segunda-feira, 24 de maio de 2010

EUA vão fechar a embaixada no Brasil?

Reproduzo o engraçadíssimo texto de João Peres, publicado no blog Nota de Rodapé. Não deixe de ler a nota de esclarecimento ao final do artigo:

A Casa Branca comunicou nesta quinta-feira, 20, que irá fechar a sua representação diplomática no Brasil. A medida foi adotada durante reunião de mais de três horas entre a chefe do Departamento de Estado, Hillary Clinton, e o embaixador no Brasil, Thomas Shannon.

O encontro, segundo a reportagem apurou, ocorreu sob forte tensão e com acusações de Hillary a Shannon. Hillary teria chegado a dizer que Shannon se comportou feito “uma mocinha comunista” durante a negociação do acordo na área nuclear entre Brasil, Irã e Turquia. “Você não é um patriota. A América (sic) paga seu salário para ficar aí, no meio dessa horda de subdesenvolvidos, sem fazer nada”, teria afirmado a dama-de-ferro durante o encontro em Washington.

Shannon, na saída da reunião, confirmou o fechamento da embaixada e dos consulados dos Estados Unidos em território brasileiro e ressaltou que o acordo Brasil-Irã teve papel fundamental na decisão, mas negou que tenha sido ríspido o tom da conversa com Hillary.

A conclusão, segundo disse o embaixador, é de que já não faz sentido ter representações diplomáticas em um país no qual os Estados Unidos estão amplamente representados. “Você viu como a Globo, a Folha e o Estadão se comportaram durante essa história do acordo? Afirmando que a proposta do Brasil nem era tudo isso e que o Irã é um baita mentiroso? Nem um comunicado do Departamento de Estado seria tão favorável aos interesses da Casa Branca. Logo, perdeu sentido que eu continue por aqui. Vou ter de procurar outro emprego. Pior que de editorialista não dá: o Brasil está cheio”, afirmou, claramente abatido, aos jornalistas presentes à saída do encontro.

Serviço

A partir de 1º de junho, os brasileiros que desejarem tirar passaporte ou gozar de qualquer outro serviço diplomático devem se dirigir aos seguintes lugares:

- Folha de S.Paulo;

- O Estado de S.Paulo;

- O Globo;

- Qualquer emissora da Rede Globo em território nacional.

João Peres é jornalista e colunista do Nota de Rodapé. Este texto é uma crônica, portanto, aos que acham que é verdadeira a notícia, a piada irônica teve o efeito desejado.

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Sorria! Você está sendo manipulado



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A “virada” do Datafolha: crime eleitoral?

A nova pesquisa do Datafolha, divulgada neste final de semana, não deve ter causado desarranjo apenas no comando da campanha demotucana. Ela criou graves desajustes na direção do próprio instituto, comandado pela famíglia Frias, que também é proprietária do jornal FSP (Folha Serra Presidente). Em abril, quando todos os outros institutos confirmavam o crescimento de Dilma Rousseff e o empate técnico com José Serra, o Data-da-Folha surpreendeu ao indicar o aumento da distancia – da boca do jacaré, no jargão do setor – entre o tucano e a petista (12 pontos).

Em cerca de um mês, aqueles doze pontos de diferença simplesmente sumiram – num verdadeiro “fenômeno sísmico”, segundo a ironia do blogueiro Paulo Henrique Amorim. Agora, segundo o suspeito instituto, os dois candidatos estão empatados em 37% – Serra despencou cinco pontos e Dilma subiu sete. Diante destes números “impressionantes”, o diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino, sacou uma desculpa risível. “O principal fato que pode ser apontado como responsável por essa alta da candidata é o programa partidário de TV que o PT apresentou recentemente”.

Desculpa esfarrapada e cinismo

Talvez temendo pelo seu emprego, Paulino evitou comentar possíveis “erros” – ou manipulações – na pesquisa anterior, tão favorável ao demotucano num momento crucial para consolidação dos apoios a sua candidatura. Na ocasião, vários especialistas em pesquisas denunciaram mudanças metodológicas que beneficiaram Serra – como a maior coleta de dados em bairros e cidades das elites brasileiras e sua redução nas regiões Norte e Nordeste. Encurralado, o Datafolha deflagrou uma guerra de baixarias contra os outros institutos para tentar salvar a sua pele.

A desculpa apresentada agora para justificar o “fenômeno sísmico” também é furada. Afinal, no mesmo período da pesquisa, o DEM também expôs seu candidato no horário gratuito de rádio e televisão. Além disso, o governo de São Paulo promove um intenso bombardeio de propaganda sobre o “paraíso” da administração tucana no estado. Já a mídia golpista não cessa sua artilharia contra o governo Lula – inclusive opondo-se ao acordo Brasil-Irã – e mantém a total blindagem sobre José Serra. O “Zé Alagão”, por exemplo, até sumiu das telinhas no período das enchentes.

A crise de identidade demotucana

A nova pesquisa Datafolha, agora mais próxima da realidade, revela as dificuldades da oposição neoliberal-conservadora. A fantasia do “Serrinha paz e amor” não colou. A bruxaria marqueteira, que tentava vender a imagem do tucano como “continuador” do governo Lula, não surtiu efeito. Se a aparição de Dilma Rousseff num único programa já causou este “fenômeno sísmico”, segundo a desculpa esfarrapada de Mauro Paulino, imagine quando tiver início a propaganda eleitoral de rádio e TV, em agosto. A candidata será ainda mais identificada com o presidente Lula!

Como observa o sítio Carta Maior, o “cavalo-de-pau” do Datafolha “reflete a crise de identidade na candidatura Serra. O patético figurino do candidato ‘cordial progressista’ tentado nos últimos meses derreteu pelo artificialismo abusivo que nenhum gênio do marketing pode contornar... Só o Datafolha ainda não havia mensurado esse vazio, mas agora não dava mais para esconder. As coisas então ficam assim: ou a mídia muda totalmente seu discurso golpista e adere ao ‘lulismo’ de Serra; ou Serra sai do armário e se junta ao udenismo anti-Lula do diretório midiático”.

Ajuste no discurso para a guerra

Tudo indica que vingará a segunda alternativa. Já na reunião do diretório nacional do PPS, José Serra promoveu ajustes no seu discurso, abandonando sua pele de cordeiro. Ele fez duros ataques ao governo Lula, num discurso terrorista sobre a existência do “bolchevismo sem utopias”. Sem ter mais como esconder, Serra também defendeu as privatizações do reinado de FHC, atacando o “patrimonialismo selvagem” do atual governo. Para alegria da mídia golpista, o tucano assume o figurino do brucutu neoliberal e sinaliza que a campanha tende para baixaria, nua e crua.

Diante desta tendência belicista, o Movimento dos Sem Mídia (MSM), liderado pelo blogueiro Eduardo Guimarães, acertou em cheio ao ingressar com representação junto à Justiça Eleitoral solicitando a fiscalização dos institutos de pesquisa. No caso do Datafolha, há fortes indícios de que ele já cometeu um grave crime eleitoral. Nada justifica seu recente “fenômeno sísmico”. Novas manipulações podem estar em orquestração, principalmente para o momento em que a campanha entrar na sua fase mais decisiva. Qualquer ingenuidade, vacilo ou tibieza poderá ser fatal.

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domingo, 23 de maio de 2010

A dor da gente não sai no jornal

Reproduzo artigo de Beto Almeida, presidente da TV Cidade Livre de Brasília, publicado no sítio Carta Maior:

O verso da canção de Luiz Reis e Haroldo Barbosa, gravada pelo Chico, me socorre diante do elevadíssimo grau de anti-jornalismo a que alcança hoje a imprensa brasileira, merecendo certamente a crítica de Lula logo ao chegar de sua gira internacional. A mídia nativa torce abertamente pelo fracasso da iniciativa do Brasil junto ao Irã. Prefere novas sanções, a lógica do castigo, o que cria perigosos riscos de desdobrar-se em guerra, em destruição e morte como se vê agora mesmo no Iraque. A mídia americana torceu fervorosamente pela invasão militar aquele país. Chegou a mentir sobre a existência de armas de destruição em massa.. Depois, o jornal New York Times pediu desculpas aos leitores pela desinformação, mas aí já havia mais de um milhão de iraquianos mortos. A mídia brasileira vai pela mesma linha? Se as potências mundiais resolverem aplicar uma sanção contra o programa nuclear brasileiro a partir de pretexto de que aqui também se constrói uma bomba, o que já foi insinuado, a mídia brasileira ficará contra o Brasil e o seu povo?

Recuperemos alguns momentos na nossa história para saber como nossa imprensa, agora mídia, tem se colocado. Nos momentos de crise, episódios dramáticos, encruzilhadas históricas, momentos de decisão, vamos constatar que freqüentemente esta mídia, aquela que é majoritariamente representante dos interesses dominantes na sociedade, esteve divorciada de soluções nacionais, opondo-se raivosamente aos interesses populares, descumprindo descaradamente sua auto-proclamada vocação democrática, assumindo, repetidas vezes, o viés golpista, oligárquico e anti-nacional.

Ela se opôs quando o país conquistava uma legislação de defesa dos direitos trabalhistas e, coerente com esta vocação oligárquica, até hoje estes mesmos segmentos midiáticos, - agora modernizados pela eletrônica, mas não nos padrões civilizatórios - continuam a conspirar e a pretender a destruição da CLT implantada na Era Vargas. Antes da CLT era comum patrões espancarem seus empregados.... Há pouco vimos o brutal assassinato de uma jovem jornalista cometido pelo diretor de um destes grandes jornais oligárquicos simplesmente porque ela teve a “ousadia” de terminar o namoro. Esta mentalidade desdobra-se muitas vezes em linha editorial eivada de ódio social contra o povo. E qual não deve ser a dose deste ódio contra um retirante Lula quando ele “ousa” cruzar não apenas os mares e os continentes - com a agilidade que o moderno avião permite - mas, também cruzar e questionar com coragem os padrões de uma diplomacia convencional, conservadora e hipócrita que não apenas se conforma mas também cultiva sanções e guerras, desprezando a priori o diálogo entre os povos?

Se lá atrás, estes barões da imprensa foram capazes de festejar, escondidos e amedrontados, a morte de Vargas porque ela significaria o fracasso de uma política de industrialização de um país agrário, do estabelecimento de direitos trabalhistas e previdenciários, como não estarão agora os herdeiros destes barões a torcer para a derrota generalizada das iniciativas de Lula? Sobretudo quando Lula já bradou em momentos mais complexos que não se suicidaria como Vargas, não renunciaria como Jânio e não sairia do País como Jango!

Noticiaram: o Brasil não tem petróleo!!!

Para se medir até onde poderá chegar este anti-jornalismo, basta citar apenas um exemplo histórico: praticamente toda a imprensa fez campanha contra Vargas quando ele criava a Petrobrás. Essa mesma imprensa noticiava reiteradamente que não havia petróleo no Brasil, conforme diziam os relatórios de espertíssimos técnicos norte-americanos. Pode-se medir o tamanho da desinformação, do anti-jornalismo, pelo tamanho dos trilionários poços de petróleo pré-sal recém descobertos!

Pelo grau de precariedade jornalística, pode-se medir também que as elites jornalistas criticadas na fala presidencial estariam engrossando ainda mais, com a vassalagem de sempre, o coro da mídia internacional que percebeu claramente que na sua dialética de retirante Lula contraria interesses da indústria bélica, patrocinadora da lógica das sanções pelo Conselho de Segurança da ONU, avesso ao diálogo. Provavelmente veremos que em certos segmentos da mídia internacional aquele espaço editorial que reconheceu em Lula um mandatário com iniciativas para enfrentar a fome e a miséria, para integrar os povos e também para promover soluções democráticas, poderá passar a ser ocupado, também, com críticas a um presidente que “afronta a segurança e a paz internacional”, tradução esperta que dão para os interesses imperialistas, sobretudo do comércio internacional de armas. No dia em que Lula desembarcava no Irã a manchete do Estadão era “Farc tem acampamento na Amazônia”. Ou seja, Lula “tolerante com o terrorismo” lá e cá, era a mensagem subliminar.

Armas: lucros em cheque

Quando a Princesa Diana libertou-se do ambiente arrogante e despótico da realeza britânica e passou a fazer campanha contra a instalação de minas terrestres instaladas em Angola e outros países - e que ainda matarão ou mutilarão inocentes por décadas - logo a grande mídia sustentada por anunciantes ligados à indústria bélica tratou de estampar como controvertidos alguns de seus aspectos pessoais, suas pretensões pacíficas "inconseqüentes" e ,inclusive, o ”inaceitável” namoro com um árabe, peça que compunha a novelinha midiática para a destruição de sua imagem.. Estes poderosos interesses bélicos poderão insinuar que Lula estaria “passando dos limites”... Mas, até o Obama, em carta a Lula recomendou o acordo com o Irã. Agora foi enquadrado. O fantasma de Kennedy, ronda...

Por isso mesmo, é preciso ver o outro lado da crítica de Lula à imprensa. E talvez isto signifique encorajar as forças progressistas a uma reflexão que está presente nos esforços para realizar a Conferência Nacional de Comunicação, para aplicar o que ali se decidiu, mas, nem sempre encontra a capacidade para organizar as forças sociais que podem preencher a lacuna gigantesca que fere de morte a cidadania brasileira: a inexistência de um grande jornal popular, de massas, capaz de um jornalismo que promova os interesses nacionais, que encontre o seu lugar como ferramenta criativa e necessária para a construção de um Brasil verdadeiramente Nação!

Última Hora

Voltemos nossos olhos novamente para nossa própria experiência histórica. Já tivemos o jornal Última Hora, popular, nacionalista, capaz de refletir os interesses das classes trabalhadoras diuturnamente atacados pelo conjunto da imprensa oligárquica. Era um respiro democrático! Havia a polarização, a diversidade opinativa e política. Hoje há uma asfixia midiática anti-democrática. Não há sequer a controvérsia! E aquele jornal, que chegou a ter duas edições diárias, circulação nacional massiva, foi uma iniciativa encorajada por Vargas. Quando em 1954 a mídia conservadora comemorou a morte de Vargas, o Última Hora chorou e resistiu ao lado do povo que saiu às ruas. Quando em 1964, esta mesma mídia oligárquica suplicou e colaborou com o golpe de estado, o Última Hora resistia e defendia a democracia.

Jornalismo estratégico

Dentro da visão estratégica de um país que pretende desempenhar legitimamente um papel importante e protagonista no jogo do poder internacional - e era assim na Era Vargas e é assim novamente agora com Lula - nós, como povo brasileiro e como Nação, não podemos deixar de lado esta questão que continua a nos desafiar. Vários passos importantes foram dados, entre eles a conquista simbolizada na criação da TV Brasil. E mais ainda agora quando na próxima segunda-feira será lançada a TV Brasil Internacional, inicialmente para dialogar com os quase três milhões de brasileiros espalhados mundo afora. A iniciativa, louvável, trará com mais realismo a necessidade do Brasil também dialogar com outros povos já que pretende atuar para que as relações internacionais sejam democratizadas, reequilibradas e marcadas pela cooperação.

Vale lembrar que a Rádio Nacional, também criada na Era Vargas, chegou a ser a quarta mais potente emissora do mundo, além de ter programação em quatro idiomas, alcançando vários continentes e tendo em seu corpo de redatores brasileiros como Nestor de Hollanda, Carlos Drummond de Andrade, Manoel Bandeira, Cecília Meirelles etc. A TV Brasil Internacional tem uma herança em que se apoiar e tem um caminho que pode recuperar para levar a mensagem de uma nação brasileira que se empenha por um mundo mais justo e baseado na cooperação, não nas sanções.

Será que as forças progressistas não deveriam encarar de fato esta tarefa da construção de um jornal popular, nacional, de ampla circulação, fazendo jornalismo na verdadeira acepção da palavra e recuperando para o jornalismo a missão de bem público e de ferramenta civilizatória hoje ignorada em boa medida pela mídia hegemônica no Brasil?

Será que estas forças que foram capazes de articular, se organizar, para resistir à ditadura, enfrentar o neoliberalismo e se fortalecer para chegar à presidência - um feito de proporções históricas numa sociedade com os arraigados esquemas dos donos do poder - não teria também a capacidade de construir um jornal e de praticar um jornalismo público, civilizador, humanista? Não se trata de estimular aqui nada contra as iniciativas para democratizar a informação no espaço digital. Trata-se de complementar, de articular, até porque com toda a importância e o grande efeito que comprovamos na internet, tuitar não esgota a necessidade de fazer jornalismo. Não se deve pretender apenas repercutir, contestar, confrontar a unanimidade conservadora da mídia hegemônica e seu anti-jornalismo em vias de deterioração acelerada.

Surra midiática diária

Há iniciativas importantes, a realização da Confecom é uma delas, a TV Brasil já citada, a recriação da Telebrás estatal, aliás, uma clara aplicação de decisão tomada na Confecom, são outras. Surgiram a Altercom, o Barão de Itararé, o Mídia Livre, todos os blogs e portais, os jornais e revistas alternativas, as TVs e rádios comunitárias etc mas, ainda assim, estamos em boa medida dispersos, desarmados no campo da comunicação e os interesses nacionais, populares, democráticos, levam várias surras por dia, todos os dias.

Vemos que algumas das forças que se articularam para levar Lula á presidência também poderiam coordenar-se para que milhões de brasileiros pudessem entrar também na Era de Guttemberg, ao mesmo tempo em que este seria, obviamente, um jornal também digital. Um jornal que permitisse chegar aos grotões, urbanos ou não, um instrumento para a discussão, a mobilização, a ação e a organização política nas mãos de uma militância carente de ações organizadas que já teve no passado.. Será que a união de certos fundos de pensão (tão lucrativos), centrais sindicais, empresários vinculados ao mercado interno não poderia enfrentar esta tarefa que sempre volta à baila?.

Há dois anos foi aprovado num congresso do PT a prioridade para a criação de um jornal de massas, mas não se realizou. Hoje, na Argentina há um Página 12, no México, há o La Jornada, na Bolívia, o jornal Cambio, criado por Evo Morales e que já é o de maior tiragem no país, com apenas 7 meses de nascido, rivalizando com o jornal conservador La Razón, que tem 70 anos. Na Venezuela, nasceu o Correio do Orenoco, está em todas as bancas, ainda que o governo tenha fortalecido a mídia pública de rádio e TV, sem contar que Hugo Chávez tem mais de 300 mil seguidores no twitter, que usa com entusiasmo. Aqui, desde o desaparecimento do Última Hora, estamos sem um jornal de ampla circulação e com capacidade de sustentar uma visão jornalística dos interesses nacionais e populares. É uma grande lacuna.

E nós?

Assim, a bronca de Lula nesta elite de jornalistas que se posiciona claramente contra o sucesso das iniciativas que visam levar o Brasil a ter um papel construtivo no mundo, sendo correta, será que não deveria também servir para provocar uma reflexão, certamente autocrítica, nas forças populares? O jornalismo ou o anti-jornalismo das elites cumpre o triste papel que lhes reserva a subordinação a interesses anti-nacionais. Mas, onde está o jornal das forças progressistas?

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A “nova” máquina de guerra dos EUA

Reproduzo artigo de Jack Smith, editor do Hudson Valley Activist Newsletter, traduzido por Caia Fittipaldi e publicado no sítio Outras Palavras:

Há mais guerra no futuro dos EUA – muito mais, a julgar pelos relatórios, pronunciamentos e ações do governo Obama nesses últimos meses.

Esses documentos incluem o Relatório de Revisão Quadrianual da Defesa [Quadrennial Defense Review (QDR)], a Revisão da Postura Nuclear [Nuclear Posture Review (NPR-2010)], o Relatório da Defesa de Mísseis Balísticos [Ballistic Missile Defense Report], o encontro de segurança nuclear em New York e a conferência da ONU, de 3 a 28 de maio, de revisão do Tratado de Não-proliferação Nuclear, além, claro, das guerras em curso no Oriente Médio e na Ásia Central, e das exigências do orçamento de guerra do Pentágono.

O governo dos EUA comanda um colosso militar sem par, mas a [QDR], publicada em fevereiro, sugere que Washington entende que os EUA estejam constantemente sob ameaça de ataque por inúmeras forças terríveis, decididas a destruí-los. Por isso, mais trilhões de dólares têm de ser consumidos em guerras presentes e futuras – ostensivamente para salvaguardas a pátria amada ameaçada.

A Revisão da Postura Nuclear (NPR-2010) diz que o objetivo de longo prazo é um mundo “livre de bombas nucleares”, mas, apesar de reduções simbólicas dos arsenais desse tipo de armas, o Pentágono só faz ampliar sua capacidade nuclear, temperando a ampliação com uma devastadora “contenção convencional” capaz de atacar vários alvos pelo mundo, no período de uma hora. Além disso, esse documento, publicado em abril, preserva a prontidão para disparar ataque nuclear imediato, não limita a força nuclear à função de contenção, sugere uso ofensivo e, pela primeira vez, autoriza ataque nuclear, se necessário, contra Estado não-nuclear (o Irã).

Entre um e outro documento, Obama expande vigorosamente as guerras que herdou do governo de George W. Bush, ampliando e operando o maior poder militar que os EUA jamais tiveram.

Feito a elogiar do governo Obama foi ter assinado, dia 9 de abril, em Praga, o novo Tratado Estratégico de Redução de Armas Nucleares com a Rússia, que reduz em 1.500 o arsenal de ogivas nucleares de cada lado. Foi passo positivo, mas todos sabem que excessivamente tímido, e nem de longe reduz efetivamente o risco de guerra nuclear.

A Revisão Quadrianual da Defesa (QDR) é um relatório de 128 páginas que o Departamento de Defesa envia ao Congresso a cada quatro anos, com uma projeção do planejamento militar dos EUA para os 20 anos seguintes. Comissão de 20 membros civis, selecionados pelo Pentágono e pelo Congresso, analisam o documento e sugerem alterações, para acrescentar uma perspectiva dita “independente”. 11 dos 20 membros ‘independentes’, inclusive o co-presidente dessa comissão – ex-secretário da Defesa William Perry; e o ex-conselheiro de segurança nacional Stephen Hadley – são empregados da indústria da Defesa.

Embora o Pentágono trabalhe nos preparativos de uma possível III Guerra Mundial e novo pós-guerra, o relatório que está sendo apresentado concentra-se no futuro relativamente mais próximo, e só acrescenta rápidas generalizações sobre o futuro de longo prazo. Três das prioridades do QDR merecem comentário extra.

A primeira dessas prioridades é “vencer as guerras em andamento” no Afeganistão, Paquistão, Iraque, Iêmen e onde mais houver intrusão militar da Washington pós-11/9 nos anos vindouros. Na apresentação da Revisão Quadrianual, dia 1/2/2010, o secretário de Defesa de Bush-Obama Robert Gates fez declaração importante: “O sucesso nas guerras futuras dependerá do sucesso nas guerras em andamento.” As “guerras futuras” não foram identificadas. Além disso, a Revisão Quadrianual declara que a vitória militar no Iraque e no Afeganistão “é apenas o primeiro passo rumo a nossos objetivos estratégicos”.

Segundo, enquanto no passado os EUA concentraram-se em construir capacidade para combater duas grandes guerras simultâneas, a Revisão Quadrianual sugere que não basta isso. Hoje, o governo Obama afirma “a necessidade de força robusta, capaz de proteger os interesses dos EUA contra uma multiplicidade de ameaças, inclusive as que advenham de sofrer ataque simultâneo por dois Estados-nação”.

Hoje se trata de mais de duas guerras – sendo o “a mais”, a obrigação de “lutar de contra-insurgência em larga escala, [montar e operar] operações de estabilização e contra-terrorismo em ampla variedade de ambientes”, sobretudo em países pequenos e pobres como o Afeganistão. Outros alvos “a mais” incluem “atores não estatais”, como a Al-Qaeda; “Estados fracassados”, como a Somália; e Estados de tamanho médio, mas bem defendidos, que não se curvem ao Tio Sam, como o Irã e a República Popular Democrática da Coréia ou, algum dia, talvez, a Venezuela.

Terceiro, é absolutamente evidente, na Revisão Quadrianual, embora não assumidamente reconhecido, que o governo Obama crê que China e Rússia sejam os dois possíveis “Estados-nação” contra os quais Washington deve preparar-se para defender-se. Nem Pequim nem Moscou têm qualquer iniciativa que justifique o pressuposto do Pentágono de que seriam suficientemente suicidários a ponto de atacar os poderosos EUA.

Afinal, os EUA, com 4,54% da população mundial, investem mais na preparação para a guerra que todo o resto do mundo somado. O orçamento de Obama em 2010 para o Pentágono é de US$ 680 bilhões, mas o total real alcança o dobro disso, se se consideram que os gastos de Washington em segurança nacional e gastos de outros departamentos devem ser somados, como o custo da manutenção e armazenamento das armas nucleares, as 16 agências de segurança, a Segurança Nacional e lucros das dívidas de guerra, dentre outros programas.

Gastos anuais relacionados à guerra alcançam facilmente o trilhão de dólares. Ao falar de um congelamento seletivo de programas nacionais, em janeiro, no discurso “State of the Union”, Obama especificamente excluiu do congelamento os gastos do Pentágono/segurança nacional. Obama é gastador pródigo em guerras. A atribuição de US$ 708 bilhões que fez ao Pentágono, para o ano fiscal 2011 (sem contar os US$ 33 bilhões que esperam aprovação no Congresso para o “surge” afegão) excede o mais alto orçamento de Bush, de US$ 651 bilhões, para o ano fiscal de 2009.

Hoje, o poder militar dos EUA está presente em todo o planeta. Como se lê na Revisão Quadrianual: “Os EUA são potência global, com responsabilidades globais. Incluindo operações no Afeganistão e no Iraque, cerca de 400 mil soldados e pessoal militar em geral estão estacionados ou na alocação militar rotativa, em todo o mundo.”

O Pentágono comanda mais de 1.000 bases militares em todo o mundo (inclusive nas zonas de guerra), grandes frotas em todos os oceanos, força aérea em expansão, satélites militares no espaço e mísseis nucleares em prontidão e alerta totais, pré-direcionados para “o inimigo” ou para cidades e instalações militares potencial emente “inimigas”.

Leitura da Revisão Quadrianual mostra que nada disso será modificado, senão da direção da modernização e da ampliação (o Pentágono acaba de ocupar seis novas bases na Colômbia) e do acrescentamento de novos sistemas, como o Prompt Global Strike, importante sistema de armas ofensivas, que discutiremos adiante.

A expressão “dominação militar de pleno espectro” – que os neoconservadores cunharam nos anos 1990s e foi adotada pelo governo Bush para definir sua estratégia militar agressiva – não foi incluída, espertamente, na Revisão Quadrianual de 2010, mas conservar e aumentar sua capacidade de dominação militar plena continuam a ser a principal preocupação do Pentágono.

A Revisão Quadrianual vem apimentada com expressões como “os interesses dos EUA e seu papel no mundo exigem forças armadas com capacidades superiores a tudo que se conhece” e proclama a importância do “domínio continuado pelas Forças Armadas dos EUA, nas guerras de larga escala de exército contra exército”. Gates foi ainda mais longe, na conferência de imprensa dia 1/2/2010: “Os EUA precisam ter amplo portfólio de capacidades militares, com versatilidade máxima no espectro mais amplo possível de conflitos”. Recentemente, Obama pavoneou-se de comandar “os mais poderosos exércitos da história do mundo”.

Evidentemente o Pentágono planeja engajar-se em várias guerras futuras, interrompidas por rápidos períodos de paz, durante os quais se preparará para a guerra seguinte. Dado que a única entidade que já manifestou claro interesse em atacar os EUA é a Al-Qaeda – organização paramilitar de fanáticos religiosos extremistas, com cerca de mil membros ativos e aproveitáveis em todo o mundo – é evidentemente claro que o poderio militar sem precedentes que os EUA acumulam hoje visa a outro objetivo.

Na minha opinião, esse “outro objetivo” é geopolítico – aumentar o poderio militar do Pentágono para assegurar que os EUA consigam tentar manter a posição hegemônica global de dominação, em tempos de endividamento pesado, erosão severa de sua base econômica, impasse quase absoluto na política doméstica e aparição, no cenário global, de outras nações e blocos interessados em contestar a hegemonia dos EUA.

A Revisão Quadrianual toca nesse ponto sensível com admirável delicadeza: “A distribuição global do poder político, econômico e militar está em transformação, tornando-se mais difusa. O aparecimento da China no quadro global, o país mais populoso do mundo; da Índia, a maior democracia do mundo, continuarão a reformatar o sistema internacional. Embora os EUA continuem como ator mais poderoso, é indispensável que cada vez mais cooperem com seus aliados e parceiros-chave para manter a paz e a segurança. O modo como os poderes hoje emergentes integrar-se-ão ao sistema global é questão das que definirão esse século e que, portanto, são centrais para os interesses dos EUA”.

No presente momento, a Revisão Quadrianual indica que Washington está preocupada com estratégias estrangeiras “antiacesso” que limitam o “poder [dos EUA] para projetar capacidades” em várias partes do mundo. Isso significa que alguns países, como China e Rússia, estão desenvolvendo novas armas sofisticadas que equivalem ao armamento dos EUA, o que “limita” o deslocamento das forças dos EUA para onde o Pentágono bem entenda. Por exemplo:

“A China está desenvolvendo e instalando em campo grande número de mísseis balísticos e cruzadores avançados de médio alcance, novos submarinos de ataque equipados com armas avançadas, sistemas de defesa antiaérea de longo alcance cada vez mais efetivos, capacidades para guerra eletrônica e redes de computadores, aviação de ataque sofisticada e sistemas espaciais de defesa. A China tem divulgado informação limitada sobre o ritmo, o escopo e os objetivos estratégicos de seus programas de modernização militar, o que faz aumentar o número de interrogações legítimas quanto a suas intenções de longo prazo.

Para contrabalançar esse movimento dos chineses – e não só deles –, o Pentágono planeja, com custos astronômicos e não divulgados, os seguintes avanços: “Expandir as capacidades de ataque a longa distância; explorar as vantagens das operações subterrâneas; garantir acesso ao espaço e ao uso de recursos espaciais; aumentar a robustez de capacidades-chave de Inteligência, Vigilância e Reconhecimento; derrotar sistemas inimigos de sensores e engajamento; aumentar a presença e a prontidão para responder, das forças dos EUA, em todo o mundo.”

Além disso, os EUA não só mantêm a China na mira de seus mísseis e bombas; estão também cercando o país (e também a Rússia, é claro) com balísticas antimísseis. O objetivo é evidente: no caso de os EUA acharem “necessário” lançar mísseis contra a China, o sistema antimíssil lá estará para destruir a capacidade limitada de retaliação dos chineses.

Matéria publicada dia 22/2/2010 no China Daily, diário chinês editado em inglês: “Washington parece determinada a cercar a China com sistemas balísticos antimísseis produzidos nos EUA, observaram hoje especialistas chineses… Para o coronel Dai Xu da Força Aérea, renomado estrategista militar, em artigo distribuído esse mês, “a China está sob cercamento em formato de meia-lua. O anel começa no Japão, estende-se pelas nações do sul do Mar da China até a Índia e termina no Afeganistão”.

Em comparação com a Revisão Quadrienal do governo Bush em 2006, no documento de 2010 constata-se que houve esforço consciente para baixar o tom da retórica anti-China. Mas é absolutamente evidente que a China é a referência número 1, nos pontos em que a Revisão Quadrienal de 2010 fala de “Estados-nação potencialmente hostis”.

Para a revista Defense News, de 18/2/2010, publicação dirigida ao complexo industrial-militar: “Dizem os analistas que a Revisão Quadrianual da Defesa visa a enfrentar o problema chinês, sem enfurecer ainda mais Pequim. ‘Se se considera a lista de novas ampliações e reforços nas forças e capacidades dos EUA (…), vê-se que são forças e capacidades necessárias para derrotar a China, não o Irã nem a Coréia do Norte nem o Hizbollah’ – disse Roger Cliff, especialista em questões militares chinesas da Rand Institution. ‘Assim, embora pouco se cite a China (…), é a ameaça chinesa, sim, que inspira muitos dos programas de modernização descritos na Revisão Quadrianual da Defesa de 2010’.”

Incidentalmente, segundo o Center for Arms Control and Non-Proliferation, o orçamento chinês de defesa para esse ano, para país quatro vezes maior que os EUA, é de US$ 78 bilhões, bem inferior aos US$ 664 bilhões reservados para o Pentágono (sem contar todos os extras para segurança nacional, espalhados nos orçamentos de outros departamentos). A China possui entre 100 e 200 ogivas nucleares; os EUA, 9.326 (se se somam as ogivas montadas em mísseis e as estocadas). A China considera a construção de um porta-aviões; os EUA mantêm 11 em atividade. E a China não tem base militar fora do território chinês.

Tudo faz crer que a China esteja construindo instrumentos, sistemas e armas de defesa, não de ataque contra os EUA. E a política exterior chinesa baseia-se a não se deixar prender no corner, pelos EUA, fazendo todo o possível para evitar confrontação mais séria.

Também a Rússia recebe melhor tratamento na nova Revisão Quadrianual da Defesa, que na de 2006, mas aparece incluída ao lado da China em vários casos. Apesar do imenso poder de contenção de Moscou, e das reservas abundantes de petróleo e gás, a Rússia aparece sempre como “inimigo potencial” número dois, entre as grandes potências. Washington sente-se mais ameaçada por Pequim. Isso, em larga medida, por causa das dimensões territoriais da China, do rápido desenvolvimento, do sucesso da economia capitalista guiada pelo Estado dirigido pelo Partido Comunista; e pelo fato de que, ao ritmo em que vamos hoje, a China ultrapassará os EUA como principal potência econômica do mundo, nos próximos de 20 a 40 anos.

Parece já bem evidente, por menos que se fale sobre isso, que essa situação é extremamente perigosa. A China não dá qualquer sinal de que aspire a dominar o mundo, mas tampouco se deixará dominar. Pequim trabalha sob o conceito de ordem mundial multipolar, no qual vários países e blocos atuam em diferentes papéis. Pode-se discutir, no máximo, quem será o primeiro entre iguais.

Washington prefere a situação que existe nos últimos 20 anos posteriores à implosão da URSS, quando os EUA ficaram com a posição de única superpotência militar remanescente e líder do bloco capitalista expandido. Nesse período, Washington operou como potência hegemônica em mundo unipolar, e não quer perder esse título.

Tudo isso parece estar mudando hoje, com a emergência de outros países, o principal deles a própria China; e os EUA dão sinais de entrar em declínio gradual. O modo como for encaminhada a transição na direção da multipolaridade nas próximas duas, três décadas, determinará se se evitará, ou não, mais uma guerra desastrosa.

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