Por Antonio Martins, no site Outras Palavras:
Os analistas da política europeia, e os que acompanham as lutas sociais contra a ditadura das finanças, aguardam com expectativa um conjunto de medidas econômicas que o governo grego anunciará ainda nesta terça-feira (24/2). O conteúdo deste “pacote” indicará se Atenas cedeu aos 19 ministros europeus, que se uniram há três dias para pressioná-la a desistir da rebeldia contra as medidas de “austeridade”; ou se, ao contrário, mantém a luta por resgatar os direitos sociais e a democracia, colocando-os acima dos interesses dos mercados financeiros. Examinar as circunstâncias que antecedem o anúncio das medidas é útil para compreender a situação concreta da Grécia e seu novo governo. Também ajuda a examinar os caminhos complexos das lutas anticapitalistas contemporâneas – em especial as que buscam enxergar dinheiro e dívida de forma não-convencional.
Eleito em 25 de janeiro, formado majoritariamente por um partido inovador denominado Syriza (sigla de Coalizão de Esquerda Radical), o novo governo grego entusiasmou os que buscam alternativas ao sistema quando adotou, logo após assumir, medidas corajosas. Suspendeu as privatizações em curso (de portos, aeroportos, estradas, uma empresas de energia elétrica e uma refinaria de petróleo). Anunciou a volta do fornecimento de energia para 300 mil famílias que ficaram no escuro por inadimplência. Propôs reverter a redução de mais de 20% no salário mínimo, adotada em 2010, por exigência dos credores, em contrapartida a um empréstimo de 250 bilhões de euros. Apresentou estas primeiras medidas como apenas o primeiro passo para algo maior: renegociar a dívida grega; rejeitar o acordo que hoje a representa (denominado “Programa de Assistência Econômica e Financeira”), e que dá à chamada Troika (União Europeia, Banco Central Europeu – BCE – e FMI) direito de intervir na política econômica do país.
Mas, aparentemente, Atenas tinha menos força do que pensava para alcançar este segundo objetivo. As primeiras medidas encantaram a esquerda, mas enfureceram aTroika. Na semana passada, duas reuniões do conselho dos dezenove ministros das Finanças da zona do euro (o chamado “eurogrupo”) procuraram enquadrar o Syriza. Os governos que tentam sufocar a dissidência grega lançaram mão de dois instrumentos.
O primeiro é o vencimento da dívida grega, que ocorre no próximo sábado (28/2). A falta de um acordo tornaria Atenas inadimplente. Duas semanas antes, o BCE agiu para tornar este evento dramático. Decidiu que, em caso de inadimplência, deixaria de oferecer, aos debilitados bancos gregos, a linha de crédito que os mantém à tona. A notícia precipitou os riscos de crise bancária. Desde dezembro, quando tornou-se clara a hipótese de vitória eleitoral do Syriza, os gregos ricos passaram a sacar maciçamente suas economias dos bancos, num movimento que converteu-se em avalanche na semana passada.
Os analistas da política europeia, e os que acompanham as lutas sociais contra a ditadura das finanças, aguardam com expectativa um conjunto de medidas econômicas que o governo grego anunciará ainda nesta terça-feira (24/2). O conteúdo deste “pacote” indicará se Atenas cedeu aos 19 ministros europeus, que se uniram há três dias para pressioná-la a desistir da rebeldia contra as medidas de “austeridade”; ou se, ao contrário, mantém a luta por resgatar os direitos sociais e a democracia, colocando-os acima dos interesses dos mercados financeiros. Examinar as circunstâncias que antecedem o anúncio das medidas é útil para compreender a situação concreta da Grécia e seu novo governo. Também ajuda a examinar os caminhos complexos das lutas anticapitalistas contemporâneas – em especial as que buscam enxergar dinheiro e dívida de forma não-convencional.
Eleito em 25 de janeiro, formado majoritariamente por um partido inovador denominado Syriza (sigla de Coalizão de Esquerda Radical), o novo governo grego entusiasmou os que buscam alternativas ao sistema quando adotou, logo após assumir, medidas corajosas. Suspendeu as privatizações em curso (de portos, aeroportos, estradas, uma empresas de energia elétrica e uma refinaria de petróleo). Anunciou a volta do fornecimento de energia para 300 mil famílias que ficaram no escuro por inadimplência. Propôs reverter a redução de mais de 20% no salário mínimo, adotada em 2010, por exigência dos credores, em contrapartida a um empréstimo de 250 bilhões de euros. Apresentou estas primeiras medidas como apenas o primeiro passo para algo maior: renegociar a dívida grega; rejeitar o acordo que hoje a representa (denominado “Programa de Assistência Econômica e Financeira”), e que dá à chamada Troika (União Europeia, Banco Central Europeu – BCE – e FMI) direito de intervir na política econômica do país.
Mas, aparentemente, Atenas tinha menos força do que pensava para alcançar este segundo objetivo. As primeiras medidas encantaram a esquerda, mas enfureceram aTroika. Na semana passada, duas reuniões do conselho dos dezenove ministros das Finanças da zona do euro (o chamado “eurogrupo”) procuraram enquadrar o Syriza. Os governos que tentam sufocar a dissidência grega lançaram mão de dois instrumentos.
O primeiro é o vencimento da dívida grega, que ocorre no próximo sábado (28/2). A falta de um acordo tornaria Atenas inadimplente. Duas semanas antes, o BCE agiu para tornar este evento dramático. Decidiu que, em caso de inadimplência, deixaria de oferecer, aos debilitados bancos gregos, a linha de crédito que os mantém à tona. A notícia precipitou os riscos de crise bancária. Desde dezembro, quando tornou-se clara a hipótese de vitória eleitoral do Syriza, os gregos ricos passaram a sacar maciçamente suas economias dos bancos, num movimento que converteu-se em avalanche na semana passada.
Realizadas em Bruxelas, terça e sexta-feira, as reuniões do “eurogrupo” foram, por isso, comparadas a negociações entre um refém e seus sequestradores. Dezoito ministros exigiam de Atenas a submissão cabal ao Programa de Assistência Econômica e Financeira. Sozinho, o ministro das Finanças grego, Yanis Varoufakis, resistiu o quanto pôde.
Ao final, chegou-se a um compromisso complexo. Varoufakis aceitou uma prorrogação, por quatro meses, do Programa – o que o Syriza havia anunciado anteriormente que não faria. Porém, o fez em condições muito distintas das que prevaleciam até então. Nos termos em que foi redigido, o documento já não menciona a obrigação da Grécia a um “superávit primário” de 3% ao ano, que estrangularia as despesas públicas e as chances de enfrentar a “austeridade”. Além disso, não caberá à Troika – e sim ao governo grego – apresentar as medidas com as quais pretende assegurar a estabilidade financeira do país. Os 18 ministros irão se pronunciar amanhã – quando analisarão, via conferência telefônica, a proposta de Atenas. Em princípio, poderão rejeitá-la.
É este pacote que o governo grego apresentaria nesta segunda-feira — mas que foi adiado para as primeiras horas de terça. Ao falar aos jornalistas em Bruxelas, na sexta passada, Varoufakis mantinha-se desafiante. Afirmou que não se deveria esperar, de seu governo, medidas praticadas pelos anteriores – como redução de gastos sociais ou aumento do imposto sobre valor agregado (semelhante ao ICMS brasileiro). Previu, ao contrário, ações para ampliar a cobrança de tributos sobre os ricos (atualmente, poupados pelo frágil sistema de arrecadação da Grécia) e para ampliar o combate à crise humanitária desencadeada pela “austeridade”.
A concessão parcial de Varoufakis decepcionou parte das correntes do Syriza. O deputado Manolis Glezos, que tem 92 anos e é um herói da resistência grega contra a ocupação nazista, propôs protestos contra a assinatura do acordo. A Plataforma de Esquerda, um grupo interno importante anunciou que os parlamentares associados a ela votarão, no Parlamento, contra o gesto do governo.
Mas se a atitude antecipada sexta-feira pelo ministro das Finanças estiver mantida amanhã, quando o pacote de Atenas for finalmente apresentado, é provável que esta oposição se amenize. Começará então uma disputa prolongada entre a Grécia e os que querem submetê-la. No confronto, ambos os lados estarão correndo contra o tempo. Fragilizados economicamente há anos, os gregos sofrerão desgaste pela incapacidade de cumprir todas as suas promessas. Em contrapartida, os demais governos europeus enfrentam resistência crescente às políticas de corte de direitos sociais e favorecimento à aristocracia financeira.
Aqui parece residir, aliás, a incógnita decisiva. Esta oposição europeia poderá converter-se em mobilizações sociais e em eleição de novos governos dispostos a desafiar a Troika? Se isso não ocorrer, os gregos terão pouca munição, diante de um adversário muito mais poderoso. Mas se forem capazes de manter a altivez até despertar as sociedades europeias de um longo imobilismo, a aristocracia financeira estará em apuros.
Ao final, chegou-se a um compromisso complexo. Varoufakis aceitou uma prorrogação, por quatro meses, do Programa – o que o Syriza havia anunciado anteriormente que não faria. Porém, o fez em condições muito distintas das que prevaleciam até então. Nos termos em que foi redigido, o documento já não menciona a obrigação da Grécia a um “superávit primário” de 3% ao ano, que estrangularia as despesas públicas e as chances de enfrentar a “austeridade”. Além disso, não caberá à Troika – e sim ao governo grego – apresentar as medidas com as quais pretende assegurar a estabilidade financeira do país. Os 18 ministros irão se pronunciar amanhã – quando analisarão, via conferência telefônica, a proposta de Atenas. Em princípio, poderão rejeitá-la.
É este pacote que o governo grego apresentaria nesta segunda-feira — mas que foi adiado para as primeiras horas de terça. Ao falar aos jornalistas em Bruxelas, na sexta passada, Varoufakis mantinha-se desafiante. Afirmou que não se deveria esperar, de seu governo, medidas praticadas pelos anteriores – como redução de gastos sociais ou aumento do imposto sobre valor agregado (semelhante ao ICMS brasileiro). Previu, ao contrário, ações para ampliar a cobrança de tributos sobre os ricos (atualmente, poupados pelo frágil sistema de arrecadação da Grécia) e para ampliar o combate à crise humanitária desencadeada pela “austeridade”.
A concessão parcial de Varoufakis decepcionou parte das correntes do Syriza. O deputado Manolis Glezos, que tem 92 anos e é um herói da resistência grega contra a ocupação nazista, propôs protestos contra a assinatura do acordo. A Plataforma de Esquerda, um grupo interno importante anunciou que os parlamentares associados a ela votarão, no Parlamento, contra o gesto do governo.
Mas se a atitude antecipada sexta-feira pelo ministro das Finanças estiver mantida amanhã, quando o pacote de Atenas for finalmente apresentado, é provável que esta oposição se amenize. Começará então uma disputa prolongada entre a Grécia e os que querem submetê-la. No confronto, ambos os lados estarão correndo contra o tempo. Fragilizados economicamente há anos, os gregos sofrerão desgaste pela incapacidade de cumprir todas as suas promessas. Em contrapartida, os demais governos europeus enfrentam resistência crescente às políticas de corte de direitos sociais e favorecimento à aristocracia financeira.
Aqui parece residir, aliás, a incógnita decisiva. Esta oposição europeia poderá converter-se em mobilizações sociais e em eleição de novos governos dispostos a desafiar a Troika? Se isso não ocorrer, os gregos terão pouca munição, diante de um adversário muito mais poderoso. Mas se forem capazes de manter a altivez até despertar as sociedades europeias de um longo imobilismo, a aristocracia financeira estará em apuros.
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