quarta-feira, 19 de setembro de 2018

'Jornal Nacional' atua como um partido

Por Eduardo Maretti, na Rede Brasil Atual:

Levantamento do Manchetômetro sobre a participação dos candidatos à presidência da República no Jornal Nacional mostra que a atuação da bancada formada por William Bonner e Renata Vasconcellos está longe de ser imparcial. Segundo o site de análise de comunicação, vinculado ao Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp) da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), o candidato do PT, Fernando Haddad – cuja entrevista, na sexta-feira (14), encerrou a série – foi o mais interrompido pelos entrevistadores: foram 66 vezes.

Geraldo Alckmin (PSDB) teve o raciocínio “cortado” em 51 oportunidades, seguido por Marina Silva (Rede), 43, e Ciro Gomes (PDT), 36. O candidato que teve mais “sorte” no JN foi o líder nas pesquisas, Jair Bolsonaro (PSL), com 34 interrupções, quase a metade do número registrado no caso de Haddad.

Segundo a análise, o petista (52%) e Ciro Gomes (51%) foram os que tiveram menos tempo para falar, do total de meia hora de entrevista, na comparação com o tempo ocupado pelos próprios entrevistadores. Marina foi a candidata que por mais tempo falou. Ela dispôs de 65% do tempo, enquanto Bonner e Renata falaram por apenas 35%. Alckmin (54%) e Bolsonaro (55%) foram os que tiveram o tempo mais equilibrado na comparação com os âncoras do telejornal global, de acordo com o estudo.

Além desses dados, Haddad foi o mais fustigado com o tema corrupção. No caso do petista, 63% da entrevista girou sobre essa pauta. No programa com Alckmin, o tempo dedicado a corrupção foi de 58%, seguindo-se Ciro Gomes (43%), Bolsonaro (16%) e Marina (14%).

“Com candidatos que não se alinham aos interesses da Globo, as entrevistas servem mais para dar publicidade a esses interesses do que para ouvir o entrevistado. Isso não é de hoje”, diz o professor Laurindo Lalo Leal Filho.

“Nas eleições de 2014, no mesmo Jornal Nacional, o publicitário que faz as vezes de apresentador e editor-chefe repetia seguidamente a palavra 'corrupção' ao entrevistar a presidenta Dilma Rousseff. Em quase todas as perguntas aparecia essa palavra. Não havia interesse em saber o que a presidenta dizia, mas em pregar a pecha de corrupta, uma ideia facilmente assimilada pelo telespectador.”

Para Lalo, na eleição de 2018 esta situação agravou-se, provavelmente pelo fato de o programa de governo do PT prever claramente a regulação da mídia, que será enviada ao Congresso Nacional. “Isso assusta a Globo e faz dos seus funcionários porta-vozes de uma campanha contrária, atuando como se fossem integrantes de um partido político.”

Em sua opinião, a diferença desta para outras eleições é que em 2018 os candidatos de oposição aos interesses da Globo “estão reagindo ao assédio dos apresentadores, o que os torna ainda mais agressivos”.

Porém, as interrupções sofridas por Fernando Haddad no Jornal Nacional “foram um tiro no pé” para a emissora, segundo interpreta Lalo Leal. “Demonstraram uma arrogância e uma grosseria incompatíveis com o senso de civilidade e de educação de grande parte da sociedade brasileira.”

Mais do que isso, essa interferência indevida dos âncoras mostrou incompetência e dificuldade de articularem as perguntas. “Isso demonstrou desconhecimento dos assuntos discutidos, provando claramente que eles apenas liam aquilo que os seus superiores, a mando dos patrões, escreveram".
Haddad: “Quem censura no Brasil”?

Em entrevista coletiva em Santa Catarina no final da tarde de hoje (18), Haddad comentou a questão dos meios de comunicação em seu eventual futuro governo. Mencionou os Estados Unidos e a Europa, onde a legislação proíbe a concentração de TV e rádio de maior audiência e jornal de maior circulação, controlados por um mesmo grupo, num determinado estado, por exemplo.

“Aqui no Brasil ninguém toca nesse assunto. Ninguém aplicou a Constituição. Do mesmo jeito que vamos enfrentar o capital dos bancos, vamos enfrentar o cartel da mídia”, disse o candidato.

O petista, porém, afirmou que, além de impedir a propriedade cruzada, há outras formas de fortalecer a democracia e a diversidade. Por exemplo, apoiando as rádios comunitárias e cooperativas de notícias.

Para ele, as cooperativas poderiam receber recursos federais como recebem jornais e emissoras de grande audiência. “É o contrário do que a grande mídia quer fazer parecer. Eles querem fazer parecer censura. Mas quem de fato censura no Brasil? Eles censuram. Entraram no STF para tirar do ar os sites das agências internacionais em língua portuguesa, alegando que não são brasileiros natos”, disse, citando o espanhol El País, a americana Intercept, a britânica BBC a alemã Deutsche Welle. “Deixaremos claro numa lei que eles não poderão fazer isso.”

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