domingo, 10 de abril de 2022

Democratização dos meios e as eleições

Por Wagner de Alcântara Aragão, no site Brasil Debate:


O universo de candidaturas para as eleições deste ano vai se desenhando e, em breve, teremos nomes e alianças definidas. Com isso, vão se tornar mais frequentes coletivas, sabatinas, debates e entrevistas olho no olho com os postulantes, em especial à Presidência da República. Entre tantos temas urgentes, um deles não pode ficar à margem, embora soe menos importante diante do tsunami de retrocessos, deterioração e entreguismo que nos assola.

Trata-se da democratização dos meios de comunicação, expressão slogan que significa, na prática, nada mais nada menos do que regulamentar o que já está estabelecido na Constituição. O tema é prioritário porque, sem uma comunicação social democrática, sabemos todos, a democracia não se completa.

É verdade que é um tema que precisa ser abordado com muito cuidado, porque no imaginário coletivo persiste a ideia de que regulamentar o setor significa restrição, coerção, censura. Quando é justamente o contrário: regulamentar o setor é assegurar regras bem fundamentadas, transparentes, a fim de garantir voz, vez a todo mundo.

A primeira providência de que necessitamos – e os candidatos e candidatas têm de ser questionados acerca de como pretendem conduzir a questão – é o de restabelecer o caráter público da TV Brasil, da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Criada em 2008, a TV Brasil/EBC começou a ser desmantelada depois do golpe de 2018, processo que se acentuou no atual governo.

Imediatamente, passo seguinte talvez seja o de regulamentar o artigo 223 da Constituição, dispositivo esse que fixa o princípio da complementaridade do sistema de radiodifusão aberta. É dizer: que os canais de rádio e televisão sejam distribuídos em equilíbrio a emissoras privadas, públicas e estatais. Hoje, sabemos, o oligopólio é das privadas.

Demonstração de que essa complementaridade é benéfica, amplia a democracia, está em caso atual relacionado à TV Cultura. A emissora pública começou a transmitir, pela segunda temporada consecutiva, partidas da Liga de Basquete Feminino (LBF). A LBF é o principal torneio nacional de clubes, na modalidade. E o basquete feminino é uma das modalidades mais vitoriosas na história do esporte brasileiro. É das mais praticadas em escolas e centros de formação.

Portanto, o basquete feminino faz parte da realidade, da cultura brasileira. Entretanto, nenhuma emissora de televisão aberta estava se interessando por transmitir a LBF. As empresas não consideravam comercialmente relevante, diante de outras opções de programação. Ora, se os canais não tratam o basquete feminino como um produto financeiramente vantajoso, isso significa que nós, sociedade, somos obrigados a não ter acesso a jogos e informações sobre esse componente da nossa identidade?

Lógico que não! Como uma emissora pública ou estatal não tem compromisso com lucro, sim exclusivamente com a prestação de serviços, ela atua complementando o sistema. Fazendo circular o que as emissoras privadas ignoram, descartam. Mas que são de interesse público tanto quanto qualquer outro conteúdo exibido pelas privadas. Na verdade, até mais.

Se esse caso fosse regra, não exceção, imagina que diversidade de conteúdos, pontos de vista, identidades, culturas teríamos sendo difundidos nos meios de comunicação de massa! Ou seja, quão mais democrática não seria nossa comunicação! Quão menos vacinados e vacinadas contra desinformação, narrativas enviesadas, mentiras, ofensas, atentados, retrocessos estaríamos, como sociedade!

O Brasil precisa se recolocar na trajetória de avanços civilizatórios que experimentávamos. Contudo, o retorno a esse caminho só será sustentável, para valer, imune a ataques, se a circulação de fatos, análises, opiniões, ideias, arte for plural. Porque tudo isso dá a base para que compreendamos a realidade com maior precisão, segurança e confiança. Portanto, para que acertemos mais nas nossas decisões.

Para se aprofundar na luta e mobilizações pela democratização dos meios de massa no Brasil, duas dicas: o coletivo Intervozes (https://intervozes.org.br/) e o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (http://fndc.org.br/).

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