Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
Para todo observador inquieto com a partidarização crescente do Judiciário brasileiro desde o julgamento da AP 470, Dias Toffoli cumpriu uma trajetória lamentável mas previsível.
Ao bloquear a liminar de Marco Aurélio Mello que determinava a soltura de cerca de 169 000 prisioneiros encarcerados em afronta ao transito em julgado para sentença penal condenatória, entre os quais se encontra Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente do STF deu sequencia a uma trajetória que nada tem de jurídica nem constitucional.
É 100% política - como confirma o elogio direto e rápido de Jair Bolsonaro, que na campanha prometeu que Lula iria " apodrecer na cadeia".
O efeito prático da sentença de Toffoli é confirmar a presença de uma jurisprudência que não pode ser definida como liberal nem conservadora, nem “punitivista” e muito menos “ garantista”, para empregar aspas da moda. É apenas instrumental - a serviço de um causa política, externa ao Direito e à Constituição.
Nas ocasiões mais diversas, com base nos argumentos mais diferentes - estapafúrdios, pedantes ou apenas medrosos - nossos juízes têm tomado sempre a decisão menos favorável à observação dos direitos e prerrogativas do ex-presidente.
Quando, por acaso, aparece uma voz dissonante, logo surgem medidas suplementares para que seja enquadrada.
São quatro decisões consecutivas em menos de um ano, o que é suficiente para se definir uma tendência a partir de qualquer critério.
Na primeira, o STF negou a observação do trânsito em julgado por 6 a 5.
Assinada pelo desembargador Rogério Favretto, uma ordem de soltura límpida e legitima foi bloqueada numa clássica operação de chave de cadeia cuja libertação, mesmo provisória, se desejava impedir.
Na terceira, uma autorização para Lula dar uma simples entrevista na prisão foi derrubada na última hora.
Ontem, Toffoli derrubou a liminar de Marco Aurélio Mello com o argumento de que trazia “potencial risco de lesão à ordem pública e à segurança”. É muita subjetividade.
Ainda que as ressalvas do presidente do STF tenham respaldo genérico na legislação em vigor e no próprio regimento do STF, a lei também diz que é preciso produzir um “ despacho fundamentado” para derrubar uma liminar.
Ou seja: é preciso explicar o quê, apontar o como. Fundamentar -- do ponto de vista jurídico bem entendido.
No caso concreto, a decisão do presidente do STF é tão subjetiva como escolher entre realismo ou impressionismo do século XIX. Ou torcer pelo Corínthians e não pelo Palmeiras.
Ele não aponta erros na sentença de Marco Aurélio, nem grandes nem pequenos. Apenas sugere que a libertação de Lula possui um "imenso potencial de risco de lesão a ordem pública e à segurança".
Pode-se lembrar que toda medida jurídica importante costuma contrariar interesses que eram protegidos pela ordem anterior e, possuem um " potencial de risco de lesão à ordem pública".
Por exemplo: o decreto que aboliu a escravidão em 1888 provocou, um ano e meio depois, a queda de um Império estabelecido em 1824. Teria sido melhor manter o cativeiro para evitar isso?
Não há dúvida de que, na opinião das brasileiras e brasileiros que consideram Lula o melhor presidente que o país já teve, ou simplesmente encaram sua prisão uma forma extrema de perseguição, justamente a permanência de Lula na cadeia possui um imenso “potencial de risco de lesão a ordem pública e à segurança”.
Para muitos estudiosos, é difícil negar que, num país tenso e polarizado, a soltura de Lula teria um benéfico efeito pacificador e de retorno a normalidade democrática e ao pluralismo político, ainda que pudesse desagradar a boa parte de seus adversários políticos.
A questão aqui não pode ser política, mas jurídica.
Num país onde a Constituição prevê um funcionamento autônomo e harmônico entre os poderes, a Justiça não pode submeter suas decisões às conveniências de outra natureza.
Seu papel é defender a Constituição e o Estado Democrático de Direito.
Há outro fator a ser considerado quando se fala em " potencial de risco a ordem pública".
Na realidade tensa do nosso sistema carcerário, que nem de longe assegura um tratamento digno aos apenados, podemos até imaginar a reação de amigos e familiares de milhares de homens e mulheres condenados que Toffoli prejudicou em seus direitos, em vez de cumprir o dever constitucional de respeitar a liberdade e as garantias de todos – qualquer que seja sua origem social, raça, ou preferência política.
Será difícil apontar um “potencial risco de lesão à ordem pública e a segurança” pelo previsível fortalecimento de quadrilhas que exploram incongruências de nosso infernal sistema de Justiça?
Alguém acha que não teremos mais estímulos a novas rebeliões ou coisa parecida?
Alguma dúvida?
Para todo observador inquieto com a partidarização crescente do Judiciário brasileiro desde o julgamento da AP 470, Dias Toffoli cumpriu uma trajetória lamentável mas previsível.
Ao bloquear a liminar de Marco Aurélio Mello que determinava a soltura de cerca de 169 000 prisioneiros encarcerados em afronta ao transito em julgado para sentença penal condenatória, entre os quais se encontra Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente do STF deu sequencia a uma trajetória que nada tem de jurídica nem constitucional.
É 100% política - como confirma o elogio direto e rápido de Jair Bolsonaro, que na campanha prometeu que Lula iria " apodrecer na cadeia".
O efeito prático da sentença de Toffoli é confirmar a presença de uma jurisprudência que não pode ser definida como liberal nem conservadora, nem “punitivista” e muito menos “ garantista”, para empregar aspas da moda. É apenas instrumental - a serviço de um causa política, externa ao Direito e à Constituição.
Nas ocasiões mais diversas, com base nos argumentos mais diferentes - estapafúrdios, pedantes ou apenas medrosos - nossos juízes têm tomado sempre a decisão menos favorável à observação dos direitos e prerrogativas do ex-presidente.
Quando, por acaso, aparece uma voz dissonante, logo surgem medidas suplementares para que seja enquadrada.
São quatro decisões consecutivas em menos de um ano, o que é suficiente para se definir uma tendência a partir de qualquer critério.
Na primeira, o STF negou a observação do trânsito em julgado por 6 a 5.
Assinada pelo desembargador Rogério Favretto, uma ordem de soltura límpida e legitima foi bloqueada numa clássica operação de chave de cadeia cuja libertação, mesmo provisória, se desejava impedir.
Na terceira, uma autorização para Lula dar uma simples entrevista na prisão foi derrubada na última hora.
Ontem, Toffoli derrubou a liminar de Marco Aurélio Mello com o argumento de que trazia “potencial risco de lesão à ordem pública e à segurança”. É muita subjetividade.
Ainda que as ressalvas do presidente do STF tenham respaldo genérico na legislação em vigor e no próprio regimento do STF, a lei também diz que é preciso produzir um “ despacho fundamentado” para derrubar uma liminar.
Ou seja: é preciso explicar o quê, apontar o como. Fundamentar -- do ponto de vista jurídico bem entendido.
No caso concreto, a decisão do presidente do STF é tão subjetiva como escolher entre realismo ou impressionismo do século XIX. Ou torcer pelo Corínthians e não pelo Palmeiras.
Ele não aponta erros na sentença de Marco Aurélio, nem grandes nem pequenos. Apenas sugere que a libertação de Lula possui um "imenso potencial de risco de lesão a ordem pública e à segurança".
Pode-se lembrar que toda medida jurídica importante costuma contrariar interesses que eram protegidos pela ordem anterior e, possuem um " potencial de risco de lesão à ordem pública".
Por exemplo: o decreto que aboliu a escravidão em 1888 provocou, um ano e meio depois, a queda de um Império estabelecido em 1824. Teria sido melhor manter o cativeiro para evitar isso?
Não há dúvida de que, na opinião das brasileiras e brasileiros que consideram Lula o melhor presidente que o país já teve, ou simplesmente encaram sua prisão uma forma extrema de perseguição, justamente a permanência de Lula na cadeia possui um imenso “potencial de risco de lesão a ordem pública e à segurança”.
Para muitos estudiosos, é difícil negar que, num país tenso e polarizado, a soltura de Lula teria um benéfico efeito pacificador e de retorno a normalidade democrática e ao pluralismo político, ainda que pudesse desagradar a boa parte de seus adversários políticos.
A questão aqui não pode ser política, mas jurídica.
Num país onde a Constituição prevê um funcionamento autônomo e harmônico entre os poderes, a Justiça não pode submeter suas decisões às conveniências de outra natureza.
Seu papel é defender a Constituição e o Estado Democrático de Direito.
Há outro fator a ser considerado quando se fala em " potencial de risco a ordem pública".
Na realidade tensa do nosso sistema carcerário, que nem de longe assegura um tratamento digno aos apenados, podemos até imaginar a reação de amigos e familiares de milhares de homens e mulheres condenados que Toffoli prejudicou em seus direitos, em vez de cumprir o dever constitucional de respeitar a liberdade e as garantias de todos – qualquer que seja sua origem social, raça, ou preferência política.
Será difícil apontar um “potencial risco de lesão à ordem pública e a segurança” pelo previsível fortalecimento de quadrilhas que exploram incongruências de nosso infernal sistema de Justiça?
Alguém acha que não teremos mais estímulos a novas rebeliões ou coisa parecida?
Alguma dúvida?
0 comentários:
Postar um comentário