Charge: Duke |
Em abril de 2020, escrevi um artigo aqui na coluna onde já apontava a atuação do Procurador-geral da República, Augusto Aras, como semelhante à de Geraldo Brindeiro, ocupante do mesmo cargo durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, marcada pela blindagem de qualquer investigação de ações do Poder Executivo, mesmo diante de evidências de desvios.
O tempo é senhor da História e o caso presente só confirma aquele diagnóstico. Passados dois anos, os dados não deixam dúvidas que o Procurador-geral da República abandonou qualquer decoro e compromisso de representar e defender os interesses da sociedade e age, de fato, como advogado do governo Bolsonaro.
Em fevereiro de 2022, Aras enviou manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF) em que pede o arquivamento do inquérito que investiga Jair Bolsonaro e o deputado federal do Paraná, Filipe Barros, para apurar se ambos cometeram crime ao divulgar, durante uma live, o conteúdo de investigações da Polícia Federal sobre os ataques cibernéticos contra o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Na manifestação, o PGR argumenta que a investigação sobre a invasão de sistemas e bancos de dados do TSE não estava protegida por sigilo e que, por isso, a divulgação de informações sobre ela não configura crime.
No início deste mês de abril, Aras solicitou à ministra Rosa Weber, também do STF, a reconsideração da decisão que negou o pedido da PGR de arquivamento do inquérito contra o presidente Jair Bolsonaro por suspeita de prevaricação no caso da importação da vacina indiana Covaxin.
Levantamento feito pela agência de notícias CNN demonstra que dos 90 pedidos de investigação apresentados contra Bolsonaro, a Procuradoria-Geral da República foi contrária a 74. Somente em um deles Augusto Aras foi favorável à abertura de inquérito contra o presidente, justamente para averiguar a prevaricação na negociação pela compra da vacina indiana Covaxin, esse mesmo caso que agora insiste no arquivamento.
Concordando com a máxima caetana de que “Narciso acha feio o que não é espelho”, Augusto Aras acusou a ministra Rosa Weber de parcialidade ao pontuar que ela “distanciou-se da legitimidade do Poder Judiciário no desenho democrático brasileiro”.
O alinhamento do Procurador-geral da República ao presidente é prejudicial não apenas ao Ministério Público Federal (MPF) e seu papel institucional, mas à democracia brasileira.
Há um ano, era lido o requerimento que criou a CPI da Covid-19 e mudou a História do povo brasileiro com relação ao tratamento da pandemia, porque foi a Comissão que mostrou ao mundo os desvios no trato da aquisição de vacinas e obrigou o governo a mudar de postura para diminuir as perdas de vidas humanas.
Importa, no caso, lembrar que a despeito de uma série enorme de denúncias que causaram a morte de meio milhão de pessoas àquele tempo, a PGR não viu atos governamentais passíveis de reprimenda ou investigação.
O novo escândalo no Ministério de Educação e Cultura, que aponta desvios de recursos para favorecer municípios em troca de propinas cobradas por pastores, mereceu abertura de análise na PGR após diversos pedidos formulados, sobretudo por parlamentares, mas apenas sobre a conduta do então ministro Milton Ribeiro. Embora em conversa gravada que veio a público, o titular da pasta da educação tenha dito que tinha conhecimento do esquema e que cumpria ordens do presidente Jair Bolsonaro.
É de se lamentar que no atual caso também o parlamento, em sua maioria por interesses espúrios e trocas nada republicanas, não vá levar a cabo uma investigação via CPI, ao menos é o que os números indicam.
Desvios de compra de material, superfaturamento de ônibus escolar, construção de escolas “fake”. Assim como a saúde, a educação é um joguete nas mãos de um governo completamente sem escrúpulos. E as instituições, infelizmente, estão falhando em seu papel de fazer cumprir as normas. A principal delas, detentora da exclusiva competência de abrir investigação e apresentar denúncia contra o Presidente da República, transformou-se em puxadinho do governo, para vergonha da nação.
* Tânia Maria Saraiva de Oliveira é advogada, historiadora e pesquisadora. É integrante do Grupo Candango de Criminologia da UNB (GCcrim/UNB) e integrante da Coordenação Executiva da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD).
O tempo é senhor da História e o caso presente só confirma aquele diagnóstico. Passados dois anos, os dados não deixam dúvidas que o Procurador-geral da República abandonou qualquer decoro e compromisso de representar e defender os interesses da sociedade e age, de fato, como advogado do governo Bolsonaro.
Em fevereiro de 2022, Aras enviou manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF) em que pede o arquivamento do inquérito que investiga Jair Bolsonaro e o deputado federal do Paraná, Filipe Barros, para apurar se ambos cometeram crime ao divulgar, durante uma live, o conteúdo de investigações da Polícia Federal sobre os ataques cibernéticos contra o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Na manifestação, o PGR argumenta que a investigação sobre a invasão de sistemas e bancos de dados do TSE não estava protegida por sigilo e que, por isso, a divulgação de informações sobre ela não configura crime.
No início deste mês de abril, Aras solicitou à ministra Rosa Weber, também do STF, a reconsideração da decisão que negou o pedido da PGR de arquivamento do inquérito contra o presidente Jair Bolsonaro por suspeita de prevaricação no caso da importação da vacina indiana Covaxin.
Levantamento feito pela agência de notícias CNN demonstra que dos 90 pedidos de investigação apresentados contra Bolsonaro, a Procuradoria-Geral da República foi contrária a 74. Somente em um deles Augusto Aras foi favorável à abertura de inquérito contra o presidente, justamente para averiguar a prevaricação na negociação pela compra da vacina indiana Covaxin, esse mesmo caso que agora insiste no arquivamento.
Concordando com a máxima caetana de que “Narciso acha feio o que não é espelho”, Augusto Aras acusou a ministra Rosa Weber de parcialidade ao pontuar que ela “distanciou-se da legitimidade do Poder Judiciário no desenho democrático brasileiro”.
O alinhamento do Procurador-geral da República ao presidente é prejudicial não apenas ao Ministério Público Federal (MPF) e seu papel institucional, mas à democracia brasileira.
Há um ano, era lido o requerimento que criou a CPI da Covid-19 e mudou a História do povo brasileiro com relação ao tratamento da pandemia, porque foi a Comissão que mostrou ao mundo os desvios no trato da aquisição de vacinas e obrigou o governo a mudar de postura para diminuir as perdas de vidas humanas.
Importa, no caso, lembrar que a despeito de uma série enorme de denúncias que causaram a morte de meio milhão de pessoas àquele tempo, a PGR não viu atos governamentais passíveis de reprimenda ou investigação.
O novo escândalo no Ministério de Educação e Cultura, que aponta desvios de recursos para favorecer municípios em troca de propinas cobradas por pastores, mereceu abertura de análise na PGR após diversos pedidos formulados, sobretudo por parlamentares, mas apenas sobre a conduta do então ministro Milton Ribeiro. Embora em conversa gravada que veio a público, o titular da pasta da educação tenha dito que tinha conhecimento do esquema e que cumpria ordens do presidente Jair Bolsonaro.
É de se lamentar que no atual caso também o parlamento, em sua maioria por interesses espúrios e trocas nada republicanas, não vá levar a cabo uma investigação via CPI, ao menos é o que os números indicam.
Desvios de compra de material, superfaturamento de ônibus escolar, construção de escolas “fake”. Assim como a saúde, a educação é um joguete nas mãos de um governo completamente sem escrúpulos. E as instituições, infelizmente, estão falhando em seu papel de fazer cumprir as normas. A principal delas, detentora da exclusiva competência de abrir investigação e apresentar denúncia contra o Presidente da República, transformou-se em puxadinho do governo, para vergonha da nação.
* Tânia Maria Saraiva de Oliveira é advogada, historiadora e pesquisadora. É integrante do Grupo Candango de Criminologia da UNB (GCcrim/UNB) e integrante da Coordenação Executiva da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD).
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