quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Serra, o candidato do Arco de Fogo

Reproduzo artigo de Antonio Lassance, publicado no sítio Carta Maior:

Serra foi campeão de votos nas áreas de maior desmatamento. Uma análise mais detida sobre o sucesso do candidato na região pode ser feita a partir dos mapas eleitorais dos municípios que foram mais atingidos pela operação Arco de Fogo. Esta operação foi deflagrada pela Polícia Federal em 2008, com o apoio da Força Nacional, a partir
de uma demanda do Ministério do Meio Ambiente, quando Marina Silva ainda era ministra, e incidiu sobre as localidades onde a prática das queimadas e da retirada de madeira era mais crítica.

A magnitude da operação, a dimensão do apoio federal e os resultados colhidos, em conjunto com outras políticas - como a de implantar os Territórios da Cidadania em toda a extensão do arco do desmatamento - contradizem a afirmação de Marina Silva de que sua saída do Ministério do Meio Ambiente (MMA) deveu-se a que o Governo Federal não a teria apoiado na luta contra o “desenvolvimento a qualquer custo”. A
operação Arco de Fogo foi a maior luta já travada no Brasil contra tal desenvolvimento desenfreado, com resultados significativos na redução do desmatamento. Resultados, aliás, que Marina exibiu como feitos de um trabalho iniciado em sua gestão. Estranha essa forma de boicote.

O PV, a começar por Gabeira, Sirkys e Feldman, sabe o quanto Serra é o candidato do Arco de Fogo. Nenhum deles desconhece que Marina foi severamente punida nas urnas da faixa que vai do Acre (terra natal da candidata) ao Maranhão, apelidada de Arco do Desmatamento.

Considerados os 18 municípios mais afetados pela operação Arco de Fogo e que a ela ofereceram maior resistência, Serra ganhou em 14 deles (72%). Dilma, em 4. Marina, em nenhum. As vitórias de Dilma se deram em áreas da política de reforma agrária, com maior organização dos trabalhadores sem terra ou dos assentados, ou em localidades que passaram a depender menos da economia do desmatamento.

Em Tailândia, sul do Pará, cidade que foi palco da primeira operação Arco de Fogo, Serra teve 61% dos votos, contra apenas 32,75% de Dilma e míseros 5,70% de Marina. Em cidades pólo da atividade madeireira e da expansão predatória do agronegócio, como Alta Floresta e Sinop, no Mato Grosso, e Altamira e Paragominas, no Pará, Serra não teve menos de 50% dos votos (foram quase 60% em Alta Floresta). Dilma oscilou
entre cerca de 34% (Altamira) e 38% (Paragominas), e Marina ficou entre 3,3% (Alta Floresta) e 11% (Paragominas).

O trabalho de fiscalização realizado pelo Ministério do Trabalho e os levantamentos feitos pela Comissão Pastoral da Terra e pela organização Repórter Brasil mostram também que há uma relação direta entre o agronegócio predatório e a prática do trabalho escravo. Diga-se de passagem, ao contrário de Dilma, Serra não assinou até
agora a Carta-Compromisso contra o trabalho escravo.

Quando o governo Lula deu início à operação Arco de Fogo, 26 dos 36 municípios (72,22%) que faziam parte da lista prioritária de combate ao desmatamento tinham ocorrência de trabalho escravo . A fiscalização e o resgate de trabalhadores em situação análoga à que a OIT define como de escravidão produzem números que demonstram uma grande diferença de esforços entre o governo FHC e o governo Lula. Em 8 anos,o Governo FHC resgatou em média pouco mais de 736 trabalhadores nessas circunstâncias (ao todo, 5.893 pessoas). De 2003 a 2008, conforme dados do Ministério do Trabalho, o governo Lula retirou da escravidão quatro vezes e meia mais pessoas (26.670), com uma média de quase 4.500 por ano.

Os dados corroboram as suspeitas levantadas por Arlete Sampaio e Marilena Chauí,que apontaram a coincidência entre as votações majoritárias obtidas por Serra em alguns Estados e a presença do agronegócio predatório. Altamiro Borges (Blog do Miro) lembrou que a maior votação proporcional de Serra no país ocorreu em Marcelândia (MT), com 75,1% dos votos. “O município é reduto pecuarista e tem altos índices de desmatamento”. Flávio Aguiar (Carta Maior) também destacou que Serra ganhou nos estados do chamado “espinhaço do agrobusiness”, de Santa Catarina a Rondônia.

A posição de “independência” do PV para o 2º turno - pelo que se sabe, costurada por Marina a duras penas - não tem impedido que uma parcela de seus dirigentes entenda a posição de neutralidade como um aval para subir no muro dos tucanos. Mas o eleitorado que votou em Marina por razões ambientais tem elementos de sobra para compreender a dimensão da luta que se trava na Amazônia e perceber a opção antiecológica dos que preferem por lenha na fogueira do candidato do Arco de Fogo, custe o que custar.

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1 comentários:

Jorge Stolfi disse...

Outra "realização" do Serra como Ministro da Saúde foi o decreto do FHC que permitiu as queimadas para colheita da cana.

Essas queimadas são uma das coisas mais vergonhosas que há nesse país. Na época da colheita, o ar nas regiões canavieiras fica mais poluído do que o da capital paulista nos seus piores dias. Em cidades como Campinas, a poluição devia a queimadas pode ser muitas vezes mais intensa que a de um cigarro numa sala fechada. Ainda na era FHC, estudos científicos mostraram claramente a relação entre essas queimadas e o aumento de problemas respiratórios --- e, inevitavelmente, de mortes de crianças, velhos, e doentes --- nos hospitais de São Pualo.

Por essas razões, as queimadas deveriam ter sido proibidas há muito tempo. O problema é que os cortadores de cana pecisam ser pagos em dobro quando a palha não foi quaimada. Portanto FHC, por decreto, autorizou as queimadas a continuarem por mais 8 (ou 10?) anos. E como é um decreto federal, estados e municípios não podem passar legislação própria sobre esse assunto.

Ou seja, FHC não só liberou as queimadas, mas probiu que elas sejam proibidas.

Onde estava seu Ministro da Saúde nessa hora?