Por Lindbergh Farias
Na quarta-feira (9), a agência de classificação de risco Standard & Poor's rebaixou a nota do Brasil de BBB- para BB+. Para a S&P, o Brasil deixou de ter o grau de investimento, passando a ter uma nota que corresponde ao nível especulativo. Contudo, é óbvio que o governo não deixará de honrar seus compromissos com os credores. A S&P é a agência que avaliou com Triplo A, grau máximo de segurança, os títulos subprime que provocaram a grande crise financeira americana de 2008. Não podemos nos esquecer ainda que essa mesma agência atribuiu classificação máxima ao Lehman Brothers no mesmo mês em que o banco americano quebrou. Pois bem, qual nota essas agências merecem? Paul Krugman, em 2011, ao comentar a decisão da S&P de rebaixar a nota dos EUA, disse: "essa agência é a pior instituição a qual alguém deveria recorrer para receber opiniões sobre as perspectivas do nosso país".
O maior paradoxo é, no entanto, que o ministro Joaquim Levy foi nomeado justamente para evitar que o Brasil perdesse seu grau de investimento. O ministro da Fazenda dizia que o Brasil tinha que fazer um ajuste fiscal rigoroso para melhorar a situação das contas públicas, porque, em 2014, havíamos fechado o ano com déficit nominal de 6,7% do PIB.
No Senado, eu votei contra o ajuste com o argumento de que em vários países onde foram adotados planos de austeridade semelhantes o resultado foi o de piorar a situação fiscal e agravar os problemas sociais. Esses ajustes colocam a economia em recessão, diminuem a arrecadação e fazem a dívida pública aumentar. É o que está acontecendo no Brasil. Nós estamos em recessão! A arrecadação caiu 3% e nosso déficit nominal, que tinha sido de 6,7% do PIB em 2014, alcançou 8,8% no acumulado dos últimos 12 meses.
Esse déficit é fruto da desaceleração da economia, mas principalmente de uma política monetária esquizofrênica, que coloca o Brasil como campeão mundial de taxa de juros. Essa política tem um enorme impacto fiscal. Cada 1% de aumento da taxa Selic provoca um custo fiscal de R$ 15 bilhões a R$ 20 bilhões a mais. Só com o aumento da taxa de juros e com o custo das operações de swaps cambiais, o governo federal desembolsou R$ 288,6 bilhões de janeiro a julho desse ano. Para efeito de comparação, de janeiro a julho do ano passado, o Brasil tinha pagado R$ 148 bilhões, ou seja, houve um crescimento de 95%. Em 2014, os gastos do governo com juros foram de R$ 311,5 bilhões, o que corresponde a 5,64% do PIB. E agora, no acumulado dos últimos 12 meses, até julho, essa despesa chegou a 7,92% do PIB, o equivalente a R$ 452 bilhões.
Por outro lado, o governo cortou este ano R$ 19 bilhões em investimentos, que caíram de R$ 85 bilhões para R$ 66 bilhões. Aprovou ainda duas medidas provisórias que mexeram no seguro desemprego e no abono salarial para economizar outros R$ 18 bilhões. Isso significa uma economia da ordem de R$ 35 bilhões.
Não tem como dar certo. O governo corta investimentos e direitos, mas gasta muito mais com aumento de juros e swaps cambiais.
Agora entramos em um momento da conjuntura em que o centro do debate politico é sobre como resolver o problema do déficit do orçamento de 2016.
Nós estamos entre aqueles que defendem que o centro da estratégia deve ser a retomada do crescimento econômico, com a diminuição da taxa Selic, para fechar o ralo da perda de recursos. Assim, será possível ampliar os investimentos e gerar emprego e renda, o que aumentará a arrecadação e preservará os direitos sociais e o orçamento, tirando a economia desse círculo vicioso que aprofunda a recessão. Do outro lado estão aqueles que equivocadamente advogam que é necessário aprofundar os cortes, com a retirada de mais direitos trabalhistas e previdenciários, com a redução de recursos do orçamento (o que compromete os investimentos em educação, saúde e programas sociais) e com a diminuição dos investimentos públicos.
Acredito que o aprofundamento da política de austeridade agravará a recessão, ampliará a crise social, com o crescimento do desemprego e queda da renda, e alimentará a crise política. Foi assim em todos os países que aplicaram esse receituário desastroso. É assim no Brasil, com a política econômica do ministro Joaquim Levy.
Aumentar a arrecadação fazendo justiça social
Dados das declarações do imposto de renda divulgados recentemente pela Receita Federal, com base nos números de 2013, apontam que 71 mil brasileiros super-ricos (com renda mensal superior a 160 salários mínimos e que correspondem a 0,3% dos declarantes de Imposto de Renda Pessoa Física) ganharam R$ 196 bilhões sem pagar nenhum centavo de imposto de renda, porque receberam esse valor por meio da distribuição de lucros e dividendos, que são totalmente isentos de tributos no Brasil.
Mais chocante é quando a lupa da Receita se aproxima: dos 71.440 super-ricos, 51.419 receberam bilhões de reais em lucros e dividendos, mas pagaram em impostos menos de 6% da sua renda total. Apesar da renda média declarada ser de R$ 4,5 milhões, R$ 3,1 milhões ficaram integralmente isentos por serem lucros e dividendos.
Vejam que absurdo: o sócio de uma grande empresa que recebe R$ 350 mil por mês via distribuição de dividendos não paga nada de imposto, enquanto um professor universitário ou um servidor público, que recebem R$ 5 mil por mês, são taxados em 27,5%.
Além de retomarmos a tributação sobre lucros e dividendos, será necessário acabar com a figura do juro sobre o capital próprio, outra distorção criada no governo FHC e que estabeleceu que os mesmos recursos nas mãos de um empresário podem ser, simultaneamente, investidos na produção e ficticiamente colocados no mercado financeiro, ou seja, o mesmo capital pode gerar lucros e juros. É quase mágica! A Lei 9.249, de iniciativa do governo de FHC, inventou, portanto, uma fórmula para reduzir contabilmente os lucros das empresas para que elas pagassem menos impostos. Mas o lucro verdadeiro continuaria o mesmo.
O dinheiro do empresário que é colocado na empresa, chamado de capital próprio, é considerado um empréstimo do dono à sua empresa. Então, a empresa tem que pagar juros ao seu dono. Logo, o dono recebe juros da sua empresa sobre o seu próprio capital. Em suma, ele recebe da empresa juros (pelo empréstimo fictício que fez à sua empresa) e lucros (pelos verdadeiros investimentos que realizou com o seu capital). E isso beneficia demasiadamente a pessoa jurídica - a empresa -, porque suas despesas aumentam com o pagamento de juros, o que faz seu lucro cair, e, dessa forma, ter que pagar menos impostos (Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e Contribuição Social sobre Lucro Líquido).
Há varias alternativas tributárias para tornar nosso sistema mais justo e progressivo. É possível criar um imposto sobre grandes fortunas - previsto na Constituição, mas nunca implementado -, aumentar a alíquota do imposto sobre herança ou até mesmo reformular o Imposto Territorial Rural. Em 2011, apresentei uma PEC que altera o artigo 155 da Constituição Federal, para permitir que o Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) incida sobre veículos de luxo, como iates, jatinhos e helicópteros.
Como resolver o déficit do orçamento de 2016
Neste momento de crise, temos urgência para aprovar propostas mais eficientes e viáveis para arrecadar mais, mas fazendo justiça social.
Acredito que a resposta para o problema do déficit no orçamento do próximo ano é a retomada da tributação sobre lucros e dividendos, com uma alíquota de 15%, e a eliminação da figura dos juros sobre o capital próprio, que passaram a vigorar em 1995 com o argumento de atrair capitais e estimular os investimentos privados (apesar disso, os investimentos ficaram estagnados e o sistema tributário brasileiro ficou mais regressivo e distorcido, aumentando a concentração de renda e riqueza). O volume de lucros e dividendos distribuídos e declarados subiu de R$ 108 bilhões em 2007 para R$ 287 bilhões em 2013. Com a aprovação desses projetos, podemos arrecadar em 2016 até R$ 60 bilhões.
Sendo assim, nós podemos acabar com o déficit orçamentário sem retirar direitos dos trabalhadores, sem cortar o orçamento da União e sacrificar os investimentos públicos necessários para a retomada do crescimento. Com a elevação da arrecadação e a diminuição da taxa Selic, é possível superar essa política de austeridade, que não resolve os problemas da nossa economia. Além disso, daremos um passo importantíssimo para reformar o nosso sistema tributário, hoje regressivo e injusto.
* Lindbergh Farias é senador da República pelo PT do Rio de Janeiro.
Na quarta-feira (9), a agência de classificação de risco Standard & Poor's rebaixou a nota do Brasil de BBB- para BB+. Para a S&P, o Brasil deixou de ter o grau de investimento, passando a ter uma nota que corresponde ao nível especulativo. Contudo, é óbvio que o governo não deixará de honrar seus compromissos com os credores. A S&P é a agência que avaliou com Triplo A, grau máximo de segurança, os títulos subprime que provocaram a grande crise financeira americana de 2008. Não podemos nos esquecer ainda que essa mesma agência atribuiu classificação máxima ao Lehman Brothers no mesmo mês em que o banco americano quebrou. Pois bem, qual nota essas agências merecem? Paul Krugman, em 2011, ao comentar a decisão da S&P de rebaixar a nota dos EUA, disse: "essa agência é a pior instituição a qual alguém deveria recorrer para receber opiniões sobre as perspectivas do nosso país".
O maior paradoxo é, no entanto, que o ministro Joaquim Levy foi nomeado justamente para evitar que o Brasil perdesse seu grau de investimento. O ministro da Fazenda dizia que o Brasil tinha que fazer um ajuste fiscal rigoroso para melhorar a situação das contas públicas, porque, em 2014, havíamos fechado o ano com déficit nominal de 6,7% do PIB.
No Senado, eu votei contra o ajuste com o argumento de que em vários países onde foram adotados planos de austeridade semelhantes o resultado foi o de piorar a situação fiscal e agravar os problemas sociais. Esses ajustes colocam a economia em recessão, diminuem a arrecadação e fazem a dívida pública aumentar. É o que está acontecendo no Brasil. Nós estamos em recessão! A arrecadação caiu 3% e nosso déficit nominal, que tinha sido de 6,7% do PIB em 2014, alcançou 8,8% no acumulado dos últimos 12 meses.
Esse déficit é fruto da desaceleração da economia, mas principalmente de uma política monetária esquizofrênica, que coloca o Brasil como campeão mundial de taxa de juros. Essa política tem um enorme impacto fiscal. Cada 1% de aumento da taxa Selic provoca um custo fiscal de R$ 15 bilhões a R$ 20 bilhões a mais. Só com o aumento da taxa de juros e com o custo das operações de swaps cambiais, o governo federal desembolsou R$ 288,6 bilhões de janeiro a julho desse ano. Para efeito de comparação, de janeiro a julho do ano passado, o Brasil tinha pagado R$ 148 bilhões, ou seja, houve um crescimento de 95%. Em 2014, os gastos do governo com juros foram de R$ 311,5 bilhões, o que corresponde a 5,64% do PIB. E agora, no acumulado dos últimos 12 meses, até julho, essa despesa chegou a 7,92% do PIB, o equivalente a R$ 452 bilhões.
Por outro lado, o governo cortou este ano R$ 19 bilhões em investimentos, que caíram de R$ 85 bilhões para R$ 66 bilhões. Aprovou ainda duas medidas provisórias que mexeram no seguro desemprego e no abono salarial para economizar outros R$ 18 bilhões. Isso significa uma economia da ordem de R$ 35 bilhões.
Não tem como dar certo. O governo corta investimentos e direitos, mas gasta muito mais com aumento de juros e swaps cambiais.
Agora entramos em um momento da conjuntura em que o centro do debate politico é sobre como resolver o problema do déficit do orçamento de 2016.
Nós estamos entre aqueles que defendem que o centro da estratégia deve ser a retomada do crescimento econômico, com a diminuição da taxa Selic, para fechar o ralo da perda de recursos. Assim, será possível ampliar os investimentos e gerar emprego e renda, o que aumentará a arrecadação e preservará os direitos sociais e o orçamento, tirando a economia desse círculo vicioso que aprofunda a recessão. Do outro lado estão aqueles que equivocadamente advogam que é necessário aprofundar os cortes, com a retirada de mais direitos trabalhistas e previdenciários, com a redução de recursos do orçamento (o que compromete os investimentos em educação, saúde e programas sociais) e com a diminuição dos investimentos públicos.
Acredito que o aprofundamento da política de austeridade agravará a recessão, ampliará a crise social, com o crescimento do desemprego e queda da renda, e alimentará a crise política. Foi assim em todos os países que aplicaram esse receituário desastroso. É assim no Brasil, com a política econômica do ministro Joaquim Levy.
Aumentar a arrecadação fazendo justiça social
Dados das declarações do imposto de renda divulgados recentemente pela Receita Federal, com base nos números de 2013, apontam que 71 mil brasileiros super-ricos (com renda mensal superior a 160 salários mínimos e que correspondem a 0,3% dos declarantes de Imposto de Renda Pessoa Física) ganharam R$ 196 bilhões sem pagar nenhum centavo de imposto de renda, porque receberam esse valor por meio da distribuição de lucros e dividendos, que são totalmente isentos de tributos no Brasil.
Mais chocante é quando a lupa da Receita se aproxima: dos 71.440 super-ricos, 51.419 receberam bilhões de reais em lucros e dividendos, mas pagaram em impostos menos de 6% da sua renda total. Apesar da renda média declarada ser de R$ 4,5 milhões, R$ 3,1 milhões ficaram integralmente isentos por serem lucros e dividendos.
Vejam que absurdo: o sócio de uma grande empresa que recebe R$ 350 mil por mês via distribuição de dividendos não paga nada de imposto, enquanto um professor universitário ou um servidor público, que recebem R$ 5 mil por mês, são taxados em 27,5%.
Além de retomarmos a tributação sobre lucros e dividendos, será necessário acabar com a figura do juro sobre o capital próprio, outra distorção criada no governo FHC e que estabeleceu que os mesmos recursos nas mãos de um empresário podem ser, simultaneamente, investidos na produção e ficticiamente colocados no mercado financeiro, ou seja, o mesmo capital pode gerar lucros e juros. É quase mágica! A Lei 9.249, de iniciativa do governo de FHC, inventou, portanto, uma fórmula para reduzir contabilmente os lucros das empresas para que elas pagassem menos impostos. Mas o lucro verdadeiro continuaria o mesmo.
O dinheiro do empresário que é colocado na empresa, chamado de capital próprio, é considerado um empréstimo do dono à sua empresa. Então, a empresa tem que pagar juros ao seu dono. Logo, o dono recebe juros da sua empresa sobre o seu próprio capital. Em suma, ele recebe da empresa juros (pelo empréstimo fictício que fez à sua empresa) e lucros (pelos verdadeiros investimentos que realizou com o seu capital). E isso beneficia demasiadamente a pessoa jurídica - a empresa -, porque suas despesas aumentam com o pagamento de juros, o que faz seu lucro cair, e, dessa forma, ter que pagar menos impostos (Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e Contribuição Social sobre Lucro Líquido).
Há varias alternativas tributárias para tornar nosso sistema mais justo e progressivo. É possível criar um imposto sobre grandes fortunas - previsto na Constituição, mas nunca implementado -, aumentar a alíquota do imposto sobre herança ou até mesmo reformular o Imposto Territorial Rural. Em 2011, apresentei uma PEC que altera o artigo 155 da Constituição Federal, para permitir que o Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) incida sobre veículos de luxo, como iates, jatinhos e helicópteros.
Como resolver o déficit do orçamento de 2016
Neste momento de crise, temos urgência para aprovar propostas mais eficientes e viáveis para arrecadar mais, mas fazendo justiça social.
Acredito que a resposta para o problema do déficit no orçamento do próximo ano é a retomada da tributação sobre lucros e dividendos, com uma alíquota de 15%, e a eliminação da figura dos juros sobre o capital próprio, que passaram a vigorar em 1995 com o argumento de atrair capitais e estimular os investimentos privados (apesar disso, os investimentos ficaram estagnados e o sistema tributário brasileiro ficou mais regressivo e distorcido, aumentando a concentração de renda e riqueza). O volume de lucros e dividendos distribuídos e declarados subiu de R$ 108 bilhões em 2007 para R$ 287 bilhões em 2013. Com a aprovação desses projetos, podemos arrecadar em 2016 até R$ 60 bilhões.
Sendo assim, nós podemos acabar com o déficit orçamentário sem retirar direitos dos trabalhadores, sem cortar o orçamento da União e sacrificar os investimentos públicos necessários para a retomada do crescimento. Com a elevação da arrecadação e a diminuição da taxa Selic, é possível superar essa política de austeridade, que não resolve os problemas da nossa economia. Além disso, daremos um passo importantíssimo para reformar o nosso sistema tributário, hoje regressivo e injusto.
* Lindbergh Farias é senador da República pelo PT do Rio de Janeiro.
1 comentários:
Pois é, uma professora paga imposto de renda. Que renda? Na hora de falar em taxar IR dos ricos, os políticos vão ficar contra. Fico preocupada com os brasileiros que estão sendo demitidos.
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