terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Sindicatos processam McDonald's

Por Sarah Fernandes, na Rede Brasil Atual:

Quando Glaice Oliveira, de 21 anos, arrumou seu primeiro emprego, em um restaurante do McDonald's em Guarulhos (SP), as expectativas eram muitas: “Eu tinha 16 anos e me foi prometido um salário mínimo e a oportunidade de evoluir de cargo em só seis meses. Nada disso se cumpriu. Meu contrato era de seis horas, mas eu acabava trabalhando até dez horas por dia. Cheguei a repetir de ano porque não conseguia sair no horário das aulas. O salário era de R$ 3,06 por hora, mas eles aplicavam tantos descontos que já cheguei a ganhar R$ 75 em um mês. Eu ficava na cozinha, na limpeza, entrava na câmara fria, carregava peso, tudo”.

Casos como o de Glaice não são incomuns no país. Só entre 2012 e 2014 a rede somou pelo menos 400 ações ajuizadas na Justiça do Trabalho nos 26 estados e no Distrito Federal. Devido a essa recorrência, a Confederação dos Trabalhadores em Turismo e Hospitalidade (Contratuh) protocolou ontem (23) uma ação civil pública contra a McDonald's e sua franqueadora, a Arcos Dourados Comércio e Alimentos Ltda.

A ação sustenta que a empresa viola a legislação brasileira e constitui o chamado dumping social, caracterizado pela exploração irregular de mão de obra para diminuir os custos da produção e ganhar vantagens competitivas no mercado. O processo foi protocolado na 22ª Vara do Trabalho de Brasília, com abrangência nacional, e pede que a rede seja proibida de abrir novos restaurantes no Brasil até se adequar à legislação trabalhista. O McDonald's é hoje um dos maiores empregadores do país, somando 50 mil funcionários em suas 850 lojas e 84 cafés. Só no estado de São Paulo, a multinacional emprega 30 mil pessoas. No mundo, são 440 mil trabalhadores.

No Brasil, foram identificadas irregularidades trabalhistas como jornada móvel, acúmulo de funções sem a devida remuneração, insalubridade, alta rotatividade, trabalhadores menores de 18 anos exercendo funções proibidas para esta faixa etária, como trabalhos nas chapas e na câmara fria das lojas. “Tínhamos entre 30 segundos e um minuto para montar um lanche. Eu entrava direto na câmara fria sem proteção. Só ganhávamos por oito horas de trabalho. Para as demais recebíamos só um lanche”, conta o ex-funcionário de uma loja também em Guarulhos Caio Cesar, de 23 anos.

Na manhã de hoje (24), a Contratuh e mais sete entidades sindicais lançaram uma campanha pelos direitos dos trabalhadores do McDonald's, chamada "Sem direitos não é legal". A central sindical norte-americana Service Employees International Union (Seiu) apoiou a iniciativa. O governo americano já emitiu pelo menos 20 reclamações contra a rede de fast food, alegando violações trabalhistas, que incluem intimidação e demissões ilegais de funcionários que tentavam se organizar sindicalmente.

“A campanha tem um aspecto político importante: não podemos aceitar que o governo e o Congresso Nacional não impeçam que o nosso país seja desrespeitado dessa forma. Por isso, essa ação é sobretudo de danos morais e sociais”, afirma a secretária-geral adjunta da CUT, Maria Godói de Faria. “A globalização veio para concentrar a riqueza e socializar a pobreza e o que o McDonald's faz é a prova disso.”

No Brasil, nos últimos três anos, já foram protocoladas ações contra o McDonald's em Porto Alegre, Novo Hamburgo (RS), Florianópolis, Curitiba, São Paulo, Campinas (SP), Rio de Janeiro, Niterói (RJ), Belo Horizonte, Governador Valadares (MG), Brasília, Goiânia, Anápolis (GO), Palmas, Campo Grande, Cuiabá, Vitória, Salvador, Maceió, Aracajú, João Pessoa, Natal, Fortaleza, São Luiz, Teresina, Belém, Manaus, Rio Branco, Macapá, Porto Velho, Boa Vista e Recife. Está última resultou em um acordo nacional homologado em 2013 na 11ª Vara de Pernambuco, que proibia a prática de jornada móvel variável nos restaurantes da rede. As entidades sindicais afirmam que o McDonald's descumpriu o acordo.

“Foram diversos termos de ajustamento de conduta e diversas sentenças ignoradas e descumpridas. A rede precisa ter um contrato social condizente com nossa legislação e ter responsabilidade com a sociedade e com seu maior patrimônio, que são os trabalhadores. No processo, queremos que eles se enquadrem na nossa legislação ou fiquem proibidos de abrir novas lojas no Brasil”, defende o presidente da Contratuh, Moacyr Roberto Tesch Auersvald.

Em nota, a Arcos Dourados informou que a empresa ainda não foi notificada oficialmente sobre o processo. “No entanto, a companhia reforça que tem absoluta convicção de suas práticas laborais e do cumprimento de todas as normas e legislações às quais está sujeita nos locais nos quais atua, assim como reafirma cumprir todos os acordos firmados com o Ministério Público em todo o país”, diz o texto. A companhia reforça que todos os seus empregados são registrados de acordo com a legislação e que recebem remuneração e benefícios conforme convenções coletivas validadas por diversos sindicatos do país.

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