quarta-feira, 15 de abril de 2015

Dilma e a crise política

Por Maria Inês Nassif, no site Carta Maior:

A presidenta Dilma Rousseff carregou para o seu segundo mandato um acúmulo de desajustes econômicos e também uma crise política advinda de um longo “terceiro turno”, em que as forças políticas derrotadas investiram em formas pouco convencionais de embargo à candidatura vencedora. “Logo depois das eleições, veio o inusual pedido de recontagem de votos”, lembrou Dilma, em entrevista exclusiva à Carta Maior e outros jornalistas da mídia alternativa, nesta terça-feira. Foi atípica, segundo ela, porque o país tem um sistema de votação eletrônico eficiente e nunca foi questionado pelas partes em disputa. Em seguida, veio uma pressão para a rejeição de contas de campanha, rejeitada por unanimidade pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O estresse eleitoral se prolongou até a posse.

Simultaneamente à tensão política, os ajustes decorrentes, segundo Dilma, de pressões sobre a economia que se acumulavam desde 2011, incentivaram o clima de descontentamento.

“Temos que reconhecer que isso (o ambiente político) faz parte da democracia, mas não acho que seja disruptivo, isso é parte da luta política do Brasil no estágio atual”, afirmou a presidente. “Vamos fazer 13 anos de governo e quem não está (no poder) reage dessa forma”, afirmou.

Dilma apontou, contudo, que o país viveu uma situação econômica complicada – mas que, apesar de toda a sua complexidade, não produziu o volume de estragos do passado.

“O Brasil mudou completamente”, disse. As vantagens sobre o passado seriam um mercado consumidor de 44 milhões de pessoas, o baixo nível de endividamento do país – a dívida pública é “perfeitamente manejável”, nos limites atuais de 34,1% de dívida líquida e 58,9% de divida bruta – e existe a proteção de reservas internacionais.

Para a presidenta, a situação econômica já esteve pior e é possível vislumbrar uma recuperação a partir do próximo ano.

A trajetória da crise – Segundo Dilma, uma série de fatores acabaram levando a um desajuste fiscal, que as medidas tomadas no início de seu segundo governo pretendem corrigir.

Após dois anos de medidas anticíclicas, em 2011 o país sofreu o impacto de políticas monetárias dos países desenvolvidos, e sofreu o “estresse” de um câmbio de 1 dólar para 1,5 reais. Para neutralizar esse impacto, o governo ampliou os subsídios sobre o crédito e adotou uma política de desoneração fiscal “bastante relevante”, tanto para investimentos em bens de capital como para a cesta básica e folha de pagamentos.

O país também viveu “uma das piores crises hídricas da história”, que chegaram ao Sudeste, com grande impacto sobre o preço da energia. O sistema hidrotérmico adotado pelo país poupou-o de racionamento de energia, mas inevitavelmente o custo da produção cresceu, pelo uso de combustíveis na produção energética, em substituição à energia hídrica. Segundo a presidenta, o governo não fez o ajuste abruptamente, mas o impacto sobre a economia de qualquer forma acabou sendo grande.

O governo manteve a política de suavizar o impacto da substituição da matriz energética e as políticas anticíclicas enquanto a arrecadação, embora “não fosse maravilhosa”, estava crescendo.

A partir de 2014 houve uma “queda brutal” na arrecadação, acompanhada de movimentos na economia internacional desfavoráveis ao país – foi o “pior ano” para a China, grande importador de commodities brasileiras, especialmente minério de ferro; e foi o ano que amargou o impacto da queda de produção da Petrobras de 2013, só retomada no ano seguinte. “E ocorreu um quadro de agravamento no final do ano, não apenas para a União, mas para os Estados e Municípios”, afirmou a presidenta.

A partir de então, iniciou-se um ajuste cujas medidas já haviam começado a ser elaboradas pela equipe econômica que deixava o governo e até então comandada por Guido Mantega. Segundo a presidenta, a equipe anterior não deixou as medidas tributárias prontas, mas já havia trabalhado em propostas de correção das distorções detectadas no seguro-desemprego, no abono salarial, na Previdência e no próprio Fies (financiamento educacional em universidades privadas).

O novo ministro, Joaquim Levy, completou o ajuste com medidas fiscais – e, segundo a presidenta fez questão de ressaltar, o ministro apenas fez o que o governo – e, portanto, ela – decidiram que ele fizesse. “Não tem a menor correspondência com a realidade dizer que o Levy é o verdadeiro presidente da República. Para ser ministro da Fazenda e para defender medidas políticas, ele depende da Presidência da República. Ele não pode fazer nada que a Presidência não concorde”.

O governo, então, reduziu os subsídios dos juros – “não é mais 2,5%, mas também não é a Selic”. “Mas não houve mexida para acabar integralmente com o subsídio ao crédito, porque é preciso manter essas políticas, se quiser manter a visão de retomada (do crescimento)”.

“Não mexemos na desoneração da cesta básica nem dos bens de capital. E estamos propondo mexidas na folha de pagamentos”. Segundo a presidenta, a intenção, nesse caso, é reduzir o custo do trabalho “numa conjuntura internacional em que a redução está ocorrendo” de outras formas, com grande perda de avanços sociais e demissões. A redução proposta do custo do trabalho, segundo Dilma, está sendo feita via impostos, “principalmente para setores industriais onde a competição bate forte”. Ainda assim, a desoneração da folha, em função do ajuste, foi reduzida de uma perda de R$ 25 bilhões para o governo, para uma renúncia de R$ 12 bilhões.

O impacto do aumento dos juros sobre a dívida pública foi subestimada pela presidenta, que considera que a alta não esteriliza as economias feitas pelo lado fiscal, mas atua sobre a variável inflacionária – para ela, a questão de maior impacto para a população. Mas ela deixou claro que o governo não faz política monetária.

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