segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Celso Amorim escanteia Eliane Cantanhêde

Eliane Cantanhêde, a colunista da "massa cheirosa" do PSDB, bem que provocou, mas o ministro Celso Amorim deu um baile na entrevista concedida à Folha. Confira:

"Não lamento nada." Com essa frase, dita em francês e emprestada de Edith Piaf, o ministro Celso Amorim, 68, termina oito anos à frente do Itamaraty defendendo de forma enfática sua política, que batizou de "altiva e ativa".

Mantém as críticas aos EUA, carrega nas tintas ao pintar o protagonismo do Brasil no comércio e na política externos e defende a posição que o país teve em casos polêmicos, como mediar o acordo nuclear do Irã.

Ele diz que cumpriu sua missão e que seria "incapaz" de se candidatar a permanecer no governo Dilma Rousseff. Compara o presidente a Pelé e vaticina: "Igual a Lula não vai ter, mas não quer dizer que Dilma não vá fazer um governo extraordinário".

Segue a íntegra a entrevista, cujos principais trechos são publicados na Folha de hoje.

O sr. é candidato a continuar no cargo?

Fiquei muito contente com a vitória da ministra Dilma, com quem sempre tive relações da melhor qualidade. Isso não significa que eu vá, ou possa, criar algum tipo de constrangimento. Eu seria incapaz de me colocar como candidato a alguma coisa, ou cobrando alguma coisa. Isso não existe.

E, se você olhar sob o ponto de vista da vaidade pessoal, eu passei o Barão do Rio Branco em número de dias no ministério. Sou o ministro mais longo da história do Itamaraty e o segundo mais longevo de todos. Só o Gustavo Capanema ficou mais tempo do que eu.

O "Foreign Affairs" me colocou como o melhor chanceler do mundo. Honestamente, o que mais eu posso querer? É melhor sair no ápice do que esperar acontecer alguma coisa.

O que é o ápice?

Você lê qualquer jornal internacional, mesmo os que são contra a algum aspecto da política externa brasileira, e todos dizem que a importância do Brasil no mundo cresceu.

Claro que atribuem ao crescimento econômico, aos avanços sociais, mas também à ousadia da política externa. Que é do presidente, diga-se, mas eu ajudei.

Se o sr. fosse convidado, ficaria?

Qualquer coisa que eu diga soará mal. Não tenho como responder. Eu me sinto bem, considero minha missão cumprida.

Agora, se alguém me pedir um conselho, estou disposto a dar.

Por exemplo...

Acho que o próximo ministro deva ser um profissional e a gente deve continuar trabalhando na linha da renovação. Precisamos de gente mais nova.

Eu já estou velho, tenho 68 anos, vivi muito.

O sr. apoia o embaixador Antônio Patriota?

Acho que ele tem plenas condições, mas não é o único. Mas não quero discutir nome a nome.

Mas, quando fala em solução profissional, exclui o ministro Nelson Jobim?

Isso não cabe a mim. Mas acho que o Itamaraty se engrandeceu por ter profissionais não apenas na chefia da Casa, mas em todos os cargos diplomáticos, e isso é a primeira vez que acontece na história deste país. As pessoas trabalham com vontade redobrada.

Mas San Thiago Dantas, por exemplo, não era diplomata de carreira e foi um grande ministro, que marcou a história. Nada é absoluto.

Por que o sr. participou tão assiduamente na campanha de Lula em 2006, mas sumiu na de Dilma?

Eu fui três vezes, mas a situação é um pouco diferente, porque eu era ministro do Lula. Minha participação mais direta era mais natural.

E, em 2010, coincidiu que tive uma agenda de viagens mais carregada.

Por que a política externa, diferentemente das expectativas, não foi tema de campanha?

Ora, porque a oposição não tinha nada a ganhar com isso, porque o povo brasileiro, em sua esmagadora maioria, só tem palavras de apreço à política externa. Eu vejo isso claramente na rua.

Se é assim, por que o governo não se aproveitou disso na campanha?

Porque não precisava, era um ponto pacífico.

E falava-se, sim, no prestígio internacional do Brasil, ao lado do Bolsa Família, crescimento, salário mínimo.

A que se deve esse prestígio internacional? À força de Lula, ao crescimento econômico ou a uma estratégia de política externa?

A personalidade do Lula foi um fator indispensável, obviamente, mas isso foi acompanhado desde o primeiro momento de uma visão de política externa inovadora. E houve uma sucessão de acertos que deu no que deu.

Até a "The Economist", que criticou várias vezes a política externa, agora chama o Brasil de "gigante diplomático". A "Foreign Affairs", o "Le Monde", a "Foreign Policy", "El Pais", todos elogiam.

Mas o Lula e os assessores dele dizem que essas avaliações estrangeiras sobre o Brasil não têm a menor importância. Afinal, têm ou não têm? Ou só têm quando é a favor?

Infelizmente, só sai notícia mais positiva quando a imprensa lá fora publica. É o que a gente chama de "complexo de vira-lata" que o presidente tanto critica. Tem de se trabalhar com ele para vencê-lo, como na psicanálise.

Como o sr. virou chanceler?

Eu nunca soube porque o Lula optou por mim, nunca perguntei a ele. Ele costumava dizer que eu tinha um pouquinho de caspa, então, devia ser um pouco mais popular.

Adivinha qual a primeira pessoa para quem eu liguei quando o Lula foi eleito em 2002? Dá um palpite. Eu nem conhecia o Lula. Foi para o Fernando Henrique Cardoso, com quem eu me dava muito bem. Eu disse que a chegada de Lula ao poder, depois dele, era a consolidação da democracia. E foi, de fato. A estabilidade foi mantida, a inclusão social aprofundada, avançamos na área de clima.

Com o governo acabando, posso falar tranquilamente que o Lula é uma figura excepcional, você vai contar três ou quatro líderes políticos como ele no século. É quase da dimensão do Nelson Mandela, e só não é igual porque a situação lá era mais dramática.

E como vai ser agora, sem Lula?

Sempre me perguntam isso, e eu respondo: Olha, Pelé só teve um, mas o Brasil foi cinco vezes campeão do mundo, algumas vezes sem Pelé. Igual a Lula não vai ter, ele é uma personalidade única na história recente do Brasil.

Mas não quer dizer que a Dilma não vá fazer um governo extraordinário e uma política externa muito boa. É uma mulher presidente do Brasil, e uma mulher que sabe o que quer e sabe comandar. Há quem compare a Dilma com a Margareth Tatcher, mas eu discordo.

A Dilma tem uma sensibilidade social, uma capacidade de ver as necessidades do povo que me dá confiança de que será muito bom para o país.

Qual foi o grande acerto da política externa no governo Lula?

Quando o presidente Lula me indicou publicamente, eu tinha de dizer umas palavras rápidas ali. Eu tinha falado umas duas vezes com Lula, não tinha combinado nada, não tinha estudado o programa do PT, e, aí, eu disse que a política externa seria altiva e ativa.

E essas palavras, que eu disse quase por acaso, acabaram entrando para o programa do PT e da presidente [Dilma]. Era uma questão de atitude. Hoje, eu até trocaria por política externa desassombrada e solidária, sobretudo porque não tem medo da própria sombra.

A política externa antes não era altiva e ativa?

Tenho 50 anos de Itamaraty e vi muita gente muito boa, muito competente, mas com aquela atitude que um secretário-geral de muito tempo atrás traduzia assim: "Política externa dá bolo".

Então, é melhor cuidar da burocracia, fazer uma coisinha ou outra e evitar bolo.

Exemplo do que poderia dar bolo?

Quando nós fizemos o G-20 comercial em Cancún, quando começamos a brigar contra a Alca e todos os vizinhos pareciam muito atraídos pela Alca, inclusive a Argentina.

Mas, veja bem, eu não decidi brigar com a Alca, eu disse: vamos ver, vamos conversar, vamos discutir. E ela morreu em Miami, sabe por quê? Porque foi quando conseguimos chegar a uma Alca que serviria ao Brasil, que não cerceasse a nossa capacidade de escolha de um modelo de desenvolvimento, e aí não interessava mais para os outros.

Era uma Alca que não nos sujeitava a um modelo neoliberal em compras governamentais, em investimento, em proteção à propriedade intelectual, e em agricultura. Os fundamentalistas de lá não quiseram. Então, matamos a Alca sem dar um tiro.

Isso tudo não foi um pouco de teatro? A intenção não era matar a Alca desde o início, por uma questão ideológica?

Olhando em retrospectiva, foi melhor talvez mesmo não ter tido a Alca. A crise nos EUA demonstrou isso. Nós ficamos mais protegidos, tivemos mais liberdade. E pudemos investir numa política Sul-Sul. E nada foi mais importante do que o processo de integração da América do Sul. Os presidentes se falam o tempo todo. Isso é muito importante.

Mas o Brasil ficou sem a Alca, não concluiu a Rodada Doha de comércio e se recusou a fazer acordos bilaterais. O país tirou a Alca e não botou nada no lugar?

Tenho certeza de que a Rodada Doha da OMC será concluída, mais cedo ou mais tarde. E, quando for, as pessoas vão olhar que o germe da conclusão correta foi a criação do G-20 comercial em Cancún, e aí foi o Brasil.

O nosso comércio cresceu com o mundo inteiro. Vão dizer que foi por causa disso, por causa daquilo outro, mas a verdade é que cresceu e o Brasil já é a oitava economia do mundo e já está entre os dez maiores cotistas do FMI.

Não há nenhuma, nenhuma mesmo, negociação comercial para a qual o Brasil não seja chamado. Como a China, a Índia, e isso é tudo resultado de Cancún, em agosto de 2003. Tinha um acordo todo prontinho entre EUA e União Europeia, para nos enganar de novo, como sempre. Só sobravam umas migalhinhas para os outros. Quem disse "não" foi o G-20, e não há quem não reconheça que quem liderou o G-20 foi o Brasil.

Ou Celso Amorim?

Quem liderou foi o presidente Lula, mas quem estava lá na linha de frente fui eu. Eu não escrevi livros, nunca formulei uma filosofia própria, mas o que, sim, eu fiz uma boa parte da minha vida foi ser negociador.

Até por isso é um bom momento para trocar de ministro, porque não tem nenhuma grande negociação em andamento.

E a contaminação ideológica, as picuinhas contra os EUA?

Falar em política externa independente é quase pleonasmo. Eu diria que tivemos uma política externa que não teve medo de tomar as atitudes internacionalmente.

Logo no início, o presidente Lula condenou claramente a invasão do Iraque, mas sem confrontacionismos inúteis, tanto que ele teve uma boa relação com o presidente [George W. Bush].

Como foi aquele início em que o sr. mandava de um jeito, o Marco Aurélio Garcia, de outro, e o Samuel Pinheiro Guimarães, de um terceiro? Como foi afinal definido o rumo?

Foi uma conversa contínua. Foi tudo empírico, intuitivo. O presidente Lula muitas vezes tinha uma intuição do que devia fazer, mas foi preciso formular aquilo em termos diplomáticos, e isso exige alguma experiência. É como fazer uma casa.

Você tem a ideia do que quer, mas precisa de um técnico que desenvolva essa ideia. E o presidente Lula já disse que a gente se comunica até por telepatia.

Falando assim, não houve um risco grande de improvisação, de risco?

As coisas centrais foram objeto de discussões amplas com ministros de outras áreas, como no caso da Alca e da OMC. Eu definia a tática, mas o presidente Lula é que aprovava. Às vezes, dizia: "Não, isso aqui eu prefiro não fazer". Quando nós estávamos voltando da segunda viagem presidencial, a Davos, ele disse: "Celso, nós agora vamos fazer uma nova geografia econômica e comercial do mundo". Foi inspiração dele. Não fui eu quem inventou, foi ideia dele.

E, aos poucos, fomos fazendo a aproximação com os países árabes, com a África. Veja a África hoje: se você considera como um país só, é o quarto parceiro comercial nosso, maior do que Alemanha e do que Japão. Fizemos muito com a África, mas eu acho que ainda é pouco, teríamos que fazer ainda mais. Corremos o risco de perder terreno para a China ou para a Índia.

Hoje, vou a Moçambique e vejo nossos empresários de peso sentados lá. Antes, ia para lá o representante do representante do representante, quando ia. Só do presidente foram 12 viagens à África.

A sensação de sucesso não gerou uma certa megalomania? O Brasil não começou a se meter onde não devia?

A função de um diplomata, quando está tudo escuro, é vislumbrar aquela réstia de luz ali na porta e ir lá, tentar aumentar. É isso que a gente tem de fazer e a política externa do presidente Lula fez.

Já que não é possível ter uma democracia perfeita no mundo, você tem de ter um pouco mais de equilíbrio, para que ninguém possa impor apenas sua vontade, para que várias visões de mundo estejam presentes em relação ao comércio, às finanças, ao clima, à paz e à segurança internacionais. A multipolaridade é um instrumento que a gente tem obrigação de usar.

A aproximação com a África, com os países árabes, com a Ásia, entra nisso. É assim que a gente alarga aquela réstia. Não posso dizer: Ah. Isso é muito difícil para mim, vou deixar só os EUA cuidarem disso, ou só a Rússia, ou só a China. Eu tenho obrigação de cuidar disso também.

Quando o presidente visitou a Síria e a Líbia, por exemplo, houve uma avalanche de críticas. Quando pouco depois o Blair e o Aznar foram lá, aí todo mundo achou bacana. Então, nós apenas estávamos à frente.

Hoje, está claro que não é possível falar em paz no Oriente Médio sem Síria participando. Não é questão de achar que é boa ou ruim, é de reconhecer que é um ator indispensável.

E a questão de princípios, de democracia, de direitos humanos?

A repercussão que pode ter tido aqui um ou outro fato, uma coincidência infeliz...

O sr. considera uma coincidência infeliz o presidente e seus ministros às gargalhadas com os irmãos Castro justamente no dia em que morre de fome um dissidente que esperava ajuda do Brasil?

O fato de ele ter morrido quando o presidente Lula estava lá era imprevisível, você chame como quiser chamar.

Não é equivalente a Lula comparar a resistência iraniana a chororô de time derrotado, quando se sabe que lá os dissidentes são mortos?

Não me cabe comentar declarações do presidente Lula. Mas digo que não é correta a percepção de que o Brasil procurou fazer certas coisas porque é amigo do Irã e quer fazer certas coisas porque é amigo. O Brasil procura ter relações de amizades com todos os povos.

O que o Brasil ganha em se meter a intermediar o acordo nuclear do Irã?

Na questão nuclear, o que o Brasil fez foi o que os países ocidentais queriam. Nós viabilizamos a aceitação pelo Irã de uma proposta feita, na verdade, pelo ocidente. E por que não devíamos tentar? É como a gente se trancar dentro de casa e dizer: "nós somos pequenininhos, não podemos sair na rua..."

Tem uma hora que a gente precisa olhar para fora e ver se todo mundo está achando que você é pequenininho mesmo. E vai ver que não. Agora mesmo, quando o Obama fala na inclusão da Índia no Conselho de Segurança [da ONU] todos captaram que não é possível fazer uma reforma do conselho sem o Brasil.

Quando se discute clima, você chama o Brasil. Quando se fala de finança, você chama o Brasil. Quando se fala de comércio, você chama o Brasil, como a Índia e a China. O único terreno em que havia ainda uma certa reserva de mercado, digamos assim, era a questão da paz e da segurança. E foi por isso que a ação do Brasil e da Turquia incomodou.

Os dois ficaram isolados.

A verdade é que os países ocidentais diziam: "Vai lá, vai lá". Nós fomos em boa fé, mas a verdade é que ninguém acreditava que o Irã aceitasse três pontos da carta do Obama, e o Irã aceitou, a verdade é essa.

Os EUA então puxaram o tapete do Brasil?

Quem disse foi o El Baradei, da Agência de Energia Atômica. Ele disse claramente que os proponentes não podiam aceitar "sim" como resposta. Acho que eles se desentenderam internamente. Não esperavam obter, obtiveram e não souberam o que fazer com isso.

A história, você não pode contar em seis ou oito meses. Eu não sei o que vai acontecer, mas certamente tudo isso diz respeito à paz mundial, porque se houver uma guerra no Irã não vai afetar só o Irã, vai ter efeitos muitos graves para todo o Oriente Médio.

Nós vimos na proposta, veja bem, elaborada pelo próprio Ocidente, era uma possibilidade de solução. E contemplava uma hipótese da qual o Irã não vai abrir mão: a de ter energia nuclear, inclusive enriquecimento, para fins pacíficos. E isso é permitido pelo TNP [Tratado de Não Proliferação Nuclear].

Por que o Brasil se omite na condenação de países que desrespeitam os direitos humanos?

Eu lidei 8 anos com a ONU e já participei diretamente disso, sei o quanto essas coisas são manipuladas. No ano em que os EUA estavam fazendo acordos comerciais com a China, a China desaparecia das resoluções de direitos humanos. No ano seguinte, não tinha mais acordo comercial com a China, e a China voltava para as resoluções. E agora não entra mais. Isso é sabidíssimo.

E você pode reparar que há sete países que convivem com situações crudelíssimas, inclusive contra mulheres, e que jamais são mencionados. Por quê? Porque têm bases americanas ou têm outros interesses.

Nosso objetivo não é fazer diploma, é promover mudanças reais nas condições. Mas, no caso da Coreia do Norte, por exemplo, que fez ouvidos moucos a todas as recomendações, aí sim, nós votamos a favor da resolução que condenava.

Nem acho que ela vá funcionar, porque é tão hostil que cria uma barreira, quando o objetivo deve ser o diálogo. Condenar só não adianta nada.

O Brasil está exercitando o "soft power" ao gastar rios de dinheiro em países de todos os continentes, alguns muito distantes de nossa realidade? Trata-se de compra de votos?

Em geral, está financiando empresas brasileiras. Então, você dá por um lado e recebe pelo outro. E o que o Brasil gasta, na verdade, é ínfimo.

Nossa cooperação técnica é comparável talvez à de um pequeno país europeu, tipo Áustria. Você não pode estar entre as dez maiores economias do mundo, querer uma política ativa na OMC e querer que esses países de apoiem sem nada em troca.

É também querer que esses países assumam um risco na hora de você brigar com os Estados Unidos, brigar com a União Europeia. Você cria vínculos, cria alianças.

A diferença é que a Áustria não tem os milhões de miseráveis que o Brasil ainda tem.

Mas uma coisa não pode eliminar a outra. Você vai resolver o problema dos mais pobres com um bom mercado interno, mas também com uma boa inserção internacional, com apoio internacional.

É muito mais complexo do que ser bonzinho daqui, interesseiro dali. Diz respeito à própria imagem brasileira. Eu não vi, por exemplo, nenhuma crítica à ajuda que o Brasil dá ao Haiti.

Abrir tantas embaixadas, até em países minúsculos, está dentro desse contexto?

Vai ver quantas embaixadas tem a Rússia, tem a Índia, tem a China... Influir na realidade internacional é do interesse do Brasil. Uma das maneiras é ter contato direto com os países, ter um embaixador lá para falar com um ministro, até com o presidente. As próprias empresas nos procuram, pedindo, estimulando.

E quando, afinal, o Brasil vai nomear um embaixador para Honduras?

Há um passo a ser dado que nós consideramos muito simples, que é permitir ao menos a volta do [ex-presidente deposto Manuel] Zelaya ao país. Ele foi expulso por um golpe militar com uma arma na cabeça.

Com a consolidação da Unasul, qual o futuro da OEA?

Cada uma vai ter o seu papel. A OEA inclui países muito heterogêneos. São dois países muito desenvolvidos e um bando enorme de países em desenvolvimento.

Então, até para que haja um diálogo produtivo, é importante que os países em desenvolvimento na região se integrem. Integrados, nós teremos mais força, não só para brigar, não, mas para dialogar mesmo com os EUA e o Canadá.

A OEA tem sobrevida, mas muita coisa pode ser resolvida ou bem encaminhada no âmbito da Unasul antes de chegar lá.

O mundo está centrado em duas incógnitas, EUA e China. É uma nova bipolaridade?

Não acho que nós saímos de uma bipolaridade para cair em outra, porque o mundo hoje é muito mais complexo. Por mais que a China seja importante, precisa do Brasil para discutir clima.

Por mais que os EUA sejam importantes, precisam do Brasil para discutir comércio e finanças. Do Brasil e de vários outros.

Eles têm de ouvir os outros, porque não há mais como haver políticas impositivas, nem um mundo dividido em dois campos, com cada um dominando o seu campo a seu modo. Isso, com certeza, não há nem haverá.

A China é aliado do Brasil nos Bric, mas não é ao mesmo tempo competidor comercial direto?

Nosso saldo comercial com a China deve chegar a US$ 7 bilhões neste ano, enquanto temos um deficit de US$ 5 bilhões com os EUA, que é o maior superavit dos EUA no mundo. Então, vamos convir que a China não é o nosso grande problema.

Se o sr. pudesse voltar atrás, o que faria diferente?

Vou falar como a Edith Piaf: "Je ne regrette rien".

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Desafios e ameaças para gigantes

Reproduzo artigo de Beto Almeida, membro da junta diretiva da Telesur:

Num curtíssimo espaço de tempo, dois membros do governo Lula atacaram firmemente dois esteios do sistema capitalista global, em sua fase imperialista: a OTAN e o dólar como padrão internacional. Nelson Jobim, Ministro da Defesa, criticou a pretensão da OTAN de arvorar-se a intervir também no Atlântico Sul desconhecendo o status jurídico de países como o Brasil que tem 350 milhas de sua plataforma continental sob sua soberania. Já Meirelles, presidente do Banco Central, seguindo o Ministro Guido Mantega , atacou a permanência do dólar como moeda padrão internacional, defendendo a idéia de uma nova moeda de referência.

O curioso é que os dois ministros – Meirelles também tem status de ministro - são membros do PMDB e tidos como da cota conservadora do governo Lula. Seriam sinais do novo curso que o Brasil terá que enfrentar na Era Dilma ou da profundidade da crise do capitalismo global, expressa agora com a super emissão de 600 bilhões de dólares pelos EUA o que se constitui em verdadeira guerra de demolição e rapina da das economias da periferia? Ou ambas hipóteses?

Para se ter uma idéia da importância de ambos os posicionamentos, vale dizer, começando pelo lado monetário, que idéia semelhante é defendida hoje pelo Presidente do Iran, Mahmud Armadinejad, que durante anos vem denunciando a ditatorial emissão de dólar sem lastro pelos EUA como verdadeiros atos de delinqüência e banditismo internacionais. No mesmo discurso, perante a ONU, ele também defendeu que entidade adotasse para o próximo ano o slogan “Energia Nuclear pra Todos, Armas Nucleares para Ninguém”. Evidentemente, poucos deram ouvidos e a mídia, controladíssima pelo capital, sequer registrou.

Já o agudo enfrentamento de Nelson Jobim às pretensões intervencionistas dos EUA e da OTAN nos mares do Atlântico Sul foi acompanhado da defesa de que o Brasil e o subcontinente construam “uma aparato dissuasório voltado para as ameaças extraregionais que lhes permitam dizer não quando for preciso dizer não”. Claro está, com a Marinha brasileira desarmada como está hoje - embora em fase de recuperação e reequipamento, reconheça-se - de nada adiantaria dizer não se não se pode assegurar com os meios concretos a defesa política da soberania.

Como no tópico monetário, outro dirigente que também defendeu a constituição de uma Organização do Tratado do Atlântico Sul, foi o líder líbio Muamar Kadafi, ao participar da Reunião de Cúpula América Latina – África, realizada na Venezuela no início deste ano. A defesa da criação de uma OTAS pelo dirigente líbio foi acompanhada de argumentação realista baseada no crescente intervencionismo dos países imperiais pelo mundo afora em busca dos recursos naturais que lhes permitam superar a crise que se agrava, evidentemente se agrava. Ele mesmo teve sua filha de um ano e meio morta em bombardeio ordenado desde Washington por Bill Clinton.

Fortalecimento da aliança do sul

De fato, as duas situações configuram um processo mundial que tende ao tensionamento e recomenda o fortalecimento das alianças dos povos e países que buscam assegurar sua soberania, sua independência e o direito escolher seus próprios destinos. A super emissão de dólar - papel pintado na expressão do cientista brasileiro Bautista Vidal - tem efeitos devastadores para a produção e o trabalho das nações. Na visão do ministro da economia da Argentina, cuja presidenta Cristina anunciou que reagirá à tentativa de destruição de sua moeda e de sua economia, a super emissão de dólares “é como se o trabalho dos argentinos, a sua produção, não valessem nada”.

Buscar caminhos independentes

As duas iniciativas do campo do império, uma monetária outra na esfera da doutrina militar, ambas com desdobramentos que relativizam e enfraquecem a soberania dos países e dos povos, indicam, por outra parte, o acerto de algumas das medidas adotadas pelo governo Lula buscando, de vários modos, um curso de distanciamento do dólar. Já está em prática, por exemplo, o comércio bilateral Brasil-Argentina aposentando o dólar como mediação e referência, o que representa concretamente economia na operação de troca.

Da mesma forma, o apoio brasileiro à formação do Banco Sul, que, em razão da persistência da crise econômica nos EUA, necessita de uma vigorosa aceleração em suas operações, também é uma decisão que o panorama internacional permite registrar como acertada. Além disso, a projetada criação de uma nova moeda no âmbito da UNASUR deveria ser fortemente priorizada, assim como estão fazendo os países da ALBA, que fundaram a moeda Sucre e já acumulam um expressivo volume de suas operações de troca nesta nova base monetária, sem qualquer intermediação da declinante e questionada moeda norte-americana.

Não seria prudente imaginar que o campo monetário esteja totalmente distanciado do aspecto militar. São duas operações de alto valor estratégico para os países imperiais, que não distinguem economia da guerra. Talvez reconhecendo a razão dos que qualificam a economia dos EUA diretamente como uma economia de guerra, o colunista do jornal Washington Post, David Brooker, sustentou, provavelmente ecoando sinistros murmúrios dos gabinetes do Pentágono, que “uma guerra contra o Irã dinamizaria a economia dos EUA”. Disse que esta seria a solução para os problemas políticos de Barak Obama. E nem se ruborizou...

Entre o conselho deste jornalista e a discussão de uma nova doutrina para a OTAN abarcar também o Atlântico Sul e a super emissão de 600 dólares, há toda uma linha de reorganização para uma nova fase em que o cenário mundial registra o despontar de um conjunto de países emergentes buscando uma articulação em novas bases, rediscutindo os pilares do sistema mundial.

Compartilhar com quem?

Neste cenário, soa bastante realista o discurso do Ministro Jobim que questionou o posicionamento de uma alta autoridade americana que defendeu “soberanias compartilhadas” no Atlântico, ao que o brasileiro contestou em conferência pública: “Qual é a soberania que os EUA querem compartilhar, a deles ou a nossa?”, reagiu.

É interessante como o cenário mundial duro e sombrio vai colocando questões e posicionamentos antes tidos como do âmbito da esquerda na agenda dos governos e mesmo na mesa de segmentos tidos como da cota conservadora do governo Lula. Certamente, Jobim ecoa um pensamento militar brasileiro que vem configurando uma nova doutrina de defesa. Mudanças sempre implementadas em razão do processo histórico, das experiências práticas em que os militares tiveram que analisar estrategicamente da defesa e os interesses nacionais.

Foi provavelmente o que teria levado o Brasil, durante a ditadura militar, a constituir uma indústria bélica, a desenvolver a área estatal de telecomunicações e satélites (Telebrás e Embratel), e, até mesmo, a defender a expansão do mar territorial para 200 milhas, medida esta que recebeu apoio da Presidenta Dilma quando estava na prisão Tiradentes, na década de setenta, que também comemorava as vitórias da seleção canarinho na Copa do México. Mais tarde, o curso político internacional também teria levado o Brasil a medidas como quebrar o bloqueio internacional que os países imperiais impuseram contra o Iraque na década de 70 e, também, a reconhecer o novo Governo de Agostinho Neto que, pela força das armas, chegava ao poder em Luanda.

Anos depois, o Brasil, ainda sob o governo Figueiredo, ofereceu apoio logístico e operacional à Argentina quando da Guerra das Malvinas, colocando-se, uma vez mais, em posição de distanciamento e conflito com os países do campo imperial. Nesta oportunidade, vale lembrar, Fidel Castro chegou a oferecer tropas cubanas para lutar ao lado da Argentina, ainda sob o governo do general Galtieri. Há uma evolução no pensamento militar brasileiro, mais recentemente indicado pelo acordo de cooperação firmado entre o Exército Brasileiro e o Exército do Vietnã para técnicas de luta na selva e pelo esforço na constituição de um Conselho de Defesa da América do Sul.

Muitos que rememoram o passado não muito distante do Ministro Jobim antes do governo Lula, certamente se espantam a vê-lo defendendo o direito da Venezuela desenvolver a energia nuclear para fins pacíficos e criticando o bloqueio dos EUA contra Cuba, oportunidade em que também afirmou que “a política internacional não pode ser definida a partir da perspectiva do que convém aos EUA”.

Construção de uma nova agenda progressista

O que surpreende é que estas temáticas nem sempre são tratadas sistematicamente nos fóruns progressistas e da esquerda em geral, muito embora sejam parte integrante da agenda do governo Lula. São posições de governo. Mas, ainda assim, é com alguma dificuldade que movimentos sociais, os sindicatos e a esquerda em geral tratam destas questões, muito embora sua importância histórica seja inequívoca. Creio que era Darcy Ribeiro que dizia “falta nacionalismo na esquerda brasileira”, buscando enquadrar as questões do enfrentamento com o império como algo que deveria ter presença central na agenda das forças progressistas.

Assim como Gandhi, em luta contra o colonialismo inglês, vislumbrou em certo momento a necessidade de defender a nacionalização estratégica do sal, provavelmente seria o caso aqui também dos movimentos sociais - mantendo sua independência - incorporarem em sua agenda, por exemplo, a nacionalização do etanol e da álcool-química, que certamente terá importância ampla em futuro próximo no cenário produtivo mundial, com mencionou recentemente Dilma em entrevista ao lado de Lula.

O PT chegou a aprovar em sua Conferência Nacional a constituição de uma Empresa Pública de Energia Renovável, decisão importante, ainda que, não tenha tido a continuidade esperada, até o momento. Mas, assim como um amplo movimento cívico-militar foi decisivo para a criação da Petrobras, agora também, com os sinais sombrios que os pólos imperiais nos enviam, seria hora decisiva para constituir uma aliança governo e sociedade, os sindicatos, o clero progressista, o movimento estudantil, os movimentos sociais, para configurar uma consistência ainda mais profunda no programa de ação do governo Lula e em sua continuidade com a Presidenta Dilma. Já há uma recuperação da Telebrás, faltando agora a da Embratel, sem o que não se pode falar em soberania em plenitude neste mundo de idade mídia, pois mesmo as comunicações militares satelitais hoje estão sujeitas a interferências de empresa de propriedade norte-americana. Os militares devem ser incoporados neste amplo debate nacional.

Voto indicou um caminho

A agenda em parte já foi construída pelo voto democrático dos brasileiros posicionando-se pela continuidade das políticas do governo Lula. Mas, a persistência da crise mundial, os sinais imperiais de inadmissíveis desejos intervencionistas na soberana plataforma brasileira, onde está o pré-sal, indicam que a agenda política do governo Dilma possivelmente necessitará de um aprofundamento programático, ampliando os vínculos com a sociedade organizada, já que os olhares de cobiça que se lançam sobre o Brasil não são nada amistosos, nem muito menos complacentes com a aplicação de políticas públicas independentes e soberanas de nossa parte, aliás como já fez o governo Lula por meio de sua política externa.

Desnecessário desenvolver longamente, mas importante relembrar sempre, uma política estratégica para o Brasil, que abarque desde a necessidade de uma renacionalização do setor de fertilizantes - esta sim uma medida de segurança nacional - ou de soberania energética (um problema é que se estima uma desnacionalização de 40 por cento do setor etanol, apesar da Petrobrás ter entrado em campo), todo este debate fundamental para o destino do povo brasileiro e do Brasil como nação, exige um novo modelo de comunicação.

Não há qualquer sombra de dúvida que questões tão cruciais, tão decisivas, estejam sendo tão deformadas e vulgarizadas pelo modelo midiático atual, no qual predominam os interesses vinculados e dependentes dos anunciantes controlados pelo capital externo ou de seus sócios nativos, o que impede o nosso povo compreender plenamente sua relevância.

Não são nada simples o tamanho das tarefas e a magnitude dos desafios que o Brasil enfrentará na Era Dilma. Mas, tal como ela que já suportou, resistiu e venceu as mais duras provas, assim é o povo brasileiro em seu dia a dia, capaz de identificar sob um dilúvio brutal de mentiras e desinformações onde está o caminho do progresso, da transformação e da justiça social.

Ele será capaz de dar o apoio necessário para que o Brasil tenha todos os instrumentos necessários para garantir sua soberania, desde uma defesa à altura de suas potencialidades, uma política monetária que assegure nossa independência e a aplicação das políticas sociais que retirem com urgência milhões e milhões de brasileiros do poço da miséria e da pobreza em que ainda se encontram. Um desafio para gigantes.

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II Fórum da Cultura Digital está bombando

Reproduzo release da comissão organizadora:

A programação iniciou às 9h com o espaço Experiências da Cultura Digital, um grande mosaico de experiências de cultura digital apresentada em 10 minutos na sala Petrobrás. Em seguida, às 10h, tivemos a programação da tenda de Encontro de Redes, localizada no gramado da Cinemateca, com o primeiro encontro do Newscamp (desconferência sobre jornalismo e colaboração).

À tarde, na mesma tenda, às 14h, o Espaço de Redes reinicia as atividades com o encontro da Redelabs (encontro sobre cultura digital experimental). Alguns dos nomes confirmados são Felipe Fonseca (RedeLabs), Marcos Garcia (Medialab-Prado), Tapio Makela (Translocal.net), Ricardo Brazileiro, Lucas Bambozzi.

Já o Espaço de Redes encerra o dia com o Encontro de Servidores e Acervos Livres, às 18h30, com Leo Germani (HackLab), Lincoln de Sousa (Minc), Billy Blay Costa (ITeia) e Fabianne Balvedi (Estúdio Livre).

Por volta das 11h30 começa a primeira oficina do espaço Cultura Digital Mão na Massa, localizado numa tenda ao lado da sala BNDES da Cinemateca. Dados Abertos: o maravilhoso mundo do screen-scraping, com Pedro Belasco. Seguem as oficinas Animação 2D com software livre (Paulo Emmanuel Cunha da Silva), às 12h, Oficina Connexions às 14h, Walking Tools (Brett Staulbam), às 16h, Mapa Cognitivo Barcamp (Alissa Gottfried e Felipe Fiorenza Nunes), às 18h, e Ledslife (Fabio Stasiak), às 20h.

A programação deste espaço ainda segue com as atividades permanentes Transparência Hack Da, Hackerspace “Garoa Hacker Clube”, Cobertura Colaborativa, Install Fest.

Gilberto Gil, John Perry Barlow, Bob Stein e Vincent Moon

O Seminário Internacional tem início às 14h, na sala BNDES (a principal da Cinemateca) com Cultura Digital oito anos depois, dez anos à frente. Participam como palestrantes John Perry Barlow (Eletronic Frontier Foundation) e Gilberto Gil (Músico e compositor). Como provocador Cláudio Prado (Laboratório Brasileiro de Cultura Digital).

Às 16h30, começa o segundo debate neste espaço, “Os futuros do livro”, que terá como palestrante Bob Stein (Institute for the Future of The Book) e como provocadora Giselle Beiguelman (Instituto Sérgio Motta/PUC).

Por fim, às 19h o Seminário Internacional encerra a programação do dia com Perspectivas criativas da Cultura Digital, que terá os palestrantes Vincent Moon (La Blogotheque) e HD Mabuse (C.E.S.A.R). Como provocador José Luis Herencia (Secretário de Políticas Culturais/Ministério da Cultura).

Todas atividades deste espaço terão transmissão em streaming de duas formas: em português (flash) e inglês (HTML5, áudio original) pelo endereço:

Arena da Cultura Digital

No Arena da Cultura Digital, montada no interior da Cinemateca, a programação também inicia as 10h com o debate “Governança da Internet“, que terá como facilitadores Alvaro Galvani (MRE), Demi Getschko (CGI), Marília Maciel (CTS-FGV) e Caff Souza (IGF)

A discussão na arena segue às 15h com “Compartilhamento e remuneração do autor em contexto digital”, com os facilitadores Ladislau Dowbor (PUS-SP), Rodrigo Savazoni (Casa da Cultura Digital), Pablo Capilé (Circuito Fora do Eixo), Pena Schmit (Auditório Ibirapuera), Pablo Ortellado (Gpopai-USP), Guilher Varella (Idec) e Alfredo Belo (Dj Tudo).

Às 19h, essa área finaliza as atividades com Festivais de Música e Cultura Digital, tendo os facilitadores Talles Lopes (Festival Jambolada/ Uberlândia) , Ricardo Rodrigues (Festival Contato/ São Carlos), Ivan Ferraro (Feira da Música de Fortaleza), Rita de Cássia Silva Cardoso (Festival Big Bands/ Salvador), Atílio Alencar de Moura Corrêa (Festival Macondo Circus/ Santa Maria), Paulo “Linha Dura” Avila (Festival Consciência Hip Hop/ Cuiaba MT – CUFA).

II Fórum da Cultura Digital Brasileira

A Cinemateca Brasileira receberá, entre os dias 15 e 17 de novembro, a segunda edição consecutiva do Fórum da Cultura Digital Brasileira. Na ocasião, experiências de diferentes redes nacionais e internacionais se encontrarão para refletir e oferecer subsídios à construção de políticas públicas na era digital.

Criada de forma colaborativa, a programação contou, principalmente, com a participação de agentes envolvidos na rede social CulturaDigital.Br (www.culturadigital.br), que mantém um processo permanente de discussões sobre os impactos das novas tecnologias na transformação da cultura e da democracia do país.

O II Fórum da Cultura Digital Brasileira é uma realização do Ministério da Cultura e da Casa da Cultura Digital.

II FÓRUM DA CULTURA DIGITAL BRASILEIRA
Data: 15 e 17 de novembro
Local: Cinemateca Brasileira (Largo Senador Raul Cardoso, 207 – Vila Clementino)
Mais informações: http://culturadigital.br/forum2010/




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‘Patricinha’ do Twitter pode ser neonazista

Reproduzo artigo de Eduardo Guimarães, publicado no Blog da Cidadania:

O endereço do Twitter @Ju_Tedesco tem 15.835 seguidores. O “avatar” mostra a foto de uma garota loira de cerca de vinte anos. À diferença de outros “tuiteiros” que na noite de 31 de outubro, durante a apuração da eleição presidencial, difundiram mensagens racistas, essa pessoa continua na mesma toada até agora.

Em seu perfil, @Ju_Tedesco se diz do sexo feminino e “Estudante de publicidade, apaixonada pela vida e pseudo-intelectual”. Suas postagens racistas, xenofóbicas e homofóbicas, que continua disparando às centenas, sem parar, constituem crimes iguais aos que cometeram outros jovens de classe média de São Paulo na noite do segundo turno da eleição presidencial.

Eis algumas mensagens que a suposta “garota” publica em seu perfil no microblog:

Este pessoal defende o aborto, e contamina a comunidade hetero com DSTs. Não há vantagem em deixar eles vivos…

O Brasil carrega nas costas “peso morto” gente q vota com o estomago, eles são o fracasso de nossa nação!!

Os bissexuais são mais promiscuos, são pessoas focadas no próprio ego, na beleza fisica.

A pior parte de td a hist paulistana, eh q a cidade d SP sustenta cuase td o Brasil e td os estrangeiros so conhecem RJ!

Eu sou uma mulher matemática, analiso a lógica, penso de forma algébrica. Os gays representam um problema, e isto é um #fato

Oos homossexuais são um grupo de risco, a doença só chegou aos héteros graças as vagabundas e viados bi.

Os homossexuais transmitem AIDS para a população hétero através do poveco BI. Eles são um câncer moral e social.

Não generalizo quando falo dos negros, apenas me baseio em estatísticas e modelos prontos. Vide “A curva do sino”

Eugenia nada mais é que o melhoramente genético de uma população, vagabundos tem que ser impedidos de se reproduzirem…

Os gays e relatados deviam ser representados apenas por uma letra, o A, A de aberração, hahahahahaha

Não gosta de homossexuais, isto é meu direito, se vocês tem o direito de dar o cu, eu tenho o direito de ter nojo de quem dá o cu.

Homofobia sequer existe, é uma palavra inventada pelos gayzistas, aceitem isto. Não é crime e não existe.

São Paulo SUSTENTA o Nordeste. Isto é um #fato, convivam com isto.

Esse muleque pardo http://youtu.be/1pGh-wLu1pA não é a mesma coisa que o Justin Bieber, ele não é branco…

Espancaram dois viadinhos em SP ? Alguém liga ? Só se for os outros viadinhos, que sabem que estão na fila para apanhar, hahahahaha

Isto aqui está parecendo o balcão do bolsa familia hoje, está cheio de pobres com nomes escrotos tipo Welyton de mimimi…

Bom dia para todos, menos para os gays, pretos e nordestinos.


Chega? Sim, chega. É possível encher uma enciclopédia inteira com as mensagens dessa pessoa. A certa altura, porém, fica a dúvida se o perfil criminoso no Twitter é mesmo de uma mulher.

@Ju_Tedesco diz que vive no Canadá e que, portanto, não tem medo da lei brasileira. Contudo, uma fonte indica que se trata, na verdade, de um homem. Um neonazista com longa ficha corrida que a Justiça brasileira não consegue alcançar.

Como não consegue alcançar? Um pedido de extradição ao governo canadense contra criminoso desse calibre seria prontamente atendido por um país conhecido por suas tradições humanistas. O que parece faltar é que as autoridades tomem uma atitude.

Está na hora de alguém representar contra a criminosa ou criminoso @Ju_Tedesco no Ministério Público Federal. Quem se habilita? Se ninguém o fizer, o Movimento dos Sem Mídia fará, incluindo pedido de apuração de omissão de autoridades.

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Ferreira Gullar e a ira dos inconformados

Reproduzo artigo de Ricardo Kotscho, intitulado "Eleições 2010: o velho poeta e a ira dos inconformados", publicado no blog Balaio do Kotscho:

Eleição para presidente é bom por causa disso: só acontece de quatro em quatro anos, tem dia e hora para acabar. Em pouco tempo, fica-se sabendo quem ganhou e quem perdeu. No dia seguinte, a vida segue seu rumo. Os vencedores escolhem o time que vai governar e os perdedores reorganizam suas tropas para a próxima eleição. Por isso, como vocês sabem, nem pretendia voltar ao assunto.

Nas democracias costuma ser assim, mas não é bem o que está acontecendo no Brasil nestas duas semanas que se passaram desde que fomos às urnas. Em alguns “bolsões sinceros mas radicais”, como se dizia nos tempos dos militares, quando não se podia votar para presidente, nota-se um rancoroso inconformismo com o resultado, especialmente na imprensa e nas redes sociais.

Manifestações diárias deste sentimento podemos encontrar em mensagens e artigos carregados de ira, preconceitos e intolerância que circulam em colunas, editoriais, blogs, celulares, facebooks, twitters e que tais, nas velhas e nas novas mídias impressas e eletrônicas, por toda parte - hoje como ontem, os mais estridentes redutos do que sobrou da oposição radical. Não são tantos como pensam, mas fazem muito barulho.

Um exemplo patético do que pensa este tipo de eleitor derrotado é o inacreditável artigo publicado domingo na Folha de S. Paulo pelo poeta Ferreira Gullar, sob o título “Ah, se não fosse a realidade!”. De fato, se não fosse a realidade das urnas, ele talvez estivesse hoje mais feliz, menos amargo, escrevendo novos versinhos, mas o voto digitado não tem volta e os resultados oficiais já foram proclamados pelo TSE.

A começar pelo trecho destacado no texto - “Ninguém imagina que Lula deixe dona Marisa em São Bernardo para instalar-se na alcova de Dilma” -, Gullar destila sua bílis num panfleto carregado de ódio e desrespeito, que não deve fazer bem a quem o escreve, muito menos a quem o lê num final de tarde de domingo como aconteceu comigo.

Viúvo do comunismo de resultados de Roberto Freire, o octogenário poeta ganhou destaque na reta final da campanha eleitoral como uma espécie de líder dos intelectuais de oposição, encabeçando manifestos e abaixo-assinados “em defesa da democracia e da vida”, como se ambas estivessem ameaçadas.

Fez o que pode e o que não pode, como se pudesse, para impedir a vitória de Dilma Rousseff, candidata de um governo que ele abomina desde que tomou posse, em 2003. Por isso, ele até hoje simplesmente não aceita a derrota.

“De fato, como acreditar que uma mulher que nunca se candidatara a nada, destituída de carisma e até mesmo de simpatia, fosse capaz de derrotar um candidato como José Serra, dono de uma folha de serviços invejável, tanto como parlamentar quanto como ministro de Estado, prefeito e governador? Não obstante, aconteceu (…)”

Gullar faz parte do elenco fixo de intelectuais e “ólogos” em geral sempre requisitados pela imprensa para escrever artigos ou dar entrevistas contra o governo Lula, a presidente eleita e o PT. Até hoje, tem gente que não admite e não se conforma com as vitórias de Lula em 2002 e 2006, e muito menos com a de Dilma este ano.

Premiado porta-letras de um setor da sociedade que o venera nos saraus dos salões elegantes, o poeta é figurinha carimbada, mas agora é hora de renovar o plantel, pois ninguém vai conseguir ler sempre os mesmos lamentos e insultos por muito tempo.

Na semana passada, a mesma Folha recolheu do anonimato dois articulistas do melhor estilo “neocon”, que atribuem aos feios, sujos e malvados as razões de todas as nossas desgraças, e os abrigou em sua terceira página.

Primeiro, foi um rapaz chamado Leandro Narloch. Em seu breve currículo, ele informa já ter trabalhado na Veja e que é autor do livro “Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil”. Sob o título “Sim, eu tenho preconceito”, ele escreveu um texto em defesa da elite branca de Cláudio Lembo e da moça que culpou os nordestinos pela derrota e sugeriu o afogamento deles como solução. É mais um autor “neocon” em busca de um nicho de mercado dominado por “oldcons”.

Pouco importa que, mesmo sem os votos do Norte-Nordeste, Dilma tivesse vencido as eleições do mesmo jeito, com mais de 1,3 milhão de votos de vantagem. A tese dos neocons é que os pobres, doentes e iletrados das “regiões mais atrasadas” ganharam dos sábios, saudáveis e abonados do Sul-Sudeste maravilha, o que para eles é inconcebível.

A segunda a entrar em cena foi a professora doutora Janaina Conceição Paschoal, apresentada ao público como professora associada (de quem?) de Direito Penal na gloriosa Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Na mesma linha, ela publicou o artigo “Em defesa da estudante Mayara” e colocou a culpa pela explosão do “racismo regional” em Lula.

Enquanto a oposição procura juntar os cacos e entender o que aconteceu, sem a participação do seu líder derrotado, que sumiu do mapa e fez apenas uma fugaz e infeliz aparição no Sul da França, o noticiário pós-eleitoral se concentra nas muitas crises entre os partidos aliados na disputa por cargos no novo governo e no superdimensionamento de problemas administrativos enfrentados pela administração federal.

Pelo jeito, boa parcela do eleitorado mais conservador continua sem lideranças na representação político-partidária e no movimento social, embora tenha mostrado sua força na recente eleição, o que leva bispos, poetas, pastores e setores da imprensa a exercer este papel cada vez com maior furor.

Como dizia um velho jornalista dos meus tempos de Estadão, o mestre Frederico Branco, ainda nos anos 60 do século passado: eles não aprendem, não esquecem e não perdoam.

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Olurun Eke e a república incompleta

Reproduzo artigo de Gilson Caroni Filho, publicado no sítio Carta Maior:

Ao incluir o Dia da Consciência Negra no calendário escolar, a lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003, não propiciou apenas um resgate da história dos povos negros. Foi bem além. Ensejou a necessidade de um novo olhar sobre culturas que, ao contrário da postulação ocidental, não colocam a questão da Verdade, de conteúdos absolutos e inarredáveis, de essências escondidas atrás de formas ou aparências. Sua riqueza é de outra ordem. E talvez este seja o significado mais profundo do dia 20 de novembro: memória e resistência como possibilidades históricas.

Para os que estudam a cultura afro-brasileira, é importante registrar a dinâmica de suas origens. Nelas, observamos uma espécie de culto da forma pela forma, algo como a valorização das dimensões plásticas. Seus mitos, rituais, danças, jogos e orações não remetem a quaisquer referências que lhes sejam exteriores, não expressam “outra coisa”, não são aparências de uma essência. Portanto não podem ser “decifrados”, “interpretados” ou “descobertos”, como ainda pretendem algumas de nossas teorias da cultura, herdeiras do ranço etnocêntrico do velho colonizador.

É o que apreciamos na aparentemente inconciliável visão de mundo que parece existir em alguns poetas negros, como Solano Trindade (1908-1974). Em versos como “A minha bandeira/ É da cor de sangue/ Olurun Eke/ Da cor da revolução/ Olurun Eke“, há uma estranheza que parece apontar para ausência de sentido lógico. Pura ilusão. O que lemos são instantes culturais, sínteses de uma vida vivida, de um artista ao sentir a realidade trágica do que é ser negro, também no Brasil.

Na verdade, do ponto de vista dos afro-descendentes, as expressões artísticas são mais para serem percebidas sensorialmente, vistas com a Alma, do que para serem “entendidas”. Existe, portanto, uma defasagem entre aquilo que se quer dizer de um lado, e o que se consegue transmitir na realidade. É exatamente neste espaço que o negro brasileiro consegue criar as coisas mais bonitas de sua produção simbólica e de maior valor para sua negritude.

Ser negro no Brasil de 2010 é, culturalmente, assumir a Alma Popular: é pensar a partir do ponto de vista do povo. É, sobretudo, estabelecer sintonia ideológica com as classes sociais que foram exploradas durante nossos 510 anos de história. O grande saque que se iniciou com a invasão portuguesa, por causa do pau-brasil, continuou e prosperou até depois da Independência, sempre a beneficiar os brancos. Consolidou-se com a Abolição/Proclamação da República, e continua até os nossos dias.

No terceiro milênio, da perspectiva do negro, a paz, objetivo perseguido por toda a espécie humana, passa necessariamente pela resolução dos problemas que o grande saque, ocidental e cristão, criou para a negritude. No Dia da Consciência Negra, é preciso repudiar a História do Brasil como um suceder de arranjos, combinações, “jeitinhos” em que o conflito nunca aparece ou, se vem à tona, é considerado como “coisa externa à nossa gente”.

O processo de desestruturação do mito da “democracia racial” no campo teórico tem avançado muito nos últimos anos. Já no terreno social e da luta política, apesar das políticas públicas implementadas recentemente, o atraso ainda é considerável. Por isso, é necessário resgatar a memória histórica dos negros, em todos os tempos e sentidos. Olurun Eke, para que a República seja proclamada em definitivo.

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Centrais criam rede de comunicação na AL

Reproduzo artigo de Leonardo Wexell Severo, publicado no sítio da Agência Latinoamericana de Informação (Alai):

“As frentes de guerra número um, dois e três estão nos meios de comunicação e no controle da opinião pública”. As palavras do jornalista basco Unai Aranzadi, transmitidas em vídeo aos participantes da Conferência Sindical sobre Democratização da Comunicação, definiram as discussões do encontro realizado em Montevidéu nos dias 1° e 2 de novembro. Segundo Aranzadi, os grandes meios seguem alguns “padrões de manipulação e de silêncio impostos pelos conglomerados privados” para prostituir a informação em troca da liberdade de empresa e do discurso único do “partido do capital”.

Promovida pela Confederação Sindical de Trabalhadores/as das Américas, com a participação de centrais sindicais, organizações sociais e especialistas de mais de 20 países latino-americanos, a Conferência destacou a necessidade de mais protagonismo dos trabalhadores na luta pela liberdade de expressão – considerada um “valor indispensável para a construção de uma sociedade mais justa”.

A atuação dos meios de comunicação de massa foi condenada pelos participantes enquanto se repetiam as denúncias de desrespeito, por parte de quem faz uso indevido de concessões públicas, das mais elementares normas de disputa democrática. Foram mencionados desde o recente caso brasileiro – onde o candidato da oposição à presidência, José Serra, foi supostamente “agredido” por uma bolinha de papel – até o racismo contra o presidente boliviano Evo Morales e as críticas a presidente Cristina Fernández, que aprovou uma lei para disciplinar os abusos dos meios de comunicação na Argentina.

O secretário geral da CSA, Víctor Báez, mencionou exemplos concretos da necessidade de construir um poder em rede para contrapor as mentiras difundidas contra a soberania e a liberdade dos povos. Víctor falou do caso dos mineiros chilenos. Os 33 mineiros estiveram 70 dias debaixo da terra, com os meios de comunicação privados falando muito mais da ação de resgate e ocultando as verdadeiras causas do desastre: a falta de investimentos em segurança por parte da empresa, a ausência de fiscalização por parte do governo. Por força da mobilização popular, o governo teve que fechar minhas privadas que se encontravam nas mesmas condições.

“O movimento sindical chileno falou das causas do acidente, mas a denúncia acabou isolada e a verdadeira notícia não foi difundida porque não havia uma rede articulada para fazer isso”, avaliou Báez. “O desmoronamento na mina de San José nos lembrou do fato ocorrido no México, em Pasta de Conchos, onde muitos trabalhadores ficaram enterrados a 100 metros de profundidade, sem qualquer auxílio. E o dirigente sindical que denunciou o acidente teve que se exilar no Canadá”.

Imposição de um modelo

Rosane Bertotti, secretária nacional de Comunicação da Central Única de Trabalhadores (CUT), do Brasil, destacou a necessidade política e ideológica de se construir um novo marco para regular o setor. Na conferência de Montevidéu, Rosane disse que algumas das medidas a serem tomadas foram debatidas democraticamente pela sociedade brasileira e aprovadas na Conferência Nacional de Comunicação, devendo agora serem materializadas na Consolidação das Leis Sociais do país.

“A democratização da comunicação é um passo essencial para o aprofundamento da democracia e é um elemento fundamental para a valorização dos seres humanos. Com sua concepção neoliberal de Estado mínimo, os privatistas tentaram nos impor seus contra-valores, confundindo liberdade de imprensa com liberdade de empresa”, acrescentou Rosane. Como contrapartida ao cenário hegemônico dos grandes meios de comunicação no Brasil, a secretária da CUT apontou que a central sindical investiu na estruturação de seus próprios canais de TV e rádio que começaram a transmitir sua programação recentemente.

Como lembrou o uruguaio Aram Aharonian, fundador da Telesur e dirigente do Observatório Comunicação e Democracia, da Venezuela, é fundamental que o movimento sindical se articule com os movimentos sociais para a disputa de projetos na arena midiática. “Três décadas atrás, para impor-se um modelo político-econômico tínhamos que recorrer às armas, com um saldo de milhares de mortos, desaparecidos e torturados. Hoje, os meios de comunicação de massa levam o bombardeio da mensagem hegemônica diretamente à sala de nossas casas, 24 horas por dia”.

A criação de uma rede de comunicação sindical

Segundo o pensamento de Aharonian, “atualmente são as grandes corporações que manejam o latifúndio midiático, que criam imaginários coletivos virtuais e decidem quem tem a palavra, quem é o protagonista e o antagonista, enquanto trabalham para que as grandes maiorias sigam mudas e invisíveis”. Para combater esta “verdadeira ditadura midiática”, defendeu o jornalista, é preciso “reivindicar e transformar em realidade o sentido etimológico da comunicação, que implica diálogo, interação e intercâmbio para construir consensos entre as partes envolvidas no processo”. Aharonian destacou a importância da proposta da CSA para estruturar redes para construir um movimento contra-hegemônico com vistas a incentivar ações espalhadas no continente, tornando-as muito mais fortes e eficientes.

Gustavo Gómez Germano, diretor nacional de telecomunicações do Uruguai, ressaltou que, na América latina, por muitas razões, está se produzindo um processo de revisão das leis sobre os meios de comunicação, em especial os eletrônicos, com o rádio e TV. “Na verdade, trata-se de um processo de re-regulação, porque a regulação anterior habilitava e fomentava a concentração dos meios de comunicação nas mãos de uns poucos, ao mesmo tempo em que obstaculizava o acesso às grandes maiorias”.

De acordo com Gómez, os Estados devem revisar e reformar suas legislações e realizar controles adequados para reverter e impedir a formação de monopólios e oligopólios no controle dos meios de comunicação. “Se o Estado não desempenha um papel ativo, a democratização não será possível, o livre jogo da oferta e da demanda não diminuirá os abismos existentes em nossas sociedades”, acrescentou.

Novo internacionalismo

Álvaro Padrón, da Fundação Friedrich Ebert, entidade que apoiou a Conferência de Montevidéu, disse que o momento é de um “novo internacionalismo, com nova base pragmática, mais unidade e mais pluralidade”. Segundo Padrón, questões que eram marginais agora ganham mais transcendência no embate de idéias, pondo em questão a concentração dos meios. A conformação de uma rede de comunicação sindical, acrescentou, é uma tarefa urgente para colocar as entidades em uma nova posição de ação democratizadora. Assim, será possível virar a página do neoliberalismo que ainda asfixia muitos Estados nacionais.

Omar Rincón, também da Fundação Friedrich Ebert, acredita que estamos assistindo a “uma batalha inédita pelo relato do país e pela hegemonia política, onde os meios privados criaram sua própria realidade, que representa os donos desses meios que expressam pouca transparência informativa e econômica”.

O representante do Coletivo Intervozes, do Brasil, Pedro Eckman, resgatou a trajetória de luta dos movimentos sociais pela liberdade de expressão e demonstrou como os interesses dos grandes barões da comunicação e da livre empresa entraram em contradição frente aos direitos comunicacionais. Eckman defendeu a necessidade de mais articulação com o conjunto dos movimentos sociais para que caminhem juntos na consolidação das redes contra-hegemônicas. E explicou que “não é necessário reinventar a roda, uma vez que já há muita experiência acumulada. Basta fortalecer as alianças”.

A Agência Latinoamericana de Informação (ALAI) esteve representada na Conferência de Montevidéu por Osvaldo León, para quem o momento favorece uma campanha sincronizada pela democratização da comunicação. “Nunca esteve tão claro o papel danoso dos grandes oligopólios midiáticos, que encarnam uma agressão ao verdadeiro papel e à responsabilidade dos meios de comunicação. Pluralidade e diversidade não entram nestes meios que aí estão. Por isso, nós defendemos a necessidade de investir e contar com instrumentos próprios. Se não dizemos nossa própria palavra, os outros vão dizê-la por nós”.

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domingo, 14 de novembro de 2010

O vexame do egocêntrico Jô Soares

Reproduzo artigo de Mauricio Stycer, publicado em seu blog no UOL com o título "Jô Soares constrange escritores e organizadores de prêmio literário":

A cerimônia de entrega da oitava edição do Prêmio Portugal Telecom de Literatura, na noite de segunda-feira (8), é a fofoca do momento no mundo das letras. O assunto principal nem é a vitória de Chico Buarque, com o romance “Leite Derramado”, mas a performance do humorista Jô Soares como mestre de cerimônias da noitada, na Casa Fasano, em São Paulo.

Dez escritores concorriam ao cobiçado prêmio de R$ 100 mil, que também dá R$ 35 mil para o segundo lugar e R$ 15 mil para o terceiro.

A cerimônia foi imaginada nos moldes do programa que o humorista apresenta na televisão, incluindo o seu sexteto musical. Jô ignorou diversas passagens do roteiro preparado para a sua leitura e, improvisando, causou diferentes constrangimentos.

O roteiro previa que Jô apresentasse cada um dos dez autores finalistas do prêmio, fazendo um breve resumo biográfico e da obra que disputava a láurea. Não disse uma linha sequer. Vários dos autores indicados estavam presentes e sequer foram mencionados. O segundo colocado, Rodrigo Lacerda, autor do romance “Outra Vida”, foi praticamente enxotado do palco para a entrada de Chico.

Além de ignorar o roteiro, Jô demonstrou falta de conhecimento literário, como se viu na pouca familiaridade do apresentador com o nome de Armando Freitas Filho, um dos principais poetas brasileiros, terceiro colocado, com “Lar”.

O constrangimento estendeu-se a Pilar del Rio, viúva de José Saramago, o escritor homenageado da noite. Jô recebeu Pilar no palco e, como de hábito, falou mais que a entrevistada, além de transmitir a impressão que era íntimo do autor. Sobre o seu último livro, “As Palavras de Saramago”, distribuído aos convidados, o apresentador disse pouco.

Ao entrevistar Chico Buarque, o grande vencedor, Jô aproveitou para tecer um paralelo entre o trabalho literário do compositor e o seu próprio, além de conversar sobre futebol.

Ao final da cerimônia, Selma Caetano, curadora do prêmio, pediu desculpas aos escritores finalistas. Disse a eles lamentar que o que deveria ser uma festa da literatura tenha se transformado num evento social.

O apresentador “só não destratou o copeiro, porque não havia copeiro”, escreveu o jornalista Roberto Kaz, na “Folha”. “Foi uma coisa realmente grotesca”, resumiu um dos presentes a este blogueiro.

A Portugal Telecom não quer comentar o episódio. Apenas considera que o prêmio está acima deste constrangimento.

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Como cultivar a exclusão social em SP

Reproduzo artigo de Leonardo Sakamoto, publicado em seu blog:

Daqui a uma geração, quando estudarem a arquitetura de nossa época, além dos prédios em forma de melancia e dos espigões de aço e vidro azul, outra coisa, menos bonita por certo, chamará a atenção. Temos gasto muito tempo e inventividade para criar formas de excluir do convívio da cidade aqueles para os quais nunca abrimos as portas dos direitos econômicos – e isso não passará despercebido.

Reuni alguns desses métodos informais em forma de manual. Apesar de não estarem publicados e não seguirem padrões da ABNT, existem e fazem vítimas diariamente, ainda mais em noites frias e chuvosas como essas pelas quais estamos passando. Registrar isso serve para lembrar o quanto somos ridículos e ajudar o pessoal que vai nos julgar amanhã. Espero que não tenham dó ou piedade.

1) Áreas cobertas em viadutos, pontes, túneis ou quaisquer locais públicos que possam receber casas imaginárias do povo de rua devem ser preenchidas com concreto. A face superior não deve ficar paralela à rua, mas com inclinação suficiente para que um corpo sem-teto nela estendido e prostrado de cansaço e sono role feito um pacote de carne velha até o chão.

1.1) Outra opção, caso seja impossível uma inclinação acentuada, é o uso de floreiras, cacos de vidro ou lanças de metal. É menos discreto, mas tem o mesmo resultado.

2) Prédios novos devem ser construídos sem marquises para impossibilitar o acúmulo de sem-teto em noites chuvosas.

2.1) Caso seja impossível por determinações estéticas do arquiteto, a alternativa é murar o edifício ou cercá-lo. A colocação de seguranças armados é outra possibilidade, caso haja recursos para tanto.

2.2) Em caso de prédios mais antigos, uma saída encontrada por um edifício na região central de São Paulo e que pode ser tomada como modelo é a colocação de uma mangueira furada no teto, emulando a função de sprinklers. Acionada de tempos em tempos, expulsa desocupados e usuários de drogas. Além disso, como deixa o chão da calçada constatemente molhado, espanta também possíveis moradores de rua que queiram tirar uma soneca por lá.

3) Bancos de praça devem receber estruturas que os separem em três assentos independentes. Apesar disso impossibilitar a vida de casais apaixonados ou de reencontros de amigos distantes, fará com que sem-teto não durmam nesses aparelhos públicos.

4) Em regiões com alta incidência de seres indesejáveis, recomenda-se o avanço de grades e muros para além do limite registrado na prefeitura, diminuindo ao máximo o tamanho da calçada. Como é uma questão de segurança, o fiscal pode “se fazer entender” da importância de manter a estrutura como está.

5) Cloro deve ser lançado nos locais de permanência de sem-teto, principalmente nas noites frias, para garantir que eles não façam suas necessidades básicas no local. Caso não seja suficiente, talvez seja necessária a utilização de produtos químicos mais fortes vendidos em lojas do ramo, como vem fazendo algumas lojas no Centro da cidade. A sugestão é o uso de um aspersor conforme o item 2.2, mas instalado no chão.

Já que não se encontra solução para um problema, encobre-se. É mais fácil que implantar políticas de moradia eficazes – como uma reforma urbana que pegue as centenas de milhares de imóveis fechados para especulação e destine a quem não tem nada. Ou repensar a política pública para usuários de drogas, hoje baseada em um tripé de punição, preconceito e exclusão e, portanto, ineficaz.

Muitos vêem os dependentes químicos como lixo da sociedade e estorvo ao invés de entender que lá há um problema de saúde pública. As obras que estão revitalizando (sic) a região chamada de Cracolândia, têm expulsado os moradores da região – para outros locais, como a Barra Funda e Santa Cecília. Contanto que fiquem longe dos concertos da Sala São Paulo, do acervo do Museu da Língua Portuguesa e das exposições Estação Pinacoteca uó-te-mo.

Melhor tirar da vista do que aceitar que, se há pessoas que querem viver no espaço público por algum motivo, elas têm direito a isso. A cidade também é deles, por mais que doa ao senso estético ou moral de alguém. Ou crie pânico para quem acha que isso é uma afronta à segurança pública e aos bons costumes. Em vez disso, são enxotados ou mortos a pauladas (sem que ninguém nunca seja punido por isso) para limpar a urbe para os cidadãos de bem.

PS: Recado à turma que entalou um “tá com dó leva para casa” na garganta: cresçam.

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O primeiro encontro dos blogueiros do Paraná

Reproduzo matéria publicada no sítio oficial dos blogueiros do Paraná:

O I Encontro Estadual de Blogueiros Progressistas do Paraná é uma conseqüência direta da participação de blogueiros paranaenses no I Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, que aconteceu entre os dias 20 e 22 de Agosto p.p., em São Paulo (SP), e uma ação preparatória para o Segundo Encontro Nacional, a realizar-se em maio de 2011.

Naquela oportunidade, criou-se o comitê para organizar o I Encontro Estadual de Blogueiros Progressistas no Paraná (I EEBP-PR).

Este evento está marcado para ocorrer na Sede Campestre do Sindijus, em Curitiba, nos dias 26, 27 e 28 de novembro de 2010, em Curitiba.

O tema do primeiro encontro será: “A cidadania ativa na Internet: o caráter revolucionário dos blogs. O desafio do Paraná”.

O encontro estadual terá como objetivos disseminar o fenômeno dos blogs no Paraná e ampliar o número de agentes ativos na blogosfera como forma de aprofundar o conteúdo de cidadania da internet.

Além do I EEBP-PR, ficou definido que sindicatos e partidos políticos progressistas serão convidados para fazer parte do “Movimento Paranaense pelo Direito à Comunicação” – organizado pela recém-criada Associação, como resposta à perseguição à mídia livre e independente e aos blogueiros progressistas, em especial, ao jornalista Esmael Morais, que foi eleito diretor da entidade.

Na mesma direção, a diretoria provisória realizou no dia 21/10/2010, na sede do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná (Sindijor), na capital paranaense, o “Ato em Defesa da Liberdade de Expressão e da Mídia Alternativa”, em respeito ao artigo 220 da Constituição Federal.

Esse ato foi muito concorrido, contando com a presença de mais de 50 pessoas, entre as quais vários representantes da sociedade civil, entidades estudantís e sindicais.

A diretoria provisória da Associação dos Blogueiros Progressistas do Paraná é a responsável por realizar as primeiras eleições da entidade e está assim definida:

Presidente: Sérgio Luís Bertoni (www.tie-brasil.org)

Vice-Presidente: Mário Candido de Oliveira (www.porumparanamelhor.com/mariocandido)

Secretário Geral: Ivo Augusto de Abreu Pugnaloni
(www.porumparanamelhor.com/mariocandido)

Diretora de Finanças: Nelba Maria Nycz de Lima (http://midiacrucis.wordpress.com)

Diretor de TI: Walter Koscianski (www.engajarte-blog.blogspot.com)

Diretor de Comunicação: Edson Osvaldo Melo (http://blogdoedsonmelo.blogspot.com)

Diretor Jurídico: a definir

Diretor de Mobilização: Esmael de Morais (www.esmaelmorais.com.br)

Conselho Fiscal: Paulo Afonso Nietsche (www.naluta.net), Robson Jamaica (http://protesto-jamaica.zip.net/)

O blog oficial da ABPP é o www.paranablogs.wordpress.com.

Programação do I Encontro Estadual de Blogueiros Progressistas:

26/11/2010
Sexta-Feira

19:00 - Abertura Festiva

19:45 – I Festival de Blogo-violeiros do Paraná

27/11/2010

Sábado – Exposição dos Temas
08:30 hs Liberdade de Expressão e Internet
Campanha Eleitoral de 2010 e a Manipulação via TV, Rádio . Jornais e Internet

10:00hs A internet, a cidadania e Mov Sociais
A experiência de entidades sindicais com internet

12:00 hs Almoço
13:30 hs Papel dos Blogs, Twitter e outras
O risco da censura jurídica, tecnológica e regulatória da Internet
Palestrante: Associação de Blogueiros Progressista do Paraná

15:00 hs Estratégias de formação de cidadãos ativos
e conectados na internet – Sistemas de formação de quadros para o movimento social
Palestrante: Associação de Blogueiros Progressista do Paraná

17:00 hs Conteúdo prioritário para os Blogs:
O papel da Narrativa, da Pesquisa, da Informação e da Opinião

19:00 hs Janta

28/11/2010 Domingo Grupos por Tema

08:30 – Inicio Discussão nos Grupos

12:00 Almoço

13:30 Plenária Aprovação dos Relatórios

16:00 Encerramento

16:30 Reuniões por Região

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A imprensa se faz de vítima

Reproduzo artigo de Luciano Martins Costa, publicado no Observatório da Imprensa:

Mal ou bem, o noticiário sobre eventos para discutir a liberdade de imprensa começa a oferecer algo mais do que os repetitivos e mal fundamentados alertas sobre o risco de volta da censura no Brasil.

Tanto as reportagens a respeito do encerramento da 66ª Assembléia Geral da Sociedade Interamericana de Imprensa, que se realizou na cidade de Mérida, no México, quanto o seminário sobre o futuro das mídias, que se inicia na terça-feira (9/11) por iniciativa do governo, em Brasília, estão trazendo um pouco mais de informação sobre um tema que a imprensa brasileira tradicional tem mantido, propositadamente, na obscuridade.

Vejamos, primeiro, o que nos trazem os jornais sobre a assembléia da SIP. A entidade, que congrega mais de 1.300 empresas privadas de comunicação nas Américas, tem conflitos permanentes com o governo em alguns países – cuja natureza varia conforme o país – mas trata a todos esses governos como inimigos das liberdades civis.

Ao mesclar propositalmente as situações da Venezuela e do Brasil, por exemplo, e acusar genericamente outros países de promover a "bolivarização" das comunicações, a imprensa desinforma, confunde e atenta contra os interesses da sociedade cujos direitos diz defender.

Noticiário manipulado

Conforme observa o Estado de S.Paulo, ainda antes de encerrar-se o encontro no México representantes de governos criticados pelas empresas de comunicação faziam reparos aos documentos apresentados durante o congresso. O porta-voz do governo da Bolívia, por exemplo, comentou que "os membros da SIP, que no passado atuaram apoiando até mesmo ditaduras, estão equivocados".

O chanceler do Equador também se manifestou, recomendando que a imprensa de seu país faça a lição básica do jornalismo, de tentar se colocar do outro lado, para sentir a pressão e a manipulação enviesada da informação cometida pela imprensa contra o governo.

A choradeira da mídia, que no Brasil não tem qualquer justificativa, acaba por abrir espaço para algum esclarecimento no noticiário que, embora ainda manipulado, permite ao público tomar conhecimento de que, aqui como em outros países do continente, a imprensa não é simplesmente vítima de ditadores, mas protagonista ativa do jogo político.

Novas alternativas

Para uma abordagem jornalística do problema das relações da imprensa latino-americana com o poder público, é preciso recuar alguns anos e recordar que, no país onde esse conflito chegou ao grau máximo, a Venezuela, tudo começou com uma tentativa de golpe de Estado liderada por donos de empresas de comunicação.

Em alguns outros países, como a Bolívia, houve uma reação preconceituosa de empresários de origem hispânica à eleição de um governante de origem indígena, e parte da imprensa andou estimulando até mesmo aventuras separatistas.

No Brasil, a adesão da imprensa mais poderosa a um grupo político específico é oficial e contamina o jornalismo.

Na maior parte desses casos, ficou clara a dificuldade da mídia tradicional de lidar com contrariedades na escolha democrática dos eleitores e na execução de políticas diversas daquelas que historicamente eram produzidas por governantes aliados ou controlados pelas empresas de comunicação.

A partir do estabelecimento desse viés a priori, pode-se afirmar que quase tudo que se publica vem contaminado por esse desvio no caráter da imprensa.

Ao lado desse fenômeno deve-se observar que o rápido desenvolvimento das novas tecnologias de comunicação e informação oferece ao público alternativas mais abertas, retirando do círculo de influência da mídia até então predominante vastas porções da sociedade.

Só o jornalismo salva a imprensa

Quando se fala do público que consome informações através do jornalismo, já não se pode restringi-lo ao conceito de leitor de jornais ou revistas. De posse de uma informação, o cidadão pode rapidamente se transformar em protagonista do processo comunicacional, reproduzindo uma notícia por meio de seu aparelho eletrônico, acrescentando seu próprio comentário – que eventualmente corrige, completa, contradiz ou desmente a notícia original.

Portanto, o poder de influência da imprensa tradicional sobre a sociedade reduz-se gradualmente e tende a se concentrar sobre as instituições.

Nessa circunstância, não é partindo para o confronto e fazendo denúncias sobre ameaças que não existem que as empresas de comunicação vão recuperar alguma reputação. O que pode ajudar a imprensa não é a ação política direta ou diversionista – é apenas o jornalismo de qualidade.

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Franklin Martins defende regulamentação

Reproduzo matéria de Jacson Segundo, publicada no Observatório do Direito à Comunicação:

A futura presidente do Brasil, Dilma Rousseff, e os próximos deputados e senadores terão sob suas responsabilidades uma oportunidade ímpar de tornar o sistema de comunicação brasileiro mais democrático e plural. No primeiro dia de trabalho, cada um deles terá à disposição uma proposta de anteprojeto de lei geral para área, preparada por uma comissão interministerial criada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em julho deste ano.

Para não criar alarde em cima das propostas que estão sendo construídas, os membros do governo praticamente não têm falado sobre o assunto. Em entrevista coletiva concedida nesta segunda-feira (8) pelo ministro chefe da Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins, não foi diferente. No entanto, ele deu sinalizações importantes do que está sendo pensado pela comissão governamental, coordenada pela Casa Civil.

O ministro garantiu que no anteprojeto estarão presentes propostas de regulamentação de artigos do capítulo da Comunicação Social da Constituição que “há 22 anos dormem em algum canto”. É o que acontece, por exemplo, com os artigos 220, 221 e 223. O primeiro garante a liberdade de expressão e proíbe a formação de oligopólios e monopólios, o segundo dita princípios a serem seguidos pelos veículos (como promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação) e o terceiro, entre outras definições, diz que os sistemas privado, público e estatal de mídia devem ser complementares.

O desinteresse histórico dos governos e do Congresso em regulamentar tais artigos fez com que a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e Federação dos Radialistas (Fitert) entrassem com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) no Supremo Tribunal Federal (STF), em 20 de outubro deste ano, para que a Justiça obrigasse o legislativo a regulamentá-los.

A ministra Ellen Gracie entendeu que as entidades sindicais não poderiam apresentar tal pedido e arquivou a Ação. No entanto, Fábio Konder Comparato e Georghio Tomelin, advogados proponentes do recurso judicial, recorreram da decisão, e a ministra encaminhou a ADO para a Procuradoria Geral da República para que emita sua opinião sobre a procedência do agravo regimental solicitado pelos advogados.

O ministro Franklin Martins também reforçou que o anteprojeto vai se basear em princípios como a pluralidade, a neutralidade, o estímulo à competição à inovação e a proteção da cultura nacional e regional. A maioria, inclusive, já presente na Constituição Federal.

Outra preocupação evidente da comissão que elabora o anteprojeto é com uma regulação mais efetiva sobre o papel de cada agente econômico em um mercado em que as mídias e os serviços estão cada vez mais convergentes. O ministro Franklin lembrou a discrepância que há entre o setor de telecomunicações e o de radiodifusão em termos de faturamento. No ano passado, o primeiro faturou R$ 13 bilhões, e o segundo, R$ 180 bilhões. “Ou a gente regula para frente ou as teles passam por cima da radiodifusão”, disse.

O governo já havia frisado que o anteprojeto está sendo construído tomando em consideração as propostas aprovadas na Conferência Nacional de Comunicação. No entanto, algumas organizações da sociedade civil têm reivindicado maior participação na construção da proposta de revisão do marco legal. O governo, por sua vez, diz que neste primeiro momento a intenção é criar consensos internos sobre a proposta. Caberá a presidente Dilma decidir o encaminhamento do anteprojeto. Se vai ou não fazer uma consulta pública sobre ele, por exemplo.

Liberdade de imprensa

Na coletiva, o ministro também emitiu opinião sobre temas que estão sendo pautados por alguns veículos. Ele afirmou, por exemplo, que, se um conselho de comunicação for criado para censurar a mídia, o governo deve ser contra. No entanto, “se o conselho for para debater a mídia, qual é o problema?”, indagou Martins, lembrando que tal órgão existe em outras áreas.

Perguntado sobre se o governo não estaria com a intenção de cercear a mídia, o ministro foi enfático em afirmar que a imprensa é livre no país e que ela não está acima das críticas. Fez questão também de resgatar sua trajetória de vida. “Não apoiei a ditadura em momento algum”, respondeu ele à repórter do jornal O Globo.

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Mapa eleitoral identifica a direita

Reproduzo artigo de Marcos Coimbra, intitulado "Os tons do azul", publicado na revista CartaCapital:

Quase toda a imprensa usou mapas coloridos nas representações dos resultados da eleição presidencial. E, por razões evidentes, foi consenso pintar de vermelho os estados onde Dilma Rousseff ganhou e de azul aqueles em que José Serra se saiu melhor.

É um procedimento que ajuda a visualizar o que aconteceu, mas que leva a diversos equívocos. O mais grave é dar a impressão de que fomos “dois Brasis” na eleição: na metade- de baixo (Sul, Sudeste e Centro-Oeste), predominando o azul e, na de cima (Nordeste e Norte), o vermelho.

Como todo mundo sabe que a parte azul é mais rica e moderna e a vermelha mais pobre e atrasada, a impressão provocada por mapas desse tipo é de que o Brasil desenvolvido foi derrotado pelo subdesenvolvido. Se dependesse do primeiro, Serra seria o presidente. Inversamente, dos mapas emerge a conclusão de que Dilma venceu à custa da pobreza.

Mas é possível ir adiante nessa cartografia, buscando os matizes de cada cor. Por meio deles podemos identificar os nichos mais típicos de cada candidato, os lugares onde o azul é mais azul e o vermelho mais vermelho. É neles que o serrismo e o dilmismo atingiram seu auge e sua essência ficou mais clara.

Os da presidente eleita são fáceis de antecipar: Dilma alcançou seu máximo nos bolsões de extrema pobreza do interior do Nordeste. Lá, onde o Bolsa Família cobre quase toda a população, ela ultrapassou 90% dos votos, esmagando o adversário.

Que bela e convincente maneira de demonstrar que, quanto maior a pobreza, maior a derrota de Serra, maior a vitória do “paternalismo” sobre a “modernidade”, do analfabeto sobre o educado. O que deixa o quadro menos arrumado e complica a versão fácil que empolga os setores conservadores é que o serrismo tem uma geografia que desafia essa explicação. Pois, se o vermelho se acentua de forma previsível, o azul fica mais carregado em lugares inesperados. Em outras palavras, o voto Serra chegou ao ápice em municípios e regiões que de modernos e educados não têm nada.

São várias as explicações para o fato de o Acre ter sido o paraíso do serrismo. Não foi em São Paulo, onde ninguém estranharia que vencesse por larga margem, nem nas partes mais tradicionais do País que ele teve sua melhor performance. Foi lá, longe do “Sul Maravilha”, que Serra obteve mais que o dobro dos votos da petista, venceu em todos os municípios (salvo em Feijó) e está o município mais serrista do Brasil, Porto Acre, cidade miserável e de baixos níveis de escolaridade, onde suplantou Dilma por uma vantagem amazônica.

A versão mais corrente é que o petismo acriano seria responsável pela catástrofe. Depois de 12 anos no poder, o eleitorado teria mostrado, pelo voto em Serra, sua insatisfação com os irmãos Viana e seu grupo. Hipotéticas evidências são arroladas para sustentar a tese, desde desgastes com o funcionalismo público estadual a críticas ao modo como dialogam com a mídia.

O problema desse raciocínio é que tanto Tião Viana se elegeu governador quanto Jorge Viana senador. Ou seja, os acrianos teriam se comportado de maneira totalmente esdrúxula: para protestar contra os dois, os elegeram, mas derrotaram a candidata a presidente que apoiavam. Não seria muito mais lógico impedir que continuassem a administrar o estado?

Para complicar o “mistério acriano” e colocar sob suspeita as explicações localistas, Marina Silva também perdeu para Serra, apesar de “filha da terra”. E, em outros estados do “corredor do agronegócio”, houve vários resultados que sugerem que a avaliação de quem apoiava Dilma não teve efeito no voto que ela recebeu. Blairo Maggi, por exemplo, foi um dos campeões de voto para o Senado, elegeu seu candidato ao governo do Mato Grosso, mas viu Dilma perder.

Não foram fatos locais que explicaram o que aconteceu no Acre e nos demais estados vencidos pelo tucano. Também não foi uma oposição “Brasil moderno” vs. “Brasil arcaico”, como ilustram amplamente os casos do Acre e de Porto Acre. Não foi a educação que deu votos a Serra e a ignorância a Dilma.

Serra venceu onde venceu por fatores ideológicos (exceção de São Paulo, onde o bairrismo teve influência). Não foi um voto explicado pela sociologia (ou a geografia), mas pela política.

No Brasil inteiro, foi basicamente o eleitor antipetista, em muitos casos anticonservacionista, anti-indigenista e “antimovimentos sociais”, a favor da “agenda moral” e dos “valores tradicionais” que votou em Serra. Foi o eleitor de direita. No Sul e no Centro-Oeste, chegando ao Acre e a Roraima, ele era maioria, ainda que pequena. Por isso, Serra venceu nessas regiões. E perdeu no País, onde esse voto é minoria.

O predomínio do voto de direita no Acre é algo que merece estudo. Mas o certo é que Tião e Jorge Viana estão de parabéns pela vitória que tiveram em um estado que se inclinou tanto nessa direção. Sua votação mostra que, apesar disso, o eleitorado do Acre reconhece o trabalho que fizeram em benefício do estado.

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Livro sobre "trabalho indecente" de jovens

Reproduzo matéria enviada por Reiko Miura, da Fundação Perseu Abramo:

O mundo do trabalho é, frequentemente, alvo de investigações acadêmicas ou de esforços descritivos que buscam compreendê-lo melhor, nas particularidades de cada momento histórico, e assim, instrumentalizar a militância sindical para os embates da luta de classes.

Neste início de século 21, um elemento fundamental do mundo do trabalho é a questão da juventude - seja pela necessidade de trabalhar e suas nuances, seja pela ausência de trabalho ou sua precarização. Para contribuir com esse debate, o sociólogo Anderson Campos, especialista em Economia do Trabalho e Sindicalismo pelo Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho, da Unicamp e assessor político da CUT, lança o livro "Juventude e ação sindical: Crítica ao trabalho indecente", buscando problematizar de que forma se dá a inserção dos jovens no mercado de trabalho e os impactos dessa presença para a luta por "trabalho decente", bandeira do movimento sindical em defesa de direitos trabalhistas e contra a flexibilização, precarização e informalização do trabalho.

Prefaciado pelo economista Márcio Pochmann, presidente do Ipea (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), o livro aborda temas atuais como a questão do estágio, as políticas públicas de proteção social da juventude e a sindicalização de trabalhadores/as dessa faixa etária. "O assunto sindical também se torna estratégico para uma massa juvenil que envolve cerca de 50 milhões de brasileiros", afirma Pochmann.

Artur Henrique, presidente nacional da CUT, destaca que "a baixa estruturação do mercado de trabalho brasileiro afeta mais fortemente os jovens, que na média, tem uma inserção precária, instável e insegura; e talvez o mais grave dessa inserção precária no presente, seja o futuro".

De acordo com o autor, a intenção do trabalho é buscar uma ação sindical de jovens integrada à agenda do sindicalismo combativo, e ao mesmo tempo, que essa ação possibilite a renovação da mesma agenda.

* Lançamento em São Paulo será no dia 23/11 às 19h, no Clube da Cana. Rua Barão de Tatuí, 272, Santa Cecília.

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Um retrato da desigualdade no Chile

Reproduzo artigo de Andrés Figueroa Cornejo, da Argenpress.info, publicado no sítio Carta Maior:

Enquanto Sebastián Piñera aproveita os últimos créditos político-midiáticos do espetacular resgate dos 33 mineiros da mina San José, Também em Copiapó, no dia 8 de novembro, Homero Aguirre e Daniel Lazcano, trabalhadores da mina de cobre Los Reyes, morreram em um novo acidente de trabalho. A exploração pertence à empresa Sociedad Legal Compañía Minera Del Sur.

Quando centenas de desempregados, dos milhares que ficaram na rua por ocasião do abrupto corte dos empregos emergenciais em Concepção - numa situação crítica logo após o terremoto e o maremoto de fevereiro de 2010 -, viajaram a Santiago e depois a Valparaíso para exigir a reabertura dos trabalhos emergenciais, o presidente Piñera anunciou as vigas mestras de sua agenda de governo batizada com pompa "Chile País Desenvolvido: Mais Oportunidades e Melhores Empregos". A fórmula piñerista simplesmente é uma extensão ampliada das políticas dos últimos governos da Concertação: aumentar o investimento no país, incentivos tributários para o reinvestimentos de pequenas e médias empresas e incentivo ao turismo.

A fantasia publicitária de converter o Chile em um país desenvolvido sobre pilares que intensificam a abertura econômica e o investimento transnacional sem travas nem impostos significativos só tornam o Chile mais dependente dos preços do cobre. Não é estranho que entre janeiro e outubro de 2010, o governo tenha autorizado um investimento histórico de capitais de mega corporações estrangeiras que chegou a 13,275 bilhões de dólares (mais de 200% em relação ao mesmo período de 2009), distribuídos assim: 83% para a exploração de cobre; 9,1% para serviços; 4% para os setores de eletricidade, gás e água; e 3,4% para comunicações.

Os preços do cobre estão em níveis extraordinariamente altos (como todas as matérias primas do continente) em função da demanda asiática, em especial da China. Isso, como já ocorreu em outros períodos, torna a economia chilena muito sensível ao destino das potências que hegemonizam o planeta. Neste contexto, aprofunda-se o perfil primário extrativista do país. Esses capitais estrangeiros migram segundo seu próprio capricho e de acordo com variáveis incontroláveis pelo Estado chileno. Além disso, geram pouco trabalho. Ou seja, se incrementa a natureza rentista do padrão de acumulação capitalista da classe no poder e se posterga a industrialização e a diversificação necessária ao país para impulsionar um projeto nacional e integral de desenvolvimento.

A classe dominante só persegue o lucro rápido e no curto prazo, hipotecando as bases genuínas de um país a caminho de um desenvolvimento democrático, alimentando uma estrutura econômica deformada, contra toda ideia de soberania, dramaticamente subordinada ao capital das economias centrais cujos objetivos estão muito longe de ser o bem estar e os interesses das maiorias nacionais.

Assim mesmo, com um desemprego estrutural "oficial" beirando os 10%, a simplificação na criação de microempresas - que, na maioria dos casos, são negócios familiares - é uma maneira desesperada de multiplicar o trabalho precário por conta própria em função da ausência de trabalho formal para absorver a força de trabalho desempregada. Aquelas pequenas e médias empresas que se dedicam a atividades produtivas, além disso, estão condenadas a vender seus produtos aos preços impostos por um mercado cada vez mais concentrado (a cadeia de supermercados Wal-Mart, que se chama Líder no Chile, é paradigmática neste sentido), com o agravante de ter que competir com mercadorias asiáticas cuja importação é livre.

E quando Piñera fala de "modernização do Estado", ele se refere simplesmente ao seu encolhimento, com o subsequente aumento do desemprego e menor fiscalização em todos os âmbitos. De fato, espera-se numerosas demissões para o final de novembro, no marco de uma dura negociação coletiva com os sindicatos do setor público que pedem um aumento salarial de 8,9%, sendo que, até agora, o governo só ofereceu um escasso 3,7% nominal.

A acumulação capitalista por meio do saqueio dos recursos naturais desta vez tem seu ponto duro no território do Lago Neltume, cujas comunidades mapuche resistem à construção do túnel de prospecção para a Central Neltume, propriedade da transnacional Endesa-Enel. Os mapuche denunciaram que a "Endesa-Enel invadiu nosso território, retirando-nos a água, apropriando-se dos direitos de aproveitamento contínuo dos bens de vários riachos que pertencem a famílias de nossa comunidade".

Entre as maldições da prospecção está o fato de que a companhia "nos deixará sem nossas ervas medicinais ao elevar o caudal do lago Neltume, ervas que usamos desde tempos ancestrais e que, sem as quais, morreremos". Os mapuche dizem ainda que a Endesa-Enel "deve compreender que os seres humanos não são donos da natureza, mas sim parte dela, e que o dinheiro e o lucro não podem ficar acima dos direitos coletivos dos povos".

Os trabalhadores da terceira corporação de cobre privada que explora o mineral no país, Doña Inés de Collahuasi, estão em greve desde o dia 5 de novembro. A 4.500 metros de altura na região norte, o presidente do sindicato, Manuel Muñoz informou que a companhia, em 2010, terá investimentos de 3 bilhões de dólares, enquanto os trabalhadores estão exigindo 50 milhões de dólares em três anos, somando todas as suas demandas.

Em outro setor, os trabalhadores da construção civil que edificam o Hospital de Puerto Montt, no sul do Chile, cujas empresas selecionadas para a obra são Besalco, Moller y Pérez Cotapos, associadas no Consórcio Hospital de Puerto Montt, mobilizaram-se contra as más condições de segurança e higiene no interior de uma obra estatal. Os operários agrupados na Federação de Trabalhadores da Construção (Fetracoma), foram desalojados da obra com extrema violência por Forças Especiais de Carabineiros, com a anuência do governador da zona, Francisco Muñoz, da secretária regional do Ministério da Saúde, Mônica Winkler, e da secretária do Trabalho, Andrea Rosmanich, que conheciam perfeitamente as péssimas condições de trabalho na construção. 23 trabalhadores e dirigentes sindicais foram detidos pela polícia.

Segundo a Pesquisa de Caracterização Socio-Econômica 2009 (Casen), realizada pelo Ministério do Planejamento a cada 3 anos, o Chile é hoje mais pobre que em 2006. De acordo com os dados oficiais, em 2006 a pobreza alcançava 13,7% da população nacional, enquanto hoje esse índice é de 15,1%. Por regiões, a pesquisa aponta como líderes do ranking da miséria a região de La Araucanía, com 27,1%, a de Bio Bío, com 21%, a de Maule, com 20,8%, a de Los Ríos, com 20,4%, Atacama, com 17,4% e Coquimbo com 16,6%. As mulheres são mais pobres do que os homens (15,7% x 14,5%); e a população originária (indígena) mais pobre que a mestiça (19,9% x 14,8%).

Agora vem o importante. O corte ou linha de pobreza fixado pelo Estado é de 64 mil pesos por mês (128 dólares) para os que vivem nas cidades e de 43 mil pesos mensais (86 dólares) para os que vivem em zonas rurais. Ou seja, se no momento da realização da pesquisa a pessoa obtém um peso a mais que os mínimos assinalados, para efeitos estatísticos já não é mais considerada pobre. E a linha de pobreza é fabricada mediante uma misteriosa cesta "básica de alimentos por pessoa cujo conteúdo calórico e proteico permita satisfazer um nível mínimo de exigências nutricionais". Isto é, um conjunto de produtos alimentícios - cuja qualidade e origem não interessa - que um ser humano precisa para não desfalecer de inanição.

E mais. Com uma suposição fundada no cinismo mais abjeto, o informe da Casen indica que "se assume que os lares que conseguem cobrir adequadamente suas necessidades de alimentação satisfazem, ao mesmo tempo, os padrões mínimos das outras necessidades básicas". Por que se supõe que alguém que mal tem recursos para comer conta com recursos para ter acesso aos serviços básicos (moradia, eletricidade, água, gás telefone), à saúde, à educação, à seguridade social, à recreação, a um emprego estável e a um larguíssimo etcétera?

Que ciência apóia essa hipótese?

O Estado fixa a linha de pobreza em 64 mil pesos, em um Chile onde duas viagens no transporte público custam mil pesos, um quilo de pão outros mil pesos, uma mensalidade universitária mais de 200 mil pesos em média e o aluguel de uma habitação ou quarto com banho compartilhado custa entre 60 e 80 mil pesos/mês. Quantos chilenos ganham com seu trabalho – considerando um desemprego estrutural que não sai de 8 a 10% - menos de 350 mil pesos (700 dólares). Cerca de 70 ou 80% da população?

Resulta óbvio que a pobreza ou o empobrecimento da população do país é muito maior que 15,1%, e que esse número não é mais que um indicador colocado na vitrine para as agências avaliadoras de risco multinacionais que orientam o grande capital investidor para benefício de uma minoria rentista e grande proprietária.

Em um micro-ônibus da Transantiago havia um aviso fixado por algum usuário que dizia: "Se pago a passagem, não como". Essa é uma verdade do tamanho do sol em um pequeno país cujo PIB cresce a cerca de 6%, ao custo da mais dura desigualdade social, concentração econômica e exploração sem limite nem regulação alguma de seres humanos e natureza.

Tradução: Katarina Peixoto

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Ipea debate o desenvolvimento nacional

Reproduzo entrevista concedida ao jornalista Umberto Martins, publicada no sítio Vermelho:

Cerca de 2 mil pessoas já estavam inscritas para a 1ª Conferência do Desenvolvimento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) até quinta-feira (11). O evento será realizado na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, dias 24 a 26. Reunirá economistas como Maria da Conceição Tavares, autoridades, dirigentes das centrais sindicais e dos movimentos sociais. O economista Renaut Michel, diretor adjunto de Estudos Macroeconômicos do Ipea, falou ao Vermelho sobre o tema. Leia abaixo:

Quais os objetivos da conferência?

Em primeiro lugar, o Ipea pretende promover um grande debate nacional sobre desenvolvimento, envolvendo não só acadêmicos, mas a sociedade como um todo. O tema, considerado central nos anos 1950 a 1980, foi relegado ao esquecimento durante os anos 1990 e, mais tarde, retornou com força em toda a América Latina, sendo incorporado como o norte dos trabalhos do Ipea. Nossa grande expectativa é colocar na agenda brasileira as questões centrais associadas ao desenvolvimento, ao projeto de nação.

Qual a razão do esquecimento?

Vejo dois motivos, um deles ideológico, que foi o arcabouço teórico hegemônico nos anos 1990 hostil às ideias desenvolvimentistas. Outro é o pensamento que não vê a necessidade da participação do Estado no desenvolvimento econômico e advoga que a economia deve ser abandonada do livre jogo do mercado. O resultado das políticas fundadas nessas concepções foi medíocre e esta é também uma das razões pela qual o debate sobre desenvolvimento voltou à ordem do dia.

Ao convidar representantes das centrais e dos movimentos sociais para algumas mesas, a intenção do Ipea é ampliar o debate sobre o tema?

Com efeito, a questão do desenvolvimento ultrapassa a esfera acadêmica e até a esfera exclusivamente econômica. Temos a dimensão ambiental e social do desenvolvimento, a infra-estrutura, os problemas urbanos, a inserção internacional. Enfim, é uma questão multidisciplinar.

As centrais sindicais lutam, hoje, pela redução da jornada e concebem a valorização do trabalho como uma fonte de desenvolvimento, ao contrário do pensamento dominante, que aposta sempre na redução de custos trabalhistas. Qual sua opinião a este respeito?

Não tenho dúvidas de que o debate sobre o mundo do trabalho é central. As centrais sindicais têm um papel muito importante no debate e na definição de uma agenda desenvolvimentista. 2010 foi um ano interessante neste sentido, uma vez que foram registrados recordes mensais sucessivos na geração de empregos formais.

O comportamento do mercado de trabalho foi muito positivo, contribuindo para a ampliação da renda e do consumo. A política de valorização do salário mínimo também foi fundamental para aquecer a demanda doméstica, ao lado das políticas sociais do governo Lula. Considero importante a redução da jornada de trabalho para avançar no sentido de uma melhor distribuição funcional da renda, dada pela sua divisão entre capital e trabalho. Isto melhorou ligeiramente, mas é preciso avançar mais.

Hoje, o capital se apropria de cerca de 60% do PIB enquanto o trabalho participa com 40%, a relação anos atrás era de 62% contra 38%. Precisamos avançar mais e a redução da jornada, sem redução de salários, é um passo significativo nesta direção.

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Da polarização à politização da sociedade

Reproduzo artigo de Igor Felippe Santos:

A eleição de Dilma Rousseff (PT) é uma vitória da sociedade brasileira. E não temos que ter vergonha de comemorar a derrota de José Serra (PSDB), que se tornou símbolo dos setores que se opõem às bandeiras progressistas no país.

A mídia burguesa, os setores conservadores da igreja católica e evangélica, os ruralistas mais truculentos e o imperialismo dos Estados Unidos perderam uma batalha importante com a derrota de Serra.

O tucano fez uma campanha fratricida, lançando mão de boatos, mentiras e ataques aos movimentos sociais (especialmente ao MST), com um corte de extrema-direita, para fazer terrorismo eleitoral. A imagem das mulheres grávidas no horário político de Serra demonstra sua opção pelo chamado “vale tudo”, inclusive jogar sua biografia no lixo.

Por debaixo dos panos, sem a coragem de debater publicamente, a campanha tucana satanizou a descriminalização do aborto e o casamento civil entre homossexuais, que já foram aprovados em países mais avançados. Com isso, os tucanos caíram no colo da Tradição, Família e Propriedade (TFP) e da Opus Dei.

O clima criado pela campanha de Serra, tanto a oficial como a das sombras, causou uma polarização eleitoral, que obrigou os setores mais importantes da sociedade a tomarem partido. Organizações da sociedade civil, entidades de classe, intelectuais, artistas, estudantes, médicos, profissionais liberais, igrejas e a mídia (desde as televisões, passando pelos jornais, até chegar à internet) tiveram que fazer uma opção entre Dilma e Serra. E aqueles que se omitiram, pagarão o preço de ver o trem da história passar nos próximos quatro anos.

Como o embate eleitoral teve um nível muito baixo, essa polarização não girou em torno de projetos políticos antagônicos para o Brasil, mas na capacidade dos candidatos de continuarem as linhas gerais do governo Lula. De qualquer forma, dois campos políticos se expressaram de forma clara nessas eleições, contraponto o setor progressista e conservador. Em 2006, por exemplo, o quadro político não ficou tão claro.

Nesse quadro, o grande desafio dos setores progressistas é manter a coesão desse bloco construído em torno de Dilma e politizar as disputas políticas que virão, em torno do programa democrático-popular. Assim, a partir desta eleição, esse campo poderá fazer pressão por mudanças estruturais necessárias para a sociedade brasileira, que garantam educação, saúde, moradia, saneamento básico e terra para os brasileiros.

Embora as políticas públicas nessas áreas sejam muito importantes, não terão forças para solucionar os principais problemas que essa geração do povo brasileiro enfrenta no seu dia a dia. Os direitos sociais da população só estarão garantidos com reformas estruturais, que implicam enfrentar os interesses da classe dominante brasileira e internacional, que quer impor uma outra agenda ao país.

As forças do neoliberalismo, lideradas pelos bancos, capital financeiro, empresas transnacionais e os grandes meios de comunicação, farão o possível – e impossível, como mostraram na campanha – para impedir qualquer medida progressista do governo federal.

Não podemos ignorar, inclusive, que esses setores têm força e influência dentro da ampla coalizão de forças que venceu a eleição presidencial. Por isso, é fundamental a pressão da sociedade para enfrentar os interesses conservadores, inclusive dentro do que vier a ser o governo Dilma.

Os setores progressistas venceram uma batalha importante com a vitória de Dilma, mas a luta continua, será intensa e dependerá da participação de toda a sociedade brasileira, que precisa se posicionar em relação a cada disputa, enfrentando os interesses dos poderosos para garantir transformações sociais para resolver os problemas do povo brasileiro.

* Igor Felippe Santos é jornalista, editor da Página do MST, integrante da Rede de Comunicadores pela Reforma Agrária e do Centro de Estudos Barão de Itararé.

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