sábado, 7 de novembro de 2015

Moro e a deslegitimação do sistema político

Por Tereza Cruvinel, em seu blog:

Há onze anos o juiz Sergio Moro já sonhava com a Operação Lava Jato. No artigo de 2004, hoje muito citado, em que tece considerações sobre a Operação Mãos Limpas italiana, Moro destaca uma de suas consequências mais importantes para a Itália, a deslegitimação dos atores e dos partidos então hegemônicos. O que veio a seguir nós sabemos: Berlusconi e a decadência do sistema político italiano. A pesquisa IBOPE recém divulgada nos informa que a Java Jato vem conseguindo o mesmo efeito: todos os grandes nomes da política nacional estão em franco declínio e os partidos em queda livre na preferência dos cidadãos. E depois da queda e da vertigem, o que virá?

Segundo o IBOPE, a rejeição aos políticos que podem disputar a presidência da República em 2018 disparou. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente mais popular da história, que deixou o governo com quase 90% de aprovação, aparece na frente com 55% de rejeição (não votaria nele "de jeito nenhum”) Estão empatados tecnicamente com Lula o senador José Serra (PSDB), com 54%, o governador Geraldo Alckmin (PSDB), com 52%, e o ex-ministro Ciro Gomes (PDT), com 52%.

Aécio Neves (PSDB) é rejeitado por 47% e Marina Silva (Rede) por 50% dos entrevistados. Aqui entra o efeito da Lava-Jato e da desacreditação da política na esteira das denúncias e do fogo cruzado entre adversários, sempre na linha da “desconstrução do outro”. Em maio de 2014, apenas 33% não votariam em Lula "de jeito nenhum". Aécio tinha 37% de rejeição e Marina 36%.

Quando se trata de preferência, espontaneamente apontada pelo entrevistado, Lula ainda é o preferido: 23% votariam nele, contra 15% em Aécio e 11% de Marina. Serra vem com 8%, Alckmin com 7% e Ciro, 4%. Mas todos apresentam déficit de legitimidade, derivado da rejeição.

Em relação aos partidos o quadro é o mesmo. Durante muitos anos o PT foi o partido preferido e mais respeitado e admirado pelos brasileiros. No poder, o partido perdeu tudo isso, atolado em práticas que adotou. Nenhum partido financia a sua própria hegemonia sem valer-se do Estado que conquistou. Isso sempre valeu para todos e o PT achou que valeria par ele também. Perdeu. E veio Moro.

Agora surge um empate na preferência: PT (12%), PMDB (10%) e PSDB (10%). Empate técnico mas num patamar de legitimidade muito baixo. O PT já foi o preferido de quase 40% da população. Em 2013, para não recuar muito, o índice de preferência pelo PT ainda era de 36%, apesar do mensalão e do forte tiroteio que o partido enfrenta desde que chegou ao governo em 2002. Na pesquisa, 70% afirmaram ter uma opinião mais desfavorável contra 23% que declaram ter uma opinião mais favorável ao partido. O restante não opinou.

Já o PSDB viu a preferência pela sigla dobrar, passando de 5% para 10%, embora partindo de um patamar muito baixo. 50% disseram ter opinião mais desfavorável sobre o partido, contra 31% que declararam opinião mais favorável. O PMDB, em 2010, tinha uma preferencia inferior a 10% até 2010. Agora, com a crise do PT, chegou aos 10%. E os outros, todos, neste quadro partidário absurdo de mais de 30 partidos, aparecem com preferência inferior e opinião desfavorável superior à destes três partidos centrais no espectro. Ou seja, legitimidade muito rasa.

Moro, em seu artigo, falando sobre as Mãos Limpas (Mani Puliti, como ele prefere grafar), afirma:

“A deslegitimação do sistema foi ainda agravada com o início das prisões e a divulgação de casos de corrupção. A deslegitimação, ao mesmo tempo em que tornava possível a ação judicial, era por ela alimentada: A deslegitimação da classe política propiciou um ímpeto às investigações de corrupção e os resultados desta fortaleceram o processo de deslegitimação. Conseqüentemente, as investigações judiciais dos crimes contra a Administração Pública espalharam-se como fogo selvagem, desnudando inclusive a compra e venda de votos e as relações orgânicas entre certos políticos e o crime organizado. As investigações mani pulite minaram a autoridade dos chefes políticos – como Arnaldo Forlani e Bettino Craxi, líderes do DC e do PCI – e os mais influentes centros de poder, cortando sua capacidade de punir aqueles que quebravam o pacto do silêncio (2).

O processo de deslegitimação foi essencial para a própria continuidade da operação mani pulite. Não faltaram tentativas do poder político interrompê-la”.


Aqui, em relação à Mãos Limpas, ele não pode dizer o mesmo. O governo, cujo partido é alvejado, não manda na Polícia Federal, não tem sequer um serviço de inteligência que o matenha informado do rumo que as coisas estão tomando na República de Curitiba. O dono da maior construtura do país continua preso sem razões evidentes, as prisões preventivas continuam sendo renovadas e prolongadas de forma heterodoxa e as delações premiadas (que ele também muito louva no artigo) governam a dinâmica da política e a sensibilidades dos mercados.

Neste momento, quem arde na fogueira da deslegitimação é o presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Dilma segue no banho-maria do impeachment e das ações no TSE. Os partidos cambaleiam, revezando-se na televisão com programas que entendiam a população. E quando todos tombarem no vale dos caídos e esquecidos, presos ou não, o que virá para a democracia que estamos construindo? O que ficará no lugar? Não sei, ninguém sabe, o ponto de interrogação está à nossa frente.

1 comentários:

Anônimo disse...

Conversa Afiada em 23/10/2015:
''A Lava Jato é um instrumento para desmontar a Petrobras e destruir o campo político que a mantém sob o controle do povo brasileiro! Os russos consideram o Brasil seu parceiro estratégico nas Américas. E a Lava Jato é um obstáculo a essa parceria. Os russos sabem que a Lava Jato é para entregar a Petrobrax à Chevron. A Lava Jato é do Obama.'' http://www.conversaafiada.com.br/politica/obama-esta-na-lava-jato

Moro e PGR têm a ver com o ''pool'' do Di Pietro e Lava-Jato tem a ver com Mani Pulite --- Para muitos analistas Mani Pulite foi um golpe judiciário para abater uma classe politica corrupta mas contrária a ceder a soberania nacional italiana: «A velha dirigȇncia DC-Psi, que no bem ou no mal, governava, não cederia à pressões de liquidação dos bens (assets) estratégicos e patrimoniais do país aos EUA. O abatimento da soberania italiana só foi possível graças aos novos partidos nascidos às pressas das cinzas dos velhos, mimetizados com novas siglas e cores. O governo dos EUA decidira substituir a velha classe politica com uma elite tecnocrática obediente e disposta a sabotar o inteiro sistema produtivo italiano. Conseguiu plenamente com Mani pulite.
Di Pietro, que abandonou a magistradura sem explicar o motivo, foi comprovadamente usado pelos EUA para aniquilar o impecilho político a favor dos EUA e da NATO. Vale recordar que a Casa Branca odiava Craxi, Spadolini e Andreotti, em particular modo, Craxi, que ousou peitá-la na questão de Sigonella. Di Pietro tinha estreita relações com Michael Ledeen, expoente neocon do “American Enterprise Institute”, um fascista da extrema direita do partido Republicano, colaborador de Reagan e Bush, com o seu nome ligado a escândalos e atentados na Italia (sequestro do Moro, do general Dozier, das bombas na estação de Bolonha, atendado do Papa João Paulo II, etc.). O então chefe do Serviço de Inteligência Fulvio Martini revelou 15 anos depois aos membros de uma comissão parlamentar (Copaco) de ter dito em 1984 ao embaixador Maxwell Raab, «Ledeen não deve mais voltar pra Italia» porque «indesejável». Em tempo: Michael Ledeen é atualmente conselheiro do primeiro ministro Renzi.
Fontes:
http://www.libreidee.org/tag/antonio-di-pietro/
http://www.libreidee.org/2014/04/stragi-e-segreti-renzi-e-lo-strano-amico-americano/