Por Tiago C. Soares, no sítio da Fundação Perseu Abramo:
O papel dos blogs e das novas tecnologias de comunicação na mídia e na participação popular foram temas centrais do 1º Encontro Mundial de Blogueiros, que reuniu em Foz do Iguaçu, nos dias 27, 28 e 29 de outubro, ativistas, pesquisadores, jornalistas e representantes de partidos e dos movimentos sociais do Brasil e do exterior.
O evento, que entre palestrantes e espectadores contou com mais de 400 pessoas vindas de países das Américas Latina e do Norte, da Europa e da África, foi organizado pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé e pela Altercom (Associação Brasileira de Empresas e Empreendedores da Comunicação), e tratou de temas como democracia participativa, democratização dos meios de comunicação e marco regulatório, e circulação de informação nas redes sociais, com especial atenção às novas formas de ativismo oferecidas pela web.
Com mesas organizadas nos eixos “O papel das novas mídias”, “Experiências nos EUA e Europa”, “Experiências na Ásia e África”, “Experiências na América Latina”, “As experiências no Brasil”, e “A luta pela liberdade de expressão e pela democratização da comunicação”, o encontro trouxe representantes de projetos como Wikileaks, Página 12, Le Monde Diplomatique e Democracy Now. As mesas contaram, ainda, com ativistas digitais envolvidos nas mobilizações da Primavera Árabe, analistas políticos, acadêmicos e representantes de governos da América Latina.
Abrindo o encontro, a mesa “O papel das novas mídias” uniu o porta-voz do WikiLeaks, Kristinn Hrafnsson; o criador do Le Monde Diplomatique, Ignácio Ramonet; e o jornalista e blogueiro brasileiro Luis Nassif num debate sobre as novas plataformas de comunicação online e as mudanças vividas pelo universo da informação.
Pelo Wikileaks, Krinstin Hrafnssson falou das recentes dificuldades vividas pelo projeto - que teve seus fundos bloqueados por grandes empresas financeiras - e apontou no governo dos EUA um dos responsáveis pela perseguição sofrida pelo site. Hrafnsson explicou ainda os motivos pelos quais o Wikileaks teria rompido sua parceria com alguns veículos de mídia tradicionais, afirmando que “alguns jornais veem no Wikileaks apenas uma fonte de conteúdo bruto, e não aceitam o fato de termos, também, interesse editorial no modo como são divulgados os conteúdos que levantamos”. Ele lembrou que, em sua opinião, a emergência do Wikileaks tem a ver com a queda, junto ao público, na credibilidade das informações veiculadas pela grande mídia. “Nos últimos dez anos intensificou-se a falta de transparência nas informações relativas a governos e corporações”, argumentou.
Em seguida, Ignácio Ramonet, do Le Monde Diplomatique, propôs uma análise conjuntural do momento vivido pela comunicação de massa com o surgimento, nos anos recentes, de novas plataformas para a participação dos cidadãos na produção da informação. “Estamos em meio à mudança, daqui a cinco anos o cenário da mídia de massas estará completamente mudado e não temos como saber para onde isso apontará”, disse Ramonet, que justificou seu diagnóstico lembrando da crise financeira e editorial hoje enfrentada pelos grandes meios de comunicação.
Ramonet lembrou também que a queda de alguns grupos de mídia tradicionais não significaria a princípio uma mudança na correlação de forças no mercado da comunicação. “Há o surgimento de novos atores centrais, grupos econômicos que lucram com a produção de informação na internet. Empresas que fazem sua riqueza com a informação trocada pelo público em suas plataformas”, argumentou. E lembrou: “O acesso do público à informação primária levou à criação de um novo proletariado, mercenariado da comunicação”. Para o criador do Le Monde Diplomatique, o amplo acesso às novas ferramentas de comunicação não necessariamente significa uma postura menos conservadora de novos atores: “há blogueiros rebeldes e há os reacionários, precisamos ser cuidados são atribuir à blogosfera no geral um papel progressista”, afirmou.
Encerrando a mesa, o jornalista Luis Nassif tratou da relação entre mídia e capital financeiro no Brasil, enfatizando o papel da blogosfera no agendamento da opinião pública e na desconstrução de pautas e interesses dos meios de comunicação tradicionais.
Como exemplo, Nassif lembrou do papel da blogosfera no debate público no período do caso Satiagraha. “A mídia jogou seu poder para atacar a operação e defender Daniel Dantas e Gilmar Mendes. O contraponto foi na blogosfera, que respondeu, ponto por ponto, as inverdades levantadas pela mídia, com informações”. O jornalista disse acreditar na criação de novos espaços para a mediação e circulação do conteúdo circulado online, em redes para a checagem e levantamento de dados e informações que sirvam de contrapeso para o oferecido pela mídia tradicional.
Ativismo e redes sociais
O evento continuou com a mesa “Experiências nos EUA e Europa”, que reuniu Pascual Serrano, blogueiro e fundador do sítio Rebelión, da Espanha; e Andrés Thomas Conteris, fundador da versão em espanhol do site Democracy Now, dos EUA.
Pascual Serrano traçou um breve histórico da apropriação das novas ferramentas digitais pelos veículos independentes, oferecendo uma análise crítica da relação entre o ativismo e a mobilização nas novas redes digitais.
“Na década passada e no início desta década foram os jornalistas alternativos os que apostaram inicialmente nas possibilidades da internet”, disse Serrano -- cujo site, o Rebelión.org, foi criado em 1996. Ele repassou ainda os diferentes momentos vividos pela internet nas últimas décadas, passando pela criação do Youtube (marco que teria deslocado a linguagem online para o audiovisual) e a emergência das redes sociais (que teria dado aos jovens a frente do processo que chamou de “ativismo informático”).
O criador do Rebelión vê com desconfiança as novas mobilizações articuladas por ativistas digitais (ações como os Indignados, na Espanha, e o Occupy Wall Street, nos EUA) e não as vê como ações capazes de criar transformações profundas. Para Serrano, ao aumentar a velocidade e a concisão nas práticas de comunicação, os blogs e redes sociais inibiriam reflexões mais profundas.
Num contraponto, Andrés Thomas Conteris tratou com entusiasmo das novas manifestações políticas organizadas em rede por ativistas ao redor do mundo. Conteris lembrou do amplo apoio popular e da espontaneidade na articulação dos movimentos relacionados ao ativismo digital, enfatizando acreditar que essas ações surgem como uma tentativa de mobilização permanente. “É a mensagem de insatisfação dos 99%”, afirmou, numa referência à maioria que vem sofrendo os efeitos da crise econômica causada pela população dos 1% mais ricos do planeta.
Ao fim do primeiro dia, a experiência da primavera árabe e o cenário político do Oriente Média foram o tema do debate “Experiências na Ásia e África”, que contou com os ativistas Ahmed Bahgat (Egito), Ahmed Alohan (Arábia Saudita) e Muhammad Farhan (Paquistão), além do jornalista especialista em assuntos da região Pepe Escobar.
Os ativistas trataram das estratégias de mobilização e contra-informação postas em prática nas manifestações populares organizadas em rede em seus países. Eles trataram, ainda, das dificuldades sofridas na divulgaçãode de suas ações nos veículos de mídia tradicionais, que promovem o sistemático boicote de notícias sobre as manifestações civis promovidas nos últimos tempos. Foi lembrado, também, o papel central de redes sociais como o Facebook na organização e circulação de informações e na mobilização do público.
A fala dos ciberativistas foi complementada pela exposição do jornalista Pepe Escobar. Correspondente do Asia Times e da Al Jazeera, Pepe traçou um breve histórico dos conflitos pelo poder na região Oriente Médio e no norte da África no século XX.
América Latina e mobilização
O segundo dia do evento teve início com a mesa “Experiências na América Latina”. O debate, voltado à mídia alternativa no continente, reuniu Iroel Sánchez, do sítio CubaDebate (Cuba); Osvaldo Leon, editor da Agência Latinoamericana de Informação – Alai (Equador); Martin Becerra – professor universitário e blogueiro (Argentina); Jesse Freeston – blogueiro e ativista dos direitos humanos (Honduras); e Martin Granovsky, editor Especial do jornal Página 12 (Argentina).
O equatoriano Osvaldo Leon defendeu que só com a incorporação da comunicação na pauta dos movimentos sociais será possível conquistar a democratização da informação. Essa incorporação, segundo ele, é o que pode garantir a manifestação do povo equatoriano - citou os povos indígenas e camponeses. Ele também falou sobre rádios comunitárias que foram assumidas pelas comunidades, tanto na Bolívia como no Equador.
A comunicação online em Cuba foi o tema da fala de Iroel Sánchez, blogueiro da página La Pupila Insomne e do site CubaDebate. Sánchez defendeu em sua fala que a internet dá voz aos que não encontram vazão na mídia tradicional, mas não é suficiente para garantir a democracia. O cubano falou ainda sobre o papel das redes para levar ao mundo o que se passa em Cuba, vitimada pelo bloqueio econômico que já dura 50 anos.
Sobre a Argentina, falaram Martin Becerra, professor universitário argentino, e Martin Granovsky, jornalista. Becerra traçou um panorama do cenário da mídia no país, historicizando o processo de concentração dos meios de comunicação.
O professor defendeu que a falta de alternativas teria deixado a Argentina num clima de bipolaridade, orientado entre as agendas pró-governo e pró-grupos empresariais – num fenômeno que teria, ao fim, extravasado também para a blogosfera. Para Martin Becerra, as novas redes de comunicação online não teriam ainda abrangência massiva como os meios tradicionais, não se constituindo, portanto, como um movimento de massa.
Martin Granovsky, por sua vez, citou a Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual, popularmente chamada ‘Ley dos Medios’, que resultou da mobilização dos movimentos organizados em prol da democratização dos meios de comunicação. Granovsky recordou, também, o exemplo das manifestações populares ocorridas no Oriente Médio ao defender que a blogosfera tem a tarefa de “despertar as inquietações e revoltas democratizantes, aos moldes do acontecido na região da Primavera Árabe”.
Sobre Honduras, falou o canadense Jesse Freeston, que cobriu o recente golpe de estado no país. Freeston defendeu que não será nos ipads, notebooks, ipods e outras ferramentas digitais que se dará a mobilização popular, mas nas movimentações sociais e populares. Ele falou ainda sobre a acomodação que vem acometendo os internautas que atuam nas redes sociais, deixando de ter contatos pessoais, sociais, para se limitar a digitar e atuar no ciberespaço.
Freeston apresentou, em video, reportagem sua feita em Honduras na qual acompanhava represálias sofridas por jornalistas hondurenhos que questionaram decisões do governo. Ele concordou com os que defendem que o ativismo virtual não substitui a verdadeira mobilização nas ruas, e enfatizou a importância das redes mobilizadas no processo do Fórum Social Mundial para o novo ativismo visto em diversos países.
Brasil e regulação
Sobre a blogosfera brasileira, a mesa “As experiências no Brasil” reuniu o cartunista Carlos Latuff, Conceição Oliveira (criadora do blog Maria Frô) e o jornalista Leandro Fortes, da CartaCapital.
O debate foi aberto por Latuff, que foi ao incisivo ao cobrar uma autocrítica da blogosfera brasileira. O cartunista defendeu que a participação nas redes é importante caso ajude a mobilizar e a conscientizar pessoas – para tanto, deu o exemplo de suas charges, que foram usadas por manifestantes nos recentes protestos árabes.
A mesa prosseguiu com Conceição Oliveira, que em sua fala defendeu o caráter ativista da blogosfera, lembrando, como exemplo, do fato de boa parte dos blogs progressistas terem surgido na luta contra a mídia tradicional que, afirmou, pretendia derrubar Lula em 2005. Atuante no Twitter, ela disse acreditar que a mobilização deve se dar na rua e chamou os blogueiros a convocarem uma marcha pela democratização da informação.
Na sequência, o jornalista Leandro Fortes falou sobre a mídia tradicional e o jornalismo praticado nas redes sociais, numa análise estrutural das relações de poder entre o público e os grandes grupos de mídia. Para Fortes, a internet, ao retirar dos meios de comunicação tradicionais o monopólio da informação primária, teria gerado uma crise no processo de construção e acompanhamento das notícias pela grande mídia, forçando uma relação horizontal entre jornais e público. Ele não acredita, porém, que essa reconfiguração do cenário da comunicação venha a tornar desnecessário o ofício jornalístico – as redações continuarão sendo, defende, essenciais no processamento da informação.
Encerrando o encontro, o debate “A luta pela liberdade de expressão e pela democratização da comunicação” reuniu o ex-ministro das Comunicações da Venezuela, Jesse Chacón; o integrante da comissão que elaborou a Ley de Medios na Argentina, Damian Loreti; e secretária de redes sociais do governo do Peru do Peru, Blanca Josales.
A mesa, sobre os contextos da comunicação nos países da América do Sul e as perspectivas de consolidação da democracia a partir do direito à comunicação, tratou dos obstáculos políticos e processos institucionais vividos na implantação e regulação de políticas de mídia.
O papel dos blogs e das novas tecnologias de comunicação na mídia e na participação popular foram temas centrais do 1º Encontro Mundial de Blogueiros, que reuniu em Foz do Iguaçu, nos dias 27, 28 e 29 de outubro, ativistas, pesquisadores, jornalistas e representantes de partidos e dos movimentos sociais do Brasil e do exterior.
O evento, que entre palestrantes e espectadores contou com mais de 400 pessoas vindas de países das Américas Latina e do Norte, da Europa e da África, foi organizado pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé e pela Altercom (Associação Brasileira de Empresas e Empreendedores da Comunicação), e tratou de temas como democracia participativa, democratização dos meios de comunicação e marco regulatório, e circulação de informação nas redes sociais, com especial atenção às novas formas de ativismo oferecidas pela web.
Com mesas organizadas nos eixos “O papel das novas mídias”, “Experiências nos EUA e Europa”, “Experiências na Ásia e África”, “Experiências na América Latina”, “As experiências no Brasil”, e “A luta pela liberdade de expressão e pela democratização da comunicação”, o encontro trouxe representantes de projetos como Wikileaks, Página 12, Le Monde Diplomatique e Democracy Now. As mesas contaram, ainda, com ativistas digitais envolvidos nas mobilizações da Primavera Árabe, analistas políticos, acadêmicos e representantes de governos da América Latina.
Abrindo o encontro, a mesa “O papel das novas mídias” uniu o porta-voz do WikiLeaks, Kristinn Hrafnsson; o criador do Le Monde Diplomatique, Ignácio Ramonet; e o jornalista e blogueiro brasileiro Luis Nassif num debate sobre as novas plataformas de comunicação online e as mudanças vividas pelo universo da informação.
Pelo Wikileaks, Krinstin Hrafnssson falou das recentes dificuldades vividas pelo projeto - que teve seus fundos bloqueados por grandes empresas financeiras - e apontou no governo dos EUA um dos responsáveis pela perseguição sofrida pelo site. Hrafnsson explicou ainda os motivos pelos quais o Wikileaks teria rompido sua parceria com alguns veículos de mídia tradicionais, afirmando que “alguns jornais veem no Wikileaks apenas uma fonte de conteúdo bruto, e não aceitam o fato de termos, também, interesse editorial no modo como são divulgados os conteúdos que levantamos”. Ele lembrou que, em sua opinião, a emergência do Wikileaks tem a ver com a queda, junto ao público, na credibilidade das informações veiculadas pela grande mídia. “Nos últimos dez anos intensificou-se a falta de transparência nas informações relativas a governos e corporações”, argumentou.
Em seguida, Ignácio Ramonet, do Le Monde Diplomatique, propôs uma análise conjuntural do momento vivido pela comunicação de massa com o surgimento, nos anos recentes, de novas plataformas para a participação dos cidadãos na produção da informação. “Estamos em meio à mudança, daqui a cinco anos o cenário da mídia de massas estará completamente mudado e não temos como saber para onde isso apontará”, disse Ramonet, que justificou seu diagnóstico lembrando da crise financeira e editorial hoje enfrentada pelos grandes meios de comunicação.
Ramonet lembrou também que a queda de alguns grupos de mídia tradicionais não significaria a princípio uma mudança na correlação de forças no mercado da comunicação. “Há o surgimento de novos atores centrais, grupos econômicos que lucram com a produção de informação na internet. Empresas que fazem sua riqueza com a informação trocada pelo público em suas plataformas”, argumentou. E lembrou: “O acesso do público à informação primária levou à criação de um novo proletariado, mercenariado da comunicação”. Para o criador do Le Monde Diplomatique, o amplo acesso às novas ferramentas de comunicação não necessariamente significa uma postura menos conservadora de novos atores: “há blogueiros rebeldes e há os reacionários, precisamos ser cuidados são atribuir à blogosfera no geral um papel progressista”, afirmou.
Encerrando a mesa, o jornalista Luis Nassif tratou da relação entre mídia e capital financeiro no Brasil, enfatizando o papel da blogosfera no agendamento da opinião pública e na desconstrução de pautas e interesses dos meios de comunicação tradicionais.
Como exemplo, Nassif lembrou do papel da blogosfera no debate público no período do caso Satiagraha. “A mídia jogou seu poder para atacar a operação e defender Daniel Dantas e Gilmar Mendes. O contraponto foi na blogosfera, que respondeu, ponto por ponto, as inverdades levantadas pela mídia, com informações”. O jornalista disse acreditar na criação de novos espaços para a mediação e circulação do conteúdo circulado online, em redes para a checagem e levantamento de dados e informações que sirvam de contrapeso para o oferecido pela mídia tradicional.
Ativismo e redes sociais
O evento continuou com a mesa “Experiências nos EUA e Europa”, que reuniu Pascual Serrano, blogueiro e fundador do sítio Rebelión, da Espanha; e Andrés Thomas Conteris, fundador da versão em espanhol do site Democracy Now, dos EUA.
Pascual Serrano traçou um breve histórico da apropriação das novas ferramentas digitais pelos veículos independentes, oferecendo uma análise crítica da relação entre o ativismo e a mobilização nas novas redes digitais.
“Na década passada e no início desta década foram os jornalistas alternativos os que apostaram inicialmente nas possibilidades da internet”, disse Serrano -- cujo site, o Rebelión.org, foi criado em 1996. Ele repassou ainda os diferentes momentos vividos pela internet nas últimas décadas, passando pela criação do Youtube (marco que teria deslocado a linguagem online para o audiovisual) e a emergência das redes sociais (que teria dado aos jovens a frente do processo que chamou de “ativismo informático”).
O criador do Rebelión vê com desconfiança as novas mobilizações articuladas por ativistas digitais (ações como os Indignados, na Espanha, e o Occupy Wall Street, nos EUA) e não as vê como ações capazes de criar transformações profundas. Para Serrano, ao aumentar a velocidade e a concisão nas práticas de comunicação, os blogs e redes sociais inibiriam reflexões mais profundas.
Num contraponto, Andrés Thomas Conteris tratou com entusiasmo das novas manifestações políticas organizadas em rede por ativistas ao redor do mundo. Conteris lembrou do amplo apoio popular e da espontaneidade na articulação dos movimentos relacionados ao ativismo digital, enfatizando acreditar que essas ações surgem como uma tentativa de mobilização permanente. “É a mensagem de insatisfação dos 99%”, afirmou, numa referência à maioria que vem sofrendo os efeitos da crise econômica causada pela população dos 1% mais ricos do planeta.
Ao fim do primeiro dia, a experiência da primavera árabe e o cenário político do Oriente Média foram o tema do debate “Experiências na Ásia e África”, que contou com os ativistas Ahmed Bahgat (Egito), Ahmed Alohan (Arábia Saudita) e Muhammad Farhan (Paquistão), além do jornalista especialista em assuntos da região Pepe Escobar.
Os ativistas trataram das estratégias de mobilização e contra-informação postas em prática nas manifestações populares organizadas em rede em seus países. Eles trataram, ainda, das dificuldades sofridas na divulgaçãode de suas ações nos veículos de mídia tradicionais, que promovem o sistemático boicote de notícias sobre as manifestações civis promovidas nos últimos tempos. Foi lembrado, também, o papel central de redes sociais como o Facebook na organização e circulação de informações e na mobilização do público.
A fala dos ciberativistas foi complementada pela exposição do jornalista Pepe Escobar. Correspondente do Asia Times e da Al Jazeera, Pepe traçou um breve histórico dos conflitos pelo poder na região Oriente Médio e no norte da África no século XX.
América Latina e mobilização
O segundo dia do evento teve início com a mesa “Experiências na América Latina”. O debate, voltado à mídia alternativa no continente, reuniu Iroel Sánchez, do sítio CubaDebate (Cuba); Osvaldo Leon, editor da Agência Latinoamericana de Informação – Alai (Equador); Martin Becerra – professor universitário e blogueiro (Argentina); Jesse Freeston – blogueiro e ativista dos direitos humanos (Honduras); e Martin Granovsky, editor Especial do jornal Página 12 (Argentina).
O equatoriano Osvaldo Leon defendeu que só com a incorporação da comunicação na pauta dos movimentos sociais será possível conquistar a democratização da informação. Essa incorporação, segundo ele, é o que pode garantir a manifestação do povo equatoriano - citou os povos indígenas e camponeses. Ele também falou sobre rádios comunitárias que foram assumidas pelas comunidades, tanto na Bolívia como no Equador.
A comunicação online em Cuba foi o tema da fala de Iroel Sánchez, blogueiro da página La Pupila Insomne e do site CubaDebate. Sánchez defendeu em sua fala que a internet dá voz aos que não encontram vazão na mídia tradicional, mas não é suficiente para garantir a democracia. O cubano falou ainda sobre o papel das redes para levar ao mundo o que se passa em Cuba, vitimada pelo bloqueio econômico que já dura 50 anos.
Sobre a Argentina, falaram Martin Becerra, professor universitário argentino, e Martin Granovsky, jornalista. Becerra traçou um panorama do cenário da mídia no país, historicizando o processo de concentração dos meios de comunicação.
O professor defendeu que a falta de alternativas teria deixado a Argentina num clima de bipolaridade, orientado entre as agendas pró-governo e pró-grupos empresariais – num fenômeno que teria, ao fim, extravasado também para a blogosfera. Para Martin Becerra, as novas redes de comunicação online não teriam ainda abrangência massiva como os meios tradicionais, não se constituindo, portanto, como um movimento de massa.
Martin Granovsky, por sua vez, citou a Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual, popularmente chamada ‘Ley dos Medios’, que resultou da mobilização dos movimentos organizados em prol da democratização dos meios de comunicação. Granovsky recordou, também, o exemplo das manifestações populares ocorridas no Oriente Médio ao defender que a blogosfera tem a tarefa de “despertar as inquietações e revoltas democratizantes, aos moldes do acontecido na região da Primavera Árabe”.
Sobre Honduras, falou o canadense Jesse Freeston, que cobriu o recente golpe de estado no país. Freeston defendeu que não será nos ipads, notebooks, ipods e outras ferramentas digitais que se dará a mobilização popular, mas nas movimentações sociais e populares. Ele falou ainda sobre a acomodação que vem acometendo os internautas que atuam nas redes sociais, deixando de ter contatos pessoais, sociais, para se limitar a digitar e atuar no ciberespaço.
Freeston apresentou, em video, reportagem sua feita em Honduras na qual acompanhava represálias sofridas por jornalistas hondurenhos que questionaram decisões do governo. Ele concordou com os que defendem que o ativismo virtual não substitui a verdadeira mobilização nas ruas, e enfatizou a importância das redes mobilizadas no processo do Fórum Social Mundial para o novo ativismo visto em diversos países.
Brasil e regulação
Sobre a blogosfera brasileira, a mesa “As experiências no Brasil” reuniu o cartunista Carlos Latuff, Conceição Oliveira (criadora do blog Maria Frô) e o jornalista Leandro Fortes, da CartaCapital.
O debate foi aberto por Latuff, que foi ao incisivo ao cobrar uma autocrítica da blogosfera brasileira. O cartunista defendeu que a participação nas redes é importante caso ajude a mobilizar e a conscientizar pessoas – para tanto, deu o exemplo de suas charges, que foram usadas por manifestantes nos recentes protestos árabes.
A mesa prosseguiu com Conceição Oliveira, que em sua fala defendeu o caráter ativista da blogosfera, lembrando, como exemplo, do fato de boa parte dos blogs progressistas terem surgido na luta contra a mídia tradicional que, afirmou, pretendia derrubar Lula em 2005. Atuante no Twitter, ela disse acreditar que a mobilização deve se dar na rua e chamou os blogueiros a convocarem uma marcha pela democratização da informação.
Na sequência, o jornalista Leandro Fortes falou sobre a mídia tradicional e o jornalismo praticado nas redes sociais, numa análise estrutural das relações de poder entre o público e os grandes grupos de mídia. Para Fortes, a internet, ao retirar dos meios de comunicação tradicionais o monopólio da informação primária, teria gerado uma crise no processo de construção e acompanhamento das notícias pela grande mídia, forçando uma relação horizontal entre jornais e público. Ele não acredita, porém, que essa reconfiguração do cenário da comunicação venha a tornar desnecessário o ofício jornalístico – as redações continuarão sendo, defende, essenciais no processamento da informação.
Encerrando o encontro, o debate “A luta pela liberdade de expressão e pela democratização da comunicação” reuniu o ex-ministro das Comunicações da Venezuela, Jesse Chacón; o integrante da comissão que elaborou a Ley de Medios na Argentina, Damian Loreti; e secretária de redes sociais do governo do Peru do Peru, Blanca Josales.
A mesa, sobre os contextos da comunicação nos países da América do Sul e as perspectivas de consolidação da democracia a partir do direito à comunicação, tratou dos obstáculos políticos e processos institucionais vividos na implantação e regulação de políticas de mídia.
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