Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
Não custa lembrar: há 58 anos, a CIA organizou um grupo de adversários de Fidel Castro para invadir Cuba na esperança de produzir um levante popular capaz de derrubar um regime recém-instaurado.
Foram derrotados em 72 horas.
Num comportamento particularmente notável quando se considera o grau de sofrimento imposto aos venezuelanos pelos embargos orientados por Washington, a indiferença da população aos apelos de lideranças que imaginavam que bastaria acender uma faísca no palheiro para incendiar o país mostra um dado essencial.
Além das anedotas e trapalhadas que ilustram todas as narrativas dos vexames políticas, o fiasco confirma que os adversários do chavismo estão muito longe de representar uma alternativa confiável aos olhos da maioria dos venezuelanos.
Por essa razão, e nenhuma outra, a derrota de La Carlota terminou da mesma forma que as missões humanitárias que representaram a primeira iniciativa de Guaidó para desestabilizar o governo Maduro, no início do ano.
O detalhe é que, desta vez, o mentor de Guaidó, Leopoldo Lopez, que vivia no país sob o regime de prisão domiciliar, chegou a participar dos primeiros lances da operação até que, ao confirmar-se o fracasso, pediu refugio numa embaixada.
Lembrando a noção de que a história é uma tragédia condenada a se repetir como farsa, desde ontem a pergunta é saber como o império pretende agir daqui para a frente.
Do ponto de vista dos valores construídos pela humanidade ao longo de séculos, o correto seria conhecer o princípio da autonomia dos povos e a soberania das nações, para permitir que os venezuelanos seguissem seu caminho como achassem melhor.
Seria bom para todos, inclusive para a parcela da população dos Estados Unidos que não recebe os benefícios proporcionados pelo domínio imperialista sobre o planeta.
Descartando-se essa hipótese, cabe reconhecer que o domínio sobre a Venezuela segue um objetivo estratégico de Washington, incansável em seu esforço para tentar recuperar o controle das imensas riquezas naturais do país, perdido depois que Hugo Chávez rompeu com a velha acomodação da oligarquia com os mercados externos para construir um projeto autônomo de exploração do petróleo, distribuindo boa parte de seus lucros para a população mais pobre.
A lição menos visível e mais importante dos episódios de ontem é moral e é política.
Diz respeito a liderança do chavismo, em particular das Forças Armadas, e envolve questões que vão além da qualidade de seus equipamentos.
Consiste em reconhecer a comprovada dificuldade para se cooptar e/ou corromper os comandantes militares venezuelanos, de modo a que tenham interesse em garantir seu conforto pessoal em troca da traição aos compromissos históricos com seu país e seu povo.
Versões na linha do "estava tudo combinado com Maduro, que desistiu na última hora por causa dos russos" não merecem um fiapo de credibilidade.
São desculpas risíveis de mau perdedor, obviamente.
Mas confirmam que tentativas de aproximação foram feitas ou pelo menos ensaiadas - e repelidas.
A promessa de anistia a quem mudasse de lado, perdão que incluía o levantamento de embargos financeiros a lideranças do governo, chegaram a ser feitas e oficializadas. Nada.
E aqui está o problema do império, no futuro.
Sem apoio popular nem traição para abrir o caminho, a ambição imperial irá conduzir a um novo esforço para derrubar o chavismo, no qual a pressão por medidas de força militar irá se acentuar.
Ao fazer questão de dizer aos jornalistas que o fiasco de La Carlota "de modo algum pode ser chamada de golpe", o assessor John Bolton, principal estrategista militar de Trump, apenas tenta encobrir a falta de legitimidade da operação.
Não é um debate acadêmico nem jornalístico, porém. O que se viu em Caracas foi uma tentativa de uso da força, com apoio externo, para minar o direito do povo auto-venezuelano a escolher seu destino.
Ao evitar chamar as coisas pelo próprio nome, Washington só quer esconder a natureza do processo em curso e facilitar o trabalho de governos vizinhos a Venezuela que, cedo ou tarde, podem ser chamados a prestar novos serviços em benefício do império.
Jair Bolsonaro e Ernesto Araújo já correm para colocar o Brasil no primeiro lugar na fila.
Alguma dúvida?
É possível que o fiasco inesquecível de Juan Guaidó, 30 de abril, venha a ser lembrado como uma reprise da invasão da Baia dos Porcos, em 1961.
Não custa lembrar: há 58 anos, a CIA organizou um grupo de adversários de Fidel Castro para invadir Cuba na esperança de produzir um levante popular capaz de derrubar um regime recém-instaurado.
Foram derrotados em 72 horas.
Num comportamento particularmente notável quando se considera o grau de sofrimento imposto aos venezuelanos pelos embargos orientados por Washington, a indiferença da população aos apelos de lideranças que imaginavam que bastaria acender uma faísca no palheiro para incendiar o país mostra um dado essencial.
Além das anedotas e trapalhadas que ilustram todas as narrativas dos vexames políticas, o fiasco confirma que os adversários do chavismo estão muito longe de representar uma alternativa confiável aos olhos da maioria dos venezuelanos.
Por essa razão, e nenhuma outra, a derrota de La Carlota terminou da mesma forma que as missões humanitárias que representaram a primeira iniciativa de Guaidó para desestabilizar o governo Maduro, no início do ano.
O detalhe é que, desta vez, o mentor de Guaidó, Leopoldo Lopez, que vivia no país sob o regime de prisão domiciliar, chegou a participar dos primeiros lances da operação até que, ao confirmar-se o fracasso, pediu refugio numa embaixada.
Lembrando a noção de que a história é uma tragédia condenada a se repetir como farsa, desde ontem a pergunta é saber como o império pretende agir daqui para a frente.
Do ponto de vista dos valores construídos pela humanidade ao longo de séculos, o correto seria conhecer o princípio da autonomia dos povos e a soberania das nações, para permitir que os venezuelanos seguissem seu caminho como achassem melhor.
Seria bom para todos, inclusive para a parcela da população dos Estados Unidos que não recebe os benefícios proporcionados pelo domínio imperialista sobre o planeta.
Descartando-se essa hipótese, cabe reconhecer que o domínio sobre a Venezuela segue um objetivo estratégico de Washington, incansável em seu esforço para tentar recuperar o controle das imensas riquezas naturais do país, perdido depois que Hugo Chávez rompeu com a velha acomodação da oligarquia com os mercados externos para construir um projeto autônomo de exploração do petróleo, distribuindo boa parte de seus lucros para a população mais pobre.
A lição menos visível e mais importante dos episódios de ontem é moral e é política.
Diz respeito a liderança do chavismo, em particular das Forças Armadas, e envolve questões que vão além da qualidade de seus equipamentos.
Consiste em reconhecer a comprovada dificuldade para se cooptar e/ou corromper os comandantes militares venezuelanos, de modo a que tenham interesse em garantir seu conforto pessoal em troca da traição aos compromissos históricos com seu país e seu povo.
Versões na linha do "estava tudo combinado com Maduro, que desistiu na última hora por causa dos russos" não merecem um fiapo de credibilidade.
São desculpas risíveis de mau perdedor, obviamente.
Mas confirmam que tentativas de aproximação foram feitas ou pelo menos ensaiadas - e repelidas.
A promessa de anistia a quem mudasse de lado, perdão que incluía o levantamento de embargos financeiros a lideranças do governo, chegaram a ser feitas e oficializadas. Nada.
E aqui está o problema do império, no futuro.
Sem apoio popular nem traição para abrir o caminho, a ambição imperial irá conduzir a um novo esforço para derrubar o chavismo, no qual a pressão por medidas de força militar irá se acentuar.
Ao fazer questão de dizer aos jornalistas que o fiasco de La Carlota "de modo algum pode ser chamada de golpe", o assessor John Bolton, principal estrategista militar de Trump, apenas tenta encobrir a falta de legitimidade da operação.
Não é um debate acadêmico nem jornalístico, porém. O que se viu em Caracas foi uma tentativa de uso da força, com apoio externo, para minar o direito do povo auto-venezuelano a escolher seu destino.
Ao evitar chamar as coisas pelo próprio nome, Washington só quer esconder a natureza do processo em curso e facilitar o trabalho de governos vizinhos a Venezuela que, cedo ou tarde, podem ser chamados a prestar novos serviços em benefício do império.
Jair Bolsonaro e Ernesto Araújo já correm para colocar o Brasil no primeiro lugar na fila.
Alguma dúvida?
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