sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Novo ministro preocupa sindicalistas

Por Renan Truffi, na revista CartaCapital:

Não é só o fato de ter sido presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) por duas vezes que deixa sindicalistas e trabalhadores incomodados com a nomeação do senador Armando Monteiro (PTB-PE) para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. O que gera repercussão negativa entre as centrais sindicais é a “linhagem de patrão” do novo integrante do governo Dilma Rousseff. Filho de político, empresário ligado ao setor usineiro e ex-banqueiro, Monteiro tem um histórico de defesa dos interesses do empresariado às custas das pautas dos trabalhadores.

Enquanto segmentos progressistas discutem a provável indicação da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) para o Ministério da Agricultura, e salientam a diferença entre as pautas defendidas por ela e bandeiras histórica do PT, o partido de Dilma, Monteiro tem passado incólume às críticas. Ainda assim, os representantes dos trabalhadores estão preocupados com o passado político do ministro. “Estamos em lado opostos. Ele defende o lado empresarial, nós defendemos o lado dos trabalhadores. (...) O Armando tem linhagem de patrão”, afirma o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) de Pernambuco, Carlos Veras.

A pecha de "patrão" citada por Veras surgiu na campanha deste ano para o governo de Pernambuco. O petebista disputou o cargo com Paulo Câmara (PSB-PE), eleito no segundo turno, e virou alvo do ex-governador do estado Eduardo Campos, falecido em um acidente de avião em agosto. Ao criticar Monteiro, adversário de seu candidato, Campos disse que “governar Pernambuco não é brincadeira de filho de rico”. Geraldo Julio (PSB), prefeito do Recife, complementou a crítica ao afirmar que Monteiro não possuía "nenhum compromisso com o povo".

As críticas tinham como referência o passado de Armando Monteiro. O novo ministro do Desenvolvimento é filho de Armando Monteiro Filho, ministro da Agricultura no governo João Goulart, e neto de Agamenon Magalhães, ex-governador de Pernambuco. Filiado ao MDB durante a ditadura, o pai de Armando Monteiro também tentou ser governador de Pernambuco, mas perdeu para Miguel Arraes, avô de Eduardo Campos. Além de influência na política, a família Monteiro era a controladora do antigo Banco Mercantil, alvo de investigação por gestão fraudulenta. Como já era deputado federal na época e, portanto, gozava de foro privilegiado, Armando Monteiro acabou fora da relação dos denunciados. O inquérito a que respondia foi arquivado, algum tempo depois, pelo Supremo Tribunal Federal.

A defesa de Monteiro foi elaborada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que apoiou o petebista para o governo de Pernambuco. Em comício realizado em junho, Lula disse que Monteiro era vítima de "preconceito". Posteriormente, o próprio candidato do PTB adotou essa linha de argumentação. “O emprego deste rótulos deveria ser algo da velha política. Trazer a velha luta de classes?”, questionou Monteiro em evento com empresários. “Não se deveria reacender velhos preconceitos. Não se deve julgar as pessoas por sua origem e sim pelo caráter” disse.

Direitos trabalhistas

Administrador de empresas e advogado, o ministro também tem proximidade com o setor sucroalcooleiro. Um fato negativo para ele são as denúncias contra seu irmão. Uma empresa de Eduardo Queiroa Monteiro já foi flagrada com trabalhadores em condições análogas à escravidão por quatro vezes, segundo a ONG Repórter Brasil. No total, mais de 1400 trabalhadores foram libertados da Destilaria Araguaia, situada no município de Confresa (MT), que pertence ao Grupo EQM (de Eduardo Queiroz Monteiro). A empresa chegou a figurar na chamada “Lista Suja do Trabalho Escravo” por não aceitar pagar as verbas rescisórias dos envolvidos.

Não foi só a trajetória da família Monteiro que garantiu a alcunha de “patrão” ao ministro, no entanto. O político carrega um histórico de disputas em relação às pautas dos sindicatos dos trabalhadores. Em 2009, como presidente da CNI, ele foi o responsável por pedir a reprovação da proposta da redução da jornada de trabalho, de 44 horas para 40 horas semanais. Na época, com o apoio de dez gigantes do setor industrial, a CNI pressionou o ministro da Fazenda, Guido Mantega, para que o governo rejeitasse a proposta.

Monteiro ainda foi relator de um projeto de lei, de autoria do ex-deputado tucano Eduardo Azeredo (PSDB-MG), que facilita a terceirização e "precariza" os direitos dos trabalhadores, segundo as entidades de classe. “Todos esses direitos que o trabalhador tem e o empresário acha que é custo, o Armando assumia como uma proposta própria", diz o presidente da Força Sindical, Miguel Torres. “Ele sempre primou por tentar tirar direitos dos trabalhadores e por isso, para nós, não vai ser bom, não”, complementou.

Ao assumir o cargo, na segunda-feira 1º, Armando Monteiro não tocou no assunto dos direitos dos trabalhadores como um ônus para indústria. Repetiu, por duas vezes, no entanto, que é preciso “cortar custos”. “Nosso país ainda apresenta elevados custos, com um sistema tributário complexo, que onera os investimentos e as exportações, deficiências na capacitação do capital humano e na qualidade da infraestrutura, e um excesso de regulamentações e procedimentos burocráticos que desestimulam o desenvolvimento da atividade produtiva”, afirmou.

Os custos são um assunto caro para Monteiro. Eles teriam levado o ministro a ter um desentendimento com o ex-ministro da Educação e atual prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, de acordo com reportagem da revista Piauí. Em sua edição de agosto, a publicação conta que, quando o petista estava à frente da iniciativa do governo de flexibilizar o acesso às verbas do Sistema S, para que a indústria oferecesse gratuitamente cursos à população, Monteiro teria tentado agredir Haddad fisicamente. “A CNI chegou a contratar uma assessoria de risco com equipe de 36 jornalistas para enfrentar o Ministério [da Educação]. Numa das reuniões em que governo e empresários discutiram a questão, Armando Monteiro, então presidente da confederação, teve que ser contido para não agredir Haddad fisicamente”, afirma a matéria.

Apesar dos indícios pouco auspiciosos para os trabalhadores, Carlos Veras, da CUT, se diz otimista. Ele acredita que Dilma é quem vai ditar as políticas do ministério, ainda que Monteiro tenha ganhado notabilidade em pautas de interesses contrários ao dos trabalhadores. “Ele vai ser ministro, mas o governo é da presidente Dilma", afirma. "Não acredito que ele vá de encontro à vontade da presidenta. Vai ter uma orientação de governo”, diz.

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