Foto: Ricardo Stuckert |
Os direitos políticos de Luiz Inácio Lula da Silva constituem uma das discussões mais importantes do atual processo eleitoral. A tentativa de manter o ex-presidente sub judice a qualquer preço, contudo, sofreu considerável revés com a decisão do Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) de recomendar o cumprimento dos seus direitos políticos, prontamente respondido com arrogância sobretudo pelo ministro da Justiça do governo golpista do presidente Michel temer, Torquato Jardim, e pelo Itamaraty.
O ministro disse que a recomendação não tem “nenhuma relevância jurídica”. “Lamentável a manipulação sectária a que se permite a ONU”, afirmou, acusando a decisão de “intromissão indevida”. Já o Ministério das Relações Exteriores divulgou nota dizendo que as conclusões do Comitê têm apenas caráter de recomendação. A defesa de Lula, por sua vez, reagiu afirmando que "essa decisão deve ser cumprida, é mandatória e não comporta qualquer tipo de questionamento".
Pela argumentação legal, a conclusão de que há uma tentativa de violação dos direitos políticos do ex-presidente é cristalina. Primeiro que a prisão imposta a Lula tem caráter cautelar, uma execução provisória, possível mas não obrigatória. A pena pode, em instâncias recursais nas cortes superiores, ser reduzida e até revogada. Segundo que a chamada “Lei da Ficha Limpa” está submetida à Constituição da República, que regulamenta o tema em vários artigos, como os 9º, 14º e 15º. Já no parágrafo único do artigo 1° o texto constitucional afirma que “todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”.
A prisão de Lula, como já foi amplamente divulgado, afronta explicitamente o artigo 5°, inciso LVII, da Constituição, o qual pontua que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Ao violar esse princípio jurídico, outros foram igualmente atropelados, como os da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789 (reiterada em 1948 na Declaração Americana de Direitos e Deveres), da Declaração Universal dos Direitos Humanos e do Pacto de San José da Costa Rica.
A inelegibilidade de Lula antes do trânsito em julgado, portanto, seria mais uma afronta explícita aos princípios basilares do Estado Democrático de Direito, um vilipêndio às suas garantias individuais. Mais ainda: seria o prosseguimento das ações de execração pública da sua imagem, como nas exposições sistemáticas de calúnias na mídia e na ampla publicidade dos espetáculos circenses em que seu processo de condenação e prisão foi transformado. A finalidade é uma só: impor à opinião pública o julgamento privado dos segmentos golpistas para transformar em realidade a tese fraudulenta de que não resta alternativa à condenação de Lula.
O pano de fundo dessa fraude é a tentativa desesperada de fugir dos resultados das pesquisas, que dão altos índices de intenções de votos em Lula. Os conservadores ignoraram o povo, com o qual não conseguem dialogar, e o próprio bom senso para impor o seu coquetel anti-Lula. Quando se vai ao centro das coisas, o único fato realmente essencial é que a volta de Lula à Presidência da República representa a retomada de uma grande ruptura com a nossa história e tradição política. Quando Leonel Brizola o comparou a Getúlio Vargas em 1998, ele não estava errado. Tanto que no ciclo dos seus governos e da ex-presidenta Dilma Rousseff não se tinha notícias de autoridades visitando bancos ou consultorias privadas antes de tomar decisões.
Lula se elegeu em 2002 dizendo claramente que reverteria aquele plano inclinado de ingovernabilidade para onde o país ia se encaminhando na era Fernando Henrique Cardoso (FHC). Ele chegou ao Palácio do Planalto com essa bandeira no ombro e optou pelo exercício do poder político cimentado por ingredientes como transigência, negociação e prioridade aos interesses populares. Sua principal vitória foi a capacidade de resistir aos ataques da direita e de continuar persuadindo a maioria da sociedade de que ela precisa retomar o rumo desenvolvimentista e progressista.
Esse poder democrático está traduzido em Lula desde as eleições de 1989, quando ele granjeou altos índices de popularidade que, desde então, permanecem inabalados, fazendo dele um dos grandes líderes de massas da história brasileira. No combate à marcha golpista, desde a deflagração da farsa do “mensalão” em 2005, Lula se revelou um leão na arena política.
E, como ele mesmo diria Lula, como nunca antes na história deste país as forças progressistas se uniram em torno de ideias como distribuição de renda, democracia, política externa independente, desenvolvimento econômico, planejamento, papel do Estado, integração progressista da América Latina e inserção soberana do Brasil no cenário mundial. A conclusão é de que a direita está em guerra com Lula porque ele representa o sentimento de um Brasil que não quer mais continuar com a volta do seu passado pré-ciclo democrático e progressista iniciado em 2003.
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