sábado, 7 de novembro de 2015

A tragédia em Mariana e a Lista de Furnas

Por Joaquim Carvalho, no blog Diário do Centro do Mundo:

A lista de Furnas tem cinco páginas e seu conteúdo pode ser separado em duas faces. Nas páginas 1, 2, 3 e 4, estão relacionados os nomes dos 156 políticos que receberam dinheiro para a campanha eleitoral de 2002. Eram todos da base aliada do então presidente Fernando Henrique Cardoso. É o que se poderia chamar de a lista dos corruptos.

No final da página 4 e na página 5, estão relacionados os nomes de 101 empresas, as que deram dinheiro para financiar os candidatos. É o que se poderia chamar de a lista dos corruptores.

Nesta lista , estão fornecedores diretos da estatal Furnas e empresas com as quais o então diretor de Planejamento, Engenharia e Construção, Dimas Toledo, mantinha contatos, como operador que administrava os interesses de seus políticos protetores, rol em que Aécio Neves era o destaque.

Na relação dos corruptores, estão nomes conhecidos como a Alstom e a Siemens, no grupo das fornecedoras de equipamentos, a Camargo Correa, a Odebrecht e a Mendes Júnior, no grupo das empreiteiras, a Baurense, no grupo das prestadoras de serviço, e a Samarco Mineradora, no grupo das grandes consumidoras de energia (veja na página 4 da lista abaixo).

Com o rompimento da barragem da Samarco em Mariana, interior de Minas, na última quinta-feira, a lama que destruiu casas, matou pelo menos uma pessoa e provocou o desaparecimento de outras 13, traz à tona uma relação estreita entre a Samarco e as administrações do PSDB em Minas Gerais e também no Espírito Santo, não só no caso da Lista de Furnas.

No ano 2000, uma operação de compra de créditos do ICMS, no valor à época de R$ 67 milhões, resultou num escândalo que levou à prisão o presidente da Assembleia Legislativa do Estado e colocou no banco dos réus o então governador, José Ignácio, do PSDB, a mulher dele, Maria Helena Ferreira, e o ex-ministro Aníbal Teixeira.

Os créditos do ICMS eram da Samarco, que os vendeu para a estatal de energia do Espírito Santo, Escelsa, sem que houvesse aprovação da Procuradoria do Estado. Um dos intermediários era o lobista Nílton Monteiro, que mais tarde denunciaria a Lista de Furnas.

Passado para trás na negociação dos créditos de ICMS da Samarco, ficou sem receber a comissão e denunciou o esquema. Uma investigação da Polícia Federal descobriu que parte do dinheiro recebido pela Samarco foi parar na conta de laranjas de deputados estaduais e ajudaram a comprar a eleição do deputado José Carlos Gratz a presidente da Assembleia. Gratz acabou preso e José Ignácio, nove anos depois, foi condenado a oito anos de cadeia. Ele recorreu da sentença e até hoje não foi preso.

O escândalo, que resultou na CPI da Propina, jogou luzes sobre a movimentação de Nílton Monteiro, o da Lista de Furnas, pelo submundo da política. Depois da propina no Espírito Santo, denunciou o Mensalão de Minas e a Lista de Furnas.

Nos três casos, o da Propina, o do Mensalão e da Lista, os documentos que apresentou tiveram autenticidade comprovada.

Em Minas, onde morava, Nílton respondeu a um inquérito movido pelos diretores da Samarco, por causa da denúncia no Espírito Santo. No curso da investigação, de denunciante a Samarco passou à denunciada, por apresentar provas falsas contra Nílton Monteiro.

Em 2010, um advogado que trabalhou tanto para o lobista Nílton Monteiro quanto para a Samarco prestou um depoimento considerado bombástico, em que confirmou possuir gravações que comprometiam a empresa Samarco e integrantes do primeiro escalão do governo de Minas, entre os quais o próprio governador Aécio Neves.

Depois disso, o inquérito desapareceu num trânsito entre a Delegacia e o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Peças foram reapresentadas, na remontagem dos autos, como manda a lei, mas a versão final não inclui o depoimento bombástico desse advogado, além de outros documentos considerados importantes.

Nesta semana, dois dias antes da barragem da Samarco rachar, o delegado João Otacílio, que tomou o depoimento daquele advogado – chamado Joaquim Engler Filho – confirmou em juízo o teor do depoimento e reiterou que foi afastado por causa da investigação que se aproximava do governador Aécio Neves.

Um advogado que acompanha este caso de perto é Dino Miraglia, o primeiro a denunciar o desaparecimento do inquérito e a fraude na remontagem do processo. Depois disso, teve a casa e o escritório invadidos pela Polícia Civil, numa operação com mandado judicial, obtido por policiais que o acusavam de pertencer a uma quadrilha de estelionatários.

A operação contou com cães e movimentou um helicóptero, com voos rasantes sobre o condomínio onde o advogado morava. Dino Miraglia viu um investigador arrombar a porta do banheiro quando a esposa, chorando, se refugiou ali. Perdeu o casamento e muitos clientes.

Dino Miraglia, que já foi chamado de Cidadão Mais Você, no programa de Ana Maria Braga, por tirar da cadeia um homem condenado injustamente, hoje evita dar entrevista, e fala com poucos amigos. A um deles, disse que, se o governo de Minas remover a lama da Samarco, vai encontrar, além de vítimas, esqueletos no armário do governo de Aécio Neves/Antônio Anastasia, com casos de truculência policial, manipulação da justiça e corrupção.


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