Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
Acho perfeitamente possível imaginar um 2016 menos ruim do que 2015.
Duas decisões recentes - o decreto que elevou o salário mínimo em 11% e a abertura de facilidades para o acesso de Estados e municípios ao crédito externo - mostram isso.
Não se deve exagerar o impacto dessas decisões na vida real dos brasileiros. Até porque elas vêm acompanhadas de medidas em outra direção, como o veto presidencial ao reajuste do Bolsa Família para cobrir perdas inflacionárias, e a retomada no debate sobre mudanças na Previdência Social.
Ainda assim, cabe reconhecer que as duas medidas recém-anunciadas podem trazer um alívio relativo num país sufocado pela recessão de 2015 e pela perspectiva de um segundo ano negativo.
Cabe registrar um ponto político. Essas medidas demonstram, entre outras coisas, a compreensão, por parte do Planalto, de que não se deve cultivar ilusões natalinas quando se busca uma saída para a crise.
Toda melhoria do ambiente político, toda mudança no quadro atual de depressão econômica irá depender, para começar, da capacidade do governo Dilma Rousseff e do Partido dos Trabalhadores oferecerem as respostas necessárias ao momento político.
Embora a vontade de confraternização e o espírito fraterno sejam a marca das festas de fim de ano, convém não esquecer que vivemos num mundo de conflitos materiais e disputa de interesses em todos os escalões da sociedade. Uma recessão obviamente não diminui esse conflito. Pelo contrário, amplia a disputa por cada milímetro da renda disponível, até porque ela se tornou menor.
O início de 2016 se apoia numa realidade política nova. A tentativa de derrubar um governo eleito sem a menor base jurídica sofreu uma derrota importante no final de 2015, inclusive pela manifestação popular em 16 de dezembro. Não custa lembrar, é verdade, que o Congresso ainda não rejeitou definitivamente o pedido de impeachment e que, quando isso acontecer, ao menos em teoria ainda haverá uma segunda ameaça, cuidadosamente preparada, no TSE.
De qualquer maneira, neste momento o monstro do golpe exibe garras menos afiadas.
Mesmo assim, em outro plano a disputa continua e as contradições permanecem. Isso porque não estamos falando de uma simples troca de gerente no plantão de um palácio presidencial na América do Sul mas num questionamento global de uma política econômica, que permitiu um crescimento a partir da ampliação do mercado interno, da distribuição de renda e programas importantes de bem-estar social.
Há uma agenda externa, de interesses imperiais em comunhão com aliados internos, que tenta reverter as conquistas populares obtidas na Argentina, na Venezuela, no Peru e procura espaços no Brasil.
Na dúvida, basta ler um editorial da Folha de S. Paulo, em 1 de janeiro, que afirma, com todas as letras, que a causa da crise não se encontra na economia, mas na vontade do empresariado modificar a política econômica. Ao estabelecer uma distinção essencial sobre a crise de 2015 e aquelas enfrentadas pelo país em tempos anteriores, o jornal afirma:
“Ao contrário das crises históricas, entretanto, desta vez não há insolvência em moeda estrangeira causada por dívida externa alta. O país dispõe de reservas.
O colapso do PIB deriva diretamente da paralisia decisória do setor privado, que por sua vez advém da percepção de que o governo não conseguirá estabilizar o crescimento da dívida. A questão, portanto, é puramente doméstica. “
A questão central se encontra no diagnóstico: vivemos uma “paralisia decisória do setor privado” que tem causas políticas, numa visão sobre a condução da economia, e não econômicas. “Não há insolvência,” diz o editorial que, pudicamente, não lembra a última vez em que isso ocorreu - no governo Fernando Henrique Cardoso.
Isso quer dizer que só teremos mudanças reais, ainda que modestas diante das necessidades da maioria dos brasileiros, se o governo e o PT forem capazes de recuperar a própria identidade política e tomar iniciativas reconstruir os compromissos que permitiram uma vitória dificílima em 2014 e atravessar as armadilhas e sabotagens de 2015. Demonstrando a capacidade de investir e ampliar o mercado de consumo, será possível esboçar uma recuperação.
Este é o critério para se avaliar a manutenção da política de valorização do salário mínimo e a flexibilização nas regras que permitem o acesso de prefeituras e governos ao crédito.
Combatida com ferocidade pelo empresariado conservador, em particular pelas Organizações Globo, o esforço para valorizar o menor salário legal dos brasileiros é uma conquista importante do movimento operário.
Começou a ser instituída em 2006, a partir de uma marcha das centrais sindicais em Brasília, que cinco anos mais tarde levou à aprovação de um projeto criativo e engenhoso, que assegurava um reforço no salário sem trazer os riscos das antigas indexações com base na inflação passada, que alimentavam perdas futuras.
A ampliação do acesso aos crédito liberta os investimentos públicos de um arrocho que compromete a capacidade de atuação dos estados e municípios. Num realidade universal, pela qual uma parcela essencial de gastos do Estado é assegurada por empréstimos e financiamentos, seja no Brasil, nos Estados Unidos e na maioria dos países, vivia-se uma situação absurda. Administrações que possuíam credito debatido e aprovado em instituições internacionais não conseguiam receber um dinheiro tão aguardado porque o Ministério da Fazenda se recusava a dar o último autógrafo necessário para a liberação, com o argumento de que a prioridade era cortar gastos de qualquer maneira.
Com isso, até a saúde pública do Rio de Janeiro foi sacrificada, sem que o cidadão comum sequer fosse informado pela origem real do descalabro.
Além dos efeitos econômicos óbvios, e dos benefícios sociais esperados, a medida gera outra mudança. Elimina uma velha área de atrito e irritação entre governadores, prefeitos e o Planalto, o que evita um combustível adicional à conspiração contra Dilma, que cedo ou tarde irá passar pelo voto do Congresso, instituição com incontáveis vasos comunicantes com governos estaduais e prefeituras.
A decisão também marca uma vitória importante de Nelson Barbosa. Em 2013, quando deixou o governo, ele ocupava a Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda e já cuidava desse assunto.
Acho perfeitamente possível imaginar um 2016 menos ruim do que 2015.
Duas decisões recentes - o decreto que elevou o salário mínimo em 11% e a abertura de facilidades para o acesso de Estados e municípios ao crédito externo - mostram isso.
Não se deve exagerar o impacto dessas decisões na vida real dos brasileiros. Até porque elas vêm acompanhadas de medidas em outra direção, como o veto presidencial ao reajuste do Bolsa Família para cobrir perdas inflacionárias, e a retomada no debate sobre mudanças na Previdência Social.
Ainda assim, cabe reconhecer que as duas medidas recém-anunciadas podem trazer um alívio relativo num país sufocado pela recessão de 2015 e pela perspectiva de um segundo ano negativo.
Cabe registrar um ponto político. Essas medidas demonstram, entre outras coisas, a compreensão, por parte do Planalto, de que não se deve cultivar ilusões natalinas quando se busca uma saída para a crise.
Toda melhoria do ambiente político, toda mudança no quadro atual de depressão econômica irá depender, para começar, da capacidade do governo Dilma Rousseff e do Partido dos Trabalhadores oferecerem as respostas necessárias ao momento político.
Embora a vontade de confraternização e o espírito fraterno sejam a marca das festas de fim de ano, convém não esquecer que vivemos num mundo de conflitos materiais e disputa de interesses em todos os escalões da sociedade. Uma recessão obviamente não diminui esse conflito. Pelo contrário, amplia a disputa por cada milímetro da renda disponível, até porque ela se tornou menor.
O início de 2016 se apoia numa realidade política nova. A tentativa de derrubar um governo eleito sem a menor base jurídica sofreu uma derrota importante no final de 2015, inclusive pela manifestação popular em 16 de dezembro. Não custa lembrar, é verdade, que o Congresso ainda não rejeitou definitivamente o pedido de impeachment e que, quando isso acontecer, ao menos em teoria ainda haverá uma segunda ameaça, cuidadosamente preparada, no TSE.
De qualquer maneira, neste momento o monstro do golpe exibe garras menos afiadas.
Mesmo assim, em outro plano a disputa continua e as contradições permanecem. Isso porque não estamos falando de uma simples troca de gerente no plantão de um palácio presidencial na América do Sul mas num questionamento global de uma política econômica, que permitiu um crescimento a partir da ampliação do mercado interno, da distribuição de renda e programas importantes de bem-estar social.
Há uma agenda externa, de interesses imperiais em comunhão com aliados internos, que tenta reverter as conquistas populares obtidas na Argentina, na Venezuela, no Peru e procura espaços no Brasil.
Na dúvida, basta ler um editorial da Folha de S. Paulo, em 1 de janeiro, que afirma, com todas as letras, que a causa da crise não se encontra na economia, mas na vontade do empresariado modificar a política econômica. Ao estabelecer uma distinção essencial sobre a crise de 2015 e aquelas enfrentadas pelo país em tempos anteriores, o jornal afirma:
“Ao contrário das crises históricas, entretanto, desta vez não há insolvência em moeda estrangeira causada por dívida externa alta. O país dispõe de reservas.
O colapso do PIB deriva diretamente da paralisia decisória do setor privado, que por sua vez advém da percepção de que o governo não conseguirá estabilizar o crescimento da dívida. A questão, portanto, é puramente doméstica. “
A questão central se encontra no diagnóstico: vivemos uma “paralisia decisória do setor privado” que tem causas políticas, numa visão sobre a condução da economia, e não econômicas. “Não há insolvência,” diz o editorial que, pudicamente, não lembra a última vez em que isso ocorreu - no governo Fernando Henrique Cardoso.
Isso quer dizer que só teremos mudanças reais, ainda que modestas diante das necessidades da maioria dos brasileiros, se o governo e o PT forem capazes de recuperar a própria identidade política e tomar iniciativas reconstruir os compromissos que permitiram uma vitória dificílima em 2014 e atravessar as armadilhas e sabotagens de 2015. Demonstrando a capacidade de investir e ampliar o mercado de consumo, será possível esboçar uma recuperação.
Este é o critério para se avaliar a manutenção da política de valorização do salário mínimo e a flexibilização nas regras que permitem o acesso de prefeituras e governos ao crédito.
Combatida com ferocidade pelo empresariado conservador, em particular pelas Organizações Globo, o esforço para valorizar o menor salário legal dos brasileiros é uma conquista importante do movimento operário.
Começou a ser instituída em 2006, a partir de uma marcha das centrais sindicais em Brasília, que cinco anos mais tarde levou à aprovação de um projeto criativo e engenhoso, que assegurava um reforço no salário sem trazer os riscos das antigas indexações com base na inflação passada, que alimentavam perdas futuras.
A ampliação do acesso aos crédito liberta os investimentos públicos de um arrocho que compromete a capacidade de atuação dos estados e municípios. Num realidade universal, pela qual uma parcela essencial de gastos do Estado é assegurada por empréstimos e financiamentos, seja no Brasil, nos Estados Unidos e na maioria dos países, vivia-se uma situação absurda. Administrações que possuíam credito debatido e aprovado em instituições internacionais não conseguiam receber um dinheiro tão aguardado porque o Ministério da Fazenda se recusava a dar o último autógrafo necessário para a liberação, com o argumento de que a prioridade era cortar gastos de qualquer maneira.
Com isso, até a saúde pública do Rio de Janeiro foi sacrificada, sem que o cidadão comum sequer fosse informado pela origem real do descalabro.
Além dos efeitos econômicos óbvios, e dos benefícios sociais esperados, a medida gera outra mudança. Elimina uma velha área de atrito e irritação entre governadores, prefeitos e o Planalto, o que evita um combustível adicional à conspiração contra Dilma, que cedo ou tarde irá passar pelo voto do Congresso, instituição com incontáveis vasos comunicantes com governos estaduais e prefeituras.
A decisão também marca uma vitória importante de Nelson Barbosa. Em 2013, quando deixou o governo, ele ocupava a Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda e já cuidava desse assunto.
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