Reproduzo artigo de Antonio Martins, publicado no sítio Outras Palavras:
Em público, o candidato José Serra não endossará as palavras de seu subordinado; se questionado de modo explícito, talvez até as contrarie. Mas, no intrincado jogo político que se abriu para o segundo turno, certamente não foram em vão as palavras de David Zylberstajn, ex-diretor-geral da Agência Nacional de Petróleo-ANP (no governo FHC), atual assessor para a área de Energia da campanha PSDB-DEM.
Em entrevista concedida ontem ao Valor Econômico, Zylberstajn disse ser “tecnicamente” a favor de retomar, nas reservas de petróleo do Pré-Sal, o sistema de leilões que vigorou em seu período. Para proteger o candidato a que se ligou, fez uma ressalva: “dentro do contexto político, eu não sei”…
O mecanismo antigo foi instituído em 1995, logo após o governo FHC quebrar o monopólio estatal de petróleo. Funciona assim: a União leiloa áreas do subsolo em que há possibilidade de haver jazidas. Os vencedores pagam um montante inicial ao Estado e ficam com todo o petróleo encontrado.
Tal modalidade foi contestada, durante anos, pelos movimentos sociais — que promoveram protestos e ocuparam mais de uma vez a ANP. Mantida no governo Lula, foi revista, por iniciativa do atual presidente, quando localizadas as imensas reservas do Pré-Sal. A história está contada em detalhes pela repórter Consuelo Rodrigues, na revista Piauí.
No Pré-Sal, quase não há riscos. Lula indignou-se ao perceber que, mantido o sistema, as empresas privadas ditariam, na prática (por meio dos leilões), quanto pagariam para ficar com o petróleo brasileiro. “Vamos cancelar a nona rodada [de leilões]. Foda-se o mercado”, teria dito o presidente numa reunião com membros do governo e diretores da Petrobrás, em 26 de outubro de 2008.
Pouco menos de um ano depois, o governo encaminharia ao Congresso os quatro projetos que alteram — embora sem reinstituir o monopólio estatal — as regras do jogo no Pré-Sal. Foi, para as transnacionais, um desastre. Na prática, os leilões acabaram. A União recuperou autoridade para conceder a exploração diretamente à Petrobras — como tem sido feito, invariavelmente. Em teoria, pode haver licitações de áreas. Nesse caso, a empresa estatal tem direito legal a no mínimo 30% de cada bloco leiloado. E as companhias vencedoras já não se abocanham todo o petróleo. Define-se uma partilha entre o que caberá a elas e à União.
A posição de Zylberstajn não é, portanto, de natureza técnica. Diz respeito à apropriação de uma riqueza nacional. O assessor de Serra para temas de Energia afirmou que é favorável à volta dos leilões de concessão; e que julga inadequada até mesmo a reserva de um percentual mínimo de 30% à Petrobrás.
Ainda mais relevante é o que Zylberstajn não afirmou (por politicamente explosivo), mas deixou nas entrelinhas. Se ele já se anima a debater a modalidade de leilão a ser adotada, é óbvio que pretende rever a decisão política hoje adotada pelo governo — que é de não realizar novos leilões.
Na presente fase da disputa pelo segundo turno, os candidatos estão reorganizando suas alianças. É uma etapa jogada principalmente nos bastidores, longe dos olhos do eleitorado. Cada candidatura faz acenos a grupos políticos, empresariais e sociais que deseja atrair. A publicação da entrevista de Zylberstajn, num jornal dirigido prioritariamente ao empresariado, equivale a uma piscadela de Serra às transnacionais que estão de olho no Pré-Sal.
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