quinta-feira, 8 de maio de 2014

O discurso “sheherazade” do Globo

Por Miguel do Rosário, no blog O Cafezinho:

Interfono e peço para o zelador colocar os jornais no elevador, como sempre faço. Quando os recolho e os trago para casa, mal consigo reconhecê-los, porque há uma capa “promocional”, tanto no Globo quanto no Valor. Propaganda dos Correios, que está promovendo sua nova marca.

A matéria principal no Globo é o linchamento de uma moça em Guarujá, São Paulo, por um crime que ela não cometeu, após a divulgação de um falso boato pela internet.

Merval Pereira está de férias, e por aí se vê uma coisa interessante: a gente reclama da falta de bons quadros de esquerda no parlamento e nos ministérios, mas a direita também sofre com a escassez de mão-de-obra qualificada.

Por exemplo: Merval viaja e eles não tem um substituto para ocupar seu lugar. O principal jornal da cidade, o mais influente do país (por pertencer à Globo, que tem a emissora de TV de maior audiência) ficará sem colunista político por semanas a fio, o que me parece incrível.

A gente especula que Merval deve ganhar mais de meio milhão de reais por mês - para escrever, diariamente, um petardo antipetista sem compromisso nenhum com fatos, objetividade ou justiça. O objetivo de Merval é o mesmo do Globo: derrubar o PT.

Daí vale tudo. Com patrocínio do governo federal, claro, como se vê pela “capa promocional” dos Correios, que deve ter custado alguns milhões de reais.

Não tem Merval, mas o besteirol continua. O editorial do Globo de hoje deveria ser lido, em rede nacional, por Rachel Sheherazade, a apresentadora do SBT que defendeu, há alguns meses, um grupo de linchadores do Flamengo, bairro da zona sul do Rio.

Só que o Globo é pior, claro. Mais pérfido, mais partidário, mais direto. É um texto oleoso, confuso, que a pretexto de criticar a “barbárie”, termina chancelando-a e culpando a “desordem no poder público” e o PT.

Perto do final do texto, o Globo cita uma frase, provavelmente descontextualizada, do sociólogo José de Souza Martins, professor da USP, em que, praticamente, justifica a cultura do linchamento: Como diz o professor em um dos seus livros: “o linchamento não é uma manifestação da desordem, mas de questionamento da desordem”.

Como é que é? Num país com emprego pleno e índices de pobreza caindo aceleradamente, pode-se falar que linchamentos são “questionamentos da desordem”? O texto encerra culpando o PT por tudo: O mau exemplo do PT chega a ser mais daninho, por ter conquistado o poder com a aura de extrema seriedade e honestidade. Ao trair as promessas de defesa intransigente da ética, dá grande contribuição, infelizmente, ao descrédito da população diante dos poderes constituídos.

O Globo não apenas fez um texto defendendo o linchamento; ele afirma que o linchamento que ele, Globo, estimula diariamente, contra PT e governo, tem justificativa, porque o partido teria traído “promessas de defesa intransigente da ética”.

Todo o linchamento patrocinado pela Globo contra os réus do mensalão, um linchamento na forma de editoriais, charges, infográficos, reportagens sem compromisso com a verdade, omissão de contraditório, manipulação das informações, fica então assim justificado porque linchamentos são “questionamentos da desordem”.

Tudo com patrocínio dos Correios, é claro, porque ninguém é de ferro, e os Marinho também precisam comprar o leite das crianças.

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