Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:
“A corrupção não só é uma senhora bastante idosa neste país como ela não poupa ninguém”. A frase da presidente Dilma Rousseff, destacada na terça-feira (17/3) pela imprensa brasileira, foi uma resposta ao presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), depois que ele afirmou que a corrupção está apenas no poder Executivo, não no Parlamento. Os jornais não avançam no contexto desse rápido entrevero, porque não interessa à imprensa vasculhar as origens dos escândalos que hoje ocupam as manchetes.
Por outro lado, dizer que a corrupção é um vício antigo como a política é apenas uma forma de relativizar a principal fonte das turbulências que atingem o governo, a se considerar as análises disponíveis sobre as razões que levaram a maioria dos manifestantes aos protestos do domingo (15).
Apesar de a imprensa martelar diariamente que o Brasil passa por uma grave crise econômica, os cidadãos estão longe de sentir em suas vidas os efeitos das contas governamentais desreguladas – pelo menos em termos comparativos, nada que se assemelhe a crises reais, como as que paralisaram o país, ciclicamente, até o advento do Plano Real.
De lá para cá, os brasileiros oscilam entre períodos de bem-estar e surtos de desconforto, como o que aconteceu apenas quatro anos após a consolidação do Real.
O problema é que a verdade sobre a economia brasileira nunca vai para as manchetes e raramente ocupa o precioso tempo do Jornal Nacional. E a verdade diz que, nos últimos doze anos, o país promoveu, pela primeira vez em sua história, um fenômeno massivo de mobilidade social. Esse é o contexto que desaparece no noticiário cotidiano.
Eventualmente, um ou outro jornal precisa recolocar os indicadores no lugar e vemos, por exemplo, reportagens como a que foi publicada pelo Globo no sábado (14/3), véspera da manifestação: “Em 2003, cenário doméstico era pior do que agora”, dizia o título, sobre texto que observava que, há doze anos, o Brasil patinava num mundo em crescimento, enquanto, em 2015, a única das grandes economias que se expande é a americana, o que explica a valorização do dólar.
Apenas uma versão resumida pode ser lida no site do jornal carioca (ver aqui), mas o leitor atento pode ter uma ideia do que a imprensa costuma esconder em suas manchetes.
Não é a economia, estúpido!
Jornalistas gostam de citar a frase do antigo assessor do ex-presidente americano Bill Clinton, James Carville – “É a economia, estúpido!” – para definir o espírito do tempo, em 1992, e apontar o tema que iria decidir a vitória do candidato democrata contra o então presidente George W. Bush.
No Brasil de 2015 é preciso rever a tese de Carville: não é principalmente a economia que move as massas da classe média urbana contra o governo petista, mas o temor de uma crise rosna por trás dos gritos contra a corrupção.
No balanço das manifestações, os jornais tentam compor um cenário no qual a presidente Dilma Rousseff é acuada pelos dois fatores negativos, mas a Folha de S. Paulo e O Globoapostam em manchetes relacionando os protestos principalmente à economia. Apenas oEstado de S. Paulo isola a questão da corrupção, constatando que esse foi o tema central das manifestações, e oferece uma variedade de doze opiniões curtas, mas densas, de cientistas políticos, historiadores e sociólogos sobre o fenômeno do protagonismo das classes médias.
Já se disse aqui, e nunca é demais repetir, que a narrativa jornalística tradicional já não dá conta de interpretar a realidade contemporânea. Uma iniciativa como a do Estadoajuda a reduzir essa deficiência, embora pouco se possa fazer num espaço curto como o que foi oferecido aos analistas. Mas é preciso reconhecer que há uma enorme distância entre o jornalismo panfletário adotado cotidianamente pela imprensa brasileira, que publica vitupérios pela boca de seus articulistas pitbulls, e a diversidade oferecida em pequenas notas de especialistas.
A corrupção é, de fato, uma velha conhecida nossa, mas a mídia tradicional incutiu no público a convicção de que ela acaba de nascer e que impera num cenário de catástrofe econômica. Como na peça do suíço Friedrich Dürrenmatt, a visita da velha senhora encontra nossa aldeia deprimida pela convicção de que fomos à bancarrota, os jornalistas fazem recortes aleatórios da realidade e se percebe que a corrupção está entranhada na própria sociedade.
A vida real costuma imitar a ficção.
Por outro lado, dizer que a corrupção é um vício antigo como a política é apenas uma forma de relativizar a principal fonte das turbulências que atingem o governo, a se considerar as análises disponíveis sobre as razões que levaram a maioria dos manifestantes aos protestos do domingo (15).
Apesar de a imprensa martelar diariamente que o Brasil passa por uma grave crise econômica, os cidadãos estão longe de sentir em suas vidas os efeitos das contas governamentais desreguladas – pelo menos em termos comparativos, nada que se assemelhe a crises reais, como as que paralisaram o país, ciclicamente, até o advento do Plano Real.
De lá para cá, os brasileiros oscilam entre períodos de bem-estar e surtos de desconforto, como o que aconteceu apenas quatro anos após a consolidação do Real.
O problema é que a verdade sobre a economia brasileira nunca vai para as manchetes e raramente ocupa o precioso tempo do Jornal Nacional. E a verdade diz que, nos últimos doze anos, o país promoveu, pela primeira vez em sua história, um fenômeno massivo de mobilidade social. Esse é o contexto que desaparece no noticiário cotidiano.
Eventualmente, um ou outro jornal precisa recolocar os indicadores no lugar e vemos, por exemplo, reportagens como a que foi publicada pelo Globo no sábado (14/3), véspera da manifestação: “Em 2003, cenário doméstico era pior do que agora”, dizia o título, sobre texto que observava que, há doze anos, o Brasil patinava num mundo em crescimento, enquanto, em 2015, a única das grandes economias que se expande é a americana, o que explica a valorização do dólar.
Apenas uma versão resumida pode ser lida no site do jornal carioca (ver aqui), mas o leitor atento pode ter uma ideia do que a imprensa costuma esconder em suas manchetes.
Não é a economia, estúpido!
Jornalistas gostam de citar a frase do antigo assessor do ex-presidente americano Bill Clinton, James Carville – “É a economia, estúpido!” – para definir o espírito do tempo, em 1992, e apontar o tema que iria decidir a vitória do candidato democrata contra o então presidente George W. Bush.
No Brasil de 2015 é preciso rever a tese de Carville: não é principalmente a economia que move as massas da classe média urbana contra o governo petista, mas o temor de uma crise rosna por trás dos gritos contra a corrupção.
No balanço das manifestações, os jornais tentam compor um cenário no qual a presidente Dilma Rousseff é acuada pelos dois fatores negativos, mas a Folha de S. Paulo e O Globoapostam em manchetes relacionando os protestos principalmente à economia. Apenas oEstado de S. Paulo isola a questão da corrupção, constatando que esse foi o tema central das manifestações, e oferece uma variedade de doze opiniões curtas, mas densas, de cientistas políticos, historiadores e sociólogos sobre o fenômeno do protagonismo das classes médias.
Já se disse aqui, e nunca é demais repetir, que a narrativa jornalística tradicional já não dá conta de interpretar a realidade contemporânea. Uma iniciativa como a do Estadoajuda a reduzir essa deficiência, embora pouco se possa fazer num espaço curto como o que foi oferecido aos analistas. Mas é preciso reconhecer que há uma enorme distância entre o jornalismo panfletário adotado cotidianamente pela imprensa brasileira, que publica vitupérios pela boca de seus articulistas pitbulls, e a diversidade oferecida em pequenas notas de especialistas.
A corrupção é, de fato, uma velha conhecida nossa, mas a mídia tradicional incutiu no público a convicção de que ela acaba de nascer e que impera num cenário de catástrofe econômica. Como na peça do suíço Friedrich Dürrenmatt, a visita da velha senhora encontra nossa aldeia deprimida pela convicção de que fomos à bancarrota, os jornalistas fazem recortes aleatórios da realidade e se percebe que a corrupção está entranhada na própria sociedade.
A vida real costuma imitar a ficção.
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