quarta-feira, 22 de julho de 2015

Ecos do passado na porta do Planalto

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Por Tereza Cruvinel, em seu blog:

Desde ontem à noite o alarido é grande em frente ao Palácio do Planalto. Ontem lá estavam os servidores do Judiciário esperneando contra o veto de Dilma ao reajuste que pode chegar a 78,5% de aumento. Hoje são os do Executivo, pedindo aumento e ameaçando com uma greve. Enquanto isso, logo mais às 17 horas a equipe econômica anuncia a redução da meta do superávit fiscal e um novo corte orçamentário, que pode chegar a R$ 10 bilhões, para cumprir a nova e bem menor meta. O mercado aguarda de orelha em pé.

Ontem à noite, a partir das 21 horas, eu estava no térreo do STF, aguardando para entrar ao vivo no RedetvNews, telejornal da Redetv em que sou comentarista política. Dali, ouvíamos o alarido do outro lado da Praça dos Três Poderes. Dez entre cada dez discursos proferidos tinham tom essencialmente político, e nada reivindicativo. Os que se ouvia eram pesados ataques políticos a Dilma, ao PT, à corrupção, ao ministro Ricardo Lewandowski e desafios ao presidente do Senado, Renan Calheiros, para derrubar o veto de Dilma. “Este governo precisa acabar”, dizia um servidor sem nada falar sobre suas agruras salariais. “78 por cento será o novo índice de rejeição da Dilma”, dizia outro, protestando contra a informação de que alguns poderão ter reajustes até neste patamar. Ninguém ignora que os servidores do Judiciário, bem como os do Legislativo, ganham muito mais que os do Executivo. E que não ganham mal, salários e penduricalhos somados.

Mas eu e a equipe ficamos mesmo espantadas foi com um grupo que, encerrado o protesto, foi buscar seus carros no estacionamento do STF. Gritavam impropérios de uma obscenidade atroz, impublicáveis, contra Dilma, Lewandowski e outros. Bem, brutos e broncos existem em todas as categorias profissionais, mas aquilo foi mais um sinal dos tempos – de ódio, intolerância e incivilidade – e do quanto o veto tumultuará a cena política quando agosto chegar. Mas era necessário e nenhuma categoria pode sentir-se, neste momento, acima das possibilidades do país.

Hoje, os do Executivo foram ao mesmo local anunciar que entrarão em greve se não forem atendidos.

Nós já vimos este filme antes, lá atrás, nos tempos da inflação. Todos queriam garantir o seu, inventavam-se leis de correção salarial que não repunham as perdas e estouravam greves o tempo todo. A instabilidade política e a expectativa inflacionária alimentavam o processo.

Daqui a pouco haverá o anúncio da redução da meta de superávit primário. Levy e Nelson Barbosa, e também Dilma, terão que explicar muito bem que isso está acontecendo não por tolerância fiscal mas pela real impossibilidade de alcançar os 1,2% num momento de recessão que faz minguar as receitas do governo. Terão que apontar claramente o norte que continuarão perseguindo, o do equilíbrio das contas, ainda que num prazo mais flexível. Do contrário, vamos ter o aumento do mau humor dos agentes econômicos, somado à crise política.

Pode não parecer mas entre o anúncio e os protestos dos servidores existe um forte eco do passado que não pode voltar.

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