Foto: Ricardo Stuckert |
Na derrota e na vitória, a forma e a hora contam. A prisão do ex-presidente Lula não aconteceu como desejava o ex-juiz Sergio Moro, como rendição de um réu despojado de tudo o que foi e significou, chegando abatido à cela em Curitiba, acompanhado de advogados. A pressa e o ímpeto do juiz ajudaram Lula a transformar a medida que representaria o triunfo da justiça “para todos” em um ato político de grande força simbólica, juntando as pontas de sua história contra a decretação de sua morte política e do projeto que encarnou. Selou-se a maior derrota da esquerda no Brasil depois da ditadura mas ato final não existe na política. Tudo agora será processado pela maioria que assistiu silenciosa.
Lula apresentou-se após dois dias de resistência popular legítima e pacífica, no sindicato que o projetou, onde foi preso pela ditadura há 38 anos, após uma missa que evocou a por ele celebrada quando estava no DOPS, em memória da mulher Marisa, por cuja morte voltou a culpar a Lava Jato e a mídia. A prisão de agora é outra mas a dramaturgia encenada juntou as pontas da história um PT desafiado a seguir sem Lula.
Pela manhã, acertada com a Polícia Federa a apresentação, os que estavam com ele Lula no sindicato enfrentavam um drama: como dizer a todo aquele povo lá fora que ele se deixaria prender. O povo, inarredável desde sexta-feira, dizia estar lá para impedir a prisão. Resolveu ele que anunciaria pessoalmente a decisão depois da missa.
Depois do desabafo, da sangria de mágoas com todo o processo, incluindo mídia, Lava Jato, Moro, TRF-4 e os procuradores, da evocação das lutas do passado, ele anunciou: “Eu vou atender à vontade deles”, explicando ligeiramente as razões reais da decisão: Moro decretaria a prisão preventiva, ele perderia direito a habeas corpus e a qualquer ação junto ao STF. Adubando o mito, voltou a dizer frases como “se prenderem meus sonhos sonharei pela cabeça de vocês, estarei nos sonhos de vocês”.
Ato encerrado, são dispensáveis registros insinceros, como de Marina Silva, de que é triste a prisão de um presidente que marcou tanto a história política do país, que deixou um legado de grandes mudanças mas ...mas a lei é para todos. Ou, como também se tem dito, que o sentido de derrota coletiva com a condenação, por corrupção, do maior líder popular do pais, é compensado pelo que representa de avanço, em sinal de que a sociedade tornou-se mais exigente no combate à corrupção dos políticos. A lei é para todos os pobres, mas no topo (entre os que lá sempre estiveram e os que ousaram lá chegar), vale mais para uns do que para outros. Apressou a condenação de Lula, sem entrar no juízo de sua culpa ou inocência, tirando-o da disputa, mas deixa livres tantos outros políticos alcançados pela Lava Jato. O que é o foro especial senão parte da lei?
Agora virão os desdobramentos políticos, além dos jurídicos, como a possível revisão das prisões em segunda instância. As pesquisas mostrarão a digestão inicial destes fatos. Com o espantalho da esquerda removido, Bolsonaro vai murchar ou crescer? Os candidatos da centro-direita sairão de sua insignificância nas pesquisas? E o PT, como tratará agora da sobrevivência que passa pelas eleições? Até quando dirá que Lula é o candidato, embora isso não faça mais sentido?
Uma reaproximação entre os partidos de esquerda começou há 15 dias, após o manifesto de Celso Amorim neste sentido, aqui divulgado. O PCdoB e sua candidata Manuela D’Ávila, o PSOL e o seu, Guilherme Boulos, cerraram fileiras com o PT em São Bernardo. Antes, fizeram ato conjunto no Rio por Marielle e contra a escalada e ódio da extrema-direita. Ficarão nisso ou poderão evoluir para uma frente eleitoral? São muitos os desafios para a esquerda em seu novo tempo sem Lula.
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