Foto: Ricardo Stuckert |
Antes do artigo propriamente dito, vale lembrar um trecho da fala do doutor Ulisses Guimarães, na promulgação da Constituinte, em outubro de 1988: “Traidor da Constituição é traidor da pátria. Conhecemos o caminho maldito: rasgaram a Constituição, trancaram as portas do parlamento, mandaram os patriotas para o exílio, a cadeia e o cemitério. Hoje, após tantas lutas e sacrifícios, ao promulgarmos o estatuto do homem, da liberdade e da democracia, bradamos em sua honra: temos ódio à ditadura. Ódio e nojo!”
Durante sua entrevista histórica, Lula afirmou que um de seus mais fortes desejos quando ganhar a liberdade é procurar comandantes militares para lhes perguntar o motivo de tanto ódio ao PT.
Nos dias seguintes, a curiosidade do ex-presidente deve ter sido ainda mais aguçada por matéria publicada pelo jornal O Estado de São Paulo dando conta de que a caserna não abre mão de apontar o PT como seu principal o inimigo.
Tentei refletir sobre o assunto que, embora complexo, deixa à mostra algumas evidências. Por exemplo: junto com os togados, os fardados hoje são os mais importantes fiadores da continuidade do golpe de estado, agindo obsessivamente – ora nas sombras, ora à luz do dia, como no episódio da pressão feita pelo general Villas Boas para que o STF negasse o habeas corpus a Lula - para manter a prisão ilegal do maior líder político brasileiro.
Usado à larga pelos chefes militares, o pretexto de combater a corrupção e a impunidade é coisa para inglês ver e enganar os incautos. Ou alguém se lembra de manifestações das forças armadas quando Temer comprou a peso de ouro deputados para se livrar de dois processos por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa? E por ocasião da soltura do golpista, três dias depois de ser preso, por acaso se ouviu algum protesto por parte de generais, almirantes ou brigadeiros? Tampouco se nota qualquer comoção diante da sucessão de corruptos confessos e milionários que são postos em liberdade depois de delatar quem os justiceiros de Curitiba querem encarcerar. E os 2,5 bilhões que o Dallagnol tentou morder da Petrobras para uma fundação criada por ele e sua turma? Permanece o silêncio.
Então, de onde vem o ódio dos militares ao PT, já que, como lembrou Lula, nenhum governo desde a redemocratização fez tanto por eles como os do partido, valorizando seus soldos congelados durante os oito anos de FHC, investindo em armamento e equipamentos e reestruturando os quartéis que se encontravam em petição de miséria? O que os levou a pegar carona no governo de uma besta quadrada fascista como Bolsonaro, apesar da séria ameaça de saírem desta empreitada com a imagem incinerada?
Primeiro porque ainda é forte entre os militares o sentimento anticomunista dos tempos da guerra fria, cevado através da antiga doutrina de segurança nacional, só que transformando em antipetismo. Muitos generais da ativa e de pijama acreditam piamente em imbecilidades bolsonaristas, tais como a iminência do país aderir ao regime socialista ou o “marxismo cultural” que assola as instituições de ensino.
É interessante notar também que as lideranças militares abandonaram por completo quaisquer resquícios do nacionalismo de outrora, se convertendo ao ultraliberalismo mais tosco. Por isso, apoiam a entrega do pré-sal às petroleiras estrangeiras e são coniventes com a venda da Embraer.
Mas ojeriza ao PT tem como principal causa principal algo que mora no fundo da alma : o ressentimento. O alardeado e elogiado profissionalismo que os militares mantiveram do fim da ditadura para cá acabou corroído pela mágoa profunda que sentem com a perda da narrativa para os democratas em relação aos 21 anos de ditadura. Isso fez com que os crimes cometidos pelos agentes do Estado fossem repudiados por grandes porções da sociedade, tanto no Brasil como no exterior. Para a milicada, isso é obra e graça da esquerda. Daí a ojeriza ao principal partido deste campo, o PT.
Mesmo cobertos pelo véu da impunidade oferecido pela lei da anistia, os militares não escaparam da revelação dos detalhes das atrocidades praticadas, expostos pelos trabalhos da Comissão da Verdade. Eis que surge a oportunidade de tentar reescrever a história cavalgando Bolsonaro.
Por fim, se pudesse diria ao Lula : “Presidente, não sofra com o ódio dos militares ao PT. Esperar o que do braço armado de uma burguesia antidemocrática e mesquinha como a nossa?
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