brasília.
O Sertão da Palavra
Na sexta-feira, dia 26, a partir das 21 horas, no MESCLA, acontece o show o Sertão da Palavra, com Aliciane Rodrigues, Marcos Marinho e banda. Música popular brasileira, latino-americana, onde a palavra e a poesia têm grande destaque. Os ingressos poderão comprados antecipadamente no próprio Mescla.
Um dos objetivos do espetáculo é demonstrar a importância da integração latino-americana, a riqueza cultural dessa parte do mundo e o papel da comunicação, sobretudo a internet aliando teatro, música, poesia e literatura e buscar a confraternização solidária entre os participantes e presentes.
Palestras e debates
No sábado, último dia do encontro, acontecerão as palestras e debates na Universidade Universo, a partir das oito horas da manhã. O primeiro tema será As novas formas de comunicação – seus impactos na aldeia global e as transformações sociais e a integração latino-americana. Os temas serão expostos pelo historiador Alex Lombelo, o professor de filosofia Tiago Adão Lara e o jornalista Laerte Braga.
Às 12 horas, após um breve intervalo para o almoço, o tema será Internet, o futuro da comunicação, relações humanas e direitos, e os expositores serão Edmilson Costa, pós doutor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp, o ex-prefeito e ex-deputado Tarcísio Delgado e a professora Maria Helena Falcão.
Todas as palestras serão seguidas de debates entre os participantes e ás 15 horas serão formados os grupos de trabalho para a elaboração da Carta de princípios do Iº Encontro Regional de Blogueiros Progressistas. O término do encontro está previsto para as 18 horas e será conferido certificado de participação aos presentes. Não há taxa de inscrição.
O I Encontro Regional de Blogueiros Progressistas está sendo organizado pela Casa da América Latina e seu principal objetivo, além dos debates e da confraternização entre blogueiros, é integrar o movimento nacional que dá novas formas ao jornalismo e já desponta como o principal veículo de comunicação do futuro. Neste momento a rede mundial de computadores só é superada, no Brasil, pela televisão. Mesmo em regiões mais afastadas e longínquas do País a internet já consegue espaço semelhante ao do rádio.
As conclusões serão incorporadas aos documentos do I Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, através do blog Barão de Itararé (São Paulo) e servirão de temas preparatórios para o IV Fórum Social Mineiro a realizar-se no próximo ano em Belo Horizonte.
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O Iº Encontro Regional de Blogueiros Progressistas, desdobramento do Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, realizado em agosto, em São Paulo, acontece nos próximos dias 26, 26 e 27 de novembro, em Juiz de Fora, com eventos que vão desde a exibição do filme Utopia e Barbárie do cineasta Sílvio Tendler a palestras e debates, além de do show Sertão da Palavra.
O Iº Encontro Regional de Blogueiros Progressistas deve reunir blogueiros de
várias cidades da região e acontece num momento em que a Internet vê confirmada sua importância no processo de comunicação. Pesquisa realizada logo após as eleições presidenciais de outubro mostraram que a rede mundial de computadores foi o segundo veículo de comunicação mais usado entre partidos, candidatos e eleitores. Um dos pontos mais importantes do encontro será, a exemplo que vem acontecendo em todo o país, manifestar repúdio ao projeto de lei do senador Eduardo Azeredo (PSDB/MG) que tenta criar mecanismos de censura na rede. O encontro está sendo organizado pela Casa da América Latina.
Utopia e Barbárie
Um dos mais renomados cineastas brasileiros, com vários prêmios no país e no exterior, o cineasta Sílvio Tendler estará em Juiz de Fora no dia 25 para a um
debate com os participantes do Iº Encontro Regional de Blogueiros Progressistas,
logo após a exibição de seu filme Utopia e Barbárie. O evento acontecerá no anfiteatro João Carriço (FUNALFA), na sede da antiga Prefeitura (Parque Halfeld), a partir das 19 horas.
Tendler entre outros filmes dirigiu Os anos JK, O governo João Goulart, Marighella, e é considerado um humanista dentre os cineastas brasileiros. Já produziu mais de 40 filmes entre curtas, médias e longas metragens.Seus filmes são um resgate da memória brasileira e buscam levar o espectador a refletir sobre a realidade do País e da América Latina, essencialmente. É detentor da maior bilheteria de documentários do cinema nacional. Um milhão e oitocentos mil espectadores em O mundo mágico dos trapalhões.
Entre os prêmios recebidos está o Prêmio Salvador Allende do Festival de Trieste, Itália, em 2005, pelo documentário Encontro com Milton Santos, o célebre geógrafo brasileiro, eleito também melhor filme do Júri Popular na última edição do Festival de Brasília.
O Sertão da Palavra
Na sexta-feira, dia 26, a partir das 21 horas, no MESCLA, acontece o show o Sertão da Palavra, com Aliciane Rodrigues, Marcos Marinho e banda. Música popular brasileira, latino-americana, onde a palavra e a poesia têm grande destaque. Os ingressos poderão comprados antecipadamente no próprio Mescla.
Um dos objetivos do espetáculo é demonstrar a importância da integração latino-americana, a riqueza cultural dessa parte do mundo e o papel da comunicação, sobretudo a internet aliando teatro, música, poesia e literatura e buscar a confraternização solidária entre os participantes e presentes.
Palestras e debates
No sábado, último dia do encontro, acontecerão as palestras e debates na Universidade Universo, a partir das oito horas da manhã. O primeiro tema será As novas formas de comunicação – seus impactos na aldeia global e as transformações sociais e a integração latino-americana. Os temas serão expostos pelo historiador Alex Lombelo, o professor de filosofia Tiago Adão Lara e o jornalista Laerte Braga.
Às 12 horas, após um breve intervalo para o almoço, o tema será Internet, o futuro da comunicação, relações humanas e direitos, e os expositores serão Edmilson Costa, pós doutor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp, o ex-prefeito e ex-deputado Tarcísio Delgado e a professora Maria Helena Falcão.
Todas as palestras serão seguidas de debates entre os participantes e ás 15 horas serão formados os grupos de trabalho para a elaboração da Carta de princípios do Iº Encontro Regional de Blogueiros Progressistas. O término do encontro está previsto para as 18 horas e será conferido certificado de participação aos presentes. Não há taxa de inscrição.
O I Encontro Regional de Blogueiros Progressistas está sendo organizado pela Casa da América Latina e seu principal objetivo, além dos debates e da confraternização entre blogueiros, é integrar o movimento nacional que dá novas formas ao jornalismo e já desponta como o principal veículo de comunicação do futuro. Neste momento a rede mundial de computadores só é superada, no Brasil, pela televisão. Mesmo em regiões mais afastadas e longínquas do País a internet já consegue espaço semelhante ao do rádio.
As conclusões serão incorporadas aos documentos do I Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, através do blog Barão de Itararé (São Paulo) e servirão de temas preparatórios para o IV Fórum Social Mineiro a realizar-se no próximo ano em Belo Horizonte.
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domingo, 21 de novembro de 2010
O Globo e Folha “torturam” Dilma
Por Altamiro Borges
Ainda lambendo as feridas da derrota do seu candidato, a mídia demotucana já afia as suas armas para “torturar” a presidenta Dilma Rousseff. No seu arsenal, ela não vacila em utilizar os arquivos da ditadura, dando voz aos torturadores e carrascos. Com base num processo movido pela Folha, o Superior Tribunal Militar liberou nesta semana alguns documentos deste sombrio período. O STM bem poderia liberar também os relatórios sobre a cumplicidade da mídia com os golpistas.
Jogo sujo e combinado
Na sexta-feira, 19, o jornal O Globo – pertencente à famíglia Marinho, que ergueu o seu império com o apoio dos golpistas – foi o primeiro a explorar o arquivo. Pareceu até jogo combinado. A ávida Folha conseguiu os papéis e O Globo deu a largada com o título “Documentos da ditadura dizem que Dilma 'assessorou' assaltos a bancos”. O jornal informa que os dezesseis volumes de anotações liberados pelo STM “descrevem a ex-militante como figura de expressão nos grupos em que atuou, que chefiou greves e ‘assessorou assaltos a bancos’, e nunca se arrependeu”.
Com base nas opiniões dos carrascos, O Globo diz que Dilma era chamada de “Joana D’Arc da subversão” e que seria “uma figura feminina de expressão tristemente notável”. Ele ainda destaca o relatório sobre os militantes da VAR-Palmares escrito pelo delegado Newton Fernandes. Em 12 linhas, ele traça o “perfil” de Dilma: “Uma das molas mestras e um dos cérebros dos esquemas revolucionários postos em prática pelas esquerdas radicais... É antiga militante de esquemas subversivo-terroristas... Trata-se de uma pessoa de dotação intelectual bastante apreciável”.
O rótulo de “terrorista”
No sábado, 20, foi a vez de a Folha fazer escarcéu com os documentos. Sem contextualizar a luta de resistência à ditadura – inclusive reconhecendo que a famíglia Frias apoiou o golpe e até ajudou a transportar presos políticos para a tortura –, o jornal estampou na capa: “Dilma tinha o código de acesso a arsenal usado por guerrilha”. A matéria informa que a “revelação foi feita em 1970 sob tortura por ex-colega da petista na luta armada”. Nas entrelinhas, fica implícito o seu objetivo de carimbar em Dilma Rousseff o rótulo de “terrorista”.
“A presidente eleita zelava, junto com outros dois militantes, pelo arsenal da VAR-Palmares... Entre os armamentos, havia 58 fuzis Mauser, 4 metralhadoras Ina, 2 revólveres, 3 carabinas, 3 latas de pólvora, 10 bombas de efeito moral, 100 gramas de clorofórmio, 1 rojão de fabricação caseira, 4 latas de ‘dinamite granulada’ e 30 frascos com substâncias para ‘confecção de matérias explosivas’, como ácido nítrico. Além de caixas com centenas de munições”. Noutro trecho, diz que este arsenal foi usado em assaltos a bancos e mercados e que Dilma Rousseff era informada destas “operações armadas” com três dias de antecedência.
Enfrentar os saudosos da ditadura
As duas primeiras “reporcagens” com base nos arquivos da ditadura liberados pelo STM comprovam que a mídia demotucana não dará trégua à presidenta eleita. O objetivo é enquadrá-la, ameaçando com seu arsenal de baixarias, e desgastá-la. Neste esforço, a mídia oligárquica, que clamou pelo golpe militar de 1964 e que apoiou ativamente os generais-carrascos, tentará omitir os seus próprios crimes. É preciso firmeza para enfrentar os saudosos da ditadura militar. Dilma Rousseff foi uma heroína da luta pela democracia; já a mídia golpista foi cúmplice das torturas e assassinatos.
É preciso manter a mesma coragem que a ex-ministra demonstrou quando foi “interrogada” pelo senador Agripino Maia, em 2008. Na ocasião, diante do demo, ela relatou as bárbaras torturas que sofreu e reafirmou a sua luta contra a ditadura. “Qualquer comparação entre a ditadura militar e a democracia brasileira só pode partir de quem não dá valor à democracia brasileira... Eu tinha 19 anos. Fiquei três anos na cadeia. E fui barbaramente torturada, senador... E isso, senador, faz parte e integra a minha biografia, de que tenho imenso orgulho”.
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Ainda lambendo as feridas da derrota do seu candidato, a mídia demotucana já afia as suas armas para “torturar” a presidenta Dilma Rousseff. No seu arsenal, ela não vacila em utilizar os arquivos da ditadura, dando voz aos torturadores e carrascos. Com base num processo movido pela Folha, o Superior Tribunal Militar liberou nesta semana alguns documentos deste sombrio período. O STM bem poderia liberar também os relatórios sobre a cumplicidade da mídia com os golpistas.
Jogo sujo e combinado
Na sexta-feira, 19, o jornal O Globo – pertencente à famíglia Marinho, que ergueu o seu império com o apoio dos golpistas – foi o primeiro a explorar o arquivo. Pareceu até jogo combinado. A ávida Folha conseguiu os papéis e O Globo deu a largada com o título “Documentos da ditadura dizem que Dilma 'assessorou' assaltos a bancos”. O jornal informa que os dezesseis volumes de anotações liberados pelo STM “descrevem a ex-militante como figura de expressão nos grupos em que atuou, que chefiou greves e ‘assessorou assaltos a bancos’, e nunca se arrependeu”.
Com base nas opiniões dos carrascos, O Globo diz que Dilma era chamada de “Joana D’Arc da subversão” e que seria “uma figura feminina de expressão tristemente notável”. Ele ainda destaca o relatório sobre os militantes da VAR-Palmares escrito pelo delegado Newton Fernandes. Em 12 linhas, ele traça o “perfil” de Dilma: “Uma das molas mestras e um dos cérebros dos esquemas revolucionários postos em prática pelas esquerdas radicais... É antiga militante de esquemas subversivo-terroristas... Trata-se de uma pessoa de dotação intelectual bastante apreciável”.
O rótulo de “terrorista”
No sábado, 20, foi a vez de a Folha fazer escarcéu com os documentos. Sem contextualizar a luta de resistência à ditadura – inclusive reconhecendo que a famíglia Frias apoiou o golpe e até ajudou a transportar presos políticos para a tortura –, o jornal estampou na capa: “Dilma tinha o código de acesso a arsenal usado por guerrilha”. A matéria informa que a “revelação foi feita em 1970 sob tortura por ex-colega da petista na luta armada”. Nas entrelinhas, fica implícito o seu objetivo de carimbar em Dilma Rousseff o rótulo de “terrorista”.
“A presidente eleita zelava, junto com outros dois militantes, pelo arsenal da VAR-Palmares... Entre os armamentos, havia 58 fuzis Mauser, 4 metralhadoras Ina, 2 revólveres, 3 carabinas, 3 latas de pólvora, 10 bombas de efeito moral, 100 gramas de clorofórmio, 1 rojão de fabricação caseira, 4 latas de ‘dinamite granulada’ e 30 frascos com substâncias para ‘confecção de matérias explosivas’, como ácido nítrico. Além de caixas com centenas de munições”. Noutro trecho, diz que este arsenal foi usado em assaltos a bancos e mercados e que Dilma Rousseff era informada destas “operações armadas” com três dias de antecedência.
Enfrentar os saudosos da ditadura
As duas primeiras “reporcagens” com base nos arquivos da ditadura liberados pelo STM comprovam que a mídia demotucana não dará trégua à presidenta eleita. O objetivo é enquadrá-la, ameaçando com seu arsenal de baixarias, e desgastá-la. Neste esforço, a mídia oligárquica, que clamou pelo golpe militar de 1964 e que apoiou ativamente os generais-carrascos, tentará omitir os seus próprios crimes. É preciso firmeza para enfrentar os saudosos da ditadura militar. Dilma Rousseff foi uma heroína da luta pela democracia; já a mídia golpista foi cúmplice das torturas e assassinatos.
É preciso manter a mesma coragem que a ex-ministra demonstrou quando foi “interrogada” pelo senador Agripino Maia, em 2008. Na ocasião, diante do demo, ela relatou as bárbaras torturas que sofreu e reafirmou a sua luta contra a ditadura. “Qualquer comparação entre a ditadura militar e a democracia brasileira só pode partir de quem não dá valor à democracia brasileira... Eu tinha 19 anos. Fiquei três anos na cadeia. E fui barbaramente torturada, senador... E isso, senador, faz parte e integra a minha biografia, de que tenho imenso orgulho”.
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sábado, 20 de novembro de 2010
Kátia Abreu fala em encontro de juízes
Reproduzo artigo de Conceição Lemes, publicado no blog Viomundo:
De 11 a 13 de novembro, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) realizou, em Aracaju (SE), o IV Encontro Nacional de Juízes Estaduais, cujo tema foi “Justiça e Desenvolvimento Sustentável”.
O IV Enaje arrecadou R$ 1,05 milhão em patrocínios. Um, em particular, chamou-nos a atenção. Os R$ 100 mil pagos pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA), comandada pela senadora Kátia Abreu (DEM-TO).
Kátia Abreu, segundo reportagem de Leandro Fortes em CartaCapital, é a rainha do latifúndio improdutivo:
"Com a espada da lei nas mãos, e com a aquiescência de eminências do Poder Judiciário, ela tem se dedicado a investir sobre os trabalhadores sem-terra. Acusa-os de serem financiados ilegalmente para invadir terras Brasil afora. Foram ações do poder público que lhe garantiram praticamente de graça extensas e férteis terras do Cerrado de Tocantins. E mais: Kátia Abreu, beneficiária de um esquema investigado pelo Ministério Público Federal, conseguiu transformar terras produtivas em áreas onde nada se planta ou se cria. Tradução: na prática, a musa do agronegócio age com os acumuladores tradicionais de terras que atentam contra a modernização capitalista do setor rural brasileiro".
Kátia Abreu é processada também por ter desmatado ilegalmente 776 hectares sem autorização Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama). Por isso, recebeu multa de R$ 77 mil, até hoje não aplicada porque recorreu à Justiça. Embora já tenha vendido as terras, continua respondendo ao processo, pois a multa é intransferível.
Curiosamente, foi uma das palestrantes do IV Enaje, que reuniu 600 juízes do Brasil inteiro. Falou no painel “Código Florestal e Desenvolvimento Sustentável”.
Considerando 1) as denúncias de desmatadora e grileira que pesam sobre Kátia, 2) a criminalização que faz dos movimentos sociais do campo, 3) o lobby do latifúndio e 4) o fato de o poder judiciário ser atualmente um dos gargalos da reforma agrária no Brasil, a parceria CNA/AMB levanta dúvidas.
A avaliação de que o Judiciário é um dos entraves à reforma agrária é do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o MST. Explica-se. O governo desapropria áreas consideradas improdutivas. Seus proprietários entram com recurso. A Justiça normalmente aceita. Cria-se um impasse. O governo já expropriou a terra, mas o caso fica parado na Justiça e as famílias acampadas, à espera da decisão final.
Reportagem de Phydia de Athayde e Rodrigo Martins, também publicada em CartaCapital, reforça a avaliação do MST:
"A região do oeste paulista é simbólica por potencializar alguns entraves à reforma agrária no País. No caso, o conservadorismo do Judiciário somado ao excesso de recursos ajuizados pelos proprietários. Valdez Farias, procurador-geral do Incra, diz que o estado de São Paulo é especialmente problemático nesse ponto porque, diferentemente de outras áreas, todos os recursos possíveis são aplicados".
AMB: “Juízes não são influenciados assim como repórteres não são pela publicidade"
O Viomundo questionou então a Associação dos Magistrados Brasileiros:
1) O tema do IV Enaje foi desenvolvimento sustentável. Não configuraria conflito de interesses o patrocínio da CNA?
2) Desenvolvimento sustentável envolve propriedade da terra. O patrocínio da CNA não poderia gerar na cabeça dos juízes uma boa vontade em relação aos latifundiários em detrimento de movimentos dos trabalhadores rurais sem terra?
3) A senadora Kátia Abreu, presidente da CNA, tem ações na Justiça nas áreas agrária e ambiental. É compatível, ético, uma ré fazer palestra para juízes que podem um dia julgá-la?
4) Os recursos arrecadados com o patrocínio foram destinados a quê? Pagou despesas de juízes?
A AMB, por intermédio da assessoria de imprensa, respondeu-nos por email:
1) O convite à senadora Kátia Abreu para o painel Código Florestal e Desenvolvimento Sustentável deveu-se à representação da entidade junto ao tema. Destacamos que o painel não foi unilateral. Havia outro palestrante Raul do Valle, advogado especializado em meio ambiente e assessor jurídico da ONG Instituto Socioambiental (ISA) com ponto de vista oposto.
2) Os patrocínios são dados à entidade e não aos juízes individualmente. Da mesma forma que repórteres não são influenciados pela publicidade veiculada nos jornais em que trabalham, os juízes não são influenciados por patrocinadores de eventos. Além disso, durante o encontro eles ouviram pontos de vista divergentes.
3) A senadora estava representando um setor produtivo da sociedade, da qual é presidente, e o assunto se ateve ao tema proposto. Naquele auditório ela não estava participando de um julgamento, e sim de um debate cujo o tema foi Código Florestal e Desenvolvimento Sustentável. Se verdadeira, a premissa da pergunta proibiria os juízes de ter contato com qualquer pessoa em qualquer local, visto que todos estão sujeitos a sofrer processos. É como achar que o juiz deve viver isolado.
4) Os recursos foram aplicados na organização e infra-estrutura do evento. Cada juiz pagou sua própria despesa, como passagem, hospedagem e, inclusive, inscrição. Além da CNA, várias outras entidades patrocinaram o evento.
Juíza Dora Martins: “Insustentável a defesa do IV Enaje”
Diz a velha máxima: À mulher não basta ser só honesta; tem de parecer honesta. Por isso, ouvimos também a Associação de Juízes pela Democracia (ADJ).
“A questão dos patrocínios é bastante passível de crítica. Afinal, juízes têm de ser éticos e independentes, sem se influenciar pelo peso de suas ideologias”, afirma a juíza Dora Martins, da AJD. “Além de éticos, têm ainda a obrigação funcional de mostrar e não expor a imagem da Justiça a interpretações dúbias.”
“Não creio que os juízes fiquem de mãos e consciência amarradas só por conta do patrocínio. Porém, publicamente, isso depõe contra a imagem do Poder Judiciário”, diz Dora Martins.” A partir do momento em que no nosso sistema, capitalista, impera o poder do ‘poder’ e do dinheiro, fica insustentável a defesa de um evento como IV Enaje, do jeito que foi elaborado.”
“De modo algum, os juízes que porventura estiveram no tal evento são passíveis de crítica ou qualquer forma de acusação no seu desempenho funcional”, salienta Dora Martins. “Porém, parece-me desnecessário a exposição da magistratura nacional a esse tipo de situação, evitável, e que, trazida ao conhecimento público, permite ser interpretada de todos (e qualquer) os modos.”
“A independência judicial é o bem mais caro que todo juiz deve ter, zelar e lutar”, arremata. “Tudo o que possa colocar isso em risco deve ser afastado, evitado e rejeitado.A transparência é outra virtude a ser buscada no exercício dos poderes do Estado, inclusive no poder Judiciário.”
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De 11 a 13 de novembro, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) realizou, em Aracaju (SE), o IV Encontro Nacional de Juízes Estaduais, cujo tema foi “Justiça e Desenvolvimento Sustentável”.
O IV Enaje arrecadou R$ 1,05 milhão em patrocínios. Um, em particular, chamou-nos a atenção. Os R$ 100 mil pagos pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA), comandada pela senadora Kátia Abreu (DEM-TO).
Kátia Abreu, segundo reportagem de Leandro Fortes em CartaCapital, é a rainha do latifúndio improdutivo:
"Com a espada da lei nas mãos, e com a aquiescência de eminências do Poder Judiciário, ela tem se dedicado a investir sobre os trabalhadores sem-terra. Acusa-os de serem financiados ilegalmente para invadir terras Brasil afora. Foram ações do poder público que lhe garantiram praticamente de graça extensas e férteis terras do Cerrado de Tocantins. E mais: Kátia Abreu, beneficiária de um esquema investigado pelo Ministério Público Federal, conseguiu transformar terras produtivas em áreas onde nada se planta ou se cria. Tradução: na prática, a musa do agronegócio age com os acumuladores tradicionais de terras que atentam contra a modernização capitalista do setor rural brasileiro".
Kátia Abreu é processada também por ter desmatado ilegalmente 776 hectares sem autorização Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama). Por isso, recebeu multa de R$ 77 mil, até hoje não aplicada porque recorreu à Justiça. Embora já tenha vendido as terras, continua respondendo ao processo, pois a multa é intransferível.
Curiosamente, foi uma das palestrantes do IV Enaje, que reuniu 600 juízes do Brasil inteiro. Falou no painel “Código Florestal e Desenvolvimento Sustentável”.
Considerando 1) as denúncias de desmatadora e grileira que pesam sobre Kátia, 2) a criminalização que faz dos movimentos sociais do campo, 3) o lobby do latifúndio e 4) o fato de o poder judiciário ser atualmente um dos gargalos da reforma agrária no Brasil, a parceria CNA/AMB levanta dúvidas.
A avaliação de que o Judiciário é um dos entraves à reforma agrária é do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o MST. Explica-se. O governo desapropria áreas consideradas improdutivas. Seus proprietários entram com recurso. A Justiça normalmente aceita. Cria-se um impasse. O governo já expropriou a terra, mas o caso fica parado na Justiça e as famílias acampadas, à espera da decisão final.
Reportagem de Phydia de Athayde e Rodrigo Martins, também publicada em CartaCapital, reforça a avaliação do MST:
"A região do oeste paulista é simbólica por potencializar alguns entraves à reforma agrária no País. No caso, o conservadorismo do Judiciário somado ao excesso de recursos ajuizados pelos proprietários. Valdez Farias, procurador-geral do Incra, diz que o estado de São Paulo é especialmente problemático nesse ponto porque, diferentemente de outras áreas, todos os recursos possíveis são aplicados".
AMB: “Juízes não são influenciados assim como repórteres não são pela publicidade"
O Viomundo questionou então a Associação dos Magistrados Brasileiros:
1) O tema do IV Enaje foi desenvolvimento sustentável. Não configuraria conflito de interesses o patrocínio da CNA?
2) Desenvolvimento sustentável envolve propriedade da terra. O patrocínio da CNA não poderia gerar na cabeça dos juízes uma boa vontade em relação aos latifundiários em detrimento de movimentos dos trabalhadores rurais sem terra?
3) A senadora Kátia Abreu, presidente da CNA, tem ações na Justiça nas áreas agrária e ambiental. É compatível, ético, uma ré fazer palestra para juízes que podem um dia julgá-la?
4) Os recursos arrecadados com o patrocínio foram destinados a quê? Pagou despesas de juízes?
A AMB, por intermédio da assessoria de imprensa, respondeu-nos por email:
1) O convite à senadora Kátia Abreu para o painel Código Florestal e Desenvolvimento Sustentável deveu-se à representação da entidade junto ao tema. Destacamos que o painel não foi unilateral. Havia outro palestrante Raul do Valle, advogado especializado em meio ambiente e assessor jurídico da ONG Instituto Socioambiental (ISA) com ponto de vista oposto.
2) Os patrocínios são dados à entidade e não aos juízes individualmente. Da mesma forma que repórteres não são influenciados pela publicidade veiculada nos jornais em que trabalham, os juízes não são influenciados por patrocinadores de eventos. Além disso, durante o encontro eles ouviram pontos de vista divergentes.
3) A senadora estava representando um setor produtivo da sociedade, da qual é presidente, e o assunto se ateve ao tema proposto. Naquele auditório ela não estava participando de um julgamento, e sim de um debate cujo o tema foi Código Florestal e Desenvolvimento Sustentável. Se verdadeira, a premissa da pergunta proibiria os juízes de ter contato com qualquer pessoa em qualquer local, visto que todos estão sujeitos a sofrer processos. É como achar que o juiz deve viver isolado.
4) Os recursos foram aplicados na organização e infra-estrutura do evento. Cada juiz pagou sua própria despesa, como passagem, hospedagem e, inclusive, inscrição. Além da CNA, várias outras entidades patrocinaram o evento.
Juíza Dora Martins: “Insustentável a defesa do IV Enaje”
Diz a velha máxima: À mulher não basta ser só honesta; tem de parecer honesta. Por isso, ouvimos também a Associação de Juízes pela Democracia (ADJ).
“A questão dos patrocínios é bastante passível de crítica. Afinal, juízes têm de ser éticos e independentes, sem se influenciar pelo peso de suas ideologias”, afirma a juíza Dora Martins, da AJD. “Além de éticos, têm ainda a obrigação funcional de mostrar e não expor a imagem da Justiça a interpretações dúbias.”
“Não creio que os juízes fiquem de mãos e consciência amarradas só por conta do patrocínio. Porém, publicamente, isso depõe contra a imagem do Poder Judiciário”, diz Dora Martins.” A partir do momento em que no nosso sistema, capitalista, impera o poder do ‘poder’ e do dinheiro, fica insustentável a defesa de um evento como IV Enaje, do jeito que foi elaborado.”
“De modo algum, os juízes que porventura estiveram no tal evento são passíveis de crítica ou qualquer forma de acusação no seu desempenho funcional”, salienta Dora Martins. “Porém, parece-me desnecessário a exposição da magistratura nacional a esse tipo de situação, evitável, e que, trazida ao conhecimento público, permite ser interpretada de todos (e qualquer) os modos.”
“A independência judicial é o bem mais caro que todo juiz deve ter, zelar e lutar”, arremata. “Tudo o que possa colocar isso em risco deve ser afastado, evitado e rejeitado.A transparência é outra virtude a ser buscada no exercício dos poderes do Estado, inclusive no poder Judiciário.”
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Política externa e desenvolvimento
Reproduzo entrevista concedida a Silvio Caccia Bava e Dario Pignotti, publicada no jornal Le Monde Diplomatique Brasil:
Marco Aurélio Garcia, assessor da presidência da República para assuntos internacionais, recebeu com exclusividade o Le Monde Diplomatique Brasil no Palácio do Planalto. Entre os temas tratados na entrevista, o Mercosul, a integração regional, a crise econômica e o modelo de desenvolvimento.
Qual é o balanço desses quase oito anos de política externa?
O êxito que nós tivemos em matéria de política externa se expressa hoje numa forte projeção do Brasil no mundo, que foi dado essencialmente pelas grandes transformações que nós tivemos internamente porque não só elas foram inéditas no caso brasileiro, mas, de certa maneira, foram também inéditas, ou quase inéditas, no mundo. Crescer com distribuição de renda, com estabilidade macroeconômica, com redução da vulnerabilidade externa e com democracia, não é pouca coisa. Por outro lado, incorporamos o contexto mundial como um elemento essencial para o país.
A política externa do Brasil não pode ser simplesmente entendida como um mecanismo de projeção do Brasil no mundo, ela é um elemento substancial do próprio projeto nacional brasileiro. Nós não podemos nos pensar fora do mundo, fora da região. Vivemos num mundo em transição, uma transição longa, e o desfecho não é totalmente previsível a julgar pelas transformações que o mundo passou desde os anos 1990. Fortalece-se a perspectiva de que devemos construir um mundo dominado por valores multilaterais. E nós acreditamos que este multilateralismo, ele se traduzirá também na constituição de um mundo multipolar.
Fizemos a aposta de desenvolver um processo de integração regional. Hoje, a América do Sul ocupa um lugar privilegiado no mundo e talvez ela própria não tenha consciência perfeita disso. Temos as maiores reservas de energia do mundo: petróleo, gás, carvão, potencial hidroelétrico, biocombustíveis, energia nuclear, eólica, solar etc. E o mundo demandará cada vez mais energia. Temos grandes recursos de alimentação, e recursos que não são mais resultantes daquele tipo de produção primária, exportadora, do passado. Nossa agricultura tem alta produtividade, que não existiria sem pesquisa científica, tecnológica etc. Temos grandes reservas de minério, que obviamente serão importantes para qualquer etapa da humanidade, mas particularmente para essa onde está havendo certas zonas de crescimento industrial muito forte. E nós já temos polos industriais significativos, alguns de ponta. É claro que vamos ter qu e enfatizar muito mais políticas industriais locais, nacionais e regionais.
Mas temos também outros trunfos, mudanças sociais que estão ocorrendo praticamente em todos os países, que propiciaram a inclusão de dezenas de milhões de pessoas à condição de produtores e consumidores. A região se transformou num grande mercado e num grande polo produtor. São quase 400 milhões de sul-americanos, uma população com traços de homogeneidade muito maiores do que em outras regiões do mundo.
Quais são os problemas? Temos baixo nível de integração. A integração que tínhamos anteriormente era uma integração centralmente comercial. Mercosul, Comunidade Andina etc. E essa integração essencialmente comercial, ainda que ela seja importante os dados de comércio exterior brasileiro e da região atestam isso ela tem dificuldades, tendo em vista que o confronto de uma economia como a brasileira com outras economias de menor escala pode aprofundar assimetrias entre o Brasil e outros países. Nós temos que pensar num tipo de integração que transcenda o aspecto puramente comercial e que vá em outra direção.
Nós temos um baixíssimo nível de integração física. Por incrível que pareça, agora, nesse fim dos oito anos do governo Lula, passamos a ter as primeiras conexões Atlântico-Pacífico. Vamos inaugurar a Transoceânica lá com o Peru. Agora em outubro devemos inaugurar essa estrada Iquique-Santos, passando pela Bolívia. Há também projetos muito consistentes, como a ligação Porto Alegre e Coquimbo, que vai implicar em um grande túnel na Argentina. Serão caminhos de integração muito importantes, que vão diminuir consideravelmente o custo das nossas exportações e vão provocar também uma maior inter-relação dos nossos países.
A simples ponte que nós fizemos no Peru mudou o perfil da relação Peru-Brasil e fez com que nós fossemos obrigados, inclusive, a aprofundar certas concessões importantes no que diz respeito ao domínio comercial propriamente dito. Por que os habitantes de Manaus têm que importar verduras de São Paulo quando eles podem importar do Peru por um preço muito mais barato? Essa integração vai favorecer também uma maior internalização dos nossos países, que são muito concentrados na faixa litorânea.
A região está crescendo e vai precisar de um planejamento estratégico em matéria de energia. Nós constatamos um grande paradoxo, a região tem as maiores reservas energéticas do mundo, mas tem apagão na Argentina, no Uruguai, no Chile, no Paraguai, na Venezuela. Em toda parte tem apagão. Então, o que é que precisamos? Nós precisamos estabelecer uma grande rede energética para podermos potencializar essa capacidade num período em que as taxas de crescimento devem ser muito elevadas. Aqui no Brasil está se falando de 7,5% ou 8%, na Argentina as cifras não são muito diferentes, no Uruguai também. E não tem sentido que os países promovam este crescimento de forma isolada.
Para enfrentarmos o tema das assimetrias precisamos ter políticas produtivas comuns, de integração. Políticas agrícolas e políticas industriais. Isso, nós estamos fazendo como uma experiência piloto - e os argentinos também estão participando - no caso da Venezuela.
A Venezuela é um país extraordinário, é um país com grandes riquezas minerais, petróleo, no entanto, há muitas décadas ela exporta petróleo e importa alface, tomate, ovos, frango. O que era muito funcional, tendo em vista o tipo de classe dominante que tinha lá. E criou, inclusive, uma burguesia importadora, também elitista, feliz da vida com isso. A conversão dessa economia petroleira em uma economia mais complexa, ela pode ser feita porque a Venezuela tem um mercado interno de 28 milhões de pessoas.
A Venezuela ocupa um lugar importante na área andina, ela pode se ligar a todos os mercados adjacentes, e pode suprir uma série de demandas da região. Então, nós começamos a fazer um trabalho de integração com os venezuelanos, abrimos um escritório da Embrapa lá e um escritório da Agência Brasileira do Desenvolvimento Industrial, ABDI, para desenvolver projetos agrícolas, produzir. O que eles querem? Garan tir a sua segurança alimentar e também produzir uma série de insumos, de manufaturas, que não tem sentido que eles importem, além de itens ligados à própria produção petrolífera etc.
Nós demos uma importância muito grande à construção da linha de transmissão entre Itaipu e Assunción porque achamos que, concluída essa linha, Assunción pode se transformar num grande polo industrial que vai atrair o investimento brasileiro. Já tem uma fábrica de cimento que se estabeleceu lá e tem uma série de investidores que já estão de olho para investir lá. Isso muda o perfil.
Outro item é a integração financeira. Eu tinha um entusiasmo muito grande com a possibilidade de que nós pudéssemos acelerar uma integração financeira. Hoje eu acho que é uma coisa mais complexa. Partes dessa integração financeira já estão se realizando e podem se realizar no curto prazo. Outras, não. Por exemplo, moeda comum, eu acho muito difícil. O Banco Central comum, acho muito difícil e a experiência europeia agora está nos mostrando isso. Mas pudemos avançar em várias coisas e temos que implementar mais fortemente o Banco do Sul.
Ainda que hoje o problema não seja tanto um problema de recursos. Há recursos. O problema é muito mais um problema de garantias. O BNDES pode perfeitamente alavancar muito mais as empresas brasileiras e até outras empresas não brasileiras, mas sul-americanas, na região, sobretudo agora quando criarmos o nosso Eximbank (banco que financia exportações e importações). O próprio BID teve que se adaptar a essa nova realidade. Mas o Banco do Sul, sem dúvida nenhuma, vai ser um instrumento importante.
Outra coisa, que começamos a fazer com a Argentina, são trocas em moeda local. Com a Argentina já começou e nós estamos negociando com muitos países da região. Se conseguirmos introduzir isso, estamos dando uma resposta regional ao problema da crise desse modelo do dólar no mundo. Isso baixa os custos do comércio exterior, viabiliza mais a participação de pequenas e médias empresas, que muitas vezes não têm capacidade de comercializar em dólar.
Eu acho que temos um baixo nível de institucionalização dos nossos mecanismos de integração do Mercosul. Se você observar o que é a estrutura do Mercosul em Montevidéu é ridícula, não porque seja má, ridícula porque é pequena. Na Unasul, levamos muito tempo para avançar na eleição da secretaria-geral, o Kirchner está sendo um excelente secretário-geral. Mas uma série de coisas, seja no âmbito do Mercosul, seja no âmbito da Unasul, está muito lenta ainda, está muito devagar.
Os países têm muita resistência em combinar, nos processos de integração, questões de supranacionalidade.
Evidentemente, se você começa a integrar, você perde certas cotas de soberania e isso é muito, muito difícil. No caso da América do Sul, eu acho que as dificuldades talvez venham a ser menores do que as europeias porque o nacionalismo na América do Sul sempre foi um nacionalismo muito em favor da integração. Todas as grandes potências nacionalistas da região sempre foram entusiastas da integração sul-americana ou latino-americana. Peronismo e chavismo, que são dois exemplos muito gritantes de nacionalismo, sempre foram muito favoráveis à ideia da pátria grande etc. Então, por aí nós não vamos ter grandes dificuldades. Eu acho que não haverá as resistências ideológicas porque o nosso nacionalismo é diferente do nacionalismo europeu que é um nacionalismo ensimesmado, rancoroso, conservador, exc ludente.
Quando você fala que estamos em momento de transição, transição para onde? O planeta está se dando conta que não tem recursos suficientes para tanta gente, que os recursos estratégicos vão se exaurir. E nós temos aqui a vantagem de ter o Pré-sal, de ter os minérios e tudo o mais. Um projeto de desenvolvimento brasileiro baseado na exploração das commodities, na exportação da soja, na grande concentração da terra, é um modelo de desenvolvimento que está posto em causa no mundo inteiro. Se nós potencializarmos nossas capacidades, não estaríamos entrando na contramão no sentido de que temos de cuidar mais dos recursos naturais, preservar o planeta? O que a estratégia brasileira está projetando não é a continuidade do modelo anterior? Por outro lado, o Brasil é a metade da América Latina. O PIB é a metade, a população é a metade, a terra é a metade. E existe um discurso dos nossos vizinhos que fala do imperialismo brasileiro e de que as assimetrias estão se acentuando. Se você for ver, o capital brasileiro na Bolívia, na Argentina, Uruguai, Paraguai, ele está muito presente. E a estratégia brasileira de expansão apoia empresas que se transformam em global players brasileiros, como a Odebrecht, a OAS, a Queiroz Galvão, quer dizer, elas vão junto no pacote das relações diplomáticas. Como é que você vê essa contradição?
Em primeiro lugar, nós não estamos fazendo uma revolução socialista no Brasil, certo? Então, isso significa, concretamente, que vamos continuar convivendo com empresas grandes, médias, pequenas. Oxalá, nós possamos, inclusive, estabelecer um equilíbrio entre essas empresas médias e pequenas. Na questão da terra tem havido uma tentativa de estabelecer quase que uma divisão de trabalho que tem até expressão institucional. Nós temos dois ministérios de agricultura, o ministério da reforma agrária e o ministério do agrobusiness. E acho que eles têm convivido razoavelmente.
A ideia do imperialismo brasileiro é, a meu juízo, minoritária na cabeça de alguns setores na América Latina, e ela sempre existirá. De uma maneira geral, a visão que os sul-americanos e que os latino-americanos têm do Brasil é muito boa. Nós temos, inclusive, pesquisas sobre isso.
É óbvio que nós somos colocados, em determinados momentos, diante de dilemas insolúveis. Você não tem formas de equilibrar o comércio com todos os países da região. Não tem. A menos que você deixe de exportar coisas que eles demandam e que se eles não comprarem de nós, eles vão comprar dos Estados Unidos, da Europa. E isso por uma razão muito simples, nós temos uma economia extremamente diversificada, com um nível de produtividade crescente, enquanto que outros países, como o Chile, tem seis produtos de exportação. Ele exporta o quê? Coisas do mar, vinho, frutas, cobre, madeira e celulose. Nós importamos essas coisas, mas nós podemos exportar "trocentas" coisas para lá.
A única maneira de resolver isso é impulsionar o desenvolvimento industrial e agrícola desses países para que eles possam realizar um certo tipo de substituição de importações; e criar mecanismos para estimular a importação desses produtos. O Itamaraty tem um programa que se chama Programa de Substituição Competitiva de Importações, que nos leva, por exemplo, a mandar técnicos para a Bolívia para ensinar as empresas bolivianas a exportar para o Brasil. Mas isso tem os seus limites. Todos os países melhoraram os níveis de exportação para o Brasil nesses dois últimos anos, o problema é que o Brasil também melhorou muito. Então, a única maneira que nós temos é ajudar a industrialização desses países, criar um complexo produtivo.
O fato de que hoje em dia uma parte crescente da economia argentina - que é um grande país - esteja controlada por capitais brasileiros é visto de forma contraditória. Têm pessoas que dizem: olha o imperialismo brasileiro, precisamos nacionalizar. No entanto, há uma demanda de investimentos lá, brasileiros. Como é que você fica então?
E temos um tipo de política que nos tem criado problemas aqui, não nos países lá. Quando nós negociamos o preço do gás com a Bolívia, quando aceitamos sem conflito o processo de nacionalização da Petrobras, que foi indenizada, ou quando fizemos esse acordo com o Paraguai sobre o preço da energia de Itaipu, que está trancado aqui no Congresso, o que a direita brasileira está nos dizendo? Nos acusa de generosidades, dizem que somos muito molengas com o Evo Morales, que os paraguaios fazem o que bem entendem, os argentinos todo dia estão fazendo desfeita etc. O que não é absolutamente verdade. Os conflitos que existem na esfera comercial afetam 5%, 6% do comércio, e afetam transitoriamente e são resolvidos. Como se na União Europeia não houvesse nenhum problema, tudo funcionasse de uma forma melhor.
Assim como não nos interessa São Paulo próspero e o Nordeste destroçado, também não nos interessa um Brasil próspero e uma Bolívia, um Paraguai, e outros países, afetados gravemente por problemas econômicos e sociais. O grande dinamismo que a economia brasileira tem precisa ser pensado como um fator dinamizador para essas economias.
O Pré-sal vai significar a construção de 200 navios. Não se produz 200 navios no mundo, hoje. Vai significar plataformas, gasodutos, encanamento. Ele vai produzir um impacto industrial sobre o país que será absolutamente devastador, que transcende o domínio do petróleo e do gás. Vai afetar todo o setor de máquinas e equipamentos e está estimulando até a produção dos outros países. A Venezuela, e a Colômbia estão começando a criar estaleiros. E o Uruguai está produzindo partes. Por outro lado, temos que nacionalizar mais ou regionalizar mais o processo da produção da indústria automotiva. Por isso a questão institucional da Unasul e do Mercosul é fundamental.
Sobre a questão do modelo, o grande problema que enfrentamos num país como o Brasil, e em outros países da região, é que nós vivemos problemas do presente, mas também vivemos problemas do passado e do futuro. Ora, falar em consumismo num país que tinha 40 milhões vivendo abaixo da linha da pobreza? Nós vamos ter que passar por um período mais ou menos parecido àquele que os Estados Unidos viveram do fim do século XIX, até a crise de 1929.
Eu acho que nós temos pela frente um conjunto de desafios materiais e imateriais absolutamente fenomenal. Nós temos podido compatibilizar, na área rural, grande propriedade e agricultura familiar. Tem que melhorar isso? Tem que melhorar. Mas a grande verdade é que o consumo interno do país é garantido hoje pela agricultura familiar. Isso não é pouca coisa. E estamos com um tipo de agricultura empresarial que é uma agricultura sofisticada, que vai sendo estimulada pela demanda internacional. A China não tem condições de alimentar a sua população. É óbvio. Eles têm 20% das terras agricultáveis no país e 1,2 bilhão de pessoas. E a Índia também está nesta situação. Quer dizer, haverá uma demanda.
Agora, todo progresso, com todas as conotações ideológicas que essa expressão tem, traz contrapartidas negativas, evidentemente. O Programa Luz para Todos, sem dúvida nenhuma, deve trazer ao Brasil algumas perturbações do ponto de vista ambiental. Mas eu posso defender que 10 milhões de pessoas continuem a viver com candeeiro e vela?
A transição a que eu me referia é a seguinte: antes da queda do Muro de Berlim, da dissolução da União Soviética, nós tínhamos um mundo bipolar, um mundo que vivia a ameaça da guerra nuclear. A União Soviética, os países do leste europeu, desaparecem enquanto modelo socioeconômico, enquanto projeto político. A China transita na direção da economia de mercado.
E o que você tem como resíduo político-ideológico daquele modelo, outrora tão poderoso, do século XX, são pequenos núcleos irrelevantes para se pensar um projeto de mundo. Cuba, Vietnã, e mesmo o Vietnã mudou, Coréia do Norte etc. Como modelo, do ponto de vista do projeto social, eles estão fragilizados. Isso se junta com a crise da concepção da democracia. O que coincide com uma grande hipertrofia dos Estados Unidos enquanto potência econômica, política e militar, guerra do Iraque e aquelas coisas todas.
Nós passamos então a transitar em outra direção. Eu estive recentemente na França, conversando com alguns amigos que não via há algum tempo, e eles têm uma enorme simpatia e atração por conhecer melhor o que eles chamam a Social-democracia do Sul. O que é a Social-democracia do Sul? Somos nós! Sem aquele contexto, porque a socialdemocracia num certo momento foi um projeto que não deu certo, mas cujas premissas são expectativas de um governo capaz de compatibilizar democracia econômico-social com a democracia política. O que é que eu quero mais do que isso?
Alguns teóricos estão falando que a América do Sul é uma usina de pensamento político. No caso do Brasil, por ser a grande potência econômica, geográfica, será que esse modelo da Social-democracia do Sul pode ser um modelo exportável como ideia?
Eu acho que esse é um dos grandes problemas que estamos enfrentando na região, é que as mudanças que houve, elas são muito mais importantes do que a reflexão sobre essas mudanças. E eu acho que nós temos uma esquerda - e eu estou aqui nos incluindo - em crise. Eu gosto muito de uma frase, que não é minha: antes nós tínhamos ideias e não tínhamos votos, agora nós temos votos e não temos ideias.
Essa já é uma experiência duradoura. No Brasil nós estamos com a expectativa de que isso dure mais tempo. Na Venezuela já dura 10 anos. Na Bolívia está durando. No Uruguai está durando. Na Argentina durará, não tenho a menor dúvida, ainda que o perfil da esquerda lá seja diferente, porque lá você tem esquerda no governo e na oposição. Mesmo num país como o Chile, onde a esquerda sofreu uma escovada forte, ela hoje está obrigada a se repensar. Tem mais o Equador, tem mais o Paraguai, enfim, hoje em dia você não tem nenhum país da região onde essas questões não se colocam.
Eu considero que a relação com a Argentina é absolutamente essencial para o Brasil, sem a liga, uma boa relação Brasil Argentina, não haverá integração regional. Há outros países também que podem ter um papel importante, como a Colômbia. Tão logo ela resolva o seu contencioso interno, e acho que vai resolvê-lo, será um país que vai ter também um papel fundamental na região.
Não se esqueçam que na cúpula de Mar del Plata nós tivemos uma seleção Brasil Argentina com Kirchner e Lula no ataque e marcando gol. Quem derrubou a Alca não foi nosso amigo Chávez, quem derrubou a Alca naquele momento foi o Kirchner, o Lula, com o apoio dos uruguaios e dos paraguaios, sofrendo uma pressão dos demônios.
Você está falando em um projeto multipolar, mas parece que a aposta é no G20. Por que não o G192, que são as nações associadas à ONU?
O G20 é uma expressão renovada da crise de governança mundial. Como o multilateralismo foi relegado a uma posição secundária, o que nós tivemos num determinado momento foi a criação de um diretório ad hoc, que foi o G7, depois G8.
Já no começo do governo Lula, começou a haver a percepção de que esse era um diretório obsoleto. Em Aviens, o Chirac convidou 12 países mais, Brasil, Egito, México, a Nigéria, Argélia, África do Sul, a China, a Índia etc. Depois, com exceção da reunião do G8 que se fez nos Estados Unidos, quando Bush não convidou ninguém, todas as reuniões subsequentes contaram sempre com a presença destes países, até que isso afunilou para um G5, e na reunião da Escócia o Lula disse: "se for só para o cafezinho, eu não vou".
Quando houve a crise de setembro de 2008, os primeiros dias da crise coincidiram com a Assembleia Geral da ONU, aí o Lula, no seu discurso, fez alusão à crise. Umas semanas depois, no meio de outubro, o Bush telefonou para o Lula e disse, olha, eu estou com você e quero convocar uma reunião de países para discutir a crise no dia 15 de novembro, quem é que você acha que deve ir? E o Lula, de batepronto, disse: eu acho que deve ser o G20, G20 financeiro. Ora, o G20 financeiro era uma instituição de segunda, terceira linha, porque ele era integrado pelos ministros da fazenda, mas na prática eram os chefes de gabinete, os secretários internacionais dos ministérios que iam. Isso não quer dizer que ela não fosse importante. Discutimos várias coisas importantes, e com isso, o G20 ganhou importância.
Tivemos uma reunião em São Paulo, quando o Brasil estava presidindo, nessa ocasião o G20 foi até ampliado porque tinha o problema da Espanha, que queria participar. O Sarkozy usou um artifício enquanto presidente da União Europeia. Ele cedeu o lugar para a Espanha ir no lugar da França. Eu acho que essa situação é expressão dessa crise mundial de governança e o G20 também é um diretório ad hoc. A diferença é que é um diretório ad hoc mais representativo porque inclui México, Argentina, Brasil, Indonésia, África do Sul, Nigéria, Egito. Já tem uma composição, eu diria, um pouco mais significativa. Essa crise de governança mundial provoca outros movimentos, o Ibas, os Bric, agora surge o SEVIT, com Colômbia, Egito, Vietnã, Indonésia, Turquia e África do Sul.
Isso nos traz para a relação com os Estados Unidos. Ela apresenta sinais contraditórios. Havia toda uma expectativa de que o Obama fosse um mediador, um negociador para a América Latina, e o que a gente está vendo é o contrário, os EUA fizeram novos acordos para bases militares em vários lugares, Costa Rica, Colômbia, reativaram a IV Frota, ou seja, a América Latina entrou no radar dos Estados Unidos, que consideram que há uma certa instabilidade política no seu quintal. Isso coloca em oposição a Unasul e os Estados Unidos? Porque há um plano regional de defesa, inclusive com a perspectiva de uma integração da indústria bélica, na América do Sul? Esses movimentos indicam que nós vamos passar períodos difíceis na relação com os Estados Unidos?
Não. Não. Primeiro, eu não acho que a América Latina seja uma zona de preocupação imediata dos Estados Unidos. São uma preocupação dos Estados Unidos, o Paquistão, o Afeganistão, o Oriente Médio, talvez alguns setores na África. Pelo contrário, eu acho que os Estados Unidos, por enquanto, consideram que essa é uma região tranquila. Eles têm algumas preocupações que estão ligadas a movimentos de desestabilização, movimentos políticos. Evidentemente eles devem ter uma enorme preocupação com a situação mexicana. Mesmo se forem resolvidos os problemas no México, os esquemas da criminalidade podem se estender pelo conjunto da América Central. O que é real. O problema desses grupos delinquentes, ligados ou não ao narcotráfico, ao tráfico de armas, tem uma incidência muito forte em países como a Guatemala, Honduras, Salvador.
A questão das bases militares, eu acho que elas correm um pouco autonomamente. Quando se falou na IV Frota, altos funcionários do governo americano disseram que não tinham informações sobre isso. Eu tenho a impressão que isso corresponde muito mais a um cacoete estratégico de um país que mantém ainda essa aspiração de ser, digamos, o grande responsável pela segurança coletiva no mundo.
Isso explica porque é que há reações negativas sempre que algum país quer influir sobre questões de segurança coletiva, sobre alguns pontos nevrálgicos, como é o diferendo que nós tivemos com os Estados Unidos sobre o Irã. É isso. Quem são esses caras que vão se meter numa briga que não é deles? Essa briga é nossa, dizem eles. Só que eles estão resolvendo mal essa briga e durante um bom período estiveram resolvendo mal a briga do Oriente Médio.
No caso dos temas de segurança coletiva da região, um dos acertos que a Unasul teve, e nisso funcionou muito a intuição do Lula, porque foi o Lula que fez essa proposta, foi a criação de um Conselho de Defesa Sul-americano. O processo de integração não pode prescindir de tratar o tema de segurança coletiva.
Uma das dificuldades que a integração europeia enfrenta é o fato de que ela não tem um quadro de segurança coletiva próprio, ela tem o guarda-chuva da OTAN, então isso significa concretamente que ela terá que estar sempre em sintonia com os Estados Unidos porque, entre outras coisas, os Estados Unidos comandam a OTAN.
Eu acho que é óbvio que o complexo militar e industrial dos EUA, como chamava o Eisenhower, não gostará de ver surgir uma indústria de defesa regional. As pessoas têm que saber que pagam um preço por certas limitações que elas impõem nesse modelo. Quando nós fomos vender os Super Tucanos para a Venezuela, não foram as empresas que fornecem partes para o Super Tucano que protestaram, elas estavam dispostas, foi o governo americano que impediu. É o Congresso, que tem comitês rígidos. Então, as pessoas têm que saber que assim não dá.
Mas eu não acho que nós estejamos vivendo um momento de tensão com os Estados Unidos. Muito pelo contrário. E acho, inclusive, que deveríamos procurar baixar essa tensão ao máximo. Eu sei que isso não é fácil, que existe uma retórica antiamericana muito forte na região, porém, estamos condenados - a América Latina e os Estados Unidos - ao convívio, vivemos na mesma região e acho que ganharíamos muito se tivéssemos uma boa convivência. O Brasil conseguiu manter nesse período uma relação muito boa com os Estados Unidos. Nos últimos meses tem esse problema do Irã que criou uma certa gruma aí, mas não me parece que seja uma coisa consistente. Quando você assume uma função como a de presidente dos Estados Unidos, você não faz só o que quer. Você sofre uma série de constrangimentos naturais, normais.
A própria relação dos Estados Unidos com a Colômbia, num certo momento, estava complicada por uma série de razões. E estamos muito satisfeitos com a ideia de que se possa lançar rapidamente uma solução pacífica da guerrilha.
Como é que você vê isso?
Eu acho que o presidente dos Santos tem uma percepção muito clara de que é preciso mudar a agenda da Colômbia. A Colômbia tem que deixar de ser o país das Farcs, da guerrilha, tem que ser vista como um país de todas as possibilidades. Eu estou convencido de que ele vai se empenhar muito em chegar a uma solução de paz. Eu não vejo nenhum futuro para as Farcs, nenhum futuro. E acho que se houver futuro, será um futuro amargo porque esses movimentos, quando eles entram em declínio, eles não entram em declínio de uma hora para a outra, é um declínio longo, sangrento, sacrificando milhares de pessoas que podem perfeitamente ter um outro papel na vida política colombiana.
E como poderá Dilma, se eleita, contribuir nesse processo de reconciliação da Colômbia? É claro que [o presidente Juan Manuel] Santos fala que esse é um problema deles e todo mundo sabe disso, mas a própria Dilma falou que ela também estaria muito interessada.
Nós não nos imiscuímos na situação interna da Colômbia, e essa posição vai persistir. E sempre nos colocamos dispostos a ajudar. Bom, a Dilma tem a seu favor duas coisas. Em primeiro lugar, ela tem uma boa percepção da política internacional. Ela não é uma neófita. E terá o Itamaraty para ajudá-la na implementação da política internacional. Em segundo lugar, ela é uma pessoa com grande determinação pessoal, assertiva. Ela terá uma agenda muito ampla, felizmente o Brasil hoje tem um leque de questões internacionais. Eu tenho a impressão de que, em primeiro lugar, eleita presidente, ela acompanhará o Lula na reunião do G20. Ela estará presente na reunião do Mercosul, quando o Brasil deixa a presidência. Pode ser até que ela venha a presidir a reunião do Mercosul, se a reunião fosse jogada para janeiro, como aconteceu com a da Argentina, que atrasou um pouquinho. Enfim, ela vai te r os seus dossiês aí rapidamente para tratá-los.
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Marco Aurélio Garcia, assessor da presidência da República para assuntos internacionais, recebeu com exclusividade o Le Monde Diplomatique Brasil no Palácio do Planalto. Entre os temas tratados na entrevista, o Mercosul, a integração regional, a crise econômica e o modelo de desenvolvimento.
Qual é o balanço desses quase oito anos de política externa?
O êxito que nós tivemos em matéria de política externa se expressa hoje numa forte projeção do Brasil no mundo, que foi dado essencialmente pelas grandes transformações que nós tivemos internamente porque não só elas foram inéditas no caso brasileiro, mas, de certa maneira, foram também inéditas, ou quase inéditas, no mundo. Crescer com distribuição de renda, com estabilidade macroeconômica, com redução da vulnerabilidade externa e com democracia, não é pouca coisa. Por outro lado, incorporamos o contexto mundial como um elemento essencial para o país.
A política externa do Brasil não pode ser simplesmente entendida como um mecanismo de projeção do Brasil no mundo, ela é um elemento substancial do próprio projeto nacional brasileiro. Nós não podemos nos pensar fora do mundo, fora da região. Vivemos num mundo em transição, uma transição longa, e o desfecho não é totalmente previsível a julgar pelas transformações que o mundo passou desde os anos 1990. Fortalece-se a perspectiva de que devemos construir um mundo dominado por valores multilaterais. E nós acreditamos que este multilateralismo, ele se traduzirá também na constituição de um mundo multipolar.
Fizemos a aposta de desenvolver um processo de integração regional. Hoje, a América do Sul ocupa um lugar privilegiado no mundo e talvez ela própria não tenha consciência perfeita disso. Temos as maiores reservas de energia do mundo: petróleo, gás, carvão, potencial hidroelétrico, biocombustíveis, energia nuclear, eólica, solar etc. E o mundo demandará cada vez mais energia. Temos grandes recursos de alimentação, e recursos que não são mais resultantes daquele tipo de produção primária, exportadora, do passado. Nossa agricultura tem alta produtividade, que não existiria sem pesquisa científica, tecnológica etc. Temos grandes reservas de minério, que obviamente serão importantes para qualquer etapa da humanidade, mas particularmente para essa onde está havendo certas zonas de crescimento industrial muito forte. E nós já temos polos industriais significativos, alguns de ponta. É claro que vamos ter qu e enfatizar muito mais políticas industriais locais, nacionais e regionais.
Mas temos também outros trunfos, mudanças sociais que estão ocorrendo praticamente em todos os países, que propiciaram a inclusão de dezenas de milhões de pessoas à condição de produtores e consumidores. A região se transformou num grande mercado e num grande polo produtor. São quase 400 milhões de sul-americanos, uma população com traços de homogeneidade muito maiores do que em outras regiões do mundo.
Quais são os problemas? Temos baixo nível de integração. A integração que tínhamos anteriormente era uma integração centralmente comercial. Mercosul, Comunidade Andina etc. E essa integração essencialmente comercial, ainda que ela seja importante os dados de comércio exterior brasileiro e da região atestam isso ela tem dificuldades, tendo em vista que o confronto de uma economia como a brasileira com outras economias de menor escala pode aprofundar assimetrias entre o Brasil e outros países. Nós temos que pensar num tipo de integração que transcenda o aspecto puramente comercial e que vá em outra direção.
Nós temos um baixíssimo nível de integração física. Por incrível que pareça, agora, nesse fim dos oito anos do governo Lula, passamos a ter as primeiras conexões Atlântico-Pacífico. Vamos inaugurar a Transoceânica lá com o Peru. Agora em outubro devemos inaugurar essa estrada Iquique-Santos, passando pela Bolívia. Há também projetos muito consistentes, como a ligação Porto Alegre e Coquimbo, que vai implicar em um grande túnel na Argentina. Serão caminhos de integração muito importantes, que vão diminuir consideravelmente o custo das nossas exportações e vão provocar também uma maior inter-relação dos nossos países.
A simples ponte que nós fizemos no Peru mudou o perfil da relação Peru-Brasil e fez com que nós fossemos obrigados, inclusive, a aprofundar certas concessões importantes no que diz respeito ao domínio comercial propriamente dito. Por que os habitantes de Manaus têm que importar verduras de São Paulo quando eles podem importar do Peru por um preço muito mais barato? Essa integração vai favorecer também uma maior internalização dos nossos países, que são muito concentrados na faixa litorânea.
A região está crescendo e vai precisar de um planejamento estratégico em matéria de energia. Nós constatamos um grande paradoxo, a região tem as maiores reservas energéticas do mundo, mas tem apagão na Argentina, no Uruguai, no Chile, no Paraguai, na Venezuela. Em toda parte tem apagão. Então, o que é que precisamos? Nós precisamos estabelecer uma grande rede energética para podermos potencializar essa capacidade num período em que as taxas de crescimento devem ser muito elevadas. Aqui no Brasil está se falando de 7,5% ou 8%, na Argentina as cifras não são muito diferentes, no Uruguai também. E não tem sentido que os países promovam este crescimento de forma isolada.
Para enfrentarmos o tema das assimetrias precisamos ter políticas produtivas comuns, de integração. Políticas agrícolas e políticas industriais. Isso, nós estamos fazendo como uma experiência piloto - e os argentinos também estão participando - no caso da Venezuela.
A Venezuela é um país extraordinário, é um país com grandes riquezas minerais, petróleo, no entanto, há muitas décadas ela exporta petróleo e importa alface, tomate, ovos, frango. O que era muito funcional, tendo em vista o tipo de classe dominante que tinha lá. E criou, inclusive, uma burguesia importadora, também elitista, feliz da vida com isso. A conversão dessa economia petroleira em uma economia mais complexa, ela pode ser feita porque a Venezuela tem um mercado interno de 28 milhões de pessoas.
A Venezuela ocupa um lugar importante na área andina, ela pode se ligar a todos os mercados adjacentes, e pode suprir uma série de demandas da região. Então, nós começamos a fazer um trabalho de integração com os venezuelanos, abrimos um escritório da Embrapa lá e um escritório da Agência Brasileira do Desenvolvimento Industrial, ABDI, para desenvolver projetos agrícolas, produzir. O que eles querem? Garan tir a sua segurança alimentar e também produzir uma série de insumos, de manufaturas, que não tem sentido que eles importem, além de itens ligados à própria produção petrolífera etc.
Nós demos uma importância muito grande à construção da linha de transmissão entre Itaipu e Assunción porque achamos que, concluída essa linha, Assunción pode se transformar num grande polo industrial que vai atrair o investimento brasileiro. Já tem uma fábrica de cimento que se estabeleceu lá e tem uma série de investidores que já estão de olho para investir lá. Isso muda o perfil.
Outro item é a integração financeira. Eu tinha um entusiasmo muito grande com a possibilidade de que nós pudéssemos acelerar uma integração financeira. Hoje eu acho que é uma coisa mais complexa. Partes dessa integração financeira já estão se realizando e podem se realizar no curto prazo. Outras, não. Por exemplo, moeda comum, eu acho muito difícil. O Banco Central comum, acho muito difícil e a experiência europeia agora está nos mostrando isso. Mas pudemos avançar em várias coisas e temos que implementar mais fortemente o Banco do Sul.
Ainda que hoje o problema não seja tanto um problema de recursos. Há recursos. O problema é muito mais um problema de garantias. O BNDES pode perfeitamente alavancar muito mais as empresas brasileiras e até outras empresas não brasileiras, mas sul-americanas, na região, sobretudo agora quando criarmos o nosso Eximbank (banco que financia exportações e importações). O próprio BID teve que se adaptar a essa nova realidade. Mas o Banco do Sul, sem dúvida nenhuma, vai ser um instrumento importante.
Outra coisa, que começamos a fazer com a Argentina, são trocas em moeda local. Com a Argentina já começou e nós estamos negociando com muitos países da região. Se conseguirmos introduzir isso, estamos dando uma resposta regional ao problema da crise desse modelo do dólar no mundo. Isso baixa os custos do comércio exterior, viabiliza mais a participação de pequenas e médias empresas, que muitas vezes não têm capacidade de comercializar em dólar.
Eu acho que temos um baixo nível de institucionalização dos nossos mecanismos de integração do Mercosul. Se você observar o que é a estrutura do Mercosul em Montevidéu é ridícula, não porque seja má, ridícula porque é pequena. Na Unasul, levamos muito tempo para avançar na eleição da secretaria-geral, o Kirchner está sendo um excelente secretário-geral. Mas uma série de coisas, seja no âmbito do Mercosul, seja no âmbito da Unasul, está muito lenta ainda, está muito devagar.
Os países têm muita resistência em combinar, nos processos de integração, questões de supranacionalidade.
Evidentemente, se você começa a integrar, você perde certas cotas de soberania e isso é muito, muito difícil. No caso da América do Sul, eu acho que as dificuldades talvez venham a ser menores do que as europeias porque o nacionalismo na América do Sul sempre foi um nacionalismo muito em favor da integração. Todas as grandes potências nacionalistas da região sempre foram entusiastas da integração sul-americana ou latino-americana. Peronismo e chavismo, que são dois exemplos muito gritantes de nacionalismo, sempre foram muito favoráveis à ideia da pátria grande etc. Então, por aí nós não vamos ter grandes dificuldades. Eu acho que não haverá as resistências ideológicas porque o nosso nacionalismo é diferente do nacionalismo europeu que é um nacionalismo ensimesmado, rancoroso, conservador, exc ludente.
Quando você fala que estamos em momento de transição, transição para onde? O planeta está se dando conta que não tem recursos suficientes para tanta gente, que os recursos estratégicos vão se exaurir. E nós temos aqui a vantagem de ter o Pré-sal, de ter os minérios e tudo o mais. Um projeto de desenvolvimento brasileiro baseado na exploração das commodities, na exportação da soja, na grande concentração da terra, é um modelo de desenvolvimento que está posto em causa no mundo inteiro. Se nós potencializarmos nossas capacidades, não estaríamos entrando na contramão no sentido de que temos de cuidar mais dos recursos naturais, preservar o planeta? O que a estratégia brasileira está projetando não é a continuidade do modelo anterior? Por outro lado, o Brasil é a metade da América Latina. O PIB é a metade, a população é a metade, a terra é a metade. E existe um discurso dos nossos vizinhos que fala do imperialismo brasileiro e de que as assimetrias estão se acentuando. Se você for ver, o capital brasileiro na Bolívia, na Argentina, Uruguai, Paraguai, ele está muito presente. E a estratégia brasileira de expansão apoia empresas que se transformam em global players brasileiros, como a Odebrecht, a OAS, a Queiroz Galvão, quer dizer, elas vão junto no pacote das relações diplomáticas. Como é que você vê essa contradição?
Em primeiro lugar, nós não estamos fazendo uma revolução socialista no Brasil, certo? Então, isso significa, concretamente, que vamos continuar convivendo com empresas grandes, médias, pequenas. Oxalá, nós possamos, inclusive, estabelecer um equilíbrio entre essas empresas médias e pequenas. Na questão da terra tem havido uma tentativa de estabelecer quase que uma divisão de trabalho que tem até expressão institucional. Nós temos dois ministérios de agricultura, o ministério da reforma agrária e o ministério do agrobusiness. E acho que eles têm convivido razoavelmente.
A ideia do imperialismo brasileiro é, a meu juízo, minoritária na cabeça de alguns setores na América Latina, e ela sempre existirá. De uma maneira geral, a visão que os sul-americanos e que os latino-americanos têm do Brasil é muito boa. Nós temos, inclusive, pesquisas sobre isso.
É óbvio que nós somos colocados, em determinados momentos, diante de dilemas insolúveis. Você não tem formas de equilibrar o comércio com todos os países da região. Não tem. A menos que você deixe de exportar coisas que eles demandam e que se eles não comprarem de nós, eles vão comprar dos Estados Unidos, da Europa. E isso por uma razão muito simples, nós temos uma economia extremamente diversificada, com um nível de produtividade crescente, enquanto que outros países, como o Chile, tem seis produtos de exportação. Ele exporta o quê? Coisas do mar, vinho, frutas, cobre, madeira e celulose. Nós importamos essas coisas, mas nós podemos exportar "trocentas" coisas para lá.
A única maneira de resolver isso é impulsionar o desenvolvimento industrial e agrícola desses países para que eles possam realizar um certo tipo de substituição de importações; e criar mecanismos para estimular a importação desses produtos. O Itamaraty tem um programa que se chama Programa de Substituição Competitiva de Importações, que nos leva, por exemplo, a mandar técnicos para a Bolívia para ensinar as empresas bolivianas a exportar para o Brasil. Mas isso tem os seus limites. Todos os países melhoraram os níveis de exportação para o Brasil nesses dois últimos anos, o problema é que o Brasil também melhorou muito. Então, a única maneira que nós temos é ajudar a industrialização desses países, criar um complexo produtivo.
O fato de que hoje em dia uma parte crescente da economia argentina - que é um grande país - esteja controlada por capitais brasileiros é visto de forma contraditória. Têm pessoas que dizem: olha o imperialismo brasileiro, precisamos nacionalizar. No entanto, há uma demanda de investimentos lá, brasileiros. Como é que você fica então?
E temos um tipo de política que nos tem criado problemas aqui, não nos países lá. Quando nós negociamos o preço do gás com a Bolívia, quando aceitamos sem conflito o processo de nacionalização da Petrobras, que foi indenizada, ou quando fizemos esse acordo com o Paraguai sobre o preço da energia de Itaipu, que está trancado aqui no Congresso, o que a direita brasileira está nos dizendo? Nos acusa de generosidades, dizem que somos muito molengas com o Evo Morales, que os paraguaios fazem o que bem entendem, os argentinos todo dia estão fazendo desfeita etc. O que não é absolutamente verdade. Os conflitos que existem na esfera comercial afetam 5%, 6% do comércio, e afetam transitoriamente e são resolvidos. Como se na União Europeia não houvesse nenhum problema, tudo funcionasse de uma forma melhor.
Assim como não nos interessa São Paulo próspero e o Nordeste destroçado, também não nos interessa um Brasil próspero e uma Bolívia, um Paraguai, e outros países, afetados gravemente por problemas econômicos e sociais. O grande dinamismo que a economia brasileira tem precisa ser pensado como um fator dinamizador para essas economias.
O Pré-sal vai significar a construção de 200 navios. Não se produz 200 navios no mundo, hoje. Vai significar plataformas, gasodutos, encanamento. Ele vai produzir um impacto industrial sobre o país que será absolutamente devastador, que transcende o domínio do petróleo e do gás. Vai afetar todo o setor de máquinas e equipamentos e está estimulando até a produção dos outros países. A Venezuela, e a Colômbia estão começando a criar estaleiros. E o Uruguai está produzindo partes. Por outro lado, temos que nacionalizar mais ou regionalizar mais o processo da produção da indústria automotiva. Por isso a questão institucional da Unasul e do Mercosul é fundamental.
Sobre a questão do modelo, o grande problema que enfrentamos num país como o Brasil, e em outros países da região, é que nós vivemos problemas do presente, mas também vivemos problemas do passado e do futuro. Ora, falar em consumismo num país que tinha 40 milhões vivendo abaixo da linha da pobreza? Nós vamos ter que passar por um período mais ou menos parecido àquele que os Estados Unidos viveram do fim do século XIX, até a crise de 1929.
Eu acho que nós temos pela frente um conjunto de desafios materiais e imateriais absolutamente fenomenal. Nós temos podido compatibilizar, na área rural, grande propriedade e agricultura familiar. Tem que melhorar isso? Tem que melhorar. Mas a grande verdade é que o consumo interno do país é garantido hoje pela agricultura familiar. Isso não é pouca coisa. E estamos com um tipo de agricultura empresarial que é uma agricultura sofisticada, que vai sendo estimulada pela demanda internacional. A China não tem condições de alimentar a sua população. É óbvio. Eles têm 20% das terras agricultáveis no país e 1,2 bilhão de pessoas. E a Índia também está nesta situação. Quer dizer, haverá uma demanda.
Agora, todo progresso, com todas as conotações ideológicas que essa expressão tem, traz contrapartidas negativas, evidentemente. O Programa Luz para Todos, sem dúvida nenhuma, deve trazer ao Brasil algumas perturbações do ponto de vista ambiental. Mas eu posso defender que 10 milhões de pessoas continuem a viver com candeeiro e vela?
A transição a que eu me referia é a seguinte: antes da queda do Muro de Berlim, da dissolução da União Soviética, nós tínhamos um mundo bipolar, um mundo que vivia a ameaça da guerra nuclear. A União Soviética, os países do leste europeu, desaparecem enquanto modelo socioeconômico, enquanto projeto político. A China transita na direção da economia de mercado.
E o que você tem como resíduo político-ideológico daquele modelo, outrora tão poderoso, do século XX, são pequenos núcleos irrelevantes para se pensar um projeto de mundo. Cuba, Vietnã, e mesmo o Vietnã mudou, Coréia do Norte etc. Como modelo, do ponto de vista do projeto social, eles estão fragilizados. Isso se junta com a crise da concepção da democracia. O que coincide com uma grande hipertrofia dos Estados Unidos enquanto potência econômica, política e militar, guerra do Iraque e aquelas coisas todas.
Nós passamos então a transitar em outra direção. Eu estive recentemente na França, conversando com alguns amigos que não via há algum tempo, e eles têm uma enorme simpatia e atração por conhecer melhor o que eles chamam a Social-democracia do Sul. O que é a Social-democracia do Sul? Somos nós! Sem aquele contexto, porque a socialdemocracia num certo momento foi um projeto que não deu certo, mas cujas premissas são expectativas de um governo capaz de compatibilizar democracia econômico-social com a democracia política. O que é que eu quero mais do que isso?
Alguns teóricos estão falando que a América do Sul é uma usina de pensamento político. No caso do Brasil, por ser a grande potência econômica, geográfica, será que esse modelo da Social-democracia do Sul pode ser um modelo exportável como ideia?
Eu acho que esse é um dos grandes problemas que estamos enfrentando na região, é que as mudanças que houve, elas são muito mais importantes do que a reflexão sobre essas mudanças. E eu acho que nós temos uma esquerda - e eu estou aqui nos incluindo - em crise. Eu gosto muito de uma frase, que não é minha: antes nós tínhamos ideias e não tínhamos votos, agora nós temos votos e não temos ideias.
Essa já é uma experiência duradoura. No Brasil nós estamos com a expectativa de que isso dure mais tempo. Na Venezuela já dura 10 anos. Na Bolívia está durando. No Uruguai está durando. Na Argentina durará, não tenho a menor dúvida, ainda que o perfil da esquerda lá seja diferente, porque lá você tem esquerda no governo e na oposição. Mesmo num país como o Chile, onde a esquerda sofreu uma escovada forte, ela hoje está obrigada a se repensar. Tem mais o Equador, tem mais o Paraguai, enfim, hoje em dia você não tem nenhum país da região onde essas questões não se colocam.
Eu considero que a relação com a Argentina é absolutamente essencial para o Brasil, sem a liga, uma boa relação Brasil Argentina, não haverá integração regional. Há outros países também que podem ter um papel importante, como a Colômbia. Tão logo ela resolva o seu contencioso interno, e acho que vai resolvê-lo, será um país que vai ter também um papel fundamental na região.
Não se esqueçam que na cúpula de Mar del Plata nós tivemos uma seleção Brasil Argentina com Kirchner e Lula no ataque e marcando gol. Quem derrubou a Alca não foi nosso amigo Chávez, quem derrubou a Alca naquele momento foi o Kirchner, o Lula, com o apoio dos uruguaios e dos paraguaios, sofrendo uma pressão dos demônios.
Você está falando em um projeto multipolar, mas parece que a aposta é no G20. Por que não o G192, que são as nações associadas à ONU?
O G20 é uma expressão renovada da crise de governança mundial. Como o multilateralismo foi relegado a uma posição secundária, o que nós tivemos num determinado momento foi a criação de um diretório ad hoc, que foi o G7, depois G8.
Já no começo do governo Lula, começou a haver a percepção de que esse era um diretório obsoleto. Em Aviens, o Chirac convidou 12 países mais, Brasil, Egito, México, a Nigéria, Argélia, África do Sul, a China, a Índia etc. Depois, com exceção da reunião do G8 que se fez nos Estados Unidos, quando Bush não convidou ninguém, todas as reuniões subsequentes contaram sempre com a presença destes países, até que isso afunilou para um G5, e na reunião da Escócia o Lula disse: "se for só para o cafezinho, eu não vou".
Quando houve a crise de setembro de 2008, os primeiros dias da crise coincidiram com a Assembleia Geral da ONU, aí o Lula, no seu discurso, fez alusão à crise. Umas semanas depois, no meio de outubro, o Bush telefonou para o Lula e disse, olha, eu estou com você e quero convocar uma reunião de países para discutir a crise no dia 15 de novembro, quem é que você acha que deve ir? E o Lula, de batepronto, disse: eu acho que deve ser o G20, G20 financeiro. Ora, o G20 financeiro era uma instituição de segunda, terceira linha, porque ele era integrado pelos ministros da fazenda, mas na prática eram os chefes de gabinete, os secretários internacionais dos ministérios que iam. Isso não quer dizer que ela não fosse importante. Discutimos várias coisas importantes, e com isso, o G20 ganhou importância.
Tivemos uma reunião em São Paulo, quando o Brasil estava presidindo, nessa ocasião o G20 foi até ampliado porque tinha o problema da Espanha, que queria participar. O Sarkozy usou um artifício enquanto presidente da União Europeia. Ele cedeu o lugar para a Espanha ir no lugar da França. Eu acho que essa situação é expressão dessa crise mundial de governança e o G20 também é um diretório ad hoc. A diferença é que é um diretório ad hoc mais representativo porque inclui México, Argentina, Brasil, Indonésia, África do Sul, Nigéria, Egito. Já tem uma composição, eu diria, um pouco mais significativa. Essa crise de governança mundial provoca outros movimentos, o Ibas, os Bric, agora surge o SEVIT, com Colômbia, Egito, Vietnã, Indonésia, Turquia e África do Sul.
Isso nos traz para a relação com os Estados Unidos. Ela apresenta sinais contraditórios. Havia toda uma expectativa de que o Obama fosse um mediador, um negociador para a América Latina, e o que a gente está vendo é o contrário, os EUA fizeram novos acordos para bases militares em vários lugares, Costa Rica, Colômbia, reativaram a IV Frota, ou seja, a América Latina entrou no radar dos Estados Unidos, que consideram que há uma certa instabilidade política no seu quintal. Isso coloca em oposição a Unasul e os Estados Unidos? Porque há um plano regional de defesa, inclusive com a perspectiva de uma integração da indústria bélica, na América do Sul? Esses movimentos indicam que nós vamos passar períodos difíceis na relação com os Estados Unidos?
Não. Não. Primeiro, eu não acho que a América Latina seja uma zona de preocupação imediata dos Estados Unidos. São uma preocupação dos Estados Unidos, o Paquistão, o Afeganistão, o Oriente Médio, talvez alguns setores na África. Pelo contrário, eu acho que os Estados Unidos, por enquanto, consideram que essa é uma região tranquila. Eles têm algumas preocupações que estão ligadas a movimentos de desestabilização, movimentos políticos. Evidentemente eles devem ter uma enorme preocupação com a situação mexicana. Mesmo se forem resolvidos os problemas no México, os esquemas da criminalidade podem se estender pelo conjunto da América Central. O que é real. O problema desses grupos delinquentes, ligados ou não ao narcotráfico, ao tráfico de armas, tem uma incidência muito forte em países como a Guatemala, Honduras, Salvador.
A questão das bases militares, eu acho que elas correm um pouco autonomamente. Quando se falou na IV Frota, altos funcionários do governo americano disseram que não tinham informações sobre isso. Eu tenho a impressão que isso corresponde muito mais a um cacoete estratégico de um país que mantém ainda essa aspiração de ser, digamos, o grande responsável pela segurança coletiva no mundo.
Isso explica porque é que há reações negativas sempre que algum país quer influir sobre questões de segurança coletiva, sobre alguns pontos nevrálgicos, como é o diferendo que nós tivemos com os Estados Unidos sobre o Irã. É isso. Quem são esses caras que vão se meter numa briga que não é deles? Essa briga é nossa, dizem eles. Só que eles estão resolvendo mal essa briga e durante um bom período estiveram resolvendo mal a briga do Oriente Médio.
No caso dos temas de segurança coletiva da região, um dos acertos que a Unasul teve, e nisso funcionou muito a intuição do Lula, porque foi o Lula que fez essa proposta, foi a criação de um Conselho de Defesa Sul-americano. O processo de integração não pode prescindir de tratar o tema de segurança coletiva.
Uma das dificuldades que a integração europeia enfrenta é o fato de que ela não tem um quadro de segurança coletiva próprio, ela tem o guarda-chuva da OTAN, então isso significa concretamente que ela terá que estar sempre em sintonia com os Estados Unidos porque, entre outras coisas, os Estados Unidos comandam a OTAN.
Eu acho que é óbvio que o complexo militar e industrial dos EUA, como chamava o Eisenhower, não gostará de ver surgir uma indústria de defesa regional. As pessoas têm que saber que pagam um preço por certas limitações que elas impõem nesse modelo. Quando nós fomos vender os Super Tucanos para a Venezuela, não foram as empresas que fornecem partes para o Super Tucano que protestaram, elas estavam dispostas, foi o governo americano que impediu. É o Congresso, que tem comitês rígidos. Então, as pessoas têm que saber que assim não dá.
Mas eu não acho que nós estejamos vivendo um momento de tensão com os Estados Unidos. Muito pelo contrário. E acho, inclusive, que deveríamos procurar baixar essa tensão ao máximo. Eu sei que isso não é fácil, que existe uma retórica antiamericana muito forte na região, porém, estamos condenados - a América Latina e os Estados Unidos - ao convívio, vivemos na mesma região e acho que ganharíamos muito se tivéssemos uma boa convivência. O Brasil conseguiu manter nesse período uma relação muito boa com os Estados Unidos. Nos últimos meses tem esse problema do Irã que criou uma certa gruma aí, mas não me parece que seja uma coisa consistente. Quando você assume uma função como a de presidente dos Estados Unidos, você não faz só o que quer. Você sofre uma série de constrangimentos naturais, normais.
A própria relação dos Estados Unidos com a Colômbia, num certo momento, estava complicada por uma série de razões. E estamos muito satisfeitos com a ideia de que se possa lançar rapidamente uma solução pacífica da guerrilha.
Como é que você vê isso?
Eu acho que o presidente dos Santos tem uma percepção muito clara de que é preciso mudar a agenda da Colômbia. A Colômbia tem que deixar de ser o país das Farcs, da guerrilha, tem que ser vista como um país de todas as possibilidades. Eu estou convencido de que ele vai se empenhar muito em chegar a uma solução de paz. Eu não vejo nenhum futuro para as Farcs, nenhum futuro. E acho que se houver futuro, será um futuro amargo porque esses movimentos, quando eles entram em declínio, eles não entram em declínio de uma hora para a outra, é um declínio longo, sangrento, sacrificando milhares de pessoas que podem perfeitamente ter um outro papel na vida política colombiana.
E como poderá Dilma, se eleita, contribuir nesse processo de reconciliação da Colômbia? É claro que [o presidente Juan Manuel] Santos fala que esse é um problema deles e todo mundo sabe disso, mas a própria Dilma falou que ela também estaria muito interessada.
Nós não nos imiscuímos na situação interna da Colômbia, e essa posição vai persistir. E sempre nos colocamos dispostos a ajudar. Bom, a Dilma tem a seu favor duas coisas. Em primeiro lugar, ela tem uma boa percepção da política internacional. Ela não é uma neófita. E terá o Itamaraty para ajudá-la na implementação da política internacional. Em segundo lugar, ela é uma pessoa com grande determinação pessoal, assertiva. Ela terá uma agenda muito ampla, felizmente o Brasil hoje tem um leque de questões internacionais. Eu tenho a impressão de que, em primeiro lugar, eleita presidente, ela acompanhará o Lula na reunião do G20. Ela estará presente na reunião do Mercosul, quando o Brasil deixa a presidência. Pode ser até que ela venha a presidir a reunião do Mercosul, se a reunião fosse jogada para janeiro, como aconteceu com a da Argentina, que atrasou um pouquinho. Enfim, ela vai te r os seus dossiês aí rapidamente para tratá-los.
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A vingança póstuma de Otavio Frias
Reproduzo artigo de Eduardo Guimarães, publicado no Blog da Cidadania:
O homem fardado e a declaração na foto acima correspondem a Otávio Frias de Oliveira, o falecido fundador do jornal Folha de São Paulo. Imagem e palavras pertencem a momentos distintos de sua vida. Todavia, unidas explicam por que seu herdeiro Otavio Frias Filho, o “Otavinho”, foi resgatar em arquivos dos órgãos de repressão da ditadura militar as desculpas usadas por esta para prender e torturar Dilma Vana Rousseff, a presidente eleita do Brasil.
Frias de Oliveira lutou na Revolução Constitucionalista de 1932, que tentou dar um golpe de Estado contra Getúlio Vargas. Coerente com seu apreço pelo militarismo e pela derrubada de governos dos quais não gostava, apoiou o golpe militar de 1964. Nesse período, a Folha de São Paulo serviu de voz e pernas para os ditadores que se sucederiam no poder ao exaltá-los e ao transportar para eles seus presos políticos até os centros de tortura do regime.
No dia 21 de setembro de 1971, a Ação Libertadora Nacional (ALN) incendiou camionetes da Folha que eram utilizadas para entregar jornais. Os responsáveis acusavam o dono do jornal de emprestar os veículos para transporte de presos políticos. Frias de Oliveira respondeu ao atentado publicando um editorial na primeira página no dia seguinte, sob o título “Banditismo”.
Eis um trecho do texto:
“Os ataques do terrorismo não alterarão a nossa linha de conduta. Como o pior cego é o que não quer ver, o pior do terrorismo é não compreender que no Brasil não há lugar para ele. Nunca houve. E de maneira especial não há hoje, quando um governo sério, responsável, respeitável e com indiscutível apoio popular está levando o Brasil pelos seguros caminhos do desenvolvimento com justiça social - realidade que nenhum brasileiro lúcido pode negar, e que o mundo todo reconhece e proclama. [...] Um país, enfim, de onde a subversão - que se alimenta do ódio e cultiva a violência – está sendo definitivamente erradicada, com o decidido apoio do povo e da imprensa, que reflete os sentimentos deste. Essa mesma imprensa que os remanescentes do terror querem golpear.” (Editorial: Banditismo – publicado em 22 de setembro de 1971; Octavio Frias de Oliveira).
O presidente da República de então era Emílio Garrastazu Médici. Nomeado presidente pelos militares, comandou o período mais duro da ditadura militar. Foi a época do auge das prisões, torturas e assassinatos de militantes políticos de esquerda pelo regime.
Apesar dos elogios de Frias de Oliveira à ditadura, segundo a Fundação Getúlio Vargas foi no governo Médici que a miséria e a concentração de renda ganharam impulso. O Brasil teve o 9º Produto Nacional Bruto do mundo no período, mas em desnutrição perdia apenas para Índia, Indonésia, Bangladesh, Paquistão e Filipinas.
O uso político que o jornal Folha de São Paulo começou a fazer neste sábado das desculpas da ditadura para prender e torturar impiedosamente uma garota de 19 anos que lutava para libertar seu país do regime de exceção constitui-se, portanto, em uma vingança póstuma de um homem que dedicou sua vida à uma luta incessante contra a democracia, obviamente por acreditar que o povo não sabia votar.
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O homem fardado e a declaração na foto acima correspondem a Otávio Frias de Oliveira, o falecido fundador do jornal Folha de São Paulo. Imagem e palavras pertencem a momentos distintos de sua vida. Todavia, unidas explicam por que seu herdeiro Otavio Frias Filho, o “Otavinho”, foi resgatar em arquivos dos órgãos de repressão da ditadura militar as desculpas usadas por esta para prender e torturar Dilma Vana Rousseff, a presidente eleita do Brasil.
Frias de Oliveira lutou na Revolução Constitucionalista de 1932, que tentou dar um golpe de Estado contra Getúlio Vargas. Coerente com seu apreço pelo militarismo e pela derrubada de governos dos quais não gostava, apoiou o golpe militar de 1964. Nesse período, a Folha de São Paulo serviu de voz e pernas para os ditadores que se sucederiam no poder ao exaltá-los e ao transportar para eles seus presos políticos até os centros de tortura do regime.
No dia 21 de setembro de 1971, a Ação Libertadora Nacional (ALN) incendiou camionetes da Folha que eram utilizadas para entregar jornais. Os responsáveis acusavam o dono do jornal de emprestar os veículos para transporte de presos políticos. Frias de Oliveira respondeu ao atentado publicando um editorial na primeira página no dia seguinte, sob o título “Banditismo”.
Eis um trecho do texto:
“Os ataques do terrorismo não alterarão a nossa linha de conduta. Como o pior cego é o que não quer ver, o pior do terrorismo é não compreender que no Brasil não há lugar para ele. Nunca houve. E de maneira especial não há hoje, quando um governo sério, responsável, respeitável e com indiscutível apoio popular está levando o Brasil pelos seguros caminhos do desenvolvimento com justiça social - realidade que nenhum brasileiro lúcido pode negar, e que o mundo todo reconhece e proclama. [...] Um país, enfim, de onde a subversão - que se alimenta do ódio e cultiva a violência – está sendo definitivamente erradicada, com o decidido apoio do povo e da imprensa, que reflete os sentimentos deste. Essa mesma imprensa que os remanescentes do terror querem golpear.” (Editorial: Banditismo – publicado em 22 de setembro de 1971; Octavio Frias de Oliveira).
O presidente da República de então era Emílio Garrastazu Médici. Nomeado presidente pelos militares, comandou o período mais duro da ditadura militar. Foi a época do auge das prisões, torturas e assassinatos de militantes políticos de esquerda pelo regime.
Apesar dos elogios de Frias de Oliveira à ditadura, segundo a Fundação Getúlio Vargas foi no governo Médici que a miséria e a concentração de renda ganharam impulso. O Brasil teve o 9º Produto Nacional Bruto do mundo no período, mas em desnutrição perdia apenas para Índia, Indonésia, Bangladesh, Paquistão e Filipinas.
O uso político que o jornal Folha de São Paulo começou a fazer neste sábado das desculpas da ditadura para prender e torturar impiedosamente uma garota de 19 anos que lutava para libertar seu país do regime de exceção constitui-se, portanto, em uma vingança póstuma de um homem que dedicou sua vida à uma luta incessante contra a democracia, obviamente por acreditar que o povo não sabia votar.
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EUA aumentam operações clandestinas
Reproduzo artigo de Eva Golinger, publicado no sítio Carta Maior:
Segundo o informe anual de 2010 do Escritório de Iniciativas para uma Transição (OTI) da Agência Internacional de Desenvolvimento dos Estados Unidos (USAID) sobre suas operações na Venezuela, 9,29 milhões de dólares foram investidos esse ano em esforços para apoiar os objetivos da política exterior norte-americana e promover a democracia neste país sul americano. Esta cifra representa um aumento de quase dois milhões de dólares em relação ao ano passado, quando esse mesmo escritório de transição financiou atividades políticas contra o governo de Hugo Chávez com 7,45 milhões de dólares.
A OTI é uma divisão da USAID dedicada a apoiar objetivos da política exterior dos EUA através da promoção da democracia (segundo sua avaliação) em países que se encontram em crise. A OTI fornece assistência rápida, flexível e de curto prazo para transições políticas e de estabilização. Ainda que a OTI seja, tradicionalmente, um mecanismo de curto prazo para injetar milhões de dólares em fundos líquidos que influem sobre a situação política de países estrategicamente importantes para Washington, o caso da Venezuela é diferente. A OTI abriu sua sede nesse país em 2002 e a mantém até hoje, apesar de não contar com a devida autorização do governo da Venezuela. Na verdade, é o único escritório que a USAID mantém durante tanto tempo em algum país.
As operações clandestinas da OTI
Em nota oficial com a data de 22 de janeiro de 2002, o presidente da OTI, Russel Porter, revela como e por que a USAID chegou à Venezuela. Dias antes, em 04 de janeiro, o escritório de Assuntos Andinos do Departamento de Estado pediu a OTI para estabelecer um programa para a Venezuela. Estava claro que havia uma preocupação crescente sobre a saúde política do país. Solicitaram à OTI que oferecesse programas e assistência para fortalecer os elementos democráticos (sic) que estavam sob a mira do governo de Chávez.
Porter visitou a Venezuela em 18 de janeiro de 2002 e logo comentou: "Para preservar a democracia, é necessário um apoio imediato para a mídia independente e para a sociedade civil. Uma das grandes debilidades da Venezuela é a falta de uma sociedade civil vibrante". A National Endowment for Democracy (NED) tem um programa de 900 mil dólares na Venezuela que apóia o Instituto Democrata (NDI), o Instituto Republicano Internacional (IRI) e o Centro de Solidariedade Laboral (três institutos quase governamentais norte americanos) para fortalecer os partidos políticos e os sindicatos (a CTV). Este programa é útil, porém não é suficiente. Alem do que não é flexível e nem trabalha com novos grupos ou grupos não tradicionais. E também lhe falta um componente de meios de comunicação.
Desde então, a OTI marca a sua presença na Venezuela enviando milhões de dólares por ano para manter vivo o conflito no país. Segundo o último informe anual de 2010, a OTI atua a partir da Embaixada dos Estados Unidos e é parte de um esforço maior para promover a democracia naquele país.
O principal investimento dos 9 milhões de dólares em 2010 foi durante a campanha eleitoral da oposição para as eleições legislativas de 26 de setembro passado. A USAID trabalha com vários associados da sociedade civil oferecendo assistência técnica para os partidos políticos, apoio técnico para os trabalhadores em direitos humanos e apoiando esforços para fortalecer a sociedade civil. Na Venezuela, sabe-se que `sociedade civil' é o outro nome com que se identifica a oposição ao governo de Hugo Chávez.
Os partidos políticos e as organizações financiadas pela USAID têm sido documentados através de uma grande investigação realizada por esta escritora e incluem grupos como Súmate, Ciudadania Activa, Radar de Los Barrios, Primero Justicia, Um Nuevo Tiempo, Acción Democrática, Copei, Futuro Presente, Voluntad Popular, Universidad Católica Andros Bello, Universidad Metropolitana, Sinergia, Cedice, CTV, Fedecamaras, Espacio Publico, Instituto Prensa y Sociedad, Voto Joven entre tantos que têm se dedicado à desestabilização do país.
Um fluxo secreto de dinheiro
Não obstante, o atual abastecimento de dinheiro da USAID/OTI a grupos e partidos políticos venezuelanos é mantido em segredo. Quando abriu suas operações em 2002, a OTI contratou a empresa estadunidense Development Alternatives Inc. (DAÍ) um dos maiores prestadores de serviços ao Departamento de Estado, da USAID e do Pentágono em nível mundial. Essa empresa, a DAÍ, operava uma empresa no El Rosal - o Wall Street de Caracas - de onde distribuía fundos milionários a organizações venezuelanas através de pequenos convênios não superiores a 100 mil dólares cada um.
De 2002 a 2010 mais de 600 desses pequenos convênios foram entregues por esse escritório a grupos da oposição venezuelana para seguirem alimentando o conflito no país e apoiando os esforços para provocar a saída do poder do presidente Hugo Chávez.
Em finais de 2009, a empresa DAÍ começou a ter graves problemas com suas operações no Afeganistão, quando foram assassinados cinco de seus empregados por supostos militantes do Talibã durante um ataque com explosivos na cidade de Gardez em 15 de novembro. Alguns dias antes, um de seus empregados havia sido detido em Cuba e acusado de espionagem e subversão pela distribuição ilegal de componentes de satélite a grupos contra-revolucionários.
Quando escrevi um artigo publicado em 30 de dezembro de 2009, e agentes da CIA mortos no Afeganistão trabalhavam para uma empresa de fachada ativa na Venezuela e em Cuba, evidenciava-se o vínculo operacional da DAÍ no Afeganistão, em Cuba e na Venezuela e sua natureza suspeita, o próprio presidente e chefe executivo da empresa, Jim Boomgard, me contatou e alertou-me (melhor dizer ameaçou-me) que se continuasse a escrever o que escrevia, eu seria responsabilizada por qualquer coisa que se passasse com seus empregados em nível mundial.
Contudo, o senhor Boomgard, que disse não saber muito sobre as operações de sua empresa na Venezuela, conseguiu entender que o que faziam na Venezuela não valia tanto como o que faziam no Afeganistão. Semanas depois de sua entrevista comigo, o DAÍ, misteriosamente, fechou seu escritório em Caracas.
Entrementes, a OTI continua suas operações na Venezuela e mesmo tendo outros sócios norte americanos que manejam uma parte de seus fundos multimilionários, como IRI, NDI, Freedon House e a Fundación Panamericana Del Desarrollo (Fupad), não existe transparência sobre o fluxo de dinheiro de suas contrapartidas venezuelanas.
Um informe da Fundação para as Relações Internacionais e Diálogo Exterior (FRIDE) sobre a promoção da democracia na Venezuela, com data de maio de 2010, explica que grande parte do dinheiro vindo do exterior, mais de 50 milhões de dólares esse ano, segundo eles e que financia a grupos políticos de oposição na Venezuela, entra no país de forma ilícita em dólares ou euros e se transforma em dinheiro venezuelano no mercado negro (Assim que denunciei essas atividades ilegais baseadas no informe mencionado, o FRIDE desapareceu com o texto original e publicou um novo em que abandonava qualquer referência ao mecanismo de entrega de dinheiro externo a grupos venezuelanos).
Se o DAÍ já não atua na Venezuela realizando pequenos convênios com organizações opositoras com dinheiro estadunidense, o que cabe indagar é como chegam esses milhões de dólares a tais grupos e através de qual mecanismo? Segundo a USAID, suas operações estariam agora se realizando através da Embaixada dos Estados Unidos? Esta embaixada está entregando dinheiro diretamente a grupos de oposição venezuelanos?
O informe anual USAID/OTI de 2010 diz, especificamente, que seus esforços já estão dirigidos a um evento próximo: as eleições presidenciais de 2012 na Venezuela. Seguirão aumentando os milhões de dólares para a subversão e a desestabilização do país, incrementando a clandestinidade de suas operações na Venezuela, se o governo não tomar medidas concretas para impedir tal fato.
Operações psicológicas
Washington usa vários mecanismos de ingerência para tingir seus objetivos. As operações psicológicas são operações planificadas para transmitir informação seletiva e indicadores para públicos estrangeiros e com isso influir sobre suas emoções, motivos, racionalidade objetiva e - ultimamente - sobre o comportamento de governos, organizações, grupos e indivíduos, segundo o Pentágono.
No orçamento do Departamento de Defesa para 2011, há uma solicitação nova para operações psicológicas para o Comando Sul, que é quem coordena todas as missões militares dos Estados Unidos na América Latina. Em particular, tal solicitação fala de um programa de voz de operações psicológicas, o que se entende como rádio ou alguma outra transmissão de áudio que apóie esse objetivo.
Segundo a explicação contida no orçamento, a execução de operações psicológicas (PSYOP) inclui a investigação sobre audiências estrangeiras, desenvolvendo, produzindo e disseminando produtos (programas) para influir sobre essas audiências, bem como a condução de avaliações para determinar a eficácia das atividades de operações psicológicas. Essas atividades podem incluir a manutenção de várias páginas da web e o monitoramento de meios técnicos e eletrônicos.
O orçamento completo para as operações psicológicas durante o ano de 2011 é de 384.8 (trezentos e oitenta e quatro milhões e oitocentos mil) dólares, que inclui 201.8 (duzentos e um milhões e oitocentos mil) dólares para a divisão de operações psicológicas e o estabelecimento, pela primeira vez, de um programa de operações psicológicas com o uso da voz para o Comando Sul.
Este programa de operações psicológicas é totalmente distinto de iniciativas como A Voz da América, por exemplo, que é um programa do Departamento de Estado e da agência estatal Board Broadcasting Governors (BBG) que manejam a propaganda dos EUA em nível mundial. Na verdade, o orçamento da BBG para o ano de 2011 é de 768.8 milhões de dólares e inclui um programa de cinco dias a cada semana, em espanhol, para a televisão venezuelana.
O aumento das operações psicológicas dirigidos à Venezuela e a América Latina evidencia uma ampliação da agressão norte americana para com essa região. É preciso lembrar que, desde o ano de 2006, a Direção Nacional de Inteligência dos EUA desempenha uma missão especial de inteligência para a Venezuela e Cuba. Somente quatro dessas missões especiais existem no mundo: uma para o Irã, outra para a Coréia do Norte, uma terceira para o Afeganistão e o Paquistão e a quarta para Venezuela e Cuba. Essa missão recebe uma parte importante do orçamento de mais de 80 bilhões de dólares que emprega a Direção Nacional de Inteligência, entidade que coordena as 16 agências de inteligência em Washington.
* Eva Golinger é advogada e especialista em analisar documentos desclassificados pelo Departamento de Estado dos EUA, relativos a atividades na América Latina, em especial na Venezuela.
** Traduzido do espanhol por Izaías Almada.
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Segundo o informe anual de 2010 do Escritório de Iniciativas para uma Transição (OTI) da Agência Internacional de Desenvolvimento dos Estados Unidos (USAID) sobre suas operações na Venezuela, 9,29 milhões de dólares foram investidos esse ano em esforços para apoiar os objetivos da política exterior norte-americana e promover a democracia neste país sul americano. Esta cifra representa um aumento de quase dois milhões de dólares em relação ao ano passado, quando esse mesmo escritório de transição financiou atividades políticas contra o governo de Hugo Chávez com 7,45 milhões de dólares.
A OTI é uma divisão da USAID dedicada a apoiar objetivos da política exterior dos EUA através da promoção da democracia (segundo sua avaliação) em países que se encontram em crise. A OTI fornece assistência rápida, flexível e de curto prazo para transições políticas e de estabilização. Ainda que a OTI seja, tradicionalmente, um mecanismo de curto prazo para injetar milhões de dólares em fundos líquidos que influem sobre a situação política de países estrategicamente importantes para Washington, o caso da Venezuela é diferente. A OTI abriu sua sede nesse país em 2002 e a mantém até hoje, apesar de não contar com a devida autorização do governo da Venezuela. Na verdade, é o único escritório que a USAID mantém durante tanto tempo em algum país.
As operações clandestinas da OTI
Em nota oficial com a data de 22 de janeiro de 2002, o presidente da OTI, Russel Porter, revela como e por que a USAID chegou à Venezuela. Dias antes, em 04 de janeiro, o escritório de Assuntos Andinos do Departamento de Estado pediu a OTI para estabelecer um programa para a Venezuela. Estava claro que havia uma preocupação crescente sobre a saúde política do país. Solicitaram à OTI que oferecesse programas e assistência para fortalecer os elementos democráticos (sic) que estavam sob a mira do governo de Chávez.
Porter visitou a Venezuela em 18 de janeiro de 2002 e logo comentou: "Para preservar a democracia, é necessário um apoio imediato para a mídia independente e para a sociedade civil. Uma das grandes debilidades da Venezuela é a falta de uma sociedade civil vibrante". A National Endowment for Democracy (NED) tem um programa de 900 mil dólares na Venezuela que apóia o Instituto Democrata (NDI), o Instituto Republicano Internacional (IRI) e o Centro de Solidariedade Laboral (três institutos quase governamentais norte americanos) para fortalecer os partidos políticos e os sindicatos (a CTV). Este programa é útil, porém não é suficiente. Alem do que não é flexível e nem trabalha com novos grupos ou grupos não tradicionais. E também lhe falta um componente de meios de comunicação.
Desde então, a OTI marca a sua presença na Venezuela enviando milhões de dólares por ano para manter vivo o conflito no país. Segundo o último informe anual de 2010, a OTI atua a partir da Embaixada dos Estados Unidos e é parte de um esforço maior para promover a democracia naquele país.
O principal investimento dos 9 milhões de dólares em 2010 foi durante a campanha eleitoral da oposição para as eleições legislativas de 26 de setembro passado. A USAID trabalha com vários associados da sociedade civil oferecendo assistência técnica para os partidos políticos, apoio técnico para os trabalhadores em direitos humanos e apoiando esforços para fortalecer a sociedade civil. Na Venezuela, sabe-se que `sociedade civil' é o outro nome com que se identifica a oposição ao governo de Hugo Chávez.
Os partidos políticos e as organizações financiadas pela USAID têm sido documentados através de uma grande investigação realizada por esta escritora e incluem grupos como Súmate, Ciudadania Activa, Radar de Los Barrios, Primero Justicia, Um Nuevo Tiempo, Acción Democrática, Copei, Futuro Presente, Voluntad Popular, Universidad Católica Andros Bello, Universidad Metropolitana, Sinergia, Cedice, CTV, Fedecamaras, Espacio Publico, Instituto Prensa y Sociedad, Voto Joven entre tantos que têm se dedicado à desestabilização do país.
Um fluxo secreto de dinheiro
Não obstante, o atual abastecimento de dinheiro da USAID/OTI a grupos e partidos políticos venezuelanos é mantido em segredo. Quando abriu suas operações em 2002, a OTI contratou a empresa estadunidense Development Alternatives Inc. (DAÍ) um dos maiores prestadores de serviços ao Departamento de Estado, da USAID e do Pentágono em nível mundial. Essa empresa, a DAÍ, operava uma empresa no El Rosal - o Wall Street de Caracas - de onde distribuía fundos milionários a organizações venezuelanas através de pequenos convênios não superiores a 100 mil dólares cada um.
De 2002 a 2010 mais de 600 desses pequenos convênios foram entregues por esse escritório a grupos da oposição venezuelana para seguirem alimentando o conflito no país e apoiando os esforços para provocar a saída do poder do presidente Hugo Chávez.
Em finais de 2009, a empresa DAÍ começou a ter graves problemas com suas operações no Afeganistão, quando foram assassinados cinco de seus empregados por supostos militantes do Talibã durante um ataque com explosivos na cidade de Gardez em 15 de novembro. Alguns dias antes, um de seus empregados havia sido detido em Cuba e acusado de espionagem e subversão pela distribuição ilegal de componentes de satélite a grupos contra-revolucionários.
Quando escrevi um artigo publicado em 30 de dezembro de 2009, e agentes da CIA mortos no Afeganistão trabalhavam para uma empresa de fachada ativa na Venezuela e em Cuba, evidenciava-se o vínculo operacional da DAÍ no Afeganistão, em Cuba e na Venezuela e sua natureza suspeita, o próprio presidente e chefe executivo da empresa, Jim Boomgard, me contatou e alertou-me (melhor dizer ameaçou-me) que se continuasse a escrever o que escrevia, eu seria responsabilizada por qualquer coisa que se passasse com seus empregados em nível mundial.
Contudo, o senhor Boomgard, que disse não saber muito sobre as operações de sua empresa na Venezuela, conseguiu entender que o que faziam na Venezuela não valia tanto como o que faziam no Afeganistão. Semanas depois de sua entrevista comigo, o DAÍ, misteriosamente, fechou seu escritório em Caracas.
Entrementes, a OTI continua suas operações na Venezuela e mesmo tendo outros sócios norte americanos que manejam uma parte de seus fundos multimilionários, como IRI, NDI, Freedon House e a Fundación Panamericana Del Desarrollo (Fupad), não existe transparência sobre o fluxo de dinheiro de suas contrapartidas venezuelanas.
Um informe da Fundação para as Relações Internacionais e Diálogo Exterior (FRIDE) sobre a promoção da democracia na Venezuela, com data de maio de 2010, explica que grande parte do dinheiro vindo do exterior, mais de 50 milhões de dólares esse ano, segundo eles e que financia a grupos políticos de oposição na Venezuela, entra no país de forma ilícita em dólares ou euros e se transforma em dinheiro venezuelano no mercado negro (Assim que denunciei essas atividades ilegais baseadas no informe mencionado, o FRIDE desapareceu com o texto original e publicou um novo em que abandonava qualquer referência ao mecanismo de entrega de dinheiro externo a grupos venezuelanos).
Se o DAÍ já não atua na Venezuela realizando pequenos convênios com organizações opositoras com dinheiro estadunidense, o que cabe indagar é como chegam esses milhões de dólares a tais grupos e através de qual mecanismo? Segundo a USAID, suas operações estariam agora se realizando através da Embaixada dos Estados Unidos? Esta embaixada está entregando dinheiro diretamente a grupos de oposição venezuelanos?
O informe anual USAID/OTI de 2010 diz, especificamente, que seus esforços já estão dirigidos a um evento próximo: as eleições presidenciais de 2012 na Venezuela. Seguirão aumentando os milhões de dólares para a subversão e a desestabilização do país, incrementando a clandestinidade de suas operações na Venezuela, se o governo não tomar medidas concretas para impedir tal fato.
Operações psicológicas
Washington usa vários mecanismos de ingerência para tingir seus objetivos. As operações psicológicas são operações planificadas para transmitir informação seletiva e indicadores para públicos estrangeiros e com isso influir sobre suas emoções, motivos, racionalidade objetiva e - ultimamente - sobre o comportamento de governos, organizações, grupos e indivíduos, segundo o Pentágono.
No orçamento do Departamento de Defesa para 2011, há uma solicitação nova para operações psicológicas para o Comando Sul, que é quem coordena todas as missões militares dos Estados Unidos na América Latina. Em particular, tal solicitação fala de um programa de voz de operações psicológicas, o que se entende como rádio ou alguma outra transmissão de áudio que apóie esse objetivo.
Segundo a explicação contida no orçamento, a execução de operações psicológicas (PSYOP) inclui a investigação sobre audiências estrangeiras, desenvolvendo, produzindo e disseminando produtos (programas) para influir sobre essas audiências, bem como a condução de avaliações para determinar a eficácia das atividades de operações psicológicas. Essas atividades podem incluir a manutenção de várias páginas da web e o monitoramento de meios técnicos e eletrônicos.
O orçamento completo para as operações psicológicas durante o ano de 2011 é de 384.8 (trezentos e oitenta e quatro milhões e oitocentos mil) dólares, que inclui 201.8 (duzentos e um milhões e oitocentos mil) dólares para a divisão de operações psicológicas e o estabelecimento, pela primeira vez, de um programa de operações psicológicas com o uso da voz para o Comando Sul.
Este programa de operações psicológicas é totalmente distinto de iniciativas como A Voz da América, por exemplo, que é um programa do Departamento de Estado e da agência estatal Board Broadcasting Governors (BBG) que manejam a propaganda dos EUA em nível mundial. Na verdade, o orçamento da BBG para o ano de 2011 é de 768.8 milhões de dólares e inclui um programa de cinco dias a cada semana, em espanhol, para a televisão venezuelana.
O aumento das operações psicológicas dirigidos à Venezuela e a América Latina evidencia uma ampliação da agressão norte americana para com essa região. É preciso lembrar que, desde o ano de 2006, a Direção Nacional de Inteligência dos EUA desempenha uma missão especial de inteligência para a Venezuela e Cuba. Somente quatro dessas missões especiais existem no mundo: uma para o Irã, outra para a Coréia do Norte, uma terceira para o Afeganistão e o Paquistão e a quarta para Venezuela e Cuba. Essa missão recebe uma parte importante do orçamento de mais de 80 bilhões de dólares que emprega a Direção Nacional de Inteligência, entidade que coordena as 16 agências de inteligência em Washington.
* Eva Golinger é advogada e especialista em analisar documentos desclassificados pelo Departamento de Estado dos EUA, relativos a atividades na América Latina, em especial na Venezuela.
** Traduzido do espanhol por Izaías Almada.
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Os 75 anos da Aliança Nacional Libertadora
Reproduzo matéria publicada no sítio Vermelho:
Na próxima quinta-feira, 25, às 19h, acontece na sede do Comitê Central do PCdoB palestra sobre os 75 anos da insurreição da Aliança Nacional Libertadora. À frente do evento estará a professora Marly Vianna – autora de Revolucionários de 35 e Pão, Terra e Liberdade: Memória do Movimento Comunista de 1935 –, além do historiador Augusto Buonicore. O evento é uma iniciativa da Fundação Maurício Grabois e visa debater uma importante passagem da vida brasileira.
A Aliança Nacional Libertadora, criada em 1935, foi um dos mais importantes movimentos de caráter antiimperialista e antifascista em nosso continente. Com forte influência do Partido Comunista do Brasil, seu lema era “Pão, Terra e Liberdade”. Perseguida e fechada pelo governo Vargas, acabou se orientando para insurreição armada.
Em novembro daquele ano, eclodiram violentos e heroicos combates nas cidades de Natal, Recife e Rio de Janeiro. Sua derrota levou a uma das mais violentas repressões aos democratas e comunistas brasileiros. Milhares de pessoas foram presas e torturadas. Apesar de suas limitações e erros, os levantes de 1935 fazem parte das memoráveis lutas travadas pelo povo brasileiro.
A sede do PCdoB fica na Rua Rego Freitas, 192, República, São Paulo.
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Na próxima quinta-feira, 25, às 19h, acontece na sede do Comitê Central do PCdoB palestra sobre os 75 anos da insurreição da Aliança Nacional Libertadora. À frente do evento estará a professora Marly Vianna – autora de Revolucionários de 35 e Pão, Terra e Liberdade: Memória do Movimento Comunista de 1935 –, além do historiador Augusto Buonicore. O evento é uma iniciativa da Fundação Maurício Grabois e visa debater uma importante passagem da vida brasileira.
A Aliança Nacional Libertadora, criada em 1935, foi um dos mais importantes movimentos de caráter antiimperialista e antifascista em nosso continente. Com forte influência do Partido Comunista do Brasil, seu lema era “Pão, Terra e Liberdade”. Perseguida e fechada pelo governo Vargas, acabou se orientando para insurreição armada.
Em novembro daquele ano, eclodiram violentos e heroicos combates nas cidades de Natal, Recife e Rio de Janeiro. Sua derrota levou a uma das mais violentas repressões aos democratas e comunistas brasileiros. Milhares de pessoas foram presas e torturadas. Apesar de suas limitações e erros, os levantes de 1935 fazem parte das memoráveis lutas travadas pelo povo brasileiro.
A sede do PCdoB fica na Rua Rego Freitas, 192, República, São Paulo.
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sexta-feira, 19 de novembro de 2010
Mídias e os tempos sombrios da ditadura
Reproduzo artigo de Luís Carlos Lopes, publicado no sítio Carta Maior:
A intriga e a calúnia continuam a assombrar aos brasileiros. As grandes mídias insistem na desqualificação da presidenta eleita. Foram como abutres aos arquivos oficiais do Estado para conseguir combustível, insistindo na tese de que a eleita é uma ‘criminosa’, não tendo por isto condições e legitimidade para governar. Querem continuar um processo que já foi encerrado.
Agora, o objetivo não é mais de ganhar a eleição. Já perderam. O que desejam é paralisar a eleita, fazendo-a reviver o pesadelo de sua juventude. Lembrar o que ela já foi, obviamente, na versão parcial e difamatória a que estão acostumados. Afinal, o Estado sempre foi ‘pilotado’ por homens que jamais se levantaram contra a simbiose desse com as elites do país.
Lula sempre incomodou por ser um líder operário, grevista, que desafiou a ditadura militar e criou com os sindicatos combativos e a esquerda atomizada do final dos anos setenta, o Partido dos Trabalhadores. Nunca antes, isto havia ocorrido na história do país, cheia de ‘personalidades’ e compromissos com os mesmos de sempre.
A real politik alcançou o PT e o ímpeto mais radical de origem foi contido. Seguiu-se no país uma tendência generalizada no mundo de depois da queda do Muro de Berlim. No atual contexto, os neoliberais tentam de todo jeito ganhar terreno e oprimir mais e mais os trabalhadores. Querem por toda parte que eles paguem a fatura da crise que criaram. As novas oposições populares fazem o que podem para manter conquistas e fazer avançar os direitos dos trabalhadores.
O desenvolvimentismo social-democrático dominou a sigla brasileira no poder. A verdade é que houve progressos imensos no front do combate da miséria. Mas ainda há muito que fazer, tal como a presidenta eleita confirma e se propõe a executar. O problema é se os interesses nacionais e internacionais permitirão mudanças, mesmo que seus prejuízos sejam praticamente inexistentes. Eles querem sempre mais.
Para manter a ordem intacta, eles tentam de tudo. Com uma das mãos acenam com a aceitação da vontade popular, com a outra brandem, por meio das grandes mídias, suas armas preferidas: a intriga e a calúnia. Dilma, mulher e guerrilheira nos anos de chumbo do Brasil, é muito mais do que eles conseguem tolerar. Temem que ela vá além de Lula, fazendo, por exemplo, o que sua colega da Argentina fez. Acabando com a impunidade dos criminosos da época da ditadura, abrindo para valer os arquivos secretos dos militares e dizendo a todos qual é a verdadeira história destas mídias que tanto a difamam.
Dilma nem chegou ao governo e já enfrenta uma onda de acusações. Como nada podem falar do presente, foram buscar no passado lenha para acender suas fogueiras prediletas. Esta visão inquisitorial tem uma triste história no Brasil, desde o passado colonial. Isto só vai acabar quando seus fundamentos socioculturais forem enfrentados em profundidade. Os armários dessa gente têm mais esqueletos do que os ingênuos imaginam. Basta abri-los e deixar entrar a luz purificadora do sol.
Já se disse que a verdade histórica ilumina a democracia. O nazismo foi combatido na Alemanha durante anos, após o seu triste final. A desnazificação construiu a Alemanha atual, uma campanha sistemática que mostrou aos alemães os porões do hitlerismo. O mesmo esforço ainda é feito na Espanha pós-franquista, apesar de muita resistência das viúvas e viúvos do velho ditador.
Por aqui, quase nada falamos sobre os horrores do passado escravista do Brasil. O esquecimento preenche as lacunas da memória nacional. O mesmo foi feito com as excrescências das várias fases republicanas do país. Já se esqueceu da “grande noite” do Estado Novo e da ‘noite de horrores’ da ditadura militar.
A história do país continua sendo ensinada como uma arte do esquecimento. Não chega à maioria das escolas as verdades reais do passado do país. Por isso, é fácil destacar fatos isolados, pinçá-los, sem qualquer escrúpulo e gritar que a Dilma é alguém pouco confiável. Com isto, se quer paralisá-la, impedir sua marcha e conter qualquer ímpeto mais profundo do seu futuro governo. Espera-se que ela não peça desculpas pelo que foi no passado e que aproveite a oportunidade para denunciar os que a agridem.
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A intriga e a calúnia continuam a assombrar aos brasileiros. As grandes mídias insistem na desqualificação da presidenta eleita. Foram como abutres aos arquivos oficiais do Estado para conseguir combustível, insistindo na tese de que a eleita é uma ‘criminosa’, não tendo por isto condições e legitimidade para governar. Querem continuar um processo que já foi encerrado.
Agora, o objetivo não é mais de ganhar a eleição. Já perderam. O que desejam é paralisar a eleita, fazendo-a reviver o pesadelo de sua juventude. Lembrar o que ela já foi, obviamente, na versão parcial e difamatória a que estão acostumados. Afinal, o Estado sempre foi ‘pilotado’ por homens que jamais se levantaram contra a simbiose desse com as elites do país.
Lula sempre incomodou por ser um líder operário, grevista, que desafiou a ditadura militar e criou com os sindicatos combativos e a esquerda atomizada do final dos anos setenta, o Partido dos Trabalhadores. Nunca antes, isto havia ocorrido na história do país, cheia de ‘personalidades’ e compromissos com os mesmos de sempre.
A real politik alcançou o PT e o ímpeto mais radical de origem foi contido. Seguiu-se no país uma tendência generalizada no mundo de depois da queda do Muro de Berlim. No atual contexto, os neoliberais tentam de todo jeito ganhar terreno e oprimir mais e mais os trabalhadores. Querem por toda parte que eles paguem a fatura da crise que criaram. As novas oposições populares fazem o que podem para manter conquistas e fazer avançar os direitos dos trabalhadores.
O desenvolvimentismo social-democrático dominou a sigla brasileira no poder. A verdade é que houve progressos imensos no front do combate da miséria. Mas ainda há muito que fazer, tal como a presidenta eleita confirma e se propõe a executar. O problema é se os interesses nacionais e internacionais permitirão mudanças, mesmo que seus prejuízos sejam praticamente inexistentes. Eles querem sempre mais.
Para manter a ordem intacta, eles tentam de tudo. Com uma das mãos acenam com a aceitação da vontade popular, com a outra brandem, por meio das grandes mídias, suas armas preferidas: a intriga e a calúnia. Dilma, mulher e guerrilheira nos anos de chumbo do Brasil, é muito mais do que eles conseguem tolerar. Temem que ela vá além de Lula, fazendo, por exemplo, o que sua colega da Argentina fez. Acabando com a impunidade dos criminosos da época da ditadura, abrindo para valer os arquivos secretos dos militares e dizendo a todos qual é a verdadeira história destas mídias que tanto a difamam.
Dilma nem chegou ao governo e já enfrenta uma onda de acusações. Como nada podem falar do presente, foram buscar no passado lenha para acender suas fogueiras prediletas. Esta visão inquisitorial tem uma triste história no Brasil, desde o passado colonial. Isto só vai acabar quando seus fundamentos socioculturais forem enfrentados em profundidade. Os armários dessa gente têm mais esqueletos do que os ingênuos imaginam. Basta abri-los e deixar entrar a luz purificadora do sol.
Já se disse que a verdade histórica ilumina a democracia. O nazismo foi combatido na Alemanha durante anos, após o seu triste final. A desnazificação construiu a Alemanha atual, uma campanha sistemática que mostrou aos alemães os porões do hitlerismo. O mesmo esforço ainda é feito na Espanha pós-franquista, apesar de muita resistência das viúvas e viúvos do velho ditador.
Por aqui, quase nada falamos sobre os horrores do passado escravista do Brasil. O esquecimento preenche as lacunas da memória nacional. O mesmo foi feito com as excrescências das várias fases republicanas do país. Já se esqueceu da “grande noite” do Estado Novo e da ‘noite de horrores’ da ditadura militar.
A história do país continua sendo ensinada como uma arte do esquecimento. Não chega à maioria das escolas as verdades reais do passado do país. Por isso, é fácil destacar fatos isolados, pinçá-los, sem qualquer escrúpulo e gritar que a Dilma é alguém pouco confiável. Com isto, se quer paralisá-la, impedir sua marcha e conter qualquer ímpeto mais profundo do seu futuro governo. Espera-se que ela não peça desculpas pelo que foi no passado e que aproveite a oportunidade para denunciar os que a agridem.
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O congresso das rádios comunitárias de SP
Reproduzo artigo de Virginia Toledo, publicado na Rede Brasil Atual:
Nos dias 26 e 27 de novembro será realizado na cidade de Rio Claro, interior de São Paulo, o 2º Congresso Estadual da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço). O evento será conduzido pelas discussões em torno da democratização da comunicação e também no fortalecimento da radiodifusão. Só no estado de São Paulo, são 600 rádios comunitárias autorizadas, em operação.
Para Jerry Oliveira, coordenador nacional da Abraço, a realização do congresso acontece em um período importante para comunicação no Brasil, em que discussões sobre a regulamentação do setor envolvem diversos atores da sociedade, com diferentes opiniões. "Estamos vivendo um momento crítico e decisivo, no qual a rádio comunitária é protagonista", comemora.
Entretanto, ele aponta que é necessário que as rádios comunitárias organizem-se para que possam, junto ao novo governo e ao Congresso Nacional, acompanhar e reivindicar um novo projeto para a comunicação no país. E, posteriormente, articular com os veículos voltados a interesses sociais, açõe conjuntas para combater o que chama de "monopólios midiáticos".
"A gente precisa colocar as rádios comunitárias nas ruas, para defender a posição de que o Brasil precisa de uma outra comunicação. Este é o objetivo do congresso", afirma Oliveira.
No evento, serão escolhidos os delegados que representarão a Abraço/SP no congresso de radiodifusão de âmbito nacional, a ser realizado no mês de dezembro. Além de concretizar a regularização da entidade, estatutariamente, com a eleição de nova diretoria para os próximos três anos.
Confira a programação:
Dia 26 de Novembro de 2010
19:00 horas - Abertura
- Representante da Abraço Nacional
- Representante da Câmara de Vereadores de Rio Claro
- Representante da Prefeitura Municipal de Rio Claro
- Deputada Federal Luiza Erundina
20:00 horas - Painel
Os meios de comunicação voltados para a luta dos trabalhadores
- Representante das TVs Comunitárias
- Representante do Jornal dos Trabalhadores (rede Abraço/CUT)
- Representante do Jornal Brasil de Fato
- Representante da TV dos Trabalhadores
- Representante da Revista do Brasil
- Representante do Centro de Estudos de Mídia Barão de Itararé
Dia 27 de Novembro
09:00 às 09:30 horas.
Credenciamento
09:30 horas - Painel
A situação da radiodifusão comunitária no Brasil:
Em debate: canalização do espectro de radiofreqüências, direito autoral (ECAD), procedimentos de análise de processos do Ministério das Comunicações, fiscalizações e multas.
- ABRAÇO/SP
- Representante da Anatel
- Representante Ministério das Comunicações
- Representante Escritório de Arrecadação do ECAD
- Intervozes
Debate em Plenária
12:00 horas – Almoço
13:30 horas – Leitura e aprovação dos estatutos da Abraço/SP
15:00 horas – Eleição e posse da nova diretoria da Abraço/SP
15:30 horas - Intervalo para café
16:00 horas – Eleição de delegados para o VII Congresso Nacional da Abraço
17:00 horas – Encerramento
O Congresso da Abraço será realizado na escola Estadual Paulo Koelle, na Rua 12, nº 867, Centro, Rio Claro SP. As emissoras comunitárias interessadas deverão se inscrever pelos seguintes e-mails: jerry.deoliveira@hotmail.com; abracosaopaulo@hotmail.com
Mais informações pelo blog: http://www.abracosp.blogspot.com ou pelos telefones: (19) 3739 4600 e (19) 9731 7632.
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Nos dias 26 e 27 de novembro será realizado na cidade de Rio Claro, interior de São Paulo, o 2º Congresso Estadual da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço). O evento será conduzido pelas discussões em torno da democratização da comunicação e também no fortalecimento da radiodifusão. Só no estado de São Paulo, são 600 rádios comunitárias autorizadas, em operação.
Para Jerry Oliveira, coordenador nacional da Abraço, a realização do congresso acontece em um período importante para comunicação no Brasil, em que discussões sobre a regulamentação do setor envolvem diversos atores da sociedade, com diferentes opiniões. "Estamos vivendo um momento crítico e decisivo, no qual a rádio comunitária é protagonista", comemora.
Entretanto, ele aponta que é necessário que as rádios comunitárias organizem-se para que possam, junto ao novo governo e ao Congresso Nacional, acompanhar e reivindicar um novo projeto para a comunicação no país. E, posteriormente, articular com os veículos voltados a interesses sociais, açõe conjuntas para combater o que chama de "monopólios midiáticos".
"A gente precisa colocar as rádios comunitárias nas ruas, para defender a posição de que o Brasil precisa de uma outra comunicação. Este é o objetivo do congresso", afirma Oliveira.
No evento, serão escolhidos os delegados que representarão a Abraço/SP no congresso de radiodifusão de âmbito nacional, a ser realizado no mês de dezembro. Além de concretizar a regularização da entidade, estatutariamente, com a eleição de nova diretoria para os próximos três anos.
Confira a programação:
Dia 26 de Novembro de 2010
19:00 horas - Abertura
- Representante da Abraço Nacional
- Representante da Câmara de Vereadores de Rio Claro
- Representante da Prefeitura Municipal de Rio Claro
- Deputada Federal Luiza Erundina
20:00 horas - Painel
Os meios de comunicação voltados para a luta dos trabalhadores
- Representante das TVs Comunitárias
- Representante do Jornal dos Trabalhadores (rede Abraço/CUT)
- Representante do Jornal Brasil de Fato
- Representante da TV dos Trabalhadores
- Representante da Revista do Brasil
- Representante do Centro de Estudos de Mídia Barão de Itararé
Dia 27 de Novembro
09:00 às 09:30 horas.
Credenciamento
09:30 horas - Painel
A situação da radiodifusão comunitária no Brasil:
Em debate: canalização do espectro de radiofreqüências, direito autoral (ECAD), procedimentos de análise de processos do Ministério das Comunicações, fiscalizações e multas.
- ABRAÇO/SP
- Representante da Anatel
- Representante Ministério das Comunicações
- Representante Escritório de Arrecadação do ECAD
- Intervozes
Debate em Plenária
12:00 horas – Almoço
13:30 horas – Leitura e aprovação dos estatutos da Abraço/SP
15:00 horas – Eleição e posse da nova diretoria da Abraço/SP
15:30 horas - Intervalo para café
16:00 horas – Eleição de delegados para o VII Congresso Nacional da Abraço
17:00 horas – Encerramento
O Congresso da Abraço será realizado na escola Estadual Paulo Koelle, na Rua 12, nº 867, Centro, Rio Claro SP. As emissoras comunitárias interessadas deverão se inscrever pelos seguintes e-mails: jerry.deoliveira@hotmail.com; abracosaopaulo@hotmail.com
Mais informações pelo blog: http://www.abracosp.blogspot.com ou pelos telefones: (19) 3739 4600 e (19) 9731 7632.
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