Por Eric Nepomuceno, no site Carta Maior:
Desde a tarde de sexta-feira (28/9), o Brasil entrou em clima de tensão máxima. Em seu quarto de hospital, o capitão reformado e candidato presidencial ultradireitista Jair Bolsonaro concedeu uma entrevista ao apresentador televisivo sensacionalista José Luiz Datena, cujo programa é transmitido ao vivo.
Duas frases marcaram a temperatura da conversa: Bolsonaro disse que não aceitará outro resultado nestas eleições (cujo primeiro turno acontecerá no domingo, 7 de outubro) que não seja a sua vitória. Denunciou antecipadamente que qualquer quadro diferente disto será recebido por ele como uma fraude.
A outra frase é talvez ainda mais inquietante. Bolsonaro, cuja campanha é coordenada por um importante grupo de oficiais militares da reserva, quase todos generais, disse que, em um primeiro momento, no caso de que o candidato do PT (Fernando Haddad, segundo colocado nas pesquisas até o momento) seja o vitorioso, as Forças Armadas não impedirão que ele assuma o governo. Porém, advertiu que elas vão intervir “diante do primeiro erro” dessa possível nova administração. É um caso único, desde o retorno da democracia (em 1985), e após de 21 anos de severa ditadura militar: além de adiantar que não aceitará outro resultado senão a sua própria vitória, o capitão-candidato avisa que os militares atuarão, caso o vencedor não se comporte confirme as suas expectativas, para destitui-lo do cargo.
Mais grave ainda é o fato de nenhuma autoridade do Exército e das demais forças militares ter se manifestado sobre estas declarações.
Durante a noite, outro golpe: Luiz Fux, integrante do Supremo Tribunal Federal (STF), anulou uma decisão do seu colega de corte, Ricardo Lewandowski, que havia autorizado o ex-presidente Lula da Silva (preso desde abril por uma sentença insólita, que admitiu não possuir sequer uma prova de delito cometido por ele, mas que o condenou mesmo assim) a conceder duas entrevistas, uma ao diário paulista Folha de S. Paulo e outra ao jornal El País da Espanha, ambas as quais seriam transmitidas pela Internet.
O fato de um juiz da corte suprema anular uma decisão de um colega, sem levar o tema ao plenário, é um caso inédito dentro da máxima instância do Poder Judiciário brasileiro.
E mais: Fux, conhecido pelo brilho de suas perucas importadas, determinou que se as entrevistas já tivessem sido gravadas, estaria proibida a sua divulgação. A Constituição brasileira proíbe expressamente a imposição de censura prévia.
Na mesma jornada, outro general da reserva que integra a equipe de coordenação do programa de governo do candidato ultradireitista, provocado desconforto na equipe de campanha do capitão, ao declarar que, no caso de uma vitória de Bolsonaro, os livros que retratam o regime militar (1964-1985) como “ditadura” seriam proibidos, entre outras pérolas do gênero.
Além de insistirem em qualificar o golpe civil-militar de 1964 como “revolução”, tanto Bolsonaro quanto seu candidato a vice-presidente, Hamilton Mourão, defendem a ditadura e se referem à figura do falecido capitão Carlos Alberto Brilhante Ustra como “herói nacional”. O herói em questão foi reconhecido pela Justiça brasileira como envolvido em mais de 400 casos de sequestro e tortura, e responsável direto pela morte de ao menos 47 opositores presos em operações comandadas por ele.
Contudo, os desencontros entre Bolsonaro e seu vice já se tornaram comuns, em episódios que chegam a ser risíveis e deixam clara a confusão entre os dois. Dias atrás, em um encontro com comerciantes, Mourão criticou a existência do 13º salário para os trabalhadores, dizendo que se tratava de uma extravagância nacional. Em uma situação anterior a esta, o coordenador do programa econômico, Paulo Guedes, também foi desautorizado por Bolsonaro a dizer que implantaria uma alíquota única de imposto de renda, igualando pobres e milionários. Na mesma sexta-feira da entrevista em que disse que não aceitaria a derrota, Bolsonaro pediu para que fossem evitadas as más interpretações sobre o seu veto a aparições públicas, tanto do economista Guedes quanto do general Mourão. É um caso único talvez no mundo onde um capitão ordena que um general cale a boca, para não dizer mais idiotices.
Nessa mesma noite de sexta-feira (e que noite!), uma nova pesquisa foi divulgada pelo instituto Datafolha, mostra que havia estacionado nos 28% das intenções de voto, enquanto o seu rival mais próximo, o candidato Fernando Haddad, nomeado por Lula da Silva para ser o representante do Partido dos Trabalhadores (PT) em seu lugar, escalou seis pontos percentuais e alcançou os 22%. Na projeção de segundo turno, Bolsonaro perde contra todos os demais candidatos. O nível de rejeição ao seu nome continua crescendo, especialmente entre as mulheres.
Nesse ambiente de extrema tensão, com um candidato avisando que uma derrota contra o seu adversário mais próximo poderia provocar uma reação das Forças Armadas, que não admitiram sequer “o primeiro erro”, e com um juiz do STF violando a Constituição, o país viveu um sábado de impressionantes manifestações contra Bolsonaro, que aconteceram em ao menos 160 cidades do mundo, das quais 97 dentro do Brasil.
Em São Paulo, a manifestação convocada pelas mulheres com o lema “Ele Não” reuniu ao menos 400 mil pessoas. No Rio de Janeiro, em uma das manifestações políticas mais multitudinárias dos últimos anos, foram ao menos 200 mil.
Por irônica coincidência, às 16h30, quando a região da Cinelândia, no centro do Rio, recebia cada vez mais gente que chegava para a manifestação, a pouco mais de um quilômetro dali, no aeroporto metropolitano Santos Dumont, aterrissava o voo 1036 da companha Gol. Dentro dele, cercado por um formidável esquema de segurança, estava Jair Bolsonaro, recém saído do hospital.
Foi um voo tranquilo, exceto para alguns passageiros que – ainda em São Paulo (de onde o avião partiu), ao ver quem seria seu companheiro de viagem – pediram para descer.
* Artigo publicado originalmente no jornal argentino Página/12. Tradução de Victor Farinelli.
Desde a tarde de sexta-feira (28/9), o Brasil entrou em clima de tensão máxima. Em seu quarto de hospital, o capitão reformado e candidato presidencial ultradireitista Jair Bolsonaro concedeu uma entrevista ao apresentador televisivo sensacionalista José Luiz Datena, cujo programa é transmitido ao vivo.
Duas frases marcaram a temperatura da conversa: Bolsonaro disse que não aceitará outro resultado nestas eleições (cujo primeiro turno acontecerá no domingo, 7 de outubro) que não seja a sua vitória. Denunciou antecipadamente que qualquer quadro diferente disto será recebido por ele como uma fraude.
A outra frase é talvez ainda mais inquietante. Bolsonaro, cuja campanha é coordenada por um importante grupo de oficiais militares da reserva, quase todos generais, disse que, em um primeiro momento, no caso de que o candidato do PT (Fernando Haddad, segundo colocado nas pesquisas até o momento) seja o vitorioso, as Forças Armadas não impedirão que ele assuma o governo. Porém, advertiu que elas vão intervir “diante do primeiro erro” dessa possível nova administração. É um caso único, desde o retorno da democracia (em 1985), e após de 21 anos de severa ditadura militar: além de adiantar que não aceitará outro resultado senão a sua própria vitória, o capitão-candidato avisa que os militares atuarão, caso o vencedor não se comporte confirme as suas expectativas, para destitui-lo do cargo.
Mais grave ainda é o fato de nenhuma autoridade do Exército e das demais forças militares ter se manifestado sobre estas declarações.
Durante a noite, outro golpe: Luiz Fux, integrante do Supremo Tribunal Federal (STF), anulou uma decisão do seu colega de corte, Ricardo Lewandowski, que havia autorizado o ex-presidente Lula da Silva (preso desde abril por uma sentença insólita, que admitiu não possuir sequer uma prova de delito cometido por ele, mas que o condenou mesmo assim) a conceder duas entrevistas, uma ao diário paulista Folha de S. Paulo e outra ao jornal El País da Espanha, ambas as quais seriam transmitidas pela Internet.
O fato de um juiz da corte suprema anular uma decisão de um colega, sem levar o tema ao plenário, é um caso inédito dentro da máxima instância do Poder Judiciário brasileiro.
E mais: Fux, conhecido pelo brilho de suas perucas importadas, determinou que se as entrevistas já tivessem sido gravadas, estaria proibida a sua divulgação. A Constituição brasileira proíbe expressamente a imposição de censura prévia.
Na mesma jornada, outro general da reserva que integra a equipe de coordenação do programa de governo do candidato ultradireitista, provocado desconforto na equipe de campanha do capitão, ao declarar que, no caso de uma vitória de Bolsonaro, os livros que retratam o regime militar (1964-1985) como “ditadura” seriam proibidos, entre outras pérolas do gênero.
Além de insistirem em qualificar o golpe civil-militar de 1964 como “revolução”, tanto Bolsonaro quanto seu candidato a vice-presidente, Hamilton Mourão, defendem a ditadura e se referem à figura do falecido capitão Carlos Alberto Brilhante Ustra como “herói nacional”. O herói em questão foi reconhecido pela Justiça brasileira como envolvido em mais de 400 casos de sequestro e tortura, e responsável direto pela morte de ao menos 47 opositores presos em operações comandadas por ele.
Contudo, os desencontros entre Bolsonaro e seu vice já se tornaram comuns, em episódios que chegam a ser risíveis e deixam clara a confusão entre os dois. Dias atrás, em um encontro com comerciantes, Mourão criticou a existência do 13º salário para os trabalhadores, dizendo que se tratava de uma extravagância nacional. Em uma situação anterior a esta, o coordenador do programa econômico, Paulo Guedes, também foi desautorizado por Bolsonaro a dizer que implantaria uma alíquota única de imposto de renda, igualando pobres e milionários. Na mesma sexta-feira da entrevista em que disse que não aceitaria a derrota, Bolsonaro pediu para que fossem evitadas as más interpretações sobre o seu veto a aparições públicas, tanto do economista Guedes quanto do general Mourão. É um caso único talvez no mundo onde um capitão ordena que um general cale a boca, para não dizer mais idiotices.
Nessa mesma noite de sexta-feira (e que noite!), uma nova pesquisa foi divulgada pelo instituto Datafolha, mostra que havia estacionado nos 28% das intenções de voto, enquanto o seu rival mais próximo, o candidato Fernando Haddad, nomeado por Lula da Silva para ser o representante do Partido dos Trabalhadores (PT) em seu lugar, escalou seis pontos percentuais e alcançou os 22%. Na projeção de segundo turno, Bolsonaro perde contra todos os demais candidatos. O nível de rejeição ao seu nome continua crescendo, especialmente entre as mulheres.
Nesse ambiente de extrema tensão, com um candidato avisando que uma derrota contra o seu adversário mais próximo poderia provocar uma reação das Forças Armadas, que não admitiram sequer “o primeiro erro”, e com um juiz do STF violando a Constituição, o país viveu um sábado de impressionantes manifestações contra Bolsonaro, que aconteceram em ao menos 160 cidades do mundo, das quais 97 dentro do Brasil.
Em São Paulo, a manifestação convocada pelas mulheres com o lema “Ele Não” reuniu ao menos 400 mil pessoas. No Rio de Janeiro, em uma das manifestações políticas mais multitudinárias dos últimos anos, foram ao menos 200 mil.
Por irônica coincidência, às 16h30, quando a região da Cinelândia, no centro do Rio, recebia cada vez mais gente que chegava para a manifestação, a pouco mais de um quilômetro dali, no aeroporto metropolitano Santos Dumont, aterrissava o voo 1036 da companha Gol. Dentro dele, cercado por um formidável esquema de segurança, estava Jair Bolsonaro, recém saído do hospital.
Foi um voo tranquilo, exceto para alguns passageiros que – ainda em São Paulo (de onde o avião partiu), ao ver quem seria seu companheiro de viagem – pediram para descer.
* Artigo publicado originalmente no jornal argentino Página/12. Tradução de Victor Farinelli.
2 comentários:
Claro, bravatas e bravatas e mais um texto ameaçando e criando uma suposta idéia de golpe militar. Ao ler até o final é o partido do autor tudo se explica. A muito acabou o diálogo de vocês da esquerda com qualquer um que não pactue com seu "Lula livre". Política era para ser discutida mas infelizmente nesses mais de dez anos vocês conseguiram acabar com a intenção de melhoria pro país. Pensam no sei regime, criam seus heróis e quem não concordar é errado. Fim.
Valeu,fascista!
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