Foto: Ahmad Hasaballah/Getty Images |
A construção de narrativas para manipular as percepções do público nunca foi prerrogativa do grupo de extrema direita bolsonarista que consolidou por aqui o ecossistema de desinformação.
A mídia corporativa já se utilizava dessa ferramenta há bastante tempo.
E continua a fazê-lo muito bem, como mostra a cobertura da crise recente entre Israel e o Brasil, deflagrada por uma declaração do presidente Lula em evento na Etiópia, como segue:
"É importante lembrar que em 2010 o Brasil foi o 1º país a reconhecer o Estado palestino. É preciso parar de ser pequeno quando a gente tem que ser grande. O que está acontecendo na Faixa de Gaza e com o povo palestino não existe nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler resolveu matar os judeus. Então não é possível que a gente possa colocar um tema tão pequeno, sabe, você deixar de ter ajuda humanitária. Quem vai ajudar a reconstruir aquelas casas que foram destruídas? Quem vai retribuir a vida de 30.000 pessoas que já morreram, 70.000 que estão feridos? Quem vai Quem vai devolver a vida das crianças que morreram sem saber por que estavam morrendo?…"
Vou me ater aqui apenas à cobertura do JN e sua estratégia narrativa de viés único e nenhuma pluralidade no trato com a informação, e farei comentários sobre as edições seguintes à reação de Israel à fala do presidente.
A estratégia narrativa para direcionar a percepção do público em relação ao embate entre Brasil e Israel foi tecida discursivamente a partir da condenação prévia da fala do presidente Lula – não havia nenhum interesse em mostrar contrapontos, declarações favoráveis, contextualização do problema.
E um ponto relevante: o JN, e a mídia toda, afirma que Lula compara a guerra na Palestina com o Holocausto, mas Lula não menciona o termo, ele se refere a “matança de judeus” – como vocês podem ler acima –, que tem sim outra conotação.
Vamos aos detalhes das edições:
A mídia corporativa já se utilizava dessa ferramenta há bastante tempo.
E continua a fazê-lo muito bem, como mostra a cobertura da crise recente entre Israel e o Brasil, deflagrada por uma declaração do presidente Lula em evento na Etiópia, como segue:
"É importante lembrar que em 2010 o Brasil foi o 1º país a reconhecer o Estado palestino. É preciso parar de ser pequeno quando a gente tem que ser grande. O que está acontecendo na Faixa de Gaza e com o povo palestino não existe nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler resolveu matar os judeus. Então não é possível que a gente possa colocar um tema tão pequeno, sabe, você deixar de ter ajuda humanitária. Quem vai ajudar a reconstruir aquelas casas que foram destruídas? Quem vai retribuir a vida de 30.000 pessoas que já morreram, 70.000 que estão feridos? Quem vai Quem vai devolver a vida das crianças que morreram sem saber por que estavam morrendo?…"
Vou me ater aqui apenas à cobertura do JN e sua estratégia narrativa de viés único e nenhuma pluralidade no trato com a informação, e farei comentários sobre as edições seguintes à reação de Israel à fala do presidente.
A estratégia narrativa para direcionar a percepção do público em relação ao embate entre Brasil e Israel foi tecida discursivamente a partir da condenação prévia da fala do presidente Lula – não havia nenhum interesse em mostrar contrapontos, declarações favoráveis, contextualização do problema.
E um ponto relevante: o JN, e a mídia toda, afirma que Lula compara a guerra na Palestina com o Holocausto, mas Lula não menciona o termo, ele se refere a “matança de judeus” – como vocês podem ler acima –, que tem sim outra conotação.
Vamos aos detalhes das edições:
Edição de 19/02
O JN deu 13 minutos e 20 segundos para mostrar a reação de Benjamin Netanyahu sobre a fala de Lula, e o assunto abriu a escalada (as chamadas que antecedem o começo da edição).
A condenação ao que Lula disse já estava definida na pauta, portanto, nenhum contraponto foi apresentado, não houve nenhuma contextualização par situar o que está ocorrendo na Palestina – por exemplo, números poderiam ter sido citados.
Sim, a reportagem colocou a declaração de Lula, na íntegra – isso não foi omitido, nem poderia ser –, mas ela não teve o mesmo destaque ou peso das declarações de Netanyahu dizendo que Lula havia “cruzado a linha vermelha” sem qualquer mínimo contraponto.
E na sequência, os entrevistados ouvidos já estavam prontos para corroborarem a máxima de que “Lula errou”, o que era a convicção do jornal, como ficou claro no comentário engessado da historiadora.
Outro detalhe que fica perdido na reportagem: o chanceler israelense fez uma armação muito bem calculada ao levar o embaixador brasileiro para o Museu do Holocausto após convocá-lo para a reunião de emergência, mas isso aparece como algo simples, fora do protocolo – inclusive com a postagem de Katz justificando a escolha do local.
Acontece que a declaração de Katz foi feita em hebraico, idioma que o embaixador brasileiro não domina. Fato que o JN omitiu dos telespectadores.
Outra fonte que ganhou destaque na condenação a Lula foi o senador Ciro Nogueira, ex-aliado de Jair; nenhuma fonte favorável foi ouvida, repito.
A reportagem deu destaque total à nota e às declarações da Conib (Confederação Israelita do Brasil), sem qualquer contraponto, sem notas de outras entidades, com total adesão.
O JN deu 13 minutos e 20 segundos para mostrar a reação de Benjamin Netanyahu sobre a fala de Lula, e o assunto abriu a escalada (as chamadas que antecedem o começo da edição).
A condenação ao que Lula disse já estava definida na pauta, portanto, nenhum contraponto foi apresentado, não houve nenhuma contextualização par situar o que está ocorrendo na Palestina – por exemplo, números poderiam ter sido citados.
Sim, a reportagem colocou a declaração de Lula, na íntegra – isso não foi omitido, nem poderia ser –, mas ela não teve o mesmo destaque ou peso das declarações de Netanyahu dizendo que Lula havia “cruzado a linha vermelha” sem qualquer mínimo contraponto.
E na sequência, os entrevistados ouvidos já estavam prontos para corroborarem a máxima de que “Lula errou”, o que era a convicção do jornal, como ficou claro no comentário engessado da historiadora.
Outro detalhe que fica perdido na reportagem: o chanceler israelense fez uma armação muito bem calculada ao levar o embaixador brasileiro para o Museu do Holocausto após convocá-lo para a reunião de emergência, mas isso aparece como algo simples, fora do protocolo – inclusive com a postagem de Katz justificando a escolha do local.
Acontece que a declaração de Katz foi feita em hebraico, idioma que o embaixador brasileiro não domina. Fato que o JN omitiu dos telespectadores.
Outra fonte que ganhou destaque na condenação a Lula foi o senador Ciro Nogueira, ex-aliado de Jair; nenhuma fonte favorável foi ouvida, repito.
A reportagem deu destaque total à nota e às declarações da Conib (Confederação Israelita do Brasil), sem qualquer contraponto, sem notas de outras entidades, com total adesão.
Edição de 20/02
Já na escalada do jornal, o destaque foi para as declarações – absurdas, diga-se de passagem – do chanceler Israel Katz.
Na sequência da edição, o destaque continua, sem muitos contrapontos à narrativa falsa do chanceler.
Vale pontuar que a reportagem deu espaço à declaração do ministro Paulo Pimenta e do chanceler brasileiro Mauro Viana – mas num tempo bem menor.
Como a pauta de condenação já estava fechada, deu amplo destaque ao pronunciamento de Rodrigo Pacheco condenando (sem muita convicção) a declaração do presidente Lula e exigindo retratação e omitiu a resposta do senador Omar Aziz, que afirmou o óbvio, ou seja, que o povo de Israel não se confunde com o governo. Além disso, a única fala de um petista foi a Jacques Wagner, discordando da declaração.
Não houve nenhuma fonte ou comentário dos apresentadores para criticar a linguagem absurda utilizada pelo chanceler israelense nas declarações fake dadas por ele em redes sociais.
Por fim, quero destacar aspectos que não poderiam estar ausentes de qualquer reportagem sobre o assunto:
1. Benjamin Netanyahu está politicamente desgastado com o ataque selvagem que impôs ao povo palestino.
2. Há uma falsa dualidade entre criticar a ação de Israel e apoiar ações terroristas do Hamas.
3. O que Israel fez com o embaixador brasileiro foi uma absurda armação e aquela exposição cretina típica dos manipuladores que se parece com uma ação normal e sem grandes intenções.
4. O mundo não se resume à Europa e aos Estados Unidos, ou à opinião desses grupos.
5. Lula verbaliza algo que é um forte incômodo para inúmeros países que não têm nem a coragem nem a devida representação no mundo para dizê-lo. O Brasil tem peso mundial, e a declaração de Antony Blinken na reunião do G20 mostra exatamente esse tamanho.
6. É absolutamente ridículo e desprezível a imprensa querer reduzir Lula, em seu terceiro mandato e após retirar o Brasil do caos, a um indivíduo inconsequente que diz coisas sem pensar. Ele é um chefe de Estado da maior magnitude.
Minha aposta: com o avanço da reunião do G20 no Brasil, a não intenção dos EUA em ampliar esse debate e a exposição da reação caricatural e fake de Israel Katz, a mídia vai, aos poucos, empurrando a cobertura vergonhosa para debaixo do tapete. Aguardemos.
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