Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil |
A experiência universal ensina que as reformas ministeriais são como um palito de fósforo. O espetáculo visível dura pouco -- o tempo exato de brilho da chama -- até que só reste um desprezível palito queimado. O importante é saber se a chama deixou um fogo capaz de iluminar a escuridão.
O ministério anunciado por Dilma na manhã de hoje tem a finalidade essencial da sobrevivência política e foi um passo positivo. A presidente falou o que todo governo precisa dizer no momento em que reorganiza o ministério para reforçar o lugar dos aliados políticos, em prejuízo do próprio partido. Lembrou que vivemos numa democracia de coalização – regime no qual é indispensável contar com uma boa base parlamentar, sob o risco de sobreviver tentando apagar incêndios sucessivos e, em geral, cada vez mais devastadores.
Não é preciso nem esperar pelo Ibope para saber a reação popular ao anúncio de que os ministros terão o salário reduzido. Nenhuma categoria de assalariados brasileiros – ao menos os que têm carteira assinada – teve uma redução de 10% em seus vencimentos nos últimos anos. A redução no número de ministérios vai na mesma direção. Seu efeito é discutível e, do ponto de vista de custos reais, perto da insignificância. Numa conjuntura de pancadaria permanente como a atual, ajuda a economizar críticas – o que é sempre uma utilidade num governo que, pelos motivos certos e especialmente pelos errados, não para de apanhar desde a posse.
A presidente incluiu em seu discurso dados que ajudam a ter uma ideia mais realista da crise e dos efeitos do ajuste sobre os programas sociais. Não se pode negar que ocorreram cortes. Apesar disso, foram mais 4 000 doutores para o Mais Médicos, 1,3 milhão de vagas no Pronatec e 360 000 residências no Minha Casa, Minha Vida. Pode parecer pura propaganda mas não é. Parte do processo de reconstrução do governo, que sequer completou o primeiro de quatro anos de mandado, é formar uma imagem realista de si próprio, num país onde os grandes meios de comunicação renunciaram, há muito, diante da hipótese de fazer uma cobertura equilibrada do governo.
Os ministros que chegaram não formam uma equipe de notáveis nem de sábios. Espera-se que sejam bons políticos.
A reaproximação política com Lula é a melhor notícia da semana, não só porque recompõe uma história que parecia fraturada por um afastamento sempre negado pelas partes mas cada vez mais visível, mas porque ocorre num momento particularmente difícil para a estrutura política que deu vida a ambos, o Partido dos Trabalhadores. Para quem ganhou uma nova identidade a partir das políticas de distribuição de renda iniciadas em 2003, o ajuste econômico trouxe surpresas desagradáveis. Ao fundir e/ou eliminar ministérios dessa área - só o futuro irá dizer se todos irão sobreviver com dignidade, ou se alguns irão desaparecer - a reforma pode atingir um pouco mais a imagem do partido que está em sua origem.
Uma pergunta a se fazer envolve a reação de militantes, o que pode ser decisivo se a necessária resistência a movimentos golpistas incluir mobilizações de rua.
Há um novo estado de espírito no governo, que se alimenta de um dado paralelo, diante do qual o Planalto não possui a menor responsabilidade, mas que é um elemento essencial do novo período – o ocaso de Eduardo Cunha, um inimigo que diminui a cada nova denúncia retirada de um baú talvez infinito.
Orientado a não mover um dedo que possa prejudicar o presidente da Câmara, desde a posse do campeão de votações destinadas a emparedar o governo, pautas-bomba e regras para debater o impeachment absurdamente desfavoráveis à presidente, o PT possivelmente não terá necessidade de sair do lugar para assistir à derrota de seu maior e mais poderoso inimigo.
0 comentários:
Postar um comentário