quarta-feira, 25 de maio de 2016

“Michel é Cunha”, disse Jucá. E agora?

Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:

A informação decisiva do diálogo Romero Jucá x Sérgio Machado encontra-se num trecho que você irá ler a seguir:

- Só o Renan que está contra a essa porra. 'Porque não gosta do Michel, porque o Michel é Eduardo Cunha.' Gente, esquece o Eduardo Cunha, está morto, morto, porra.'"

Sérgio Machado acrescenta, em tom de concordância: "É um acordo, botar o Michel, num grande acordo nacional."

Jucá explica: "Com o Supremo, com tudo."

Sabemos que o diálogo ocorreu em março, quando Sérgio Machado procurava provas para uma delação premiada capaz de livrá-lo de acusações na Lava Jato. Não custa recordar a data essencial da conversa.

Nas semanas seguintes, em 17 de abril, o presidente da Câmara Eduardo Cunha conduziu a votação que autorizou a abertura do processo de impeachment contra a presidente ("Com Dilma a situação não dá", segundo Jucá).

Apenas dezoito dias depois, o Supremo votou o afastamento de Eduardo Cunha da presidência da Câmara e de seu mandato. Foi uma decisão péssima para Cunha.

Quando se recorda que a denúncia contra Cunha havia chegado ao STF em dezembro de 2015 e ali ficou adormecida até o fim de abril, atravessando incólume o 17, ninguém poderia acusar o Supremo de ter agido para prejudicar Michel Temer. Se a decisão tivesse sido tomada em qualquer data entre 15 de dezembro de 2015 e 16 de abril de 2016, o resultado da votação teria sido outro. A bancada contra Dilma estaria desfalcada de grande parte dos 200 votos que devem obediência a Cunha. Se apenas 15% desses personagens não tivesse comparecido para votar, o pedido de impeachment teria sido arquivado.

Falando de um grande acordo nacional, que em suas palavras incluía o Supremo, Jucá fez questão de ressalvar: não tinha acesso a Teori Zavaski, relator da Lava Jato. Falando sobre os "caras" do STF, expressão sua, sublinhou que era um pacto "com o Supremo, com tudo."

Entre os personagens mencionados no diálogo, o único que apresentou mudança de comportamento no enredo descrito pelos dois interlocutores foi Renan Calheiros. Depois do afastamento de Cunha, ninguém poderia deixar de perguntar se, sem possuir legitimidade para presidir o Congresso, Cunha possuía condições de derrubar a presidente da República. Não havia argumentos para defender sua isenção nem imparcialidade, como a própria votação do STF - 11 a 0 - confirmava. Mas, quando o pedido de anulação da votação chegou ao Senado, Renan deixou a discussão correr mas anunciou com clareza: "É brincadeira", chegou a dizer. À luz da conversa de março, alimentada por seu amigo e aliado Sérgio Machado, difícil deixar de imaginar que naquele momento ele estava dentro do "grande acordo nacional".

"Michel é Eduardo Cunha", disse Jucá. Tão relevante, a frase que aproxima o suíço Cunha do presidente da República numa relação de absoluta identidade não recebeu a devida atenção de nossos sábios da política. Talvez porque estejam mais preocupados em preservar um presidente com fragilidade exposta no lugar de assumir suas próprias responsabilidades numa crise só agravada por um impeachment sem prova de crime de responsabilidade.

De volta ao Senado, de onde se afastou para ocupar o ministério do Planejamento de Michel, Jucá é um reconhecido talento dos bastidores da política brasileira. Acabou derrotado pelo instrumento que já derrotou homens públicos muito mais sérios e relevantes do ponto de vista dos interesses da maioria dos brasileiros.

A verdade é que nem todo mundo acerta sempre. Na conversa, ele disse que Cunha estava "morto, morto, porra."

Eduardo Cunha morto? Nem Romero Jucá acertou essa.

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